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TSE - Tribunal Superior Eleitoral

Criado em 1932, no mesmo ano em que foi promulgado o primeiro Código Eleitoral brasileiro, o TSE é órgão máximo da Justiça Eleitoral
Redação EPSJV - EPSJV/Fiocruz | 29/09/2022 14h00 - Atualizado em 29/09/2022 14h48

O ano de 2022 marca não apenas as eleições presidenciais no Brasil, mas também os 90 anos de criação da Justiça Eleitoral e da conquista das mulheres de votarem e serem votadas. Instituído por meio de um decreto emitido em 24 de fevereiro de 1932, o primeiro Código Eleitoral brasileiro, que também previa o alistamento obrigatório e o voto secreto, é o grande marco dessas mudanças.  É este documento que instituiu o Tribunal Superior Eleitoral, o TSE, como órgão máximo da Justiça Eleitoral.  Naquele momento, o desejo de novas regras estava nas ruas, seja nas articulações das sufragistas pelo voto feminino, seja no chamado movimento tenentista, que apoiou a mobilização política que impediu a posse de Júlio Prestes em 1930 e pôs fim à República Velha, ou República das Oligarquias. O período foi marcado por muitas fraudes e pouca transparência no processo eleitoral, o que favorecia a eleição dos mesmos grupos ligados aos grandes produtores rurais de São Paulo e Minas Gerais. Não à toa, a República Velha também é conhecida como período ‘café com leite’, em referência às principais produções agrícolas dos dois estados.

É nesse contexto que, em 20 de maio de 1932, foi criado o TSE e, nas semanas seguintes, começaram a funcionar os Tribunais Regionais Eleitorais (TREs), responsáveis pela administração do processo eleitoral nos estados e municípios. Mas o que parecia o início de um período democrático, logo sofreu um revés e, somente em 1946, o presidente Eurico Gaspar Dutra tomou posse após uma eleição presidencial organizada pelo TSE. Em 1934, Getúlio Vargas foi eleito por uma Assembleia Constituinte, formada por deputados eleitos pelo voto popular. A eleição direta estava prevista para 1938, mas, um ano antes, Vargas iniciou uma ditadura que durou até 1945, período também conhecido como Estado Novo. Entre 1937 e 1945, o Congresso Nacional foi fechado e a Justiça Eleitoral parou de funcionar. Algo semelhante ocorreu durante a ditadura empresarial-militar (1964-1985), quando as eleições para presidente e governadores foram suspensas. As eleições eram feitas de forma indireta sem a participação da Justiça Eleitoral e não havia liberdade de organização partidária.

Paolo Ricci, professor da Universidade de São Paulo (USP), entende que o valor do voto mudou ao longo das décadas no Brasil. “O voto era a expressão de uma relação de reciprocidade local, entre chefes locais e ’seus’ eleitores [até a primeira metade do século 20]. Hoje em dia, como o voto é secreto e o eleitor é livre, a questão é mais sobre como persuadir os eleitores. Nesse sentido, as mídias sociais são uma forma importante para isso. Resquícios de práticas abusivas (como o suborno) e pressões podem existir (como em comunidades sob controle das milícias), mas eu diria que na grande maioria do Brasil o voto é livre”, argumenta.
O Código Eleitoral em vigência é o quinto elaborado desde 1932 e foi promulgado em 1965, durante a ditadura empresarial-militar. Entre as principais mudanças desse Código estão a criação da Corregedoria-Geral do TSE e o voto no exterior para presidente da República. Desde então, algumas determinações previstas ali foram atualizadas, como o veto ao voto dos analfabetos, autorizado pela Constituição Federal de 1988. Outro avanço da Carta Magna, apontado pela professora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Rachel Meneguello, é a liberdade de organização partidária. A professora destaca também a Lei 9.504, de 1997, para regulamentar as eleições, já que, até então, cada uma era feita de uma forma diferente. “É essa lei que define, por exemplo, as regras da propaganda eleitoral, o número dos candidatos e a punição para os eleitores que não forem votar”, enumera. É essa lei também que prevê, pela primeira vez, o mínimo de 30% de mulheres entre as candidaturas, uma proporção que foi regulamentada pela Lei 12.034 de 2009. A fiscalização e o monitoramento do cumprimento dessas e de outras normas relativas ao processo eleitoral estão entre as principais atribuições do TSE.

Atribuições atuais
Para as eleições de 2022, 156 milhões eleitores poderão ir às urnas ou justificar sua ausência da votação. E o processo eleitoral vai muito além dos dias de votação. O TSE é o órgão máximo da Justiça Eleitoral e atua junto aos Tribunais Regionais Eleitorais. Sua composição é regulamentada atualmente pela Constituição de 1988. A Corte Eleitoral é formada por sete ministros com mandatos que duram dois anos, para assegurar a idoneidade das eleições, e que são indicados por outros setores do Judiciário: o Supremo Tribunal Federal (STF) indica três nomes entre os ministros do órgão e é a um deles que cabe à presidência do TSE; o Superior Tribunal de Justiça (STJ) indica mais dois, e os outros dois representantes são advogados “com notável saber jurídico e idoneidade”, indicados também pelo STF.

