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Observatório na Mídia

24/07/2013 00h00 - Atualizado em 01/07/2022 09h47

Análise

por: Flávio Paixão, professor-pesquisador da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV)

Manifestações: o lugar das ruas e o lugar das mídias sociais

Professor-pesquisador da EPSJV comenta reportagem que discute o papel da internet nas manifestações

A potencialidade das redes sociais em estimular nucleações pôde ser um pouco saboreada nestes últimos tempos de manifestações. Acredito ser este um dos momentos mais pedagógicos dos últimos anos e pelas redes se tornou possível convocar reuniões, plenárias, protestos marcados com presença de centenas de milhares de pessoas.  O aprendizado presencial, porém, continua sendo insubstituível.

O que me leva a acreditar são as contradições observadas, militantes que nunca dormiram sendo espancados por uma força histérica coletiva por usarem camisas de movimentos sociais ou partidos. As pautas  eram por vezes dissonantes: vi um professor da EPSJV com um cartaz escrito "as ruas contra o capital" e logo atrás dele um manifestante portava na sua cartolina: "menos Estado = mais liberdade". A internet tem a capacidade de apontar interseções, mas não consegue dar conta do mais específico. É neste hiato onde podem ocorrer encaminhamentos ideológicos, equívocos de interpretação, condução de uma pauta encaminhada pela mídia e o pior: achar que pelo computador dá pra resolver tudo.

O Avaaz realiza um ótimo serviço de canalização de pautas populares. Petições on-line são positivas ao apontarem insatisfação de 1,5 milhão de pessoas contra o Renan Calheiros na presidência do senado. Mesmo tendo sido entregue impresso (haja árvore), como ele sai? Mas ajuda também perguntar: como ele se sai ao ter que lidar com tudo isso,via imprensa?

Que possamos vivenciar um bom tempo de utilizações positivas para todas essas ferramentas. Ao menos hoje, no Rio,boa parte dos meus alunos viu e sentiu a ação da covardia policial. Fizeram o caminho internet-rua e têm suas próprias opiniões sobre o que passa no G1 sobre o assunto. E vêem que se não tivessem ido pras ruas não estariam vendo nada.

Grito das ruas quer ser ouvido na internet

A tatuagem do Che Guevara nas costas não deixa dúvidas: Douglas Agostinho Theodoro é daqueles ativistas que leva a indignação à flor da pele, diz o que pensa e “não se ajoelha para ninguém”. Não faz parte de nenhum partido ou movimento organizado, mas participou na linha de frente de todas as grandes manifestações de rua em São Paulo. Quando os soldados da Tropa de Choque vieram para cima, não se intimidou: montou barricadas, respirou gás lacrimogêneo e entrou na linha de tiro das bala de borracha, usando seu inseparável skate como escudo. “Enquanto apontaram uma arma para mim, eu não saí da rua”, diz. “E se a Tropa de Choque voltar, eu também volto.”

Diferentemente de seu ícone tatuado, porém, Theodoro diz que nunca pegou nem tem intenção de pegar em armas para mudar a realidade. As manifestações de rua, segundo ele, são só a ponta do iceberg. A verdadeira revolução da qual ele faz parte é a digital — a revolução da interatividade e da informação em tempo real.

“Há anos a gente está gritando na internet e ninguém escuta, porque o governo não sabe nem abrir o Facebook. Por isso a gente foi pra rua, para que eles aprendam a respeitar essa voz”, revolta-se o fotógrafo paulistano, desempregado, de 34 anos. “Os políticos estão perdidos porque não entenderam ainda que a praça pública não é mais em Atenas, é na internet. Eu não quero ser o Che Guevara. Ninguém precisa mais pegar em armas para fazer uma revolução; a revolução é digital.”

Herton Escobar, O Estado de S. Paulo, 21/07/2013
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