Serviços 
O conteúdo desse portal pode ser acessível em Libras usando o VLibras
Entrevista: 
Jesus Brigos

'No socialismo não pode sobrar gente'

Jesus Brigos é professor do Instituto de Filosofia de Havana e esteve no Brasil em abril deste ano para participar do Seminário da Frente Nacional contra a Privatização da Saúde. O momento não poderia ser mais oportuno, já que os jornais noticiavam um esforço de aproximação diplomática entre Cuba e Estados Unidos, depois de décadas de bloqueio econômico. Aproveitando sua estada no Brasil, Jesus participou de outros eventos e cursos, em que abordou os riscos que estão colocados para Cuba nesse novo cenário e, principalmente, as mudanças econômicas com as quais o país tem enfrentado a crise, promovendo uma maior abertura para a iniciativa privada. Ainda existe socialismo em Cuba? É possível controlar o capital? Essas são algumas perguntas que Jesus responde nesta entrevista, em que ele reconhece o desafio do país de criar um caminho alternativo, que não está escrito em lugar nenhum. Aqui, ele também comenta o êxito das políticas sociais cubanas, principalmente de saúde e educação, e tenta se defender das críticas sobre a postura do país em relação aos direitos humanos.
Cátia Guimarães, Maíra Mathias - EPSJV/Fiocruz | 01/05/2015 00h00 - Atualizado em 01/07/2022 09h45

 Quais as principais mudanças ocorridas em Cuba a partir do anúncio da reformulação, que ampliou o espaço da iniciativa privada no país? 
 
O foco foram essencialmente mudanças no funcionamento da economia, na criação por exemplo de possibilidades de ampliar o autoemprego. Aí resulta incluir isso que você chamou de empresas privadas, mas que nós chamamos de autoemprego, ainda que essencialmente sejam empresas privadas. O que nós chamamos de lineamento é ampliar as formas de gestão da propriedade, e não se reconheceu explicitamente que essas mudanças nas formas de gestão podem significar alterações nas formas de propriedade. Aí há um problema teórico, que tem importância pratica: o lineamento está voltado a coisas que têm que ser feitas porque essa propriedade tem que funcionar de maneira diferente, tem que permitir um processo sustentável economicamente. Mas tem que fazê-lo mantendo o socialismo. Há uma parte do lineamento que diz que em Cuba a forma fundamental de direção da economia será a planificação, atendendo ao mercado. Mais aí não fica claro se isso significa socialismo de mercado, como se diz em alguns lugares; se significa controlar o mercado. Aí surge a dificuldade que eu havia explicado: não é que se pode controlar o capital, é que não se pode introduzir relações de capital. Isso está em discussão ainda em Cuba. Mas o lineamento diz respeito essencialmente a mudanças na economia e coisas que têm de ser ampliadas: deve-se aumentar a produção agropecuária, as empresas estatais têm que ser mais eficientes e eficazes; deve-se desenvolver determinadas áreas da economia.Estamos concebendo essas alterações como um aperfeiçoamento integral.Se não for feito de forma integral, quanto mais aumentar o PIB cubano mais nos convertemos em um país capitalista.Isso de que se falou muito, que aumentou o emprego privado em Cuba, a realidade é que o emprego privado existia antes como um mercado negro. Quando houve a crise econômica isso aumentou. Vamos legalizar e ordenar para que funcione como interessa que funcione, para que não se reproduza espontaneamente.
 
No momento da primeira grande crise nos anos 1990 depois do fim da União Soviética, em alguma medida nos parece que o investimento no turismo como atividade econômica, com capital privado, já era o início de uma ampliação da presença da iniciativa privada. Ali já era o início da mesma solução que Cuba está regulando hoje?
 
