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Entrevista: 
Orlando dos Santos Junior

‘Um aspecto fundamental da reforma urbana é o direito de todos dizerem que cidade desejam’

Dez anos atrás foi aprovada a lei 10.257, conhecida como Estatuto da Cidade. Considerado um importante avanço como marco legal para um projeto mais igualitário de cidade, o Estatuto, apesar de completar uma década, ainda não pode ser considerado implementado na prática. Além disso, ele tem sido flexibilizado em função dos interesses econômicos das cidades, que se intensificam em função de megaeventos como o Copa do Mundo, que o Brasil sediará em 2014. Essas e outras análises são feitas pelo professor do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (IPPUR) da UFRJ Orlando dos Santos Junior, cientista social com mestrado e doutorado em planejamento urbano e integrante do Observatório das Metrópoles, grupo de pesquisa que envolve diversas instituições. Ele exemplifica: “É absolutamente criminosa a forma como têm ocorrido as remoções no Brasil“. Resumindo o ideário da reforma urbana como defesa do direito à moradia, da regulação pública do solo e da gestão democrática da cidade, nesta entrevista, Orlando faz um balanço desse período e analisa as mudanças nas formas de opressão e resistência da cidade contemporânea.
Cátia Guimarães - EPSJV/Fiocruz | 01/09/2011 08h00 - Atualizado em 01/07/2022 09h46

Para o senso comum, cidade é aquilo que se opõe ao rural. O que é cidade para a área de urbanismo?

Existem conceitos de cidade, não um conceito único, objetivo, que seja consensual no campo acadêmico.  É claro que densidade e população, por exemplo, são elementos importantes para se definir o que seria a cidade, mas não são os únicos. Não existem, portanto, parâmetros únicos, porque é preciso considerar a forma como determinada população está organizada no espaço, mas o modo de vida associado a essa mesma comunidade: por exemplo, a atividade econômica na qual ela está envolvida. Além disso, as fronteiras entre o rural e o urbano estão cada vez mais tênues: uma cidade que já tem um núcleo populacional expressivo, mas cuja maioria da população tem sua subsistência vinculada a atividades agrárias seria definida como rural ou urbana? Então, esses parâmetros excessivamente objetivos, que não levam em consideração o modo como a população está organizada no espaço, o seu modo de vida, tendem a não expressar a realidade tal como ela é.

Reforma agrária diz respeito à distribuição da terra como direito a moradia, mas também ao trabalho. E a reforma urbana?

É preciso destacar o fato de o Brasil ter sido caracterizado até muito recentemente como um país fortemente agrário. Só muito recentemente nos transformamos num país urbano. Por isso, temos muito mais produção teórica, acadêmica, tradição de pesquisa vinculada à temática agrária do que à temática urbana. No início do século, os problemas da cidade eram formulados como problemas sanitários. Só muito recentemente os problemas sociais que passaram a ocorrer nas cidades brasileiras foram formulados como problemas urbanos. A reforma urbana é uma construção conceitual, não é um dado objetivo. Se nós observarmos as formulações desse campo, vamos perceber algumas questões-chave que se traduzem nessa ideia. Por exemplo, acesso à moradia e ao solo urbano: tal como na questão agrária, nós temos um problema distributivo, não vinculado ao trabalho, mas vinculado à reprodução social, ao direito a morar num lugar com dignidade. Mas temos também problemáticas específicas vinculadas à forma como ocorre a produção das benfeitorias urbanas, do solo urbano e da moradia nas cidades. Porque, diferentemente da terra no campo, na cidade eu não tenho imediatamente a terra apropriada para moradia. No caso urbano, uma terra que não tenha benfeitorias, que não seja produzida no sentido de se tornar passível para fins de moradia, não pode ser apropriada. Por isso torna-se fundamental a regulamentação pública do solo urbano. Esse é um tópico fundamental. No caso da reforma urbana, a problemática envolve uma enormidade de agentes que estão envolvidos na produção dessas benfeitorias e das moradias — são agentes fundiários, imobiliários, prestadores de serviços, financeiros. A reforma urbana formula justamente isso: a necessidade de regulação pública da produção e gestão do solo urbano e da moradia. Esse é o segundo ponto. Um terceiro é a forma como a cidade se organiza. A cidade também tem influência na nossa forma de vida cotidiana. Um exemplo básico: se você morar num bairro ou num prédio de baixa densidade, isso vai mudar o número de relações que você tem, a interação social que você estabelece. A forma como a cidade está construída e organizada incide sob a forma de vida das pessoas. Eu posso lhe dizer que a cidade que nós temos hoje é a expressão da sociedade capitalista. E a sociedade capitalista, para se reproduzir, precisa obrigatoriamente destruir as cidades que não estão moldadas à sua alma e à sua lógica, e reconstruir novas cidades que sejam exatamente a sua expressão. A reforma urbana propõe reconhecer que a forma como a cidade se organiza, a gestão da cidade e a própria forma física da cidade deve estar subordinada a uma radical democracia, na qual a população possa efetivamente dizer em que cidade deseja morar e como a cidade deve funcionar. Portanto, um aspecto fundamental da reforma urbana é exatamente o direito de todos a dizerem que cidade desejam e, inclusive, o direito de destruir essa cidade e construir outra, que seja expressão de uma nova sociedade, mais justa, mais solidária e mais humana. Então, regulação pública do solo, direito à moradia digna e gestão democrática são três aspectos fundamentais daquilo que chamamos de reforma urbana.

