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MEC pressiona pela retomada das aulas presenciais

Diante de declarações do ministro Milton Ribeiro em defesa da reabertura de escolas, redes municipais e estaduais cobram ações concretas do governo federal para permitir retorno seguro. Para pesquisador da Fiocruz, situação epidemiológica pede cautela
André Antunes - EPSJV/Fiocruz | 23/07/2021 09h16 - Atualizado em 01/07/2022 09h42

Declarações do ministro da Educação, Milton Ribeiro, durante um pronunciamento realizado na terça-feira (20) geraram desgaste com as redes estaduais e municipais de educação. Em rede nacional, o ministro, que desde que foi empossado no ano passado vem defendendo o retorno presencial, subiu o tom das declarações e pressionou estados e municípios para que retornem. “O retorno às aulas presenciais é uma necessidade urgente”, declarou o ministro, ressaltando que a decisão de abertura foi “delegada” a estados e municípios. “O MEC não pode determinar o retorno presencial das aulas, caso contrário já teria determinado”, afirmou Ribeiro, para quem a vacinação de toda a comunidade escolar não pode ser condição para a reabertura das escolas.


Para presidente da Undime, falta apoio do MEC

O presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) Luiz Miguel Garcia afirma ter recebido o pronunciamento com “surpresa” e “frustração”. “Foi uma surpresa o ministro trazer essas declarações, até pelo caráter que tem um pronunciamento em rede nacional. Estamos trabalhando com força pelo retorno presencial desde o ano passado”, diz Garcia, ressaltando que a entidade construiu ao longo da pandemia matérias para subsidiar a construção de protocolos de biossegurança pelas redes municipais de educação. “Entregamos ao ministro uma carta pedindo vacinação como uma estratégia de fortalecimento do processo de volta segura, mas em nenhum momento condicionamos a volta à vacinação ou a qualquer coisa especifica se não aos protocolos, que fossem construídos no âmbito de cada rede, porque cada cidade e município que sabe suas condições de atendimento”, destacou.

Levantamento divulgado na quinta-feira (22) pela Undime indicou que 57% dos municípios haviam construído seus protocolos de biossegurança para o retorno às aulas presenciais. A pesquisa, que ouviu 3.355 redes municipais de educação, apontou ainda que a vacinação dos profissionais de educação teve início em 95% dos municípios. A pesquisa também mostrou que mais de 50% dos municípios voltaram a ter aulas presenciais de alguma forma em fevereiro. Havia expectativa de um retorno das aulas presenciais para que março ou abril. “Mas aí veio a segunda onda de contaminações”, diz o presidente da Undime, complementando em seguida. “A vacina é importante sim. Nós temos a comprovação em cidades como Serrana e Botucatu [onde a população foi vacinada em massa como parte de estudos sobre a eficiência da vacinação], impactaram imensamente o processo de imunização, de redução de casos. Mas em nenhum momento posicionamos essa questão como condição, e sim um conjunto de ações. E nesse conjunto o governo federal ficou devendo”, diz Garcia. Para ele faltaram ações concretas por parte do MEC para um retorno seguro. “Há uma frustração por não ter junto dessa declaração a apresentação de um programa concreto que permita acolher sobretudo os municípios mais carentes, que não tem a condição de atender minimamente os protocolos”, avalia.


Consed e Conass preparam nota com orientações sobre retorno

Já o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), que representa as redes estaduais, reuniu-se na terça-feira com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) para discutir a situação epidemiológica e o retorno seguro às aulas presenciais, onde os representantes das duas entidades chegaram a um consenso de que a decisão cabe a cada estado e município. Segundo a assessoria do Consed, os dois conselhos voltarão a se reunir para elaborar uma nota conjunta sobre o momento adequado para o retorno e seus riscos, que deve ser divulgada na próxima reunião do Consed, nos dias 12 e 13 de agosto. “A posição do Consed consiste em defender que a volta as aulas seja uma atribuição dada a cada gestor local, seja de saúde, seja de educação. Portanto, nenhuma medida para todo o país, uma vez que o enfrentamento da pandemia não foi coordenado nacionalmente e também tendo em vista que a situação da pandemia é diferente de um estado para o outro. Então a partir de uma avaliação regional, cada secretario da saúde, assim como de educação, poderão tomar essa decisão do ponto de vista sanitária e implementá-la dentro das escolas”, defendeu o presidente do Consed, Vitor de Angelo.


Cautela

Para o pesquisador do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (Icict/Fiocruz) Diego Xavier, o cenário epidemiológico do país pede cautela no planejamento de um retorno presencial. “Estamos passando por um período de diminuição do número de óbitos, associado principalmente à vacinação da população mais vulnerável a complicações, internação e consequentemente óbitos. A gente consegue observar um descolamento entre o comportamento do número de casos e o de óbitos. Se antes a gente observava o aumento dos casos e depois de duas três semanas o aumento do número de óbitos, agora temos observado o aumento de casos, mas não necessariamente de óbitos. Isso é um indicativo de que a vacina tem funcionado”, explica Xavier, ressaltando, porém, que o país já registra circulação comunitária da variante Delta do Sars-Cov 2, causador da Covid-19. “É uma variante mais agressiva, com uma possibilidade de infecção mais alta do que as variantes que já tínhamos visto, embora ainda não seja possível determinar se a letalidade é maior”, destaca o pesquisador do Icict/Fiocruz. Com o fim do recesso escolar, continua Xavier, a tendência é que haja um aumento da circulação de pessoas nas ruas. “Na minha opinião, o mais recomendado é que as aulas presenciais fossem retomadas de forma gradual, dando-se condições para que as escolas  que tenham situação mais precária possam cumprir seus protocolos e acelerando a vacinação de toda a comunidade escolar”, avalia o pesquisador. E completa: “Retomar as aulas para todas as idades ao mesmo tempo é um risco muito grande, porque a gente vai colocar muita gente em circulação, a não temos um nível de vacinação adequado. Quando olhamos para países da Europa e Ásia, temos observado o aumento de casos mesmo nos países com vacinação avançada, então é preciso cautela”.