Essa é uma ampliação do enfrentamento da crise. Na crise, desapareceu o campo socialista.O que podia fazer ingressar novas divisas de maneira mais rápida para podermos comprar fora o que precisávamos era o turismo. Primeiro de tudo tivemos que permitir que fosse usado o dólar em Cuba, que.circulava ilegalmente mas foi autorizado no ano de 1993 para poder facilitar que esse dólar que entrou pelo turismo entrasse de fato na economia cubana. Para isso tinha que ser legalizado, estabelecendo-se mecanismos de câmbio, ordenando pouco a pouco. Nos anos 1990 era questão de subsistência obter dinheiro para pagar as coisas. O único dinheiro que tínhamos era dos poucos hotéis. E com esse dinheiro decidíamos se comprávamos petróleo ou leite em pó, de acordo com a situação do país. Às vezes tínhamos que comprar petróleo porque tínhamos que manter a eletricidade. Em algumas províncias do país às vezes eram 12, 16 horas sem eletricidade. Por isso começamos a ampliar o turismo. Não tínhamos dinheiro para construir hotéis, tivemos que começar a fazer negócios com empresas estrangeiras. . Isso nos permitiu respirar um pouco. Hoje em dia segue-se construindo hotéis, mas os investimentos novos no turismo são feitos a partir das próprias divisas geradas pelos hotéis.
 
Mas isso não significa que o capital já não entrou em Cuba?
 
Se falamos em termos rigorosos, o capital já entrou em Cuba. Agora, nós temos que entender que não podemos regular o capital. Mas o que temos que fazer é vacinar-nos, isto é, fazer de alguma forma com que esse capital que entrou deixe de ser capital e que o que de novo fizermos não comece sendo capital. Por isso dizia que temos que inventar. Se o primeiro começou tendo fins lucrativos, se a “enfermidade” entrou, temos que dar a “vacina” e fazer com que o outro não entre dessa forma. Temos que ter como principio não permitir que as relações socioeconômicas geradas entre patrão e empregados e deles com a sociedade sejam relações de exploração. E isso não é somente criar impostos.Se quer que sejam colaboradores seus tem que deixar que participem com você das decisões, eles têm que intervir no planejamento. Não só recebendo ordens mas intervindo no Estado.E aí tem que ter a força política nossa fazendo com que eles trabalhem em função da sociedade e não em função do lucro.
 
Grande parte da situação difícil de Cuba desde os anos 1990 é atribuída ao embargo dos Estados Unidos. Mas existem outros elementos que podem ser determinações também: o fato de Cuba ter feito uma revolução socialista sendo um país ainda não desenvolvido e de ter bancado o desafio do socialismo num só país, por exemplo. Qual é a parcela de responsabilidade de cada um desses elementos? 
 
A parte que não corresponde ao embargo corresponde a erros nossos. Vou te dar um exemplo: nos anos 1960 em Cuba se eliminou praticamente todo tipo de negócio privado. Isso teve que ser feito não por razões econômicas. Mesmo Fidel, em uma visita que fez em 1959 aos Estados Unidos, em uma reunião com jornalistas norte-americanos disse que tinha  interesse em ajudar aos pequenos empresários cubanos a desenvolver-se, para trabalhar em função da nova sociedade. Mas o que aconteceu? Em muitos desses negócios privados começou-se a apoiar a contrarrevolução. Então, por uma razão política, foi preciso expropriar todas essas pessoas e colocar os trabalhadores para administrar diretamente seus recursos. Aos trabalhadores e, ao final, ao Estado que representa os trabalhadores. Isso teve que ser feito.Já o tabaco em Cuba sempre funcionou bastante bem e sempre esteve em mãos privadas. O tabaco nunca foi nacionalizado em Cuba e foi uma sorte que não tenhamos feito isso, porque o tabaco tem suas diferenças: quando são cultivos de tabaco para produzir cigarros isso pode ser feito de forma mecanizada, mas quando é para a elaboração de charutos, aí é muito importante que sejam camponeses que tenham suas pequenas propriedades porque o tabaco tem que ser tratado como uma criança: deve-se colocar telas em algumas épocas do ano para que não receba muito sol, para que não dê pragas. Isso não se pode fazer com grandes extensões estatais, maquinário. Qual o sentido de que os que consertam sapatos pertençam a um ministério dirigido de forma centralizada em Cuba? Para consertar sapatos pode ser uma pessoa em sua casa com duas ou três máquinas. Ninguém vai ficar rico consertando sapatos. Esse é o tipo de propriedade privada que nós pensamos que poderia se reestabelecer em Cuba. Quando começamos a abertura nos anos 1990 os negócios privados, tinham que ser familiares. Eu podia abrir um restaurante mas não podia contratar ninguém, tinha que ser minha filha, minha esposa. Agora permitimos contratações. São permitidos 30 contratados legalmente. Às vezes, de forma não legal tem mais 30. E a esses se explora mais, porque para os 30 contratados há leis trabalhistas em Cuba que os protegem. Os outros, como estão ilegais, não estão protegidos por nenhuma lei.
 
