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Fiocruz divulga relatório sobre os impactos causados pela TKCSA

Documento foi elaborado por pesquisadores da Escola Politécnica de Saúde e da Escola Nacional de Saúde Pública
Talita Rodrigues - EPSJV/Fiocruz | 19/10/2011 09h00 - Atualizado em 01/07/2022 09h47


Os impactos ambientais e de saúde causados pela empresa ThyssenKrupp Companhia Siderúrgica do Atlântico (TKCSA) na região de Santa Cruz, no Rio de Janeiro, são o tema de um relatório técnico elaborado por pesquisadores da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV) e da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP), da Fundação Oswaldo Cruz. O documento ‘Avaliação dos impactos socioambientais e de saúde em Santa Cruz decorrentes da instalação e operação da empresa TKCSA’, foi divulgado neste mês. “O relatório técnico tem como objetivos contextualizar o caso, avaliar as bases técnico-científicas e os dados disponíveis referentes aos impactos à saúde ambiental e humana, visando subsidiar as futuras ações institucionais da Fiocruz na análise do problema e no apoio para a implantação de políticas e ações que protejam a saúde da população”, explica o professor-pesquisador da EPSJV, Alexandre Pessoa, que elaborou o relatório juntamente com André Búrigo (EPSJV), e os pesquisadores da ENSP, Marcelo Firpo e Marco Antonio Menezes.



O relatório apresenta os antecedentes de trabalhos da Fiocruz com siderúrgicas, a participação de pesquisadores na Missão de Solidariedade e Investigação de Denúncia em Santa Cruz, em setembro de 2010, a caracterização química do material particulado, os cenários de exposição, os impactos socioambientais negativos e a avaliação clínica de moradores atingidos pela poluição atmosférica atendidos pela Fiocruz e pela UERJ. O documento traz ainda uma linha do tempo que contextualiza o caso, apresenta as ações desde 2005 até hoje, identificando as ações da empresa, dos poderes públicos executivos, legislativos e judiciários, bem como a mobilização permanente de organizações e movimentos sociais locais, nacionais e internacionais na exigibilidade dos direitos dos moradores e pescadores.



No relatório, os pesquisadores apontam alguns aspectos importantes no trabalho que vem sendo desenvolvido em Santa Cruz. Um deles é a análise da poluição atmosférica, especialmente do material particulado liberado pela TKCSA, que pretende fornecer elementos para investigações futuras a partir da natureza dos compostos químicos presentes e respectivos aspectos toxicológicos. De acordo com o relatório, “essas análises evidenciam, além do agravamento da poluição atmosférica após o início da operação do primeiro alto-forno, os problemas potenciais de saúde produzidos pela poluição atmosférica”. Outro aspecto é a avaliação clínica de moradores atingidos pela poluição atmosférica em Santa Cruz que foram atendidos pela Fiocruz e pela UERJ, dada as dificuldades de atendimento especializado por parte do Sistema Único de Saúde (SUS) local.



Segundo o documento, o complexo siderúrgico TKCSA é considerado um dos maiores empreendimentos privados do setor produtivo na América Latina, com produção prevista de 5 milhões de toneladas anuais de aço para a exportação. O projeto recebeu, até 2010, investimentos de cerca de US$ 8,2 bilhões, sendo fruto de parceria entre a ThyssenKrupp Steel, maior produtor de aço da Alemanha e principal acionista, e a Vale, maior produtora de minério de ferro do mundo, que participa com 26,87%.



Poluição ambiental



De acordo com o relatório, antes mesmo da instalação da TKCSA em Santa Cruz, dados do Instituto Estadual do Ambiente (Inea) já apontavam a saturação da bacia aérea da região devidos aos poluentes industriais emitidos por outras empresas já instaladas no local. Ainda de acordo com o documento, as queixas dos moradores do entorno sobre a poluição causada pela TKCSA, com a emissão de um pó brilhoso prateado, começaram cerca de um mês após o início das operações da TKCSA, em julho de 2010. A população também relacionava o aumento da poluição na região a diversos problemas de saúde — respiratórios, dermatológicos e oftalmológicos. Junto com isso, a população também relatava a precária assistência prestada pelo SUS na região.



Segundo o relatório, a avaliação da poeira coletada por um morador da região em sua casa constatou a presença de diversos elementos químicos no material, como ferro, cálcio, manganês, silício, enxofre, alumínio, magnésio, estanho, titânio, zinco e cádmio, dentre outras. De acordo com o texto, essas substâncias podem causar problemas respiratórios, principalmente em populações mais vulneráveis, como crianças e idosos, além de outras enfermidades.



Em relação à poluição do ar, o relatório afirma que antes do início da operação da empresa, 5,3% das concentrações diárias médias de material particulado inalável estavam acima do padrão de referência da Organização Mundial de Saúde (OMS). Já entre junho e novembro de 2010, quando a empresa já estava operando, esse percentual subiu para 23,5%.



O relatório também cita outros problemas enfrentados pelos moradores, como ruídos da linha férrea de trem durante a madrugada durante e após o início da circulação dos trens de matérias-primas para a indústria; rachaduras nas casas durante a construção; crise social e econômica entre os pescadores afetados com a redução da pesca; falta de informações; ameaças feitas às pessoas que denunciaram problemas da TKCSA, dentre outros.



Segundo Alexandre, o relatório está disponível para consulta pública e, mediante solicitação, já foi encaminhado ao Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, à Defensoria Pública Federal e à Comissão Especial para apurar possíveis irregularidades e imprevidências do Governo do Estado e do Instituto Estadual de Ambiente (Inea) no processo de concessão de licenciamento ambiental referente à implantação da siderúrgica na região.



O relatório aponta a necessidade da inclusão da Avaliação dos Impactos à Saúde (AIS) dos grandes empreendimentos no âmbito do SUS, conforme indução da Organização Mundial da Saúde, visando instituir medidas de promoção à saúde e prevenção dos fatores de risco para as populações na área de influência do empreendimento e dar maior consistência na avaliação de impacto ambiental (AIA) realizadas nos processos de licenciamento ambiental.



“No caso TKCSA, o relatório sugere a formalização de um grupo de trabalho que analise, integre e apresente propostas de atuações futuras, que sistematize os principais conhecimentos produzidos pela Fiocruz sobre o problema e aponte recomendações de estudos, bem como medidas de atenção à saúde da população e dos trabalhadores, ações de vigilância da saúde, busca ativa de casos e medidas preventivas. O caso TKCSA é fundamental para a avaliação de riscos à saúde de outros grandes empreendimentos que estão previstos para serem implantados na bacia hidrográfica da Baía de Sepetiba”, finaliza Alexandre.



De acordo com comunicado enviado pela presidência da Fiocruz, o relatório irá subsidiar as ações da Fiocruz em relação aos impactos da TKCSA e se tornará referência da Fundação para examinar o empreendimento siderúrgico, além de originar um grupo de trabalho formado por especialistas da Fundação. Segundo a presidência, o relatório tem um relevante alcance social e ambiental e traz recomendações para futuras iniciativas da Fundação, além de sugerir a criação de um grupo de trabalho na instituição que leve à frente os resultados da missão a Santa Cruz e que resulte em ações e compromissos efetivos em favor da saúde da população local.