Nos últimos 50 anos, o Brasil deu um salto surpreendente nas taxas de crianças alimentadas pelo leite materno. Dados do Ministério da Saúde (MS) indicam que, até a década de 1970, a média de tempo de amamentação era de dois meses e meio. Atualmente, o período médio de aleitamento é de 16 meses, ou seja, superior a 1 ano de idade.
Informações do Estudo Nacional de Alimentação e Nutrição Infantil (Enani) também apontam o avanço. Hoje, o índice de bebês que só tomam leite materno até os 6 meses de idade é superior a 45%. Há cerca três décadas, esse resultado não chegava nem a 5%.
Ainda que o avanço seja palpável e significativo, o país precisa avançar mais para cumprir a meta da Organização Mundial da Saúde (OMS). O compromisso firmado entre as nações que integram a OMS é chegar ao ano que vem com pelo menos 50% das crianças de até seis meses alimentadas exclusivamente pelo leite materno.
Um dos obstáculos está no crescimento da oferta de fórmulas industrializadas. Com publicidade massiva e propagandas disfarçadas de conteúdo informativo na internet, a indústria do leite em pó se vende como uma alternativa segura e saudável à amamentação.
No entanto, há consenso na ciência de que nenhum alimento é melhor que o leite materno nos primeiros meses de vida e diminuir o acesso ao aleitamento traz riscos. "O leite materno é o alimento ouro para os bebês. Não há nenhum alimento que supere todas as vantagens e os elementos nutritivos que ele oferece", afirma Abilene Gouvêa, coordenadora do Banco de Leite do Hospital da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Em conversa com o podcast Repórter SUS, ela defende que o estímulo à amamentação é um trabalho coletivo e que pressupõe uma rede de apoio para mães e bebês.
"Quando uma mulher tem dificuldades e não consegue amamentar, não foi ela que teve uma dificuldade. Na verdade, ela não recebeu a rede de apoio necessária. A família, os profissionais de saúde fracassaram em ajudar essa mulher a superar as principais dificuldades".
Na entrevista, ela também fala sobre o peso do Sistema Único de Saúde (SUS) nas políticas de incentivo à amamentação, acolhimento e atendimento a mães e famílias. Gouvêa ressalta a prática do contato imediato entre bebê e mãe após o nascimento e a importância da amamentação nas primeiras horas de vida.
"Precisamos retomar algumas práticas desde o momento do nascimento. A decisão, por exemplo, de amamentar, acontece no pré-natal. Temos que conversar com essas mulheres desde essa fase, para discutir e desmistificar mitos, angústias e medos. Temos que falar do que é importante ela saber na hora que o bebê nasce, valorizar aquele momento do nascimento do bebê, a hora de ouro."
Entre os esforços para implementar políticas de ampliação do aleitamento, o Ministério da Saúde lançou neste ano a campanha "Amamentação, apoie em todas as situações". Ela marca o Agosto Dourado, mês de conscientização para o tema.
A ideia da pasta é atuar para reduzir o impacto que as desigualdades causam à prática. As condições econômicas e sociais também têm peso na decisão de amamentar ou não. A campanha tem foco especial nas lactantes em situação de vulnerabilidade.
Também em 2024, em parceria com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o MS realiza nova pesquisa de avaliação dos índices nutricionais de crianças do Brasil. A nova fase do Enani está em processo de campo e deve ouvir 15 mil famílias até inclusive com perguntas sobre a amamentação.
O inquérito domiciliar vai percorrer 124 municípios para conversar com mães e responsáveis. Durante o processo serão realizados exames, análises de marcadores de deficiência de vitaminas e minerais e encaminhamentos para atendimento, caso necessário.
Se você recebeu a visita de uma equipe e tem dúvidas ou quer saber se sua cidade está na lista de municípios que estão incluídos no estudo, clique aqui ou ligue para o número 0800 888 0022.
O Repórter SUS é uma parceria entre o Brasil de Fato e a escola Politécnica de saúde Joaquim Venâncio, da Fundação Oswaldo Cruz.
Edição: Nathallia Fonseca
Por: Nara Lacerda e Juliana Passos