“A luta pelos direitos humanos não pode parar, porque não é a luta de uma pessoa, é um compromisso com a nossa sociedade e com a sociedade que queremos ser”, foi o que definiu Eliane Lacerda, ex-estudante da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz), que recebeu o Prêmio Marielle Franco, da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), no dia 25 de junho de 2024.
“Migrar é um Direito Humano” foi o tema da edição de 2024 da premiação, criada através da Resolução Nº 617/2021 da Alerj, que é concedida anualmente a pessoas que tenham desenvolvido ou estejam desenvolvendo ações de promoção, valorização ou defesa dos direitos humanos no Estado do Rio de Janeiro. Eliane recebeu o Prêmio pelo conjunto de seu trabalho realizado como Coordenadora de Políticas de Migração e Refúgio da Secretaria de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos do Estado do Rio de Janeiro (SEDSODH/RJ).
Filha de uma mulher negra retinta, analfabeta, moradora de favela, Eliane é formada em Direito. Antes da graduação, ela foi estudante do Curso Técnico de Nível Médio em Saúde da EPSJV, e se formou em 2009, na habilitação de Gerência em Saúde. “Acho que o maior diferencial da Politécnica foi justamente o ensino diversificado, o rico contato com diferentes áreas. É um ensino que nos estimula a pensar, não apenas decorar formas e informações. Saber pensar foi fundamental para ser uma profissional melhor na minha área e ir me direcionando para a atuação em políticas públicas”, conta a jovem.
Eliane começou seus estudos na Poli pensando em um dia cursar Medicina na graduação. Mas, a partir do que foi aprendendo na Escola ao longo dos anos, percebeu que não era exatamente esse o caminho que queria seguir. “A Poli nos abre para muitas possibilidades e eu sabia que queria continuar estudando muitas áreas diferentes”, conta. Então, ela escolheu o Direito por ser uma área que envolvia uma maior conexão entre disciplinas como Filosofia, Sociologia e História, que chamaram mais sua atenção durante a formação politécnica.
Atualmente, Eliane participa da formulação, implementação e avaliação de políticas públicas migratórias, um trabalho que, segundo ela, precisa estar em diálogo constante com a sociedade civil e lideranças comunitárias para garantir o acesso à direitos básicos para a população imigrante e refugiada. Ela elabora, produz e executa ações de sensibilização, capacitações, articulações, projetos de integração locais e demais iniciativas na área de combate à xenofobia e defesa dos direitos das pessoas imigrantes e refugiadas.
Um dos ensinamentos que Eliane mais ouviu na Poli foi sobre a universalidade do Sistema Único de Saúde (SUS), ou seja, a garantia de que a saúde é um direito de todas as pessoas. Mas ela conta que, na prática, na sua atuação profissional, ainda encontra muitas situações de xenofobia, barreiras linguísticas e culturais. “O meu trabalho é tentar desatar esses nós para minimizar as barreiras de acesso, não apenas na saúde, mas em todos os direitos fundamentais”, explica.
Ela destaca alguns trabalhos que realiza, por exemplo, ajudando pessoas migrantes que chegam ao Rio de Janeiro sonhando com a idealização turística de locais como Cristo Redentor e Maracanã, mas que, na realidade, acabam, com as dificuldades de acesso a determinadas atividades, sendo empurradas para processos de favelização e empobrecimento. “Nós iniciamos um projeto de integração local através do lazer e da cultura, porque iniciativas dessa natureza, que eram realizadas pela Poli, me mudaram como pessoa e eu tento devolver um pouco disso para a comunidade”, afirma.
“A história do Brasil é baseada em migração, desde a nossa colonização, a migração forçada decorrente da escravização de pessoas. A gente não deveria ter, ainda hoje, barreiras de acesso em serviços básicos”, diz ela. Eliane tem Marielle Franco como uma referência, e pensa na responsabilidade e no comprometimento do trabalho que faz com toda uma geração de mulheres que está por vir na política. “O meu legado vai ser seguir as palavras de Marielle e não me deixar ser interrompida”, conclui.