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Como vai funcionar a fiscalização dos cigarros eletrônicos no Brasil

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) manteve a proibição de dispositivos eletrônicos para fumar (DEF) no Brasil, norma que já existia desde 2009. Em decisão unânime, a diretoria da instituição definiu que continua ilegal a fabricação, importação, comercialização, distribuição, armazenamento, transporte e propaganda desse tipo de produto.

Com a resolução também foram estabelecidas medidas de fortalecimento da fiscalização e apreensão dos cigarros eletrônicos, assim como políticas educativas para informar a população sobre os danos à saúde que o uso pode causar. Nesta semana, alguns estados e municípios anunciaram o início das ações.

Entre as medidas que já existiam e serão intensificadas, estão o treinamento das equipes de fiscalização das unidades da federação e dos municípios e as ações conjuntas com a polícia, a receita e o Ministério Público (MP).

Além disso, a decisão prevê reforço nos canais de comunicação entre órgãos de vigilância sanitária e o MP, para recebimento de denúncias e efetivação das ações de combate ao produto. O texto também determina fiscalização em eventos esportivos e culturais, inclusive no horário noturno.

As políticas têm foco especial na proteção da saúde de crianças e adolescentes. Esse é o principal público-alvo dos cigarros eletrônicos. O voto do diretor-presidente da Anvisa, Antônio Barra Torres, cita o alerta global da Organização Mundial da Saúde (OMS) para o problema.

Segundo a instituição, o ritmo de crescimento do uso de vapes entre jovens é alarmante. Em todas as regiões que compõem a OMS, o consumo do dispositivo é maior na faixa etária de 13 a 15 anos do que em adultos. A propaganda pelas redes sociais, fóruns e por influencers da internet é massiva.

Muitas vezes, os cigarros eletrônicos são promovidos como uma alternativa menos prejudicial que os cigarros convencionais. Segundo a Coordenadora do Centro de Estudos sobre Tabaco e Saúde (Cetab) da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz), Silvana Turci, a narrativa não tem nenhuma comprovação científica.

“Pelo contrário, são produtos que têm nicotina concentrada. Não só a nicotina extraída das folhas, mas também uma nicotina sintética, que aumenta ainda mais o poder de dependência química causada por esses produtos”, alerta.

Em conversa com o Repórter SUS, ela também destacou os riscos do discurso de que o vape pode ajudar no processo de parar de fumar. “É importante ressaltar que, apesar da pressão da indústria, dos grupos de fachada, das pessoas que dizem que pararam de fumar depois que consumiram, isso tudo é uma grande balela. Se as pessoas querem realmente parar de fumar, existem outros métodos muito bem comprovados, indicados pela OMS.”

Os riscos para a saúde

Além de colocar em foco a escalada do uso do cigarro eletrônico entre crianças e adolescentes, a Anvisa baseou a decisão unânime nos estudos que mostram um potencial de dependência 20 vezes maior em pessoas que usam o dispositivo na comparação com quem fuma cigarro comum.

Também pesaram as possíveis consequências negativas da liberação desses produtos para a política nacional de controle do tabaco e a ausência de estudos sobre os efeitos do produto a longo prazo.

Segundo a OMS, além de altamente viciantes, os cigarros eletrônicos geram substâncias tóxicas que podem causar câncer, aumentar o risco de doenças cardíacas e afetar o desenvolvimento cerebral. O uso desses componentes também pode levar a distúrbios de aprendizagem entre jovens.  

Silvana Turci afirma que a comunidade médica já percebe um aumento desse público nos consultórios com quadros de comprometimento nos pulmões, por exemplo.

“As autoridades sanitárias, pediatras, pneumologistas, pessoas que trabalham em escolas têm que dar muita atenção (ao tema). Porque isso realmente aumenta muito o risco de essas crianças precocemente desenvolverem uma doença.”

Turci cita a Evali, inflamação pulmonar diretamente associada ao consumo de vape. O nome vem da sigla da expressão em inglês E-cigarette or Vaping product use-Associated Lung Injury, que traduzida significa Lesão Pulmonar Associada ao Uso de Cigarro Eletrônico ou Produtos de Vaping.

Ela também chama a atenção para uso dual, quando pessoas passam consumir o cigarro eletrônico ao fumo convencional, o que aumenta consideravelmente os riscos. "É um grande perigo, porque as concentrações de nicotina nos cigarros eletrônicos são desconhecidas. Nos estudos onde já se analisou isso, feitos em outros países, se observou que uma hora de uso do cigarro eletrônico é como se a pessoa tivesse fumado 20 cigarros em função da concentração de nicotina."

Entre as novas medidas sugeridas pela Anvisa para combate aos cigarros eletrônicos, está a formalização de acordos de cooperação com o Ministério da Educação. A ideia é sensibilizar a comunidade escolar para o problema.

O comércio eletrônico dos DEF também é foco na resolução da Agência . O voto do presidente cita o aprimoramento de ferramentas de fiscalização de anúncios na internet. Atualmente, a Agência já conta com um projeto piloto que usa inteligência artificial na fiscalização do comércio eletrônico de produtos ilegais.

Há ainda a previsão de uma parceria com os Correios para coibir envios e recebimentos de cigarros eletrônicos. Segundo a resolução, trabalhadores e trabalhadoras de órgãos como a Gerência Geral de Portos Aeroportos e Fronteiras, PROCON, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e Receita Federal.

O Repórter SUS é uma parceria entre o Brasil de Fato e a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio da Fundação Oswaldo Cruz (EPSJV/Fiocruz)
Imagem: CDC
Edição: Matheus Alves de Almeida

Por: Juliana Passos e Nara Lacerda, do Brasil de Fato

Categoria(s):

Repórter SUS