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Abertura do Fórum Mundial é marcada por protestos dos estudantes

Grupos organizados de estudantes interrompiam as falas oficiais com palavras de ordem que denunciavam os cortes no orçamento da educação.
Cátia Guimarães - EPSJV/Fiocruz | 27/05/2015 08h00 - Atualizado em 01/07/2022 09h47
Em auditório lotado, estudantes protestam contra os cortes na educação Foto: EPSJV/Fiocruz

A mesa estava cheia de autoridades, mas quem ganhou a cena na abertura do 3º Fórum Mundial de Educação Profissional e Tecnológica foram os estudantes. Da platéia, grupos organizados de estudantes de diferentes níveis interrompiam as falas oficiais com palavras de ordem que denunciavam, principalmente, os cortes no orçamento da educação. “Ô Dilma, que papelão, cortando verba da educação”, gritavam diferentes entidades do movimento estudantil, fazendo referência à diminuição de mais de R$ 9 bilhões do orçamento da educação, anunciada há poucos dias.

O ministro da educação, Renato Janine Ribeiro, principal alvo dos protestos, contou da sua participação recente no Fórum Mundial de Educação, que aconteceu de 19 a 22 de maio, na Coreia do Sul. Referindo-se à Declaração de Incheon, documento final do encontro, que estabelece metas para 2030, o ministro avaliou que o Brasil está muito bem no cenário internacional. Ele destacou, por exemplo, que a declaração estabelece que os países devem aumentar o financiamento da educação de modo a chegar a 6% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2030, lembrando que o Brasil já investe 6,6% do PIB e, de acordo com o Plano Nacional de Educação, deve chegar a 7% até 2020. “Sem verba não chega”, gritaram alguns estudantes, da plateia. “Todos nós aqui somos pela educação, mesmo os que divergem”, disse o ministro. Segundo Renato Janine, o Brasil foi acolhido no Fórum Mundial com muita festa e tratado como exemplo de um país que promoveu inclusão social sem perda de qualidade.

O ministro fez um balanço mais amplo das ações de governo realizadas nos últimos anos, destacando ações como a redução da miséria promovida pelo Bolsa Família e a política de valorização do salário mínimo, destacando que, agora, é hora de fazermos com que o trabalhador ganhe “pela sua produtividade”. “Daí a importância da Educação Profissional e Tecnológica. É essa lógica que anima o governo a dizer que o trabalho de vocês é muito importante”, disse, dirigindo-se ao auditório lotado para, na sequência, destacar a importância de se superar a divisão social que se estabelece entre uma educação voltada para o trabalho e outra direcionada ao “lazer”. Defendendo que a opção entre o caminho do curso superior e a educação profissional deve ser cada vez mais “uma questão de vocação”, ele fez referência à importância do ensino médio integrado.

Fora da mesa: reivindicações

Além do ministro da educação, compuseram a mesa que abriu evento na noite do dia 27 de maio, Cláudia Sansil, reitora do Instituto Federal de Educação Profissional e Tecnológica (IFPE) e coordenadora-geral do Fórum Mundial de Educação Profissional e Tecnológica; Eliezer Pacheco, do Conselho Internacional do Fórum Mundial de Educação e secretário de Educação de Canoas (RS); Fred Amâncio, secretário de Educação de Pernambuco; Marcelo Feres, secretário de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação (Setec/MEC); Belchior Rocha, do Conselho de Reitores dos Institutos Federais (Conif); Eduardo Davi Negrín, do Conselho Internacional do Fórum; e Maria José de Sena, reitora da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFPE). Embora tenham participado das reuniões com a comissão organizadora do Fórum, não havia representante de estudantes na parte de cima do palco. E essa era uma das “indignações” manifestadas pelo movimento estudantil. De acordo com João Paulo Lopes, da Federação Nacional dos Estudantes em Ensino Técnico (Fenet), eles solicitaram essa participação diretamente ao secretário de Educação Profissional e Tecnológica do MEC, Marcelo Feres, mas ela foi negada. Essa era uma queixa pontual, mas a pauta de reivindicações que mobilizou os muitos gritos que interromperam as falas da mesa ia muito além. “Somos contra o corte de R$ 9 bilhões na verba da educação”, explicou João Paulo.

Uma consequência direta e imediata desse corte na vida dos estudantes é a diminuição do quantitativo e o atraso no pagamento das bolsas de assistência estudantil. Segundo o militante da Fenet, nos Institutos Federais há perda na oferta de bolsas e atrasos que chegam a sete meses, dificultando a situação do aluno de mais baixa renda. “A expansão dos Institutos Federais não está conseguindo se dar com qualidade. Não adianta ter só expansão”, disse.

Essa pauta também mobilizou os estudantes universitários no Fórum Mundial de Educação Profissional e Tecnológica. Em resposta à fala do ministro — que, diante dos gritos de “cadê minha bolsa?”, destacou a importância de não se pensar apenas em si mesmo e nos seus “privilégios” —, Camila Falcão, do Diretório Central dos Estudantes da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), garante que a pauta do movimento estudantil é coletiva. Segundo ela, além do mesmo cenário de diminuição das bolsas, o processo de expansão da universidade sem a devida infraestrutura traz outros problemas, como a inexistência de restaurante universitário nos campi localizados fora da sede. “Isso é pensar no coletivo, é pensar nos estudantes que desistem do curso porque não tem restaurante para comer”, disse. De acordo com a militante, uma pesquisa realizada pelo Fórum Nacional de Pró-reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis (Fonaprace) mostrou que com R$ 2,5 bilhões seria possível garantir plenamente a política de assistência estudantil em todo o país. O cenário atual, segundo ela, é de R$ 1,5 bilhão, e esse montante está sendo reduzido em função dos cortes orçamentários.

Mas a participação do movimento estudantil universitário no Fórum também foi movida por pautas mais amplas, como a crítica ao Projeto de Lei aprovado na Câmara dos Deputados com o nº 4330, que regulamenta a terceirização. Mas a principal reivindicação, segundo Camila, é o investimento imediato (e não progressivo) de 10% do PIB na educação pública – discordando, inclusive, do texto final do Plano Nacional de Educação (PNE), que considera como pública a oferta privada que se dá por meio de programas governamentais como Pronatec e Prouni. “Educação não pode ser mercadoria”, justifica, denunciando que a crise não afetou o pagamento da dívida pública. Não por acaso, outro canto de protesto que se ouviu repetidas vezes durante a abertura foi: “É ou não é piada de salão, tem dinheiro pra banqueiro, mas não tem pra educação”.