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EPSJV/Fiocruz integra criação de Redes de Pesquisa Marxistas em Saúde e Educação

Atuação da Escola Politécnica consolida compromisso histórico com a produção crítica e a defesa das políticas públicas
Julia Neves - EPSJV/Fiocruz | 03/10/2025 09h59 - Atualizado em 03/10/2025 14h19

Com participação ativa de pesquisadores da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz), duas redes de pesquisa com perspectivas marxistas foram recentemente criadas com objetivo de consolidar espaços permanentes de diálogo sobre as contradições estruturais do sistema capitalista e seus impactos sobre a Saúde e Educação públicas. 

Na Saúde

Criada a partir do I Colóquio de Grupos de Pesquisas Marxistas na Saúde — realizado em junho de 2025, na Universidade de São Paulo (USP) —, a Rede de Pesquisa Marxista na Saúde representa um marco na articulação de pesquisadores comprometidos com uma abordagem crítica e transformadora da saúde pública no Brasil. A rede reúne grupos de pesquisa de diferentes instituições, que compartilham o compromisso com a defesa de um SUS público, universal e estatal, e com a construção de uma práxis marxista. Dentre eles, está o grupo de pesquisa Estado, Políticas e Espaço público, coordenado pelos professores-pesquisadores Marcela Pronko e André Dantas, da Escola Politécnica. Desde 2014, o grupo se dedica à análise das dinâmicas sociais que definem o espaço público na contemporaneidade e sua relação com a formulação e reformulação das políticas públicas, em especial as sociais, na América Latina e no Brasil.

No Colóquio estavam presentes, além do grupo de pesquisa da EPSJV, os grupos: Saúde, Estado e Capitalismo Contemporâneo (SECC), da USP; Cronologia Biográfica Marxiana (CronoMarx), da USP e Universidade Federal de São Paulo (Unifesp); Saúde, Sociedade, Estado, Mercado (SEM), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj); Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Educação, Trabalho e Saúde (GEPETS), da Universidade Federal de Goiás (UFG); e o Grupo de Estudo Trabalho, Ser Social e Enfermagem (GETSSE), da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), Campus de Arapiraca.

A formalização da rede foi resultado da aproximação entre os grupos de pesquisa, como explica Marcela Pronko. “O que fizemos foi estruturar esse processo, tornando-o ao mesmo tempo mais institucionalizado e mais abrangente. A rede se conforma com a premissa de que é composta não por indivíduos, mas por grupos de pesquisa”, comenta, acrescentando que cada um desses grupos parte de condições históricas e de recortes temáticos diferentes, mas contribuem para pensar o Estado no capitalismo contemporâneo e a conformação das políticas de saúde: “Ou seja, havia um campo comum de reflexão que poderia ser, portanto, também um campo comum de atuação”.

Nesse contexto, André destaca que a ideia de criar uma Rede de Pesquisa Marxista na Saúde surgiu da necessidade de disputar a compreensão sobre o setor saúde e a política que se expressa dentro do campo da saúde coletiva, especialmente. "Faltam análises de teor marxista nesse campo. Isso não significa ausência de boas análises na saúde coletiva, mas há uma carência, por exemplo, no que diz respeito à compreensão do Estado e da relação entre público e privado”, explica.

Embora ainda esteja em processo de consolidação, a rede já foi estruturada a partir de comissões, nas quais os grupos irão se dividir para atuar. “Pensamos, por exemplo, em uma comissão de formação para os integrantes de cada um dos grupos, mas também para aqueles que queiram se agregar aos grupos. Essa seria uma forma de consolidar a autoformação dos integrantes, e também ter a formação como um espaço de atuação política e momentos de reflexão coletiva”, ressalta Marcela. André acrescenta: “Teremos também uma comissão de comunicação, que produzirá boletins informativos trimestrais, com análises de conjunturas mais ponderadas e embasadas; e também uma ferramenta digital como um site no qual possamos publicar conjunturas mais imediatas, além da divulgação nas mídias sociais. A ideia é que essas comissões tenham dois meses para elaborar seus planos de trabalho e ações”.