As atribuições do Tribunal Superior Eleitoral estão divididas em quatro áreas: jurisdicional, regulatória, consultiva e administrativa. A primeira diz respeito ao julgamento de processos eleitorais e funciona como os demais tribunais do país. Os tribunais (regionais e superior) são responsáveis por julgar situações de descumprimento da legislação eleitoral, como compra de votos, boca de urna, divulgação de informações falsas e acusações de crimes na prestação de contas de partidos e candidatos, entre outras. Em matéria publicada em 27 de julho de 2022, o jornal O Globo mostra que os Tribunais Regionais de Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro cassaram 17 candidaturas de vereadores devido a inclusão de mulheres que nem sabiam que seriam candidatas, apenas para que os partidos cumprissem à cota mínima de 30% de candidatas mulheres. É do TSE a responsabilidade da decisão final sobre a cassação dessas candidaturas, caso os envolvidos no processo entrem com recurso para que a situação seja avaliada em última instância.

Já as atividades regulatórias são consideradas “atípicas” pelo Poder Judiciário, mas necessárias para que a legislação possa ser executada em seus detalhes. “Nós devemos um estrito e importante respeito à legislação eleitoral aprovada pelo Legislativo, mas a gente precisa executar essa lei dentro dos contextos e das especialidades locais ou regionais. Então existe essa competência regulamentar, que fica a cargo da coordenação do TSE, que, em geral, emite resoluções que são editadas a cada novo pleito, de dois em dois anos, para que as eleições possam acontecer da forma mais íntegra possível”, explica a secretária-geral do TSE, Christine Peter da Silva. São essas resoluções que detalham as etapas de fiscalização e auditoria das eleições, bem como um calendário de todas as etapas do processo.

O próprio site do TSE informa que o Poder Judiciário não é um órgão de consulta, mas em algumas situações a função consultiva é acionada para permitir pronunciamento do órgão sem caráter de decisão judicial sobre questões apresentadas “em tese”, que sejam abstratas e impessoais sobre o processo eleitoral. As consultas podem ser feitas por autoridades públicas, tribunais regionais e partidos políticos, mas não podem tratar de questões específicas ou situações concretas. “O TSE é um órgão consultivo para elucidar questões importantes que digam respeito ao processo eleitoral, alguma dúvida em relação à aplicação de uma determinada regulamentação eleitoral ou de uma obrigação eleitoral”, explica a secretária-geral.

As funções administrativas são aquelas mais próximas do cotidiano dos eleitores e as que eles podem acompanhar mais facilmente, até porque são as que englobam a gestão das eleições, o que compreende desde o registro de candidaturas e eleitores, análise e fiscalização da prestação de contas dos candidatos, convocação e treinamento de mesários, apuração dos votos, divulgação dos resultados e diplomação dos eleitos. De acordo com o artigo 96 da Constituição Federal, os tribunais possuem autonomia administrativa para realizar suas atividades, o que, de acordo com Paolo Ricci, é um “preceito fundamental para a garantia das eleições livres”.

Voto eletrônico
A substituição da votação em papel pela urna eletrônica começou nas eleições municipais de 1996 e transformou a forma de contagem de votos e a segurança das eleições. “As urnas eletrônicas vêm resolver um problema de falta de integridade, principalmente na totalização dos votos das urnas de papel”, diz Christine. Em documento divulgado em 2022 pela Comissão de Transparência das Eleições (CTE), o TSE detalha a segurança do sistema adotado. O Tribunal utiliza um único sistema destinado a armazenar e somar os votos baseado em software livre. No ano anterior às eleições, esse sistema começa uma nova bateria de testes para atestar a confiabilidade do processo. Uma vez lacrado, somente uma nova cerimônia pública poderá alterar dados no programa. O principal teste público das urnas para as eleições de 2022 foi realizado entre os dias 22 e 27 de novembro de 2021. Nos dias de pleito, no primeiro e segundo turnos, novas urnas serão auditadas em todo o Brasil por amostragem. Essa conferência é feita após a votação.

Para maior confiabilidade do processo, o TSE disponibiliza o código fonte para as entidades fiscalizadoras que o solicitarem — o que inclui partidos políticos, órgãos públicos e privados, entre eles Forças Armadas e Tribunal de Contas da União (TCU), a Confederação Nacional das Indústrias (CNI) e departamentos de tecnologia da informação de universidades credenciadas junto ao TSE. Ao usar o mesmo código, as entidades podem conferir se o programa é eficaz em armazenar e contabilizar os votos. O mesmo documento da CTE informa que, desde 2016, a Justiça Eleitoral disponibiliza um QRCode para cada boletim de urna (BU), o relatório de todos os votos computados naquela máquina e o aplicativo “BU na Mão” para fazer essa leitura. A novidade para 2022 é que os boletins serão divulgados em tempo real para que qualquer interessado possa fazer essa conferência. Desde 2020, atendendo a uma recomendação da Polícia Federal, o TSE centraliza a totalização dos votos em um espaço chamado sala-cofre localizado nas dependências do Tribunal Superior. Mesmo com inúmeros parceiros, é o TSE quem assegura a legitimidade das eleições. “O TSE é o responsável constitucional por gerenciar, executar e dar o resultado final das eleições, ou seja, dizer quem efetivamente foi o eleito”, diz Christine.  

 

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