Qual é o interesse dos Estados Unidos que justifica que nesse momento eles sinalizem com uma reaproximação com Cuba?
 
Eu tenho bem claro que o objetivo é destruir a revolução. Para isso impuseram o bloqueio. Mas depois que o impuseram sempre vinham estudando como endurecê-lo ou abrandá-lo quando lhes convinha. Se se reestabelecem relações e eles ajudam esse proprietário privado a enriquecer, isso o levará a ser favorável a acabar com o socialismo em Cuba. Então, nesse ponto de vista eles sabem que nós temos que lutar para que esse privado não se reproduza como capitalista Se agora que trabalho em uma empresa privada começo a ganhar mais e viver melhor materialmente do que quem trabalha em uma empresa estatal, vou terminar no longo prazo defendendo a empresa privada. Isso é o que temos que lutar em Cuba para que não se desenvolva e para isso temos que ter a empresa estatal que funcione bem,  trabalhar em uma empresa estatal tem que permitir às pessoas viverem bem, a empresa estatal tem que poder garantir os serviços públicos de saúde, educação, com qualidade.
 
Pelas notícias que saíram no Brasil quando esse primeiro pacote foi apresentado, parecia que parte dessa abertura para pequenas propriedades privadas dizia respeito à dificuldade do Estado de manter aquele volume de trabalhadores vinculados as estatais... 
 
Em Cuba existia uma situação em que todo mundo tinha trabalho. Em um lugar em que uma pessoa poderia dar conta, trabalhavam quatro pessoas. Uma empresa que funcione assim não é eficiente. Mantém-se ainda em Cuba que a empresa estatal precisa ser mais eficiente, que o que pode ser feito com um trabalhador não tenha de ser feito com três. Mas para isso temos que colocar tecnologia na empresa e precisamos de dinheiro. Nosso discurso político às vezes foi ruim, porque às vezes houve quem dissesse que tínhamos que aliviar o Estado. Esse é o mesmo discurso neoliberal. Fidel sempre dizia que não podemos falar que sobra gente. No socialismo não pode sobrar gente. Mas não pode haver gente fazendo menos do que podem fazer. Às vezes o que se fez é que para poder ter só um fazendo o trabalho de um, pegávamos os outros três e pagávamos seus salários enquanto eles estudavam para que se preparassem para trabalhar em algum novo investimento que iríamos fazer quando tivéssemos recursos. Hoje não temos recursos. Quando começamos a gerar possibilidades de recursos como fizemos com o turismo, nossa economia cresce e podemos ter novas fábricas, novos centros de trabalho com novas tecnologias, propriedades do Estado. Não é nosso interesse desmantelar o Estado.
 
Historicamente existe um grupo grande de cubanos que migraram para os Estados Unidos e são donos de várias empresas, pilotam aviões, são donos das emissoras de rádio que fazem propaganda contrarrevolucionária.  Como essa abertura pensa a inclusão dessas pessoas?
 
Nesse momento a lei não excluiu a possibilidade de que cubanos que moram fora invistam em Cuba. Mas não é qualquer cubano que vamos deixar investir. Um cubano que conseguiu juntar dinheiro fora do país, que abriu uma empresa de construção e quer fazer o mesmo em Cuba, tudo bem, venha à Cuba com as regras que nós estabelecemos, com as normas de contratação que nós estabelecemos. Hoje esse investimento de cubanos no exterior já está presente de forma não oficial.  Os cubanos recebem remessas, então se sabe que determinados serviços que foram criados como negócios em Cuba foram feitos com dinheiro recebido dos Estados Unidos. Por isso temos que regular tudo isso. Isso gera desigualdades, o cubano que recebe remessas vive melhor que o cubano que não recebe.
 
Nessas primeiras negociações com a diplomacia norte-americana, Cuba também estabeleceu exigências? Existe alguma referência a Guantánamo?
 
