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Reforma Agrária é tema de debate na Escola Politécnica

Debate foi realizado durante o encerramento do curso de especialização técnica oferecido para integrantes do Movimento dos Sem Terra.
Talita Rodrigues - EPSJV/Fiocruz | 22/12/2009 09h00 - Atualizado em 01/07/2022 09h47


A Reforma Agrária e sua relação com a saúde e o meio ambiente foi tema de uma mesa-redonda realizada na Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV). O evento foi realizado durante o encerramento do Curso de Especialização Técnica de Nível Médio em Saúde Ambiental para a População do Campo, que formou 26 alunos integrantes do Movimento dos Sem Terra (MST) e do Movimento dos Atingidos por Barragens. “O curso é uma pequena contribuição do ponto de vista numérico, mas grande do ponto de vista político porque nem sempre a escola pública esteve a favor dos trabalhadores. A educação no campo se incorpora a essa escola, que entende o trabalho e a cultura como princípios educativos”.



A Reforma Agrária como um fator de justiça social e os malefícios do agronegócio foram os principais pontos do debate. Para o assessor da Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde da Fiocruz, José Paulo Vicente da Silva, o Brasil só pode ser um país justo quando fizer a Reforma Agrária e repensar o atual modelo de agronegócio, que ele considera insustentável do ponto de vista ambiental. “O agronegócio aponta para uma perda irreparável da biodiversidade, a fragmentação dos ecossistemas e dos biomas e o envenenamento da água e do solo. Os campos da saúde coletiva e dos movimentos sociais estão unidos contra o agronegócio”, disse José Paulo.



“Houve mudanças nas formas de organização e produção da agricultura e do comércio. O capital financeiro e as transnacionais invadiram o campo e formaram uma aliança muito poderosa, que também conta com a participação do estado. Temos que atentar para as consequencias que isso traz como os efeitos no clima. Os agrotóxicos jogados nas plantações se espalham na terra, na água e no ar”, observou Adelar João Pizetta, do MST. “Enquanto a produção de alimentos cresce, com a expansão do agronegócio, a fome no mundo é cada vez mais alarmante. Mais de 1,2 bilhão de pessoas passam fome e 3,5 bilhões têm carências alimentares. Com o agronegócio houve um aumento de 75% no preço dos alimentos, diminuindo o acesso das pessoas à comida”.



O professor da Universidade de Brasília (UnB), Fernando Carneiro, lembrou que o agronegócio traz quatro vezes mais insegurança alimentar entre os bóias-frias do que entre os assentados. “O agronegócio é excludente. No caso da soja, quanto mais se produz, menos empregos são gerados. As empresas menores foram sendo engolidas para formar as gigantes do setor e, ao contrário do que se diz, os transgênicos produzidos por essas grandes empresas, não usam menos agrotóxicos”. Por outro lado, segundo o professor, estudos comprovam que quanto maior o acesso a terra, melhor o estado nutricional da população. “Se, além disso, ainda houver saneamento básico, isso é potencializado em três vezes”.



Para Pizeta, um dos desafios para que a Reforma Agrária aconteça é denunciar o caráter perverso do agronegócio. “Também temos que debater com a sociedade, mostrando que o modelo mais adequado é o da Reforma Agrária popular. A Reforma Agrária nunca foi feita no Brasil e a classe dominante acha que não precisa fazer. O acesso a terra tem que ser democratizado porque a agroindústria está se apropriando de muitas terras. A reforma vai exigir mudanças no nosso comportamento como militantes, não vai ser fácil, mas temos que fazer alianças e nos basear em quatro eixos: autonomia popular, resistência, conhecimento e educação e não ter medo de falar”. Pizeta disse ainda que o MST sofre com a criminalização e, por isso, tem que criar um senso comum na sociedade para enfrentar o poder da mídia.  “Tudo isso deve ser articulado com um projeto para o nosso país. O momento é de nos preparamos para o futuro porque ele é promissor, mas também é de luta de classes”.



Curso



O curso de especialização faz parte do projeto de desenvolvimento tecnológico ‘Formação de Formadores em Saúde Ambiental nos Territórios de Assentamentos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST): uma estratégia para o enfrentamento dos determinantes sociais da saúde da população do campo’, desenvolvido pela EPSJV, no âmbito da cooperação técnica científica firmada entre  CGVAM-SVS/MS e a FIOCRUZ/MS. O curso é voltado para lideranças de assentamentos e acampamentos do MST, visando capacitá-los no domínio de conhecimentos formais e técnicos relacionados às questões de saúde ambiental no campo, às práticas da área de atuação da vigilância ambiental em saúde nos municípios onde se localizam os assentamentos/acampamentos do MST e para subsidiar suas ações acerca dos riscos ambientais e sanitários.



O curso teve início em maio de 2008, no Centro Formador Maria Olinda (Ceforma) do MST, localizado no Assentamento Juerama, em São Mateus (ES). No total, a formação incluiu quatro unidades de aprendizagem (tempo escola) e três trabalhos de campo (tempo comunidade) intercalados entre estas unidades. A última etapa do curso foi realizada na sede da EPSJV, quando os alunos apresentaram as propostas de intervenção nos locais onde vivem, elaboradas no decorrer da especialização técnica.