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EPSJV realiza seminário sobre Registros e Informações em Saúde

Formação profissional para a área, desenvolvimento de sistemas de informação e gestão da informação foram alguns dos temas discutidos durante o evento
Talita Rodrigues - EPSJV/Fiocruz | 22/07/2011 08h00 - Atualizado em 01/07/2022 09h47


As perspectivas e desafios para a área de Registros e Informações em Saúde, além da troca de experiência na área, foram o tema do seminário ‘As tecnologias de informação e comunicação no setor saúde’, realizado nos dias 14 e 15 de julho na Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV).



Na conferência de abertura do seminário, a pesquisadora da ENSP/Fiocruz, Ilara Hämmerli, trouxe uma discussão teórica da saúde coletiva e política do campo da informação. Inicialmente, Ilara fez uma contextualização da saúde brasileira lembrando que o modelo político econômico do Brasil ainda mantém desigualdades importantes nos padrões de vida dos brasileiros. “O SUS efetivo que nós temos aí ainda impede comemorações. Gostaríamos de estar com 21 anos de SUS com outro padrão de qualidade de vida da população brasileira. Permanece o desafio de alcançar a plena materialidade do texto constitucional do direito universal à saúde com qualidade”, disse a pesquisadora, acrescentando que para esse direito ser alcançado é preciso haver a discussão de um projeto de país voltado para a democracia, a emancipação e o interesse público como primazia nas políticas de saúde.



Para que essa discussão avance na sociedade brasileira, Ilara apontou algumas ações como debater o modelo de desenvolvimento e implantação do país e qual a inserção do SUS no processo brasileiro do capitalismo globalizado; discutir qual o arranjo institucional que melhor defende o interesse público na saúde. “Após 20 anos do SUS, o quadro que temos hoje é de uma saúde fragmentada, hospitalocêntrica e não constitutiva de uma rede de atenção integral à saúde com qualidade. O desafio que a gente se propõe é pensar como buscar a superação desse modelo e um dos limites que destaco é em relação à informação. A produção e o uso da informação e informática em saúde não têm dado conta da complexidade dos atuais processos de saúde/doença/cuidado e dos problemas contemporâneos a serem superados, constituindo-se em um dos limitantes para a ampliação da capacidade de resposta do Estado brasileiro”, apontou Ilara.



Entre os limites impostos pela questão da informação, Ilara destacou a dimensão político epistemológica. Ela ressaltou que quando são analisados os determinantes desses limites fica evidente que as alternativas para sua superação dependem menos de iniciativas pontuais tecnicistas e mais da adoção de novos referenciais epistemológicos nas práticas e saberes da informação e tecnologias de informação (TI). “Há verdadeiras relações de concorrência entre as profissões para saber quem manda na área da saúde. Isso é disputa clara do campo teórico epistemológico. Nos processos sócio-políticos de construção histórica das redes de informação em saúde, há disputas de paradigmas. Eu considero que a informática médica tem sido hegemônica nos últimos tempos”.



Para a pesquisadora, essas disputas ficam submersas nos diferentes discursos, nos quais a informação e a tecnologia de informação em saúde são trabalhadas como instrumentos de processos e produtos, reduzindo a informação e a tecnologia da informação em saúde à tecnicidade. “A discussão é apresentada como despolitizada e neutra, mas não há neutralidade nesse debate, há disputas por trás disso. Cada variável que entra em um sistema de informação é uma opção política que expressa nossa visão de mundo daquilo que nós queremos que seja registrado de uma determinada sociedade”, disse.



Para superar essas questões, Ilara aponta alguns desafios, como superar o conceito biologicista que pauta a organização dos sistemas de informação em saúde atualmente e repensar o papel do sujeito na informação e informática em saúde para que ele não fique fragmentado entre as diversas bases de dados em saúde. “O indivíduo perde sua identidade integral como sujeito pleno e não existe nos sistemas de informação, o que existe são determinados agravos e grupos de risco. O conceito de sujeito está diluído e fragmentado, como a lógica dos sistemas brasileiros”, disse Ilara, acrescentando que outro desafio é repensar o conceito de ‘coletivo/população’ que tradicionalmente é tratado como o somatório de indivíduos ou de determinados agravos referidos a tempo e lugar, de forma estática e restrita. “Não dá para somar indivíduos e achar que isso é coletivo”.



