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CARTA ABERTA AO DESMONTE DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA NO BRASIL

A ciência precisa de investimentos consistentes e de longo prazo. Do contrário, não se promove uma cultura que valorize a emancipação intelectual, política e econômica de um país. O exemplo de países como os EUA, Alemanha, Canadá e França mostra que o investimento em ciência e tecnologia é particularmente importante em períodos de recessão, quando funciona também como motor de um desenvolvimento econômico mais estruturante. Na contramão dessas evidências, no entanto, o Brasil tem vivenciado sucessivos cortes na área de ciência e tecnologia, num processo que ameaça a continuidade da pesquisa e o conhecimento científico acumulado nas últimas décadas.  E é por isso que, nesta Semana Nacional de Ciência & Tecnologia, o país não tem nada a comemorar.

Os números falam por si: em março deste ano, o governo federal anunciou um corte de 44% nos valores previstos para 2017 do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicação (MCTIC), o que se significou uma redução de mais de R$ 570 milhões nos repasses de R$ 1,3 bilhão esperados pelo CNPq. Adicionalmente, há uma perspectiva de um novo corte em 2018 – que deverá ser da ordem de 15%, caso o Projeto de Lei Orçamentária Anual enviado pelo governo ao Congresso seja aprovado como está. Atualmente, o MCTIC opera com apenas 25% do orçamento que tinha no início da década.

A nós, professores, gestores, trabalhadores e estudantes da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV), unidade técnico-científica da Fundação Oswaldo Cruz, preocupa, em particular, a situação de formação de jovens cientistas. Há décadas, realizamos um trabalho exitoso de formação de pesquisadores ainda durante o Ensino Médio, seja com alunos próprios, como componente curricular do curso técnico integrado à formação geral, seja com estudantes de outras instituições, por meio do Programa de Vocação Científica (PROVOC), pioneiro na oferta de Iniciação Científica para esse segmento educacional no Brasil. Os bons resultados, de inserção desses jovens pesquisadores nas carreiras e nas descobertas científicas, são facilmente verificáveis. Por tudo isso, essa é – e continuará sendo - uma bandeira de luta da EPSJV e da Fiocruz como um todo.

É preciso não perder de vista que a renúncia à formação de gerações de pesquisadores é, ao fim e ao cabo, uma renúncia à soberania do Estado, uma vez que torna o avanço tecnológico dependente do investimento e da agenda de pesquisa de outros países, a despeito das demandas trazidas pela realidade brasileira concreta. Neste sentido, repudiamos os cortes realizados no âmbito da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicação, e contra essa posição mantemo-nos com o compromisso de luta pela democracia, a despeito dos duros ataques a que vem sendo submetida nos últimos meses.

De fato, a repercussão deste projeto de governo é mais do que preocupante: representa um desmonte das universidades e institutos de pesquisa e, por conseguinte, da própria ciência no país.

Rio de Janeiro, 23 de outubro de 2017.