Na Educação

Em julho de 2025, Marcela e André também participaram da fundação da Rede de Pesquisa Marxista em Educação, que ocorreu durante o I Seminário Internacional ”Capitalismo Digital, Financeirização e Educação”, realizado na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O propósito da rede é garantir um espaço permanente de reflexão, produção científica coletiva e construção de resistência teórico-política e de espaços de luta diante das contradições do capitalismo e de ataques à educação pública. Embora ainda em fase inicial, a rede busca ampliar sua atuação por meio do mapeamento de novos grupos e do diálogo permanente com os movimentos sociais populares.

Além do grupo de pesquisa da Poli, estavam presentes: o Coletivo de Estudos em Marxismo e Educação (ColeMarx), da UFRJ; o grupo de Pesquisa em Pensamento Pedagógico e Social Contemporâneo (GREPPS), da Universidade de Barcelona (ESP); o Laboratório de Investigação em Estado, Poder e Educação (Liepe), da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ); o Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Trabalho, Educação e Sociedade (NEPTES), da Uerj; e o Grupo de Estudos e Pesquisas Educação e Crítica Social (GEPECS), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

A concomitância da criação de redes marxistas com temáticas de Saúde e de Educação não foi acaso. Para Marcela, a perspectiva é que se possa avançar para além do setorial na compreensão das políticas públicas. “É entender que políticas de Educação e de Saúde têm as mesmas determinações e, portanto, as lutas estão conectadas e são as mesmas. Quem sabe, lá na frente, possamos fazer uma grande rede de grupos de pesquisa marxistas sobre políticas públicas”, adianta.

Desafios contemporâneos e a crítica interna como ferramenta de avanço

Entre os desafios para a consolidação das redes, Marcela aponta a sobrecarga de atividades enfrentada pelos pesquisadores. “Costumamos atuar em várias frentes, o que exige organização para dar conta de tudo. É claro que também tem desafios políticos nesse processo, que é poder se firmar, me parece, perante os espaços mais institucionalizados”, destaca. 

Pensando nos desafios políticos contemporâneos, André reflete sobre os obstáculos internos enfrentados pelas esquerdas. Para além das dificuldades impostas pela ascensão da extrema-direita no Brasil e no mundo, há, segundo ele, uma tendência preocupante dentro do próprio campo progressista: o silenciamento das críticas internas em nome de uma suposta unidade. “Como quem diz que para nos fortalecer precisamos nos preservar entre nós. O que significa não fazer crítica de parte a parte, para que estejamos em bloco contra algo. E isso é sempre um problema”, aponta. Essa postura, argumenta o pesquisador, compromete a construção de estratégias políticas mais sólidas e impede o avanço de uma atuação verdadeiramente transformadora. “Se nós não pudermos fazer a crítica interna, se não pudermos fazer a crítica para dentro do campo de atuação política, não conseguiremos nos alinhar minimamente para uma melhor estratégia política. Não discutir para dentro não é antídoto para a desunião das esquerdas. Ao contrário, a ausência desse debate é o que provoca um esfacelamento das esquerdas. Então, esse é um desafio, mas também é novidade para nós”, defende.

Pesquisa na EPSJV: fortalecimento institucional e produção crítica

A atuação da EPSJV na criação das redes reforça o papel institucional da Escola na produção crítica e no fortalecimento da pesquisa. André lembra que os debates realizados no Ciclo sobre os 30 anos do Plano Diretor da Reforma do Estado dialogam diretamente com os temas das redes.

Divididos em três sessões presenciais, os debates aconteceram em 1º julho e 12 agosto e o próximo e último encontro ocorrerá em 7 de outubro. O primeiro encontro tratou de balanços e perspectivas da Saúde, com Áquilas Mendes (USP) e Geandro Pinheiro (EPSJV); enquanto o segundo trouxe questões relacionadas à Educação, com Roberto Leher (UFRJ) e Marcela Pronko (EPSJV/Fiocruz). O próximo evento tratará do tema do Trabalho, com Luci Praun, da Universidade Federal do Acre (UFAC) e Paulo Cesar Ribeiro (EPSJV/Fiocruz). 

O próximo Colóquio de Grupos de Pesquisas Marxistas na Saúde (GPMS) será realizado em 2026, na Escola Politécnica.