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Jovens pesquisadores

Semana de Vocação Científica revela estudantes de ensino médio comprometidos com investigações em diversas áreas
Raquel Júnia - EPSJV/Fiocruz | 04/05/2011 08h00 - Atualizado em 01/07/2022 09h47


 Rafaela investiga se a portaria da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), na Avenida Brasil, porta de entrada dos trabalhadores e frequentadores do local, é acessível e está bem conservada. Flávio estuda qual é o melhor método para extrair de um gênero específico de plantas o ácido betulínico, que tem propriedades anticancerígenas. Já Linda Beatriz começou no ano passado a pesquisar a água: sua alcalinidade e os riscos de esquistossomose. Yanaê acaba de concluir sua participação em uma pesquisa sobre a percepção de adolescentes e professores de escolas públicas a respeito do Programa Nacional de Saúde e Prevenção nas escolas, que trata de temas como AIDS e gravidez na adolescência. Os quatro estudantes estão apresentando essas pesquisas na XVI Semana do Programa de Vocação Científica (Provoc) da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz), que acontece de 2 a 6 de maio. No total, 131 estudantes de ensino médio de 22 escolas públicas e privadas apresentaram trabalhos desenvolvidos com a orientação de pesquisadores de várias unidades da Fiocruz.



 



Na mesa de abertura do evento, o professor Luis Fernando Ferreira, um dos fundadores da Escola Politécnica, contou um pouco da história do Provoc, que se confunde com a da Escola. Ele lembrou que conheceu a Fiocruz quando era adolescente, levado até a instituição por um parente que lá trabalhava como pesquisador, o que o motivou ainda mais a seguir pelo caminho da pesquisa científica. "Eu vim aqui em Manguinhos e me entusiasmei, comecei a ler também o livro Caçadores de Micróbios, de Paul de Kruif, que é a biografia do Pasteur, de vários cientistas", lembrou.  Posteriormente, Luis Fernando estudou medicina, se dedicou à pesquisa e foi trabalhar na Fiocruz. "Então, quando o [Sergio]Arouca era presidente da Fundação e eu vice-presidente, um dia estávamos na mesa do bar, também com o Arlindo Gomes e eu falei: ‘por que a gente não abre a Fiocruz para outros jovens que, diferentes de mim, não têm parentes na Fundação? Aí começou a ideia do Politécnico e do Provoc", disse.



 



A diretora da EPSJV, Isabel Brasil, reforçou a importância do Programa que, de acordo com ela, se constitui num marco para a educação científica. "A existência do Provoc é a criação de uma política de iniciação científica para o ensino médio. É um feito é instituinte de políticas públicas", ressaltou.  A coordenadora do programa, Cristina Araripe, falou sobre a variedade de pesquisas desenvolvidas pelos estudantes nos vários anos do Provoc, que completa 25 anos em 2011. Ela destacou também o compromisso e interesse dos jovens e dos professores que participam do programa na organização da Semana de Vocação Científica. "Quem preparou pela primeira vez um resumo na vida?", perguntou. Muitos jovens levantaram a mão. "Quantas vezes vocês entraram na nossa sala perguntando como se faz o resumo?", continuou, exemplificando o empenho dos jovens, dos professores e dos trabalhadores da EPSJV para o sucesso da iniciativa.



 



Pesquisa na Fiocruz





Para abrir a XVI Semana do Programa de Vocação Científica, o diretor do Centro de Relações Internacionais (Cris) e ex-presidente da Fiocruz , Paulo Buss falou sobre a pesquisa em saúde na instituição. Antes de começar a palestra, elogiou a iniciativa da Escola e do Provoc em "provocar a ciência, e a criatividade". Ele explicou que as pesquisas da Fiocruz têm o compromisso de ajudar a resolver os problemas de saúde e sócio-sanitários do Brasil. No complexo quadro sócio-sanitário brasileiro, segundo o pesquisador, convivem antigos problemas de saúde, já superados em alguns países, e novos desafios, típicos de sociedades modernas. "Esses problemas exigem soluções urgentes a partir de conhecimento técnico-científico gerado por instituições nacionais", afirmou.



 



Paulo Buss especificou que a pesquisa no país vem crescendo, desenvolvida, sobretudo, por universidades públicas e instituições como a Fiocruz, além de entidades estaduais, como o Instituto Butantan, em São Paulo. Entretanto, segundo ele, o Brasil ainda é frágil em desenvolvimento tecnológico. "O país ainda apresenta grande dependência externa de insumos para a saúde, como medicamentos e fármacos, vacinas e soros, kits para diagnósticos, hemoderivados e equipamentos médico-cirúrgicos. E precisamos reverter essa situação", disse. Segundo ele, no entanto, a Fiocruz tem dado respostas importantes a essa situação de dependência. Como exemplos, citou a produção de vacinas e dois programas - o Programa de Desenvolvimento Tecnológico de Insumos para a Saúde (PDTIS) e o Programa de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde Pública (PDTSP), todos voltados para desenvolver soluções para os problemas de saúde da população brasileira.O pesquisador contou também um pouco da história da Fundação, ressaltando as várias contribuições científicas da Fiocruz no século XX, como a descrição completa da doença de Chagas, o isolamento do HIV no Brasil, e a participação na concepção do Sistema Único de Saúde (SUS).



