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História de Manguinhos é tema de palestra para agentes de saúde

Segunda etapa do curso técnico de ACS da EPSJV foi iniciada em setembro.
Talita Rodrigues - EPSJV/Fiocruz | 03/09/2009 08h00 - Atualizado em 01/07/2022 09h47


Um pouco da história de Manguinhos, contada a partir da experiência de vida da pesquisadora do Laboratório Territorial de Manguinhos (LTM), Gleide Guimarães Alentejo. Essa foi o tema da aula inaugural da Etapa Formativa 2 do curso Técnico de Agente Comunitário de Saúde da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV), realizada no dia 2 de setembro. Gleide, que é ex-ACS e moradora da região, também falou para os alunos sobre suas experiências como integrante do primeiro grupo de agentes de saúde de Manguinhos. “Os agentes têm uma tarefa muito importante nesse território. Principalmente neste momento em que estão acontecendo mudanças por causa das obras do PAC, queremos também que aconteçam mudanças na questão da saúde”, destacou Gleide.



Gleide começou a trabalhar como agente de saúde em 1986, atuando no CHP2. Ela participou do curso de formação da primeira turma de agentes de saúde de Manguinhos, que era formada só por mulheres. O curso era oferecido pelo Centro de Saúde - Escola Germano Sinval Faria da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (Fiocruz). “Esse primeiro grupo foi criado na gestão de Sérgio Arouca, que trouxe a experiência do Nordeste, por meio de uma parceria da Fiocruz com a Unicef e a Flacso (Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais). Nossas prioridades eram crianças de até cinco anos, gestantes e mulheres em idade fértil, mas também fomos treinados para observar toda a família, ficar atentos às queixas, identificar problemas de saúde e incentivar as pessoas a buscar tratamento. Para esse trabalho, tínhamos todo o suporte do Centro de Saúde”.



No trabalho como agente, além das visitas domiciliares às famílias, Gleide também aproveitava o convívio social (na fila da creche ou lavando roupa no bicão, por exemplo) para passar informações sobre saúde para outras mulheres, conscientizando da importância de exames preventivos, vacinação infantil pré-natal, entre outras. “Me apaixonei por esse trabalho, saía de casa com muita vontade de trabalhar. Tinha muito claro na minha cabeça que eu fazia educação em saúde. Foi o trabalho que mais gostei de fazer”. Em 1988, Gleide saiu do grupo e, aos 36 anos, foi fazer curso normal. Com o curso concluído, começou a trabalhar como professora e na década de 90 foi alfabetizadora de adultos no recém lançado MOVA (Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos).



Em 2003, Gleide começou a participar das atividades do Laboratório Territorial de Manguinhos (LTM). “Comecei fazendo uma palestra sobre a história de Manguinhos e fui me envolvendo nas pesquisas do LTM para conhecer as questões que podem melhorar a qualidade de vida em Manguinhos”. Hoje, Gleide participa do projeto Relatório Fotográfico, no LTM, que tem o objetivo de fazer o registro das transformações que o PAC está trazendo para a região.



“Ser agente de saúde é um trabalho difícil, que precisa de muita dedicação e também de muita luta para melhorar na profissão, tanto nas questões salariais, como na questão do conhecimento. Quem aqui pretende fazer faculdade, e acho que todos devem pretender, vai ver como esse trabalho de ouvir, doar e receber dos agentes vai ajudar na formação”, conclui Gleide, que hoje mora na CCPL, em Benfica, e, aos 51 anos, vai fazer vestibular para o curso de Letras.



História de vida



Durante sua palestra, Gleide também contou que não nasceu em Manguinhos, mas na Vila Cruzeiro, na Penha. Ela chegou a Manguinhos em 1969, aos 11 anos, vinda de Petrópolis (RJ), onde estava internada em um sanatório para tratar de uma tuberculose. “Quando cheguei, fui morar com minha mãe e meu padrasto na Vila Turismo. Achei tudo muito diferente. Tinha uma vida pastoril lá no internato e logo que cheguei aqui vi uma briga com facadas, em que morreram pessoas. Não gostava de morar aqui e passei anos negando minha identidade”, contou.



Ao longo dos anos, Gleide e sua família foram mudando de casa e conhecendo várias locais de Manguinhos. Aos 16 anos, grávida de seu primeiro filho, Gleide foi morar com a sogra no CHP2. Sete anos depois, ela e o marido compraram uma casa na mesma localidade. “A partir daí, achei que as coisas iriam mudar e conseguiríamos nos fixar em um lugar, mas em 1986, houve um acidente com uma adutora da Cedae, que era muito próxima das casas, e a prefeitura decidiu remover as famílias que moravam ali”.



Nessa época, com as discussões por causa da remoção, Gleide começou a se envolver com os movimentos sociais da região e chegou a fazer parte da associação de moradores. “Primeiro, pensaram em remover a gente para conjuntos habitacionais em locais distantes de Manguinhos, o que era comum naquela época, mas nós não queríamos sair daqui, onde já tínhamos uma estrutura, com escola, posto de saúde, creche. Então, a prefeitura mandou que a gente procurasse um terreno por aqui para onde pudéssemos ser removidos”.



Os moradores descobriram que havia um terreno na Leopoldo Bulhões, que pertencia à Embratel. A Prefeitura fez uma permuta com a Embratel, trocando o terreno da Leopoldo Bulhões por uma área na Barra da Tijuca, e foi iniciada a construção da Nelson Mandela, a princípio, apenas para os moradores da adutora. Durante a obra, aconteceram uma grande enchente (em 1988), que atingiu todo o Rio de Janeiro e também deixou muitos desabrigados em Manguinhos, e um incêndio no Parque João Goulart (em 1989), quando várias pessoas perderam suas casas. Com isso, essas famílias também foram incluídas no projeto do Nelson Mandela. “Em 1990, o conjunto ficou pronto e me mudei para lá. Nessa época, já não tinha mais a sensação de não gostar de Manguinhos, comecei a descobrir o prazer de morar aqui. O envolvimento com o movimento social me fez ver a região como um lugar que precisava de pessoas que entendiam o que acontecia aqui para ver o que precisava ser mudado”.  No Nelson Mandela, Gleide participou da primeira ONG da região, o Grupo de Mulher para Mulher de Manguinhos, que era responsável pela gestão da creche do conjunto habitacional.



Curso técnico de ACS



A Etapa Formativa II do Curso Técnico de Agente Comunitário de Saúde deve ser concluída em novembro de 2010. Participam desta turma, 34 alunos, que já atuam como agentes de saúde na região de Manguinhos. Parte da turma fez a Etapa I na EPSJV e o restante cursou essa fase na Escola de Formação Técnica em Saúde Enfermeira Izabel dos Santos.



Na segunda etapa do curso, são trabalhados os eixos Estado, Sociedade e Políticas Públicas; Educação e Saúde; Modelos de Atenção em Saúde, Promoção, Vigilância e Cuidado em Saúde; Estratégia Saúde da Família; Informação em Saúde; Investigação e Planejamento em Saúde; Oficina de Texto; Oficina de Teatro e Prática Profissional.



O curso oferecido pela EPSJV é um projeto piloto de formação completa em três etapas, realizado em parceria com a Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro e o Centro de Saúde - Escola Germano Sinval Faria da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (CSEGSF/ENSP/Fiocruz). As aulas foram iniciadas em outubro de 2008. O curso completo tem 1.200 horas-aula, divididas em três etapas. A terceira e última etapa do curso será concluída em 2011.