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Doulas apresentam trabalhos de conclusão de curso

A formatura do curso, inédito no Brasil pelo caráter público e com práticas supervisionadas, aconteceu no dia 24 de agosto
Julia Neves - EPSJV/Fiocruz | 06/09/2019 10h56 - Atualizado em 01/07/2022 09h43

Racismo, invisibilidade e sexualidade. Esses foram alguns temas dos trabalhos de conclusão do Curso de Qualificação Profissional de Doula, promovido pela Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz). Encerrado no dia 24 de agosto, o curso formou 29 profissionais que estarão aptas a atuar no desenvolvimento de atividades de auxílio físico, informacional e emocional junto a mulheres grávidas antes, durante e após o parto. A formação, inédita no Brasil pelo caráter público e com práticas supervisionadas em hospitais do Rio de Janeiro, foi viabilizada por meio de uma emenda parlamentar e uma parceria com a Associação de Doulas do Rio de Janeiro (AdoulasRJ) e com outra unidade da Fiocruz, o Instituto Fernandes Figueira (IFF). Para a representante da AdoulasRJ, Juliana Cândido, que divide a coordenação do curso com Morgana Eneile, presidente da Associação, e com os professores-pesquisadores da EPSJV, José Mauro da Conceição e Ialê Falleiros, os trabalhos finais tinham o propósito de fazer as alunas refletirem de forma crítica e propositiva a respeito de algum tema abordado durante a formação, relacionando com a realidade em que estão inseridas. “As propostas de todas as alunas foram muito ricas e as apresentações demonstraram toda a pesquisa realizada por elas a respeito do tema escolhido e a dedicação em encontrarem caminhos para discutir e trazer para as colegas uma reflexão acerca da relação das Doulas com o assunto abordado”, destacou.

A aluna Linda Siloé falou sobre a sexualidade feminina, relacionando seus aspectos físicos e sociais, numa investigação do que compõe a sexualidade e de como ela influencia a vida da mulher como um todo. “Olhar para si, para seu corpo, para seu ciclo menstrual e sua sexualidade pode não ser tão fácil quando se vive numa sociedade onde questões como essas são tabus”, afirmou a doula. Em seu trabalho, Linda apontou que a sexualidade está deturpada e doente, e o resultado disso são violências e abusos que ferem profundamente a alma de uma mulher: “Existe uma necessidade de se resgatar a sexualidade feminina. Esse resgate é o empoderamento da mulher. Ter poder sobre seu corpo é ter poder sobre sua vida, reconhecer-se como um ser que tem direito de sentir prazer sexual, sem ser taxada pejorativamente por valores de uma moral deturpada”.

Outro trabalho foi sobre ‘violência invisível’, da aluna Rafaela Vale, que é deficiente auditiva e contou com a mediação de intérpretes de libras durante todo o curso. Segundo ela, existe na sociedade atual um olhar que desconhece e exclui as pessoas surdas. “Fruto de uma visão estigmatizada, pensam que nós surdos somos incapazes e por isso nos excluem”, justificou, continuando: “Por outro lado, quis mostrar que, por causa desse contexto histórico, nós surdos lutamos e reagimos, nos articulamos como comunidade, nos reconhecemos como pares e lutando por direitos”.  Nesse sentido, o trabalho de Rafaela fala sobre a relação entre a violência invisível e o racismo institucional.  Segundo ela, muitas vezes são as gestantes negras que sofrem com o racismo, com a omissão das informações sobre o trabalho de parto, abusos como a manobra de kristeller (pressionar a parte superior do útero para acelerar a saída do bebê), a episiotomia (corte no períneo para ampliar o canal de parto) e outros tipos de violência. “Agora, imaginem as mulheres surdas que têm seus filhos e, obviamente, sofrem isso que eu chamo de violência pela falta de comunicação acessível a elas. Sem falar na ausência de intérpretes nos mais variados espaços. A gente sabe que o certo seria que os profissionais fossem todos bilíngues, mas não há intérpretes de Libras nesses contextos. Ou seja, como que as mulheres surdas vão se apropriar das informações e conhecimentos necessários para que sejam elas pessoas autônomas?”, questionou Rafaela, que também criou um sinal em libras para a palavra doula.

Para dissertar sobre a violência obstétrica na população negra, a aluna Ariene traçou um histórico para compreender o papel e como o corpo negro atua hoje nos serviços de saúde e o que ele pode enfrentar.  A ideia do trabalho, segundo ela, uma espécie de artigo, foi exatamente pautar as doulas que irão atender também mulheres negras. “Enquanto doulas, nosso papel principal é levar a informação para gestantes e, para isso, devemos estar muito preparadas para quando acontecerem casos de violência”.

Entre os outros trabalhos das alunas estão a elaboração de uma ficha de avaliação do parto, um documentário sobre o curso, instrumentos de educação pré-natal, um mapa de rodas de doulas no Rio de Janeiro, entre outros.

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