Qual a importância do Estatuto da Cidade para a reforma urbana?

O ideário do direito à cidade se expressa numa plataforma política que se traduz institucionalmente numa série de lutas: a associação de moradores que está lutando por uma linha de ônibus , a creche, o posto de saúde... E se expressa também em leis. O Estatuto da Cidade é a expressão mais próxima, no plano institucional, desse ideário do direito à cidade. Há avanços no que diz respeito ao reconhecimento do direito à moradia, à reprodução social na cidade, à regulação pública do solo urbano e à gestão democrática. Trata-se de um ideário anticapitalista porque parte da crítica à cidade capitalista e da impossibilidade de, sob o capitalismo, termos efetivamente uma cidade justa e democrática para todos. O Estatuto, no plano institucional, representa um avanço nessa perspectiva, mas o ideário não se expressa efetivamente nesse plano institucional. Reconhecendo que o Estatuto é um avanço, primeiro temos que considerar que ele está implantado há muito pouco tempo — dez anos. Depois, é preciso lembrar que a política urbana é implantada pelos municípios. O próprio Estatuto estabeleceu um prazo que venceu há muito pouco tempo para que os municípios elaborassem ou atualizassem seus planos diretores, adaptando-os a essa nova legislação. Mas nós podemos dizer que estamos muito longe de torná-lo uma realidade, de dar efetividade aos instrumentos que nele estão previstos. No que tange à gestão democrática, quase nada está sendo efetivamente implementado quando olhamos o nosso país na sua totalidade. O Estatuto da Cidade estabelece, por exemplo, que nenhuma Câmara de Vereadores pode aprovar o orçamento municipal sem fazer audiência pública. Me diz qual é a que faz. O Estatuto determina que nenhum projeto urbano pode ser implementado sem a participação da população envolvida. Eu pergunto: onde está o Estatuto quando você olha as obras ligadas aos megaeventos — Copa do Mundo, Olimpíadas? Em que medida as comunidades estão participando dos projetos que estão sendo implementados nas áreas onde elas moram? Conselhos da Cidade são muito poucos aqueles que estão implementados e funcionando. Há ainda uma longa estrada para tornar efetivos esses instrumentos vinculados à gestão democrática.

Como a saúde e o meio ambiente aparecem na pauta de reivindicações da reforma urbana?

Na verdade, a agenda da saúde, da educação, da cultura — uma agenda mais ampla — aparece associada ao direito de se reproduzir dignamente na cidade. Você sabe que no Brasil o tema da saúde está fortemente vinculado aos movimentos populares urbanos. E, nas condições desiguais nas quais nós vivemos, a saúde passa a ter uma importância maior ainda já que os efeitos dessas desigualdades se refletem nas condições de saúde da população. Então, esse é um aspecto central: falar no direito à cidade é falar em condições dignas de vida, nas quais a saúde ocupa um papel importantíssimo. A questão ambiental, pouco a pouco, tem sido um tema central na agenda da reforma urbana. Não é simples esse casamento entre a questão urbana e a questão ambiental. Porque a população excluída do mercado imobiliário, em geral, ocupou áreas ambientalmente sensíveis. Então, há uma tensão entre a agenda ambiental e a agenda urbana no que se refere a como pensar a situação da população que ocupa áreas de preservação ambiental. Mas a meu ver há um problema mais profundo. A tradição do movimento ambientalista no Brasil é preservacionