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Covid-19 mata quatro vezes mais quilombolas do que parcela urbana e branca

A chance de uma pessoa pertencente à população quilombola morrer por covid-19 é quatro vezes maior do que uma pessoa da comunidade branca e urbana, segundo Hilton Silva, membro do Grupo Temático Racismo e Saúde da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e docente do programa de pós-graduação em Saúde, Ambiente e Sociedade na Amazônia e do programa de pós-graduação em Antropologia da Universidade Federal do Pará (UFPA).

“A situação de vulnerabilidade histórica a que estão submetidas as populações quilombolas no país faz com que estejam especialmente vulneráveis e sejam atingidas de maneira diferenciada pela pandemia”, afirma Silva.

De acordo com a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) até esta quinta-feira (24), já foram contabilizados 4.590 casos confirmados da doença, 1.219 casos monitorados e 166 óbitos, em 5.972 localidades quilombolas, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Até o momento, sete meses após o início da pandemia, o governo federal ainda não tornou obrigatório o registro de covid sobre populações quilombolas. Logo, todas as informações que existem sobre mortalidade são registradas por organizações quilombolas, de maneira independente.

Situação de vulnerabilidade

Entre os principais aspectos que configuram essa vulnerabilidade, o professor destaca a dificuldade a todo tipo de serviço de infraestrutura, como aqueles ligados à saúde, saneamento básico, acesso à água potável, alimentação saudável, transporte, dificuldade de acesso a informações e à internet. “São todos fatores que fazem com que essas comunidades tenham muito mais dificuldade de acessar os serviços públicos em geral.”

Na medida em que essa condição de vulnerabilidade social se instala nas comunidades, há também mais registros de doenças crônicas, como “resultado dessa situação de abandono e negligência”, aponta o pesquisador.

“Esses fatores fazem que, quando sujeitas a uma pandemia, [as populações quilombolas] fiquem ainda mais em situação de potencial risco, uma vez que já apresentam uma série de doenças pré-existentes, muitas delas reconhecidamente de risco para a covid-19, como hipertensão arterial, diabetes, obesidade”.

Como essas populações dependem exclusivamente também de agentes comunitários de saúde (ACS) do Sistema Único de Saúde (SUS), esse serviço está comprometido durante a pandemia, uma vez que houve uma redução de atendimentos, tanto pelos agentes quanto em Unidades Básicas de Saúde (UBS).

Medidas tomadas pelas próprias comunidades

Diante do cenário de “abandono e descaso”, como pontua Silva, as próprias comunidades quilombolas começaram a se organizar para se proteger, realizando, por exemplo, barreiras sanitárias espontâneas, redução do fluxo de pessoas e conscientização de hábitos de higiene, entre outras medidas. As organizações também têm distribuído cestas básicas para as populações, uma vez que o trabalho de agricultura também está comprometido, afetando a segurança alimentar dos quilombolas.

“A participação governamental nesse processo infelizmente tem sido bastante limitada, tem variado muito de local para local, tendo ficado totalmente nas mãos desses entes o apoio para as comunidades”, afirma Silva. Para o professor, o governo deveria colocar em prática medidas já existentes, como a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra, do SUS.

A Conaq protocolou, na segunda semana de setembro, no Supremo Tribunal Federal (STF), uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), com o objetivo de obrigar o governo federal a adotar medidas de urgência para o combate da pandemia de covid-19 nos quilombos, como distribuição de equipamentos de proteção individual (máscaras e outros), água potável e materiais de higiene e desinfecção.

A coordenação também solicita que o governo de Jair Bolsonaro, no prazo de 30 dias, elabore um plano nacional de combate aos efeitos da pandemia de covid-19 nas comunidades quilombolas

Edição: Leandro Melito

Por: Ana Paula Evangelista

Categoria(s):

Repórter SUS