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Saúde do trabalhador precisa ser refundada, dizem pesquisadores

O Ministério do Trabalho e Emprego definiu a saúde mental como temática deste ano da Campanha Nacional de Prevenção de Acidentes do Trabalho (Canpat).A tradicional campanha, que existe desde o início da década de 1970, este ano representa a chance da voltar a colocar o trabalhador no centro do debate, após os anos Bolsonaro (2019 - 22) quando esteve em segundo plano, atrás de preocupações generalistas como normas e gestão.

Na última semana de abril, a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) divulgou uma nota pública em que defende que “a refundação das estruturas da área de Saúde do Trabalhador deve estar focada na saúde do trabalhador como direito humano e não apenas na identificação de morbimortalidade.”

Nos quatro anos do governo de Jair Bolsonaro (PL), a Canpat pouco discutiu diretamente sobre a saúde de trabalhadores e trabalhadoras. Os impactos da pandemia da covid-19, das mudanças na legislação trabalhista e da uberização do trabalho ficaram de fora do debate. 

O médico Heleno Correa Filho, professor da Universidade de Brasília e coordenador do Grupo Temático de Saúde do Trabalhador da Associação, afirma que o tema deixou de ser tratado em sua completude nos últimos anos.

“A saúde do trabalhador é definida como a saúde nos ambientes de trabalho subordinada ao controle social do trabalhador organizado. Se o trabalhador organizado não está presente, não dá palpite e não controla, não há saúde do trabalhador. Esse problema, foi acrescentado a um outro, fruto do período autoritário que nós acabamos de tentar encerrar com o governo anterior, em que a saúde do trabalhador deixou de existir, porque só se falava em ambiente.”

Ele dá exemplos de desastres que causam repercussões na vida de trabalhadores e trabalhadoras e não são comumente tratados a partir desse ponto de vista. 

“Todos os desastres ambientais - inundação porque uma barragem vazou, a mina que foi soterrada, o garimpeiro que matou o indígena, o garimpeiro que morreu porque estava em trabalho precário e servindo a um patrão rico que não vai lá morrer afogado embaixo da draga, no fundo do rio - todas essas questões são consideradas questões ambientais. Na hora que precisa de alguém para fazer alguma remediação ou prevenir alguma coisa lembram do pessoal da saúde do trabalhador.”

Ainda segundo o professor, é justamente essa desconexão que explica o uso do termo refundação na carta pública divulgada pela Abrasco.

“A saúde do trabalhador precisa ser refundada porque ela tem que estar na origem e no cerne da atuação da saúde ambiental. A refundação da saúde do trabalhador é uma reconcretização da aliança entre saúde ambiental e saúde do trabalhador.  Para que, não atuando dissociadas, estejam ambas enfraquecidas. Porque não existe ambiente sem trabalho. Não se preserva o ambiente se o trabalho está destruindo o ambiente. Não existe saúde do trabalhador se não levar em conta que as questões ambientais ampliadas dependem de como é feito o trabalho e de como o trabalho defende a saúde e a vida.”

De acordo com o Ministério do Trabalho, entre 2022 e 2021, a média anual de acidentes de trabalho no Brasil foi de 601.993 ocorrências, o que levou a mais de 2,5 mil mortes e 9,4 mil incapacitações permanentes. 

A proposta da Abrasco para lidar com o problema inclui a  participação dos trabalhadores como essencial para o andamento do processo e “aliar a defesa da saúde e da vida no trabalho com a construção de canais que interconectem o planejamento econômico, a exploração das riquezas naturais e prestação de serviços com a manutenção da vida.”

Segundo a nota pública da entidade, “tudo é urgente e teremos de (re)começar pela construção da democracia, com ênfase na democracia participativa direta e cidadã dos trabalhadores organizados”. As soluções precisam abranger medidas em curto prazo, de fácil e imediata operacionalização, mas sem deixar de lado questões de longo prazo. 

::Semana de 4 dias: 3,3 mil trabalhadores testam a proposta que protege saúde e meio ambiente::

Para isso, é preciso rever o papel dos Centros de Referência em Saúde do Trabalhador e garantir representação de movimentos, sindicatos e da sociedade civil para a formulação de políticas. O documento cita ainda a criação de frentes parlamentares para tratar do tema, tanto no congresso quanto nas assembleias e câmaras estaduais e municipais. 

A participação das universidades na construção dos debates e das soluções também é vista como ponto central, assim como a revisão e a reflexão sobres os papeis da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, do INSS e de outros entes governamentais. 

Edição: Rodrigo Durão Coelho

Por: Juliana Passos e Nara Lacerda, do Brasil de Fato

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