 



Ao concluir a apresentação, Paulo Buss projetou no telão imagens de vários pesquisadores importantes para a história da ciência como Pasteur, Lister, Freud e Oswaldo Cruz, incentivando os jovens pesquisadores a seguirem adiante no compromisso com a saúde pública. "Alguns de vocês podem ser um desses, quem sabe! É isso que eu desejo para a carreira de vocês", falou aos estudantes. Diante de várias perguntas do auditório, o pesquisador explicou que vários aspectos do cotidiano são questões de saúde pública e precisam da regulação do Estado.  Segundo ele, a importância da saúde pública se faz sentir tanto na garantia de medicamentos gratuitos a qualquer portador do vírus HIV quanto na regulação de propaganda de alimentos para crianças, na definição de que as farinhas precisam ser acrescidas de ácido fólico para diminuir problemas de saúde ainda na formação dos bebês, ou ainda, de iodo no sal para evitar doenças como o bócio endêmico (popularmente conhecida como doença do "papo"). "A saúde pública é ação silenciosa do Estado. Quando vocês ouvirem alguém falar mal do SUS, diga a essa pessoa para entender primeiro o que é a saúde pública brasileira antes de criticar o SUS", concluiu.



 



Vocação cientifica





A rotina do estudante que se propõe a começar cedo a pesquisa científica exige compromisso e dedicação. Pelo menos duas vezes por semana os alunos do Provoc vão até a Fiocruz desenvolver ações dos projetos de pesquisas nas várias unidades da Fundação. Rafaela Costa, de 19 anos, é estudante do 2º ano do Colégio de Aplicação da Uerj e duas vezes por semana está no Departamento de Patrimônio Histórico da Casa de Oswaldo Cruz (COC). O projeto de Rafaela está relacionado à preservação do patrimônio. "Essa possibilidade abre mais caminhos porque eu pretendo seguir na área de arquitetura e esse estágio é também uma forma de eu conhecer melhor o campo no qual quero atuar. Muita gente estranha o fato de eu trabalhar com arquitetura na Fiocruz, eu mesma não imaginava que eu teria essa possibilidade aqui", diz.



 



Flávio Ribeiro, estudante do 3º ano do Colégio Pedro II, de 18 anos, desenvolve pesquisa sobre técnicas de extração do ácido betulínico em Farmanguinhos. Para ele, que quer trabalhar como químico industrial, a experiência também tem sido muito importante. "Essa pesquisa te faz criar mais responsabilidade, te ajuda a se organizar mais para o futuro", afirma.



 



Na XVI Semana do Provoc, apresentam-se tanto estudantes da etapa avançada, como Rafaela e Flávio, quanto estudantes que estão na etapa iniciação, que, como o próprio nome já diz, é o começo dos trabalhos. É o caso de Linda Beatriz, de 17 anos, estudante do 2º ano do Colégio Pedro II de Duque de Caxias. "Estamos fazendo testes com a água, avaliando a concentração de amônia e nitrito para podermos saber se a água será adequada ou não para consumo", explica. A estudante desenvolve a pesquisa no Instituto Oswaldo Cruz (IOC). "Estamos avaliando água de tanques. Nesses tanques há caramujos. Então, estamos pesquisando também se há esquistossomose porque essa água pode estar contaminada", conta.



 



Yanaê de Moraes está há quatro anos desenvolvendo pesquisas na Fiocruz por meio do Provoc. Em 2011, Yanaê começou a cursar a universidade e está encerrando sua participação no Programa. "Eu faço minha última apresentação agora aqui na Semana. Ao contrário da maioria dos estudantes, eu não posso apresentar dados específicos, como nome das pessoas que entrevistei, porque foge da ética que eu tive que aprender para trabalhar nas pesquisas", diz a estudante, que ajudou a entrevistar estudantes e trabalhadores de escolas públicas no âmbito da pesquisa sobre a Política Nacional de Saúde e Prevenção nas escolas.



 



O Provoc





 Criado em 1986, o Provoc acolhe estudantes para desenvolver pesquisas em saúde nas áreas Biomédica, Saúde Pública, História e Filosofia da Ciência. O programa compreende duas etapas: a Etapa da Iniciação, com duração de um ano, na qual os alunos participam de diferentes atividades de pesquisa científica, familiarizando-se com a dinâmica atual da produção de conhecimentos científicos e tecnológicos nas diversas áreas; e a Etapa do Avançado, com duração de 20 meses, que é opcional para os alunos provindos da etapa anterior e que envolve a elaboração de um plano de trabalho em que as questões identificadas na primeira etapa são aprofundadas e discutidas.