Não me lembro de isso ter sido mencionado nos comunicados oficiais sobre os debates. Em 1962, quando houve a crise dos mísseis, Fidel colocou cinco condições que teriam de ser cumpridas para o reestabelecimento das relações. Desde aquele momento, sempre tivemos a posição de negociar com os Estados Unidos. O primeiro era o fim do bloqueio, que eles justificam porque dizem que Cuba tirou propriedades deles. Isso é falso. Cuba nacionalizou todas as propriedades estrangeiras que havia em Cuba, mas a todas indenizou mediante compensações. Os Estados Unidos nunca quiseram sentar para conversar. Outro ponto  era a retirada da base de Guantánamo. Estou seguro de que esse será um ponto de discussão. Porque está claro que nós não queremos a base de Guantánamo. Esse território é nosso e tem de ser devolvido.
 
Queria falar sobre da perspectiva dos direitos humanos: é ótimo quando você diz que garantir saúde para o conjunto da população, universal, pública, gratuita e de alta qualidade como Cuba tem é respeito a direitos humanos. Mas o que se convencionou chamar de direitos humanos envolve um conjunto de questões que vão além desses direitos mais ligados a políticas sociais. E Cuba tem um histórico de denúncias nessa área...
 
Cuba é criticada por manter a pena de morte, mas para que delitos temos pena de morte? Para estupro. Essa pessoa pode ser condenada à pena de morte, mas isso depois que todas as provas sejam apresentadas e ela tenha chance de se defender. Fuzila-se em Cuba a quem comete um atentado terrorista. No ano que nós fuzilamos pessoas, foram pessoas que colocaram em perigo a vida de centenas, sequestrando barcos que não tinham condições para navegar, levando gente à força e pondo em risco o país, porque, pelas leis dos Estados Unidos, se se produz uma migração desordenada, isso pode ser usado como justificativa para agredir Cuba. Por isso fuzilamos essas pessoas. Deve-se ter pena de morte para quem põe em risco um país.  É muito banal dizer que com isso não há respeito aos direitos humanos. Desrespeito aos direitos humanos é condenar pessoas à pena de morte somente por serem negras, como acontece nos Estados Unidos, o país que mais aplica a pena de morte no mundo.
 
Mas você deu o exemplo do estupro. Qual é o limite racional dentro dos princípios da revolução para se estabelecer que o assassinato de uma pessoa não é passível de pena de morte e o estupro é?
 
Em Cuba existe um consenso social de rejeição tão grande a esses crimes que a população não vê com maus olhos a aplicação da pena de morte. Há uma cultura de rejeição a esse tipo de crime. Há uma cultura profunda de rejeição a quem viola uma mulher, uma criança, à pedofilia. Tenho muitas discussões com amigos espanhóis que dizem: 'por que uma pessoa que molesta alguém tem de ser fuzilado?'. E eu pergunto: e se violarem sua irmã, sua filha?
 
Mas esse é o discurso da direita no Brasil.
 
É o discurso da direita, mas não é interpretado como uma vingança. Essa é uma pessoa que não pode viver em sociedade. Se for comprovado que é um doente mental, não se condena a morte, vai para um sanatório. Há um problema cultural também. A cultura cubana é profundamente machista. Nos anos 1960 houve certa repressão contra os homossexuais que inclusive foi mais longe: acontecia de cubanos que tinham cabelos compridos e eram acusados de serem homossexuais e colocados para trabalhar em fazendas especiais. Isso foi um erro. Mas isso não existe mais.
 
Em relação a essas questões, que não são imediatamente de classe, que dizem respeito ao fim do machismo, do preconceito contra homossexuais, do racismo etc, existe um trabalho também educativo do Estado em Cuba?
 
Existe um trabalho educativo, mas isso que não é diretamente classista é classista também. E o classista não é fácil de mudar. Há o trabalho ideológico, cultural, mas isso não basta. Há pessoas que dizem que é preciso dar os mesmos direitos às mulheres, aos negros. Em Cuba, desde 1959 todos temos os mesmos direitos, mas temos que efetivar isso. Em Cuba não há discriminação racial. Entretanto permanecem diferenças raciais na quantidade de negros que chegam à universidade em determinadas carreiras e a quantidade de brancos. Até por questões culturais. Nas famílias negras não há a tradição de estudar física, química, direito. Há a tradição de estudar arte, esportes. Isso não é discriminação racial. Há tradições que não se pode mudar com uma lei revolucionária. Isso é parte da transição cultural que tem de ser feita.
 
