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EPSJV promove oficina sobre relatório do Banco Mundial

Escola Politécnica aprofunda debate sobre o relatório do Banco Mundial que ataca especialmente o funcionalismo público e as áreas da educação e da saúde
Julia Neves - EPSJV/Fiocruz | 19/12/2017 10h03 - Atualizado em 01/07/2022 09h45

“O governo brasileiro gasta mais do que pode e, além disso, gasta mal”, conclui o relatório ‘Um ajuste justo: análise da eficiência e equidade do gasto público no Brasil’, lançado pelo Banco Mundial no dia 21 de novembro de 2017. O documento sugere uma série de medidas de contenção de despesas que poderiam produzir, segundo o Banco, uma economia de até 8,3% do Produto Interno Bruto (PIB) até 2026. Polêmico, o relatório provocou manifestações em diversos segmentos da sociedade, por trazer recomendações que, ao afetarem diretamente os setores públicos de educação e saúde, podem resultar em graves prejuízos para uma enorme parcela da população brasileira. Pensando nisso, a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) promoveu, no dia 15 de dezembro, uma oficina para aprofundar a discussão interna do documento. “Nós da Escola Politécnica temos um compromisso e não poderíamos nos omitir diante desse relatório que sugere recomendações, incluindo algumas que já estão em curso como a Reforma da Previdência. Vemos essa oficina como um primeiro passo para outros encaminhamentos institucionais”, destacou Geandro Pinheiro, pesquisador da EPSJV.

Marcela Pronko, professora-pesquisadora da EPSJV, aponta que o documento foi feito sob medida para o Brasil, com uma base fornecida pelo próprio governo brasileiro. “Um documento como esse é objeto de reflexão para a Escola Politécnica como instituição pública, porque tem uma forte inflexão para repensar o setor público no Brasil. Não se trata de orientações gerais, mas sim de um estudo específico sobre o país e isso nos afeta como instituição que trabalha diretamente na interface entre saúde, trabalho e educação, porque, de fato, são três dos pilares sobre os quais o documento se debruça para definir quais são as políticas que o governo terá de adotar nessas áreas”, afirmou a pesquisadora.
 

Ataque ao funcionalismo público

De acordo com Marcela, o relatório parte do fato de que o teto dos gastos, adotado em dezembro de 2016, é o primeiro passo, mas não é suficiente para manter uma trajetória de crescimento econômico. Visando enxugar os gastos públicos, o documento traz recomendações para os tópicos: sustentabilidade e tendências fiscais; análise comparativa internacional da massa salarial do setor público; potencial de economias nas compras públicas; revisão do sistema previdenciário brasileiro em um contexto internacional e níveis de gastos com programas de apoio ao mercado do trabalho e assistência social, do setor de saúde, da educação e com políticas de apoio à empresa.

A novidade do relatório, segundo Marcela, é o ataque ao funcionalismo público. O documento afirma que, “embora o funcionalismo brasileiro não seja grande para padrões internacionais, o nível dos salários dos servidores públicos ferais é, em média, 67% superior aos do setor privado, mesmo após levar em consideração o nível de educação e outras características dos trabalhadores como idade e experiência”, algo atípico para padrões internacionais. O estudo traz ainda que a redução pela metade dos salários dos servidores em relação ao setor privado geraria uma economia equivalente a 0,9% do PIB. “No curto prazo, o banco propõe a suspensão de reajustes nas remunerações do funcionalismo”, ressalta Marcela.
Segundo a pesquisadora, há duas grandes questões que o relatório não trata: a dívida pública e a política tributária: “A dívida aparece como os gastos abaixo da linha, aqueles que não se discute. Já a questão tributária é considerada regressiva, afeta mais os mais pobres e menos os mais ricos. Porém, isso que deveria ser a base para um ajuste justo. Nessa perspectiva, o argumento é que não há estudos suficientes sobre as alternativas à política tributária brasileira. O que é escolhido para discussão é aquilo que afeta de fato o conjunto da sociedade brasileira, através das políticas sociais”.
Geandro destacou que no relatório termos como “estimativas sugerem” ou algo similar são repetidos o tempo todo. “Ou seja, não é baseado em evidências”, alertou ele. E completa: “O texto é bastante capcioso, porque ele pega questões que nos são caras para poder fazer orientações que não nos são caras. O documento traz um conjunto de pegadinhas. Quando fala que quer um ajuste justo, claro que queremos isso, mas não dessa forma”.

Ao final da oficina, ficou definida a elaboração de um texto coletivo sobre o tema e a organização de um seminário aberto ao público no início do próximo ano letivo da EPSJV.

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