Para Ilara, a opção pela terceirização do desenvolvimento de sistemas complexos de informação em saúde tem evidenciado ser inadequada ao SUS e ao Brasil. “As empresas desenvolvedoras desses programas têm direito de uso dos padrões. Eu defendo que se deve quebrar patente de padrão, igual de medicamento: tem que ser público”, disse a pesquisadora. “Essas opções políticas de gestão da TI em Saúde geraram dependência de empresas em sistemas estratégicos para a Saúde, ao mesmo tempo em que causaram o sucateamento dos espaços públicos de TI. As secretarias de estados e municipais não criam suas instâncias com autonomia. Contratam empresas alegando sempre que o setor público não tem capacidade para fazer. Essas opções não trouxeram benefícios à população, nem aos gestores e profissionais de saúde, à altura dos recursos aplicados”.



A pesquisadora acredita que é premente a definição de um modelo de governança da Informação e das Tecnologias de Informação em Saúde que não subordine interesses públicos aos de mercado do complexo econômico industrial em saúde. “E isso pressupõe uma política pública estratégica para o SUS, que envolva o desenvolvimento de uma ‘inteligência pública’ neste campo, minimizando riscos de aprisionamento a empresas de software e garantindo autonomia ao país em negociações nacionais e internacionais de preços e qualidade de produtos e serviços”.



Outro ponto destacado por Ilara é a defesa da privacidade das informações dos cidadãos, que ela considera estratégica. “É necessário a construção de um pacto político e ético de defesa da privacidade do cidadão e confidencialidade dos dados individualizados existentes no SUS, com adoção no ato do cadastramento de um Termo de Consentimento Esclarecido. As pessoas precisam saber como vai ser usada aquela informação, dizer se concordam ou não com isso e ter sua vontade respeitada”.



Disseminação da informação para a gestão em saúde



As experiências e projetos de disseminação da informação para a gestão em saúde foram o tema da primeira mesa-redonda do seminário.



O processo de construção e o funcionamento da Rede Interagencial de Informações para a Saúde (RIPSA) foi o tema da fala de Jacques Levin, do Datasus. Falando sobre a situação atual, ele observou que nem sempre os dados da saúde no Brasil refletem a realidade, pois em alguns casos eles estão fragmentados, desarticulados, dispersos em várias fontes e com graves problemas de qualidade. “Houve um salto de qualidade nos últimos tempos e já existe um bom grau de padronização da informação, com uma melhoria significativa dos sistemas, mas ainda há um longo caminho a percorrer”.



A ideia de criar a RIPSA surgiu a partir da constatação da necessidade de conhecer melhor a situação, padronizar e melhorar a qualidade das informações, além de facilitar o acesso a esses dados. Criada em 1996, a RIPSA tem como objetivos analisar a situação de saúde e suas tendências para subsidiar políticas públicas de saúde, sistematizando, qualificando e analisando dados e informações já disponíveis através de um processo interinstitucional de construção coletiva, cujos produtos fossem resultados de consenso. “A idéia não era simplesmente pegar os dados de uma área e enviar para outra, eles teriam que ser qualificados primeiro”.



Jacques destacou que a RIPSA tem como um de seus princípios a intersetorialidade, ou seja, as informações necessárias à gestão do sistema de saúde transcendem a produção própria do setor. “Também defendemos que as instituições produtoras de informações-chave devem participar ativamente do processo de construção dos indicadores. Não basta ir ao IBGE, por exemplo, e pegar os dados, tem que trazer o IBGE para discutir. Essa intersetorialidade levou a mobilizar um conjunto de entidades para desenvolver, via consenso, uma base de dados de indicadores. O consenso é uma das palavras chaves da metodologia RIPSA”, disse.



A composição da RIPSA inclui instituições do setor saúde, universidades e sociedades científicas, como MS, OPAS, Fiocruz, Conass, Conasems, IPEA, USP, Unicamp, UnB, IMS/Uerj, ANS, Anvisa, IBGE, entre outras entidades.



