A Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) irá sediar a Conferência Livre Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora, no dia 29 de abril, das 8h30 às 17h, com o tema "Precarização do Trabalho e Direitos Humanos: como garantir o direito à saúde das trabalhadoras e dos trabalhadores informais e precarizados". O evento será realizado presencialmente no auditório da EPSJV, no Campus Manguinhos da Fiocruz, no Rio de Janeiro; e também on-line pela plataforma Zoom. Para participar, é necessário se inscrever previamente, aqui.
O evento é uma etapa preparatória para a 5ª Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (5ª CNSTT), que acontecerá entre os dias 18 e 21 de agosto, em Brasília, com o tema “Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora como Direito Humano”. A Conferência Livre é organizada pelo Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana (CESTEH/ENSP), em parceria com a EPSJV, a Coordenação de Saúde do Trabalhador (CST/Cogepe), o Sindicato dos Trabalhadores da Fiocruz (Asfoc-SN) e a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), em articulação com movimentos sociais de trabalhadores, como o Movimento Unidos dos Camelôs (Muca) e a Associação de Cuidadores do Estado do Rio de Janeiro (ACIERJ).
Precarização e saúde em debate
O tema escolhido para a Conferência Livre está alinhado ao segundo eixo da 5ª CNSTT, que propõe o debate sobre as novas formas de organização do trabalho e seus impactos na saúde. Cristina Strausz, coordenadora do Grupo Temático de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (GTSTT), da Abrasco, avalia que o foco do evento está relacionado à intensificação do desmonte do Estado de bem-estar social após 2015, impulsionado pela Reforma Trabalhista, pela Lei das Terceirizações e pela Reforma da Previdência.
Para Cristina, esse cenário aprofundou a precarização do trabalho, atingindo tanto trabalhadores formais quanto informais. “Além disso, com a ascensão do trabalho plataformizado no pós-pandemia, surgiram outros grandes movimentos de trabalhadores, que não se sentem representados por sindicatos, mas que são movimentos reivindicatórios importantes e legítimos”, observa.
Embora a profissão de camelô não seja nova, as transformações nas relações de trabalho impactaram fortemente essa categoria, de acordo com Guilherme Bonan, integrante do Movimento Unido dos Camelôs (Muca) e comunicador popular, que aponta que a “pejotização” já faz parte da realidade do setor: “Cada vez mais, vemos a tentativa de transformar os camelôs em pequenos empreendedores. Isso está prejudicando o mercado, porque o que acontece, de fato, é que pessoas mais bem estruturadas conseguem obter MEI [Microempreendedor Individual] e, assim, realizam contratações extremamente precárias, com pagamentos baixíssimos e de forma ilegal a esses auxiliares”, relata Guilherme.
A precarização do trabalho informal assume diferentes formas e, por isso, Guilherme defende que a saúde também deve estar no centro do debate. “Além do risco de sofrer violência estatal, por meio das abordagens truculentas da Guarda Municipal e da Secretaria de Ordem Pública (SEOP), enfrentamos a ausência de garantias e de infraestrutura básica, como banheiros públicos”, aponta. O integrante do Muca ressalta que a falta de banheiros pode levar a problemas de saúde, como complicações renais. Ele também destaca que a situação afeta de maneira ainda mais severa as mulheres — que representam 55,5% desses trabalhadores, segundo relatório de 2019 do Observatório das Metrópoles —, já que não têm acesso a esse espaço durante o período menstrual.
Participação social e construção coletiva
A Conferência Livre buscará eleger delegados que são integrantes de movimentos sociais. Segundo Rita Mattos, coordenadora do CESTEH, essa escolha tem como objetivo garantir que trabalhadores historicamente invisibilizados participem efetivamente dos debates. “Existe uma invisibilidade dos trabalhadores informais. Queremos que eles tenham voz nesse espaço. Por isso, a ideia é que sejam eles os nossos delegados. Isso é o mais importante da nossa Conferência”, afirma.
Durante o evento, a cada 50 participantes, um delegado será eleito, com limite máximo de 10 representantes, desde que haja comprovação da presença de 500 pessoas. “A importância das conferências livres está em eleger delegados regionais para enviá-los à Conferência Nacional, garantindo os direitos desde o micro — municípios e estados — até o macro, levando para uma esfera nacional a luta por políticas públicas e melhores condições para essas demandas”, destaca Julio Cesar Simões, integrante do CESTEH.
Além disso, a Conferência busca garantir uma abrangência nacional, requisito necessário para a validação da eleição dos delegados. Segundo critérios definidos pela Comissão Nacional de Saúde (CNS), é preciso que estejam presentes participantes de, no mínimo, três regiões do país e nove estados diferentes. Por isso, o evento será realizado em formato híbrido. Para Julio, essa diversidade é fundamental para assegurar a legitimidade e o alcance nacional da Conferência.
Guilherme Bonan também destaca a importância da representatividade na escolha dos delegados. “A gente espera ter várias lideranças de movimentos sociais ou coletivos de lutas populares como delegados, e que esse não seja um espaço nivelado apenas por acadêmicos. Acreditamos que esses espaços devem, acima de tudo, garantir a participação social”, pondera.
A Conferência também tem como meta a elaboração conjunta de um documento que será encaminhado ao encontro nacional. “Minha expectativa para o evento é que possamos produzir documentos referenciais com demandas pautadas na realidade — em uma perspectiva da rua, e não apenas a partir das institucionalidades. Essa é uma das minhas grandes expectativas: conseguir carregar o que chamamos de essencial da luta popular”, afirma Guilherme.
Diversidade e alcance nacional
A Conferência Livre convida, além dos trabalhadores informais, os precarizados, como professores, metalúrgicos e petroleiros, a participarem do evento. Julio Cesar ressalta a importância da presença de todos os movimentos sociais que transitam pelo CESTEH, fortalecendo a diversidade de vozes no debate.
Para Cristina Strausz, esse convite é essencial. “Não se faz Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora sem que eles sejam sujeitos de todo o processo — desde a análise das condições de trabalho até o planejamento, a execução e o acompanhamento das ações. É fundamental dar visibilidade aos movimentos sociais em ascensão, que reivindicam o direito humano à saúde no trabalho”, destaca.