Se nos países capitalistas a centralização dos interesses econômicos no Estado são obstáculo ao desenho da democracia burguesa, na qual parece que todo mundo pode participar, na situação concreta de Cuba eu queria que você analisasse em que medida a centralização do poder político também pode ser um obstáculo à realização plena do modelo de participação que o país construiu.
 
Se o Estado socialista se desenvolve como um Estado muito centralizado, um Estado que termine sendo de um grupo de dirigentes, não vai ser socialista. O Estado cubano faz com que todo mundo seja efetivamente parte das decisões. Na medida em que se consegue isso, fortalecemos o Estado. Não falo em fortalecimento do Estado no sentido de ter um presidente mais poderoso. Fortalecimento do Estado é que os sindicatos tenham efetivamente a possibilidade de levar os interesses dos centros de trabalho às decisões estatais. Que as mulheres tenham efetivamente possibilidade de levar seus interesses. Se não funciona assim, não é socialista. O cubano de hoje tem mais possibilidades de atuar nesse sentido: já não é analfabeto, já não é inexperiente politicamente. O que antes era suficiente como participação, hoje é insuficiente. O cubano de hoje tem condições de propor ideias, de formular políticas. Isso é o que necessita a sociedade cubana cada vez mais. Através dos delegados eleitos, as pessoas têm que estar constantemente influenciando as políticas estatais, fazendo críticas as leis, sugerindo novas leis. Pode ser através dos delegados, pode ser através dos sindicatos. Em Cuba há toda uma estrutura para que isso ocorra. 
 
Cuba tem indicadores sociais impressionantes. O próprio Banco Mundial reconheceu agora o sistema público de educação de Cuba como o melhor da América Latina, o sistema de saúde cubano é um exemplo inspirador. Em que países Cuba tem equipes de saúde hoje?

Quase não consigo enumerar: tem no Brasil, muitos na Venezuela, tem também em países da África. Na crise do Ebola, os que mais mandaram médicos e enfermeiros foram os cubanos, um deles inclusive ficou doente. Temos médicos em todos os países que nos pedem. Quando houve o terremoto no Haiti, me incomodaram as notícias que falavam dos médicos venezuelanos, brasileiros e nada diziam dos médicos cubanos. É que os médicos cubanos não chegaram com o terremoto, já estavam lá! Há médicos cubanos na Guatemala, Honduras, El Salvador, em todos os países da América Latina praticamente. Oferecemos até aos Estados Unidos quando houve o Katrina, mas eles não os quiseram. Em 48 horas preparamos uma brigada de mil médicos e enfermeiros, que foram equipados, preparados e oferecidos aos Estados Unidos para ajudar no Katrina e eles não aceitaram. E aí morreram muitos negros principalmente.

 
Mas há pessoas que dizem que não é preciso ser um país socialista para ter bons indicadores de saúde e educação, e trazem o exemplo da Suécia, da Inglaterra, da Finlândia. Qual é a diferença desses indicadores, do modelo e da situação de saúde e educação em um país como Cuba?
 
A primeira diferença é que os países capitalistas que alcançaram isso são os mais ricos. Guatemala, Honduras, El Salvador não alcançaram. Ainda que não diretamente, eles alcançaram isso à custa de que esse capital explore o resto do mundo. Fala-se muito no sistema educacional da Finlândia, mas ali se educam as pessoas no sentido do capital humano, de se preparar para ser um gerente da Coca-Cola. Nós não educamos as pessoas nesse sentido. Educamos no sentido de preparar para desenvolver suas potencialidades para ser útil à sociedade. Acredito que são diferenças essenciais. Um país pobre capitalista não vai poder ter esse modelo. Mesmo os países ricos capitalistas estão desmontando seus sistemas. Eles o mantiveram porque ao capitalista faz falta ter uma força de trabalho sadia, mas também porque existia o contrapeso do campo socialista. Ideologicamente, tinham que competir. Quando desaparece esse contrapeso, começa a desmontagem dos sistemas de saúde. Mas não podemos esquecer que os países capitalistas que alcançaram bons indicadores são países ricos.