Segundo Jacques, o principal produto gerado pela RIPSA é o ‘Indicadores e Dados Básicos para a Saúde no Brasil (IDB)’, um conjunto de indicadores selecionados e construídos a partir de sistemas de informação e estudos de abrangência nacional. Esses dados são publicados no livro ‘Indicadores básicos para a saúde no Brasil: conceitos e aplicações’, disponível na BVS RIPSA. Toda a base de dados do IDB está disponível na internet, no site do Datasus.



Dulce Quevedo, da Secretaria de Estado da Saúde de Santa Catarina, falou sobre como foi feita a implantação da RIPSA em Santa Catarina e como isso contribui para a melhoria da informação em saúde no estado. Dulce explicou que a implantação da RIPSA nos estados tinha como objetivo apoiar a rede nacional na melhoria da qualidade da informação, com a descentralização e participação efetiva dos municípios.



Santa Catarina foi um dos cincos estados pilotos para a implantação da RIPSA estadual, juntamente com os estados de Minas Gerais, Bahia, Mato Grosso do Sul e Tocantins. Nos estados, o IDB inclui não apenas as informações do IDB/Brasil, mas também informações específicas e relevantes para a gestão estadual.



Em Santa Catarina, a RIPSA foi implantada em 2008 e o primeiro IDB foi publicado em 2010. Os dados de Santa Catarina estão disponíveis no site www.saude.sc.gov.br/ripsa.



A experiência do Observatório das Tecnologias de Informação e Comunicação em Sistemas e Serviços de Saúde (Otics) foi o tema da fala de Alcindo Ferla, da UFRGS e do ICICT/Fiocruz. Destacando a importância da informação para o cotidiano do SUS, Alcindo lembrou que ela precisa estar presente nesse dia-a-dia de trabalho. “Não falo só do acesso, mas da capacidade de uso dessas informações no cotidiano. Quero que a gente pense a relação entre o cotidiano do trabalho e a informação, a partir de outra vertente que não essa da disponibilidade. Quando falo em ponto critico da informação, estou falando que o problema central é a articulação entre informação e trabalho”.



Falando sobre a experiência do Otics, Alcindo explicou que o observatório inclui a pesquisa (com a produção de conhecimentos para o cotidiano e não com caráter acadêmico), o desenvolvimento (com a sistematização de novas tecnologias, processos de trabalho e conceitos), a atuação em rede científica e a cooperação horizontal (com a integração de diferentes atores). “Com o desenvolvimento do trabalho do Otics, foram se formando certos grupos de interesse e criamos o conceito de Estações de Observação, como uma unidade do observatório que se ocupa de um tema específico e de um território”, explicou Alcindo, que citou alguns exemplos de estações como a Otics-Rio, desenvolvida em articulação com a SMSDC RJ/ICICT/UFRGS e que tem como abrangência a atenção primária e promoção da saúde no município do Rio de Janeiro; e a Estação Produtos e Serviços Hospitalares, em parceria com GHC/Anvisa/UFRGS e que tem como foco a gestão da atenção especializada no contexto hospitalar. As estações, por sua vez, podem dar origem aos Núcleos de Observação, que reúnem soluções e conhecimentos para a educação permanente e apoio à gestão em saúde.



Para Alcindo, o momento atual é importante para resolver o que ele considera um desafio para construir melhor a informação e os processos. “O grande desafio é um compromisso para pensarmos o que informação e a informática podem fazer para além da tradição que está colocada no nosso sistema de saúde e no conjunto das nossas praticas - e que sequestra o que nós temos produzido de conhecimento sobre informação e informática para o sistema de saúde”.



Software livre



O desenvolvimento e a utilização de software livre foi o tema da fala de Corinto Meffe, do Ministério do Planejamento, na abertura do segundo dia do seminário. Corinto começou dizendo que os softwares são um bem diferenciado e que geram muitas riquezas. “Hoje, a contratação da licença de um software beira a casa dos R$ 20 milhões. Será que com esse dinheiro não se pode fazer uma aplicação em serviço e devolver esse código para a sociedade? A nossa visão é que isso é possível, ainda mais sendo com recurso público”, observou.



