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A construção do SUS e a crise atual

Aula inaugural do Curso de Qualificação em Registros e Informações em Saúde da EPSJV debateu o tema com o professor Ary Miranda
Julia Neves - EPSJV/Fiocruz | 20/04/2018 11h56 - Atualizado em 01/07/2022 09h45

‘Um breve histórico da saúde no Brasil: o processo de construção do SUS e a crise atual’ foi o tema da aula inaugural do Curso de Qualificação Profissional em Registros e Informações em Saúde (Cetris), realizada no dia 18 de abril, pela Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocuz). A aula foi apresentada pelo professor-pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (Ensp/Fiocruz), Ary Miranda. “Com o curso, reafirmamos o nosso compromisso com a educação pública de qualidade, socialmente referenciada, assim como, ao nos comprometermos em contribuir com uma ação dos trabalhadores do Sistema Único de Saúde, estamos resistindo ao desmonte desse sistema”, destacou Anakeila Stauffer, diretora da EPSJV.

Na apresentação, Ary fez um histórico do modelo de atenção à saúde no Brasil. Segundo ele, desde 1930, começou a se discutir sobre a instituição de um sistema de saúde que pudesse responder às necessidades da população. “Até então, não existia um sistema público de saúde. A partir daí, a saúde passou a se organizar em dois setores fundamentais: a saúde pública, que provém do Estado, consagrado depois como Ministério da Saúde e que tinha a responsabilidade de promover campanhas de vacinação, por exemplo; e a previdência social, com os institutos de aposentadoria e pensão”.

Nessa época, apenas trabalhadores do mercado formal tinham direito à assistência. O professor ressaltou que esse modelo de atenção à saúde era campanhista, ou seja, centrado em campanhas sanitárias para combater problemas de saúde, e assistencial centrada na previdência social. “Esse sistema aumenta a arrecadação previdenciária e vai marcando desde então a nossa briga atual, de que saúde não é mercadoria. Os interesses privados na saúde brasileira não são uma questão de agora, existe um processo histórico que nasce na criação do sistema de saúde brasileiro”, esclareceu.

Segundo Ary, a 8ª Conferência Nacional da Saúde, em março de 1986, foi considerada um marco histórico, por ter proposto a criação de um sistema de saúde universal e, diferente das anteriores, ser aberta à sociedade. Na Conferência, segundo ele, foram formadas as bases para a seção ‘Da Saúde’ da Constituição Federal de 1988, que estabeleceu que saúde é direito de todos. “A Conferência definiu três eixos temáticos: a saúde como direito, que rompe com a lógica anterior de que só quem estava no mercado formal tinha acesso; a reformulação do sistema; e, consequentemente, a reformulação global da lógica do financiamento”, disse.

O professor destacou ainda a importância do SUS, criado a partir de todo esse contexto. Segundo ele, até 1990, metade da população era excluída da assistência à saúde: “Hoje, 75% da população – o equivalente a 155 milhões de pessoas – depende, exclusivamente, do SUS para seus cuidados em saúde”, informou. E completou: “Mais de 50 milhões de habitantes têm planos de saúde. Imagina a escala de renúncia fiscal desses planos“”. A contradição de um país que construiu um sistema público e universal mas assiste ao crescimento do mercado privado de saúde pode ser identificada também , segundo Ary, no funcionalismo público. “Os funcionários públicos do país têm planos de saúde financiados pelo Estado. Isso é o repasse de recursos públicos para a iniciativa privada. Existem formas disfarçadas de repasses que a gente nem percebe”, exemplificou.

O mercado é também, de acordo com o palestrante, quem ainda hoje orienta a formação em saúde, principalmente nas faculdades de medicina, que atendem aos interesses das indústrias do ramo de tecnologia da saúde. “A formação desses profissionais é feita na lógica da tecnologia. A investigação clínica é praticamente desconsiderada. O médico não olha no seu olho. Ele pede exames só”, criticou.

Ary também aproveitou a aula inaugural para falar da  crise política atual no Brasil, destacando o impeachment da presidente Dilma Rousseff, que ele classificou como um fenômeno muito grave, que foi. “Estamos vendo um avanço das forças mais reacionárias que querem favorecer o grande capital. O golpe não foi dado porque denunciou corrupção, foi dado porque querem aprovar as reformas para sustentar o grande capital. Querem desestruturar o pouco que conseguimos com o SUS. A reforma trabalhista, inclusive, tem requintes de crueldade, quando autoriza grávidas a trabalharem em locais insalubres”, concluiu.

Curso

Sob a coordenação dos professores-pesquisadores da EPSJV Sergio Munck, Martha Sharapin e Fernanda Martins, o Curso de Qualificação Técnica em Registros e Informações em Saúde (Cetris) tem carga horária de 280 horas, com previsão de término em dezembro de 2018. Está organizado em cinco eixos temáticos – ‘Introdução às Políticas Públicas de Saúde no Brasil’, ‘Fundamentos em Trabalho, Educação e Saúde’, ‘Organização do processo de trabalho em Registros e Informação em Saúde’, ‘Análise da Situação de Saúde’ e ‘Sistemas e Informações em Saúde’. “Temos o objetivo de qualificar esses profissionais para organização dos serviços de registros e análise de informações em saúde, visando à melhoria do SUS”, explica Sergio.

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