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EPSJV promove roda de conversa sobre educação e tecnologias

Encontro teve como objetivo problematizar a maneira como as tecnologias vêm sendo incorporadas aos processos educativos e no trabalho docente
Portal EPSJV/Fiocruz - EPSJV/Fiocruz | 17/08/2018 11h28 - Atualizado em 01/07/2022 09h44

A Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) promoveu na manhã de terça-feira (14/08) uma roda de conversa sobre educação e tecnologias, com o tema ‘Formação, Trabalho Docente e Tecnologias nas Políticas Educacionais Brasileiras’. A palestrante convidada foi a professora da Faculdade de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) Raquel Goulart Barreto.

Essa foi a primeira de quatro rodas de conversa que a EPSJV promove este semestre sobre educação e tecnologias. Segundo Elizabeth Leher, professora-pesquisadora da EPSJV, o objetivo dos encontros é problematizar o modo como as tecnologias têm sido incorporadas aos processos educativos e na organização do trabalho docente. “Estamos desafiados a encontrar caminhos teóricos e metodológicos que possibilitem que a apropriação das tecnologias possa mediar práticas pedagógicas que adensem a formação politécnica. É um desafio crítico ao uso fetichizado, em que as tecnologias, contraditoriamente, aprofundam a alienação do trabalho pedagógico”, afirma Elizabeth, que rejeita a concepção que vê as tecnologias como neutras nas políticas educacionais e como um imperativo da chamada “revolução tecnológica”. “Nosso objetivo é debater criticamente a incorporação das tecnologias aos processos de ensino-aprendizagem na EPSJV e construir coletivamente caminhos que permitam novos horizontes e possibilidades de construção do conhecimento promovendo a desconstrução de modelos pedagógicos lineares”, explica.

Segundo Raquel Goulart, um marco das políticas de incorporação de tecnologias na educação no Brasil foi a criação da Secretaria de Educação à Distância (Seed) do Ministério da Educação. “O fato é que a secretaria que foi criada era de educação à distância, e não uma secretaria que pensasse nas tecnologias como forma de enriquecer o processo pedagógico. No Brasil, quando se foi implementar programas oficiais de incorporação de tecnologias, se fez isso através da SEED, ou seja, através de tecnologias para a educação à distância. Nas formulações oficiais é central essa ideia da tecnologia que resolve tudo, que é o grande sujeito”, afirmou. Nessa perspectiva, a incorporação das tecnologias no processo educacional no Brasil tem representado um elemento de precarização do trabalho docente e esvaziamento da formação tanto de docentes quanto de estudantes.

A professora da UERJ falou sobre como isso tem se dado na rede municipal do Rio de Janeiro. Raquel observa que houve uma “reconfiguração do campo educacional” a partir do alinhamento entre as políticas educacionais e as formulações dos chamados reformadores empresariais da educação. “Se a gente consultar os textos legais vamos ver que o ensino foi meio que abolido. Só se fala em aprendizagem. Nos documentos do Banco Mundial se fala em ‘acessar a aprendizagem’. Ora, se eu for ‘acessar a aprendizagem’ é porque ela já está lá, pronta. Não é mais um processo interno”, afirmou Raquel. A professora citou o exemplo da ‘Educopédia’, plataforma online que segundo ela “sustenta a política de educação do município do Rio”. “A Educopédia é um depósito de ‘objetos de aprendizagem’ que os professores podem acessar pelo conteúdo e pela série. Então se você clicar em matemática, sexto ano, está tudo lá, pronto. Então aquele discurso de que essa plataforma pode representar um complemento importante perde o sentido, já que as aulas estão todas ali, para cada semana letiva”, disse.

Segundo a professora, plataformas como a Educopédia sustentam transformações na organização do trabalho docente na esteira da implantação de projetos como o ‘6º ano experimental’, em que um mesmo professor dá aulas de todas as disciplinas. O projeto foi implementado em 2011 em 53 classes do 6º ano na rede municipal de ensino. “Algumas professoras deram depoimentos de que os alunos chegam ao final do 6º ano experimental muito defasados enquanto os professores estão exaustos. E só serve para economizar, ao invés de ter cinco professores tem um”, alerta. A rede municipal do Rio emprega também o que chama de “professores polivalentes”, no 7º e 8º anos do ensino fundamental, que são responsáveis por ministrar as aulas de todas as disciplinas de uma mesma área. O professor da área de humanidades, por exemplo, precisa dar aulas de língua portuguesa, história e geografia. “Formação é outra palavra cujo sentido foi ressignificado, virou certificação pura e simples. A Secretaria Municipal de Educação criou uma coisa que é a Escola de Formação do Professor Carioca - Paulo Freire, que não mantém contato com nenhuma das universidades organizadas nessa cidade, e que promove uma espécie de milagre pedagógico que em uma semana faz o professor ter a formação que ele teria em 20 anos em algumas semanas, fazendo cinco cursos diferentes”, reclamou.

Segundo ela, a Escola de Formação oferecia para os candidatos aprovados no concurso para o município do Rio um livro chamado ’Aula nota 10: 49 técnicas para sem um professor campeão de audiência’, patrocinado pela Fundação Lemman. “Além de ter a Educopédia que diz pra o professor que as aulas estão todas prontas, é só clicar, ainda dá para ele um livro destes. O professor vai começar sua carreira colocado no lugar de ‘animador’, de ‘facilitador’. Pensando o processo de trabalho, vemos que os elementos que faziam parte do processo de trabalho docente eles somem, porque o planejamento, a execução e a avaliação saem do controle dele. Não é mais trabalho, é uma tarefa mesmo. A tarefa dele é ligar o computador na aula tal pra que os alunos aprendam o conteúdo tal”, pontuou. E complementou: “Se a linha for de recontextualizar as tecnologias em substituição ao processo trabalho docente e a formação, o que vai acontecer é que vai haver um esvaziamento das relações de trabalho e a formação passa a ser desnecessária; está tudo pronto, para que investir anos na formação dos professores? As tecnologias estão fazendo um ‘milagre’”, problematizou Raquel.

Estão previstas outras três rodas de conversa sobre educação e tecnologias ainda no segundo semestre de 2018, mas as datas e os nomes dos palestrantes ainda não foram definidas e serão divulgadas em breve. Os temas dos encontros serão: “A utilização de ambientes virtuais de aprendizagem nos processos formativos da EPSJV”, “O jogo como atividade pedagógica nos processos educacionais da EPSJV” e “O campus virtual da Fiocruz e o grupo de trabalho EaD Fiocruz”.