Corinto explicou que o software livre é um tipo de modelo que está em transição frequente, mas que tem alguns elementos básicos. “O software livre trem quatro regras básicas: ter a possibilidade de olhar, copiar, modificar e enviar o código para outra. E precisa cumprir essas regras para ser livre. Outra coisa muito importante é que quem usa um software livre não pode fechar esse software, não pode quebrar uma cadeia de benefícios. Uma vez aberto, sempre aberto”, destacou.



Falando sobre o software público, Corinto explicou que o governo federal começou a pensar a questão em 1995. Dez anos depois, foi oferecido o primeiro software livre do governo federal. “Um software pode ser oferecido como um bem público ofertado para a sociedade como um serviço. Hoje, o software livre tem uma Instrução Normativa (IN 01/2011) que faz a defesa do conceito de que o software pode ser tratado como um serviço para a sociedade”, disse.



Segundo Corinto, o modelo brasileiro atual de software livre é um dos mais avançados nessa área. “Temos um conjunto de regras, uma base de produção comum e, daqui para frente, todo mundo tem direito, é universalizante, o que está no Portal do Software Público hoje é um direito do cidadão, um direito da sociedade brasileira. O software tratado como um bem público, é uma revolução que transcende a revolução industrial”, afirmou. “Acredito que, por concepção, softwares financiados com dinheiro público e, em especial, para o setor publico, devem ser colocados no Portal do Software Público para toda a sociedade. Não podemos pagar diversas vezes pelo mesmo conhecimento comprando licenças”, concluiu.



Informação na gestão municipal



A produção da informação para a gestão municipal do setor saúde foi o tema da segunda mesa-redonda do seminário. Haroldo Lopes, do Datasus, falou sobre a política de informação e informática em saúde no SUS e a construção da Política Nacional de Informação e Informática em Saúde do SUS (PNIIS).



A ideia de construir a PNIIS surgiu a partir da constatação que havia diversos problemas a serem superados na área de informação do SUS, como a operação manual dos registros nos serviços de saúde, a falta de integração entre os sistemas de saúde e a falta de padrões para representar e compartilhar a informação em saúde. Em 2003, na 12ª Conferência Nacional de Saúde, a PNIIS foi aprovada. “O fato de ter a política não significa que já conseguimos avançar em todos esses problemas. Alguns desses antecedentes permanecem como desafios a serem superados”, observou Haroldo.



A PNIIS tem como propósito promover o uso inovador, criativo e transformador da tecnologia da informação, para melhorar os processos de trabalho em saúde, resultando em um Sistema Nacional de Informação em Saúde articulado, que produza informações para os cidadãos, a gestão, a prática profissional, a geração de conhecimento e o controle social. Entre as diretrizes da PNIIS, Haroldo destacou o fortalecimento das áreas de informação e informática nas três esferas de governo (municipal, estadual e federal); a identificação unívoca dos usuários, profissionais e estabelecimentos de saúde; o estabelecimento de padrões para representação da informação; a disseminação e democratização de informações de saúde; e o acesso livre e gratuito a bases de dados em saúde não-identificados. “O Brasil é um dos únicos países que fazem isso, disponibilizando os dados de forma pública e gratuita”, destacou.



A experiência da gestão da informação em Caxias do Sul (RS) foi apresentada por Leila Beatriz Achutti, da Secretaria Municipal de Saúde de Caxias do Sul. O município, com 435 mil habitantes, é referência regional na região nordeste no Rio Grande do Sul. Segundo Leila, atualmente, quase todos os setores da secretaria usam sistemas de informação, incluindo alguns desenvolvidos pela própria secretaria, além dos criados pelo governo federal. “Houve uma necessidade apontada pela gestão de informatizar a rede de serviços de saúde e setores de apoio da Secretaria Municipal de Saúde desenvolvendo a interoperacionalidade dos sistemas de informações”, explicou Leila.



