O 3º Fórum Global de Recursos Humanos em Saúde começou ontem em Recife com o desafio de elaborar propostas concretas para ampliar a cobertura universal de saúde em nível mundial por meio de políticas de qualificação e aumento do número de trabalhadores da saúde. Além disso, o evento busca fazer um balanço dos resultados alcançados nos últimos dez anos no cumprimento das metas dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio que se relacionam com os trabalhadores da saúde dos. Um dos objetivos do Fórum é elaborar estratégias para depois do prazo estabelecido para atingir os ODM, que termina em 2015. Organizado pelo Ministério da Saúde, pela Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) e pela Organização Mundial de Saúde (OMS), a edição tem como tema ‘Recursos Humanos para a Saúde: fundação para a cobertura universal de saúde e agenda de desenvolvimento pós-2015’. Participam do evento cerca de 2 mil pessoas de 85 países.
“Nossa meta é explícita e profunda: nada menos que garantir acesso de todas as famílias e comunidades a um cuidado de saúde abrangente e de qualidade, não importa renda, língua, orientação sexual, local de moradia, etnia”, afirmou a diretora da Opas, Carissa Etienee, durante a cerimônia de abertura do evento. Segundo ela, a região das Américas avançou nesse sentido nos últimos anos, ampliando o número de pessoas com acesso à saúde. Mas a diretora ressaltou que ainda há muito a ser feito. “Ainda há muito a fazer se quisermos alcançar e sobrepor os desafios de um ambiente em mutação e alcançar aqueles que não têm acesso à saúde sem fazê-los sofrer financeiramente. Precisamos mudar a maneira como vemos a força de trabalho; não apenas como componente da produção de serviços, e sim como agentes de mudança na sociedade”, continuou Carissa. Ela defendeu que, para isso, é necessário haver um direcionamento nas políticas de recursos humanos no sentido de instituir uma “cultura de gestão aberta, que dê poder aos trabalhadores e sua criatividade, instilando neles os valores essenciais da cobertura universal da saúde, com políticas de formação que vão além da fragmentação dos sistemas médicos, com visão holística”, apontou a diretora da Opas. Carissa concluiu sua fala ressaltando a necessidade de que a formação dos trabalhadores da saúde seja capaz de provocar seu engajamento político, contribuindo para que eles “se recusem a aceitar as desigualdades da pobreza e da injustiça social, para criar mudança social construtiva”. Ela questionou: “Como ajudá-los, por exemplo, a questionar uma indústria como a do tabaco, que cria lucros a partir do vicio das pessoas? Nada disso é fácil nem simples, mas esses trabalhadores são necessários, a menos que queiramos comprometer o futuro”.
Marie-Paule Kieny, diretora-geral assistente da OMS afirmou que o objetivo de que todos os países tenham sistemas universais de saúde é ambicioso, principalmente levando-se em consideração o déficit de trabalhadores de saúde no mundo, que segundo ela é hoje de 7,2 milhões de profissionais. “Essa lacuna vai aumentar mais ainda se não fizermos nada. As doenças comunicáveis e o envelhecimento da população podem tornar-se um problema agudo. Precisamos de mudanças de paradigma em várias dimensões: financiamento, gestão governança... É preciso uma abordagem mais sistêmica que reconheça ligações entre ações e as coloque dentro de um sistema mais amplo de saúde”, disse Marie-Paule. Segundo ela, os debates e relatórios produzidos durante o Fórum devem contribuir nesse sentido. “Nosso desafio claro é a mobilização dos recursos políticos para a renovação dos recursos humanos em saúde. Esse fórum vai enfatizar a centralidade dos recursos humanos em saúde e engajar decisões fortes para assegurar que os trabalhadores estejam engajados e motivados e que eles tenham acesso ao trabalho”.
O ministro da saúde do Brasil, Alexandre Padilha, apontou o desafio do país de oferecer cobertura universal e gratuita para sua população de mais de quase 200 milhões de pessoas. Segundo ele, são quatro os desafios estratégicos principais: financiamento do SUS, gestão e planejamento coordenado das ações nos três níveis de governo, produção nacional de insumos e medicamentos essenciais para o SUS e a formação com qualidade e em quantidade para garantir saúde universal e gratuita para a população brasileira. “Esse é o desafio mais crítico, que exige o maior esforço político, a maior troca de experiências e de conhecimento”, disse Padilha. Segundo o ministro, ao longo dos últimos 25 anos, por meio do SUS, o Brasil fez muito para atingir os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, principalmente com a redução das taxas de mortalidade infantil. “O Brasil foi o país que mais reduziu na América Latina. Para isso foi decisiva uma abordagem multiprofissional, não só focada nos médicos, mas dando um peso importante aos agentes comunitários de saúde, que são lideranças comunitárias que conhecem realidade da população”, explicou Padilha. Ele destacou que, ao mesmo tempo, a redução da taxa de mortalidade e o envelhecimento da população coloca novas questões para o SUS. “O país envelhece rapidamente e isso impacta fortemente os custos da saúde e a necessidade de formarmos outros profissionais, equipes multiprofissionais com outros perfis. Esses idosos precisam de um cuidado de saúde, de leito de terapia intensiva, de médicos capacitados para cuidar do envelhecimento, de espaços públicos para exercícios”, disse, para em seguida chamar a atenção para à saúde infantil: “A criança que não morre mais precisa de pediatra, nutricionista, psicólogo, ACS qualificados. Fizemos um levantamento em escolas para crianças de até seis anos de idades, e temos encontrado até 30% de crianças acima do peso. Esses são novos problemas que exigem políticas públicas para oferecer profissionais com qualidade para enfrentá-los”.
Padilha também chamou atenção para o problema da escassez de médicos no país. “O Brasil tem 1,8 médicos por mil habitantes, abaixo de paises como Argentina, Uruguai, Portugal. São poucos médicos e os que temos são mal distribuídos: 22 estados têm menos médicos que a média nacional de 1,8 por cada mil habitantes e cinco estados têm menos de 1 médico por mil habitantes”, enumerou.