A partir dessa necessidade, Caxias do Sul criou em 2004 o Setor de Informação em Saúde. Dois anos depois, foi iniciado o projeto de informatização da rede de saúde do município, com investimentos em infra-estrutura, recursos humanos e sistemas. Atualmente, já existem sistemas para a marcação de consultas, agendamento de exames e regulação de leitos de UTI, entre outros. Estão previstos ainda sistemas para o controle de frota, prontuário eletrônico e a criação de um portal de informações. “No decorrer desse trabalho, verificamos o quanto é complexo o processo de desenvolvimento de uma base de dados para a área da saúde, em especial para a área pública. Os passos necessários para a implantação de um sistema de informação único e totalmente integrado não dependem exclusivamente da instalação de uma ferramenta e equipamentos, mas sim de vontade política e principalmente do entendimento e envolvimento dos profissionais, tanto da área de saúde quanto da área de TI e da comunidade”, concluiu Leila.



Marcio Silvestre, da Secretaria Municipal de Saúde de Piraí (RJ), falou sobre a experiência da gestão da informação em Piraí (RJ), município de 26 mil habitantes no sul do estado do Rio de Janeiro. Segundo Marcio, apesar de ter uma população pequena, a cidade tem uma área territorial muito grande e era necessário interligar e informatizar a rede de informações entre as unidades de saúde. “Ficávamos muito incomodados com o excesso de papel, que gerava demora na análise das informações”, observou Marcio.



Atualmente, os 19 prédios de unidades de saúde de Piraí estão interligados e geram dados para os sistemas de informação municipais. A implantação do Projeto Piraí Digital, em 1997, contribui para trazer a tecnologia para a gestão municipal. “Hoje temos uma equipe própria e fixa de TI na Secretaria de Saúde, o que ajuda muito no sistema de gestão das equipes de saúde. Também fizemos investimentos em comunicação, equipamentos e TI para a saúde, sempre focando na preferência pelo software livre”, disse Marcio. “Fazer a gestão da informação dentro de um município exige a necessidade de utilizar sistemas informatizados para o controle e gestão dos serviços de saúde. Quando descentralizamos os sistemas para quem gera o dado, começamos a ter uma melhoria da qualidade da informação e observamos que houve até um aumento na quantidade de dados”, concluiu.



Formação profissional



A formação profissional para a área de Informações em Saúde foi o tema da mesa-redonda que encerrou o seminário. Ricardo Ceccim, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), falou sobre as necessidades de capacitação para a atuação profissional na área de informação e informática em saúde para o SUS.



Ricardo frisou a necessidade de compor quadros para a área de Registro e Informação. “Temos essa demanda colocada para os sistemas de saúde desde 1989 (quando a habilitação em Registros e Informações em saúde foi reconhecida pelo Conselho Federal de Educação – Parecer 353/1989), mas temos pouquíssimos cursos que formam técnicos na área de Registro e Informação. Até hoje não popularizamos essa formação, desde 1989. Mas isso segue na ordem do dia”, disse.



Para Ricardo, a capacitação deve ser pensada não apenas como um treinamento ou desenvolvimento de habilidades, mas também como uma qualificação que ative compromissos. “Se capacitar é trabalhar na perspectiva de construir compromisso ou responsabilidade, temos um desafio que considero relevante para a formação. A capacitação dos recursos humanos poderia ser a formação de um quadro técnico que visa a cumprir funções técnicas, mas quero pensar que vamos formar pessoas que são agentes de determinados compromissos com o sistema de saúde, portanto, são atores sociais de um sistema”.



Segundo Ricardo, é preciso olhar a educação não apenas como um repasse de conteúdos, mas como um campo de possibilidade de construção de um perfil. Para isso, ele acredita que as apostas de formação seriam a profissionalização do nível médio, a criação de uma linha de formação nos cursos da área de informação e de ciência da informação, a criação de residências na área de informação em saúde e de um mestrado profissional nessa área. “Também seria importante a inclusão de um eixo de formação na área de informação e comunicação em saúde nas graduações em saúde coletiva - hoje são 21 cursos no Brasil. Também poderíamos abrir o que a gente chama de vivências intensivas na área de informação, envolvendo o pessoal de saúde, informação, comunicação, administração, matemática e estatística. Profissionais de diferentes áreas que podem ser familiarizados com o tema e, eventualmente, escolher essa área”.



Para a capacitação de recursos humanos, Ricardo acredita que é necessário desenvolver perfis profissionais capazes de dar respostas às necessidades sociais em saúde e desenvolver potenciais de agenciamento. “Com isso, vemos menos os recursos humanos e mais os atores sociais, menos a capacitação e mais a educação. Podemos atuar em educação pensando não só no desenvolvimento de quadros específicos, mas também no desenvolvimento de trabalhadores que pertencem a uma lógica de equipe e que estariam se responsabilizando pela construção da gestão de um sistema de saúde que dê conta dos nossos princípios e diretrizes”.



Para Ricardo, a disseminação da informação também é considerada uma formação, pois ele entende que quem dissemina também forma, ao escolher qual conteúdo e de que forma disseminar. Portanto, a disseminação também está ligada a uma noção de gerar estratégias de pensamento e de comunicação. “Para disseminar, precisamos comunicar. Para que a informação conquista em uma prática educativa, precisa ser comunicada para que gere em outra instância a educação em informação”.



A professora-pesquisadora da EPSJV Ana Margarida Campello apresentou um panorama da educação profissional em saúde, com um recorte para a área de Registros e Informações. De acordo com os dados apresentados pela pesquisadora, de 2002 a 2010, na educação profissional em geral, houve um aumento no número de matrículas na rede pública. “Em 2002, as matrículas no público e no privado eram iguais, mas o público cresceu nessa década e passou a ter uma presença mais efetiva, principalmente a partir de 2007. Já na área de saúde, ocorre o inverso: temos uma presença do setor privado muito mais significativa. Em outras palavras, há uma ausência do setor publico na formação técnica em saúde”, apontou.



Segundos os dados apresentados, em 2010, o setor privado era responsável por 70% da formação técnica em saúde no Brasil, enquanto o setor público ficava com 30%. “Esses dados são de extrema importância porque mostram que a formação técnica para o SUS está na mão do setor privado. E será que essa formação é pensada em função do SUS ou em função das necessidades de mercado?”, questionou a pesquisadora.



Em relação à área de Registros e Informações, os dados mostram que, em 2002, havia apenas 17 alunos matriculados nessa área em todo o Brasil. Até 2010, esse número não apresentou um aumento significativo, passando para 83 alunos matriculados na rede pública e 71 no setor privado. “Quando analisamos a política educacional brasileira, vemos que nos Referenciais Curriculares do final dos anos 1990, Registros e Informações não era uma das 12 subáreas de formação para a saúde. Ela aparece como um curso a ser desenvolvido apenas em 2009, no Catálogo Nacional dos Cursos Técnicos, e, quando apareceu, o setor privado começou a se organizar para oferecer esse curso, que antes era exclusivo do setor público”, observou Ana Margarida.



Para a pesquisadora, é importante pensar quais são os modelos de formação técnica em saúde que estão em prática hoje no Brasil. “Que formação é essa? A que se visa nessa formação? A existência da educação profissional ao longo do tempo foi sendo colocada como uma educação mais aligeirada, formando trabalhadores sem a base técnico-científica necessária, ou seja, uma formação instrumental para o desempenho de uma determinada tarefa. Mas defendemos a necessidade de outro projeto, de outra maneira de olhar a formação técnica. A definição dessa formação em uma política pública, na perspectiva da formação humana, da politecnia e da formação do homem como um todo”.



Ana Margarida ressaltou que a politecnia se contrapõe à formação instrumental, no sentido de que o trabalho se desenvolva em unidade indissolúvel entre a teoria e a prática, entre o manual e o intelectual. “No currículo das formações em Registros e Informações é importante que o profissional tenha noção da importância da informação em saúde para o desenvolvimento do trabalho na área de saúde”, concluiu.



O perfil do profissional da área de Registro e Informações em Saúde no estado do Rio de Janeiro é o tema da pesquisa coordenada pela professora-pesquisadora da EPSJV, Claudete Fonseca. O trabalho tem como objetivo levantar as modificações no processo de trabalho dos Serviços de Registros e Informações em Saúde no estado, visando a identificar os requisitos atuais para um profissional atuar em tal área. Com isso, a pesquisa pretende subsidiar as reformulações necessárias aos cursos de Registros e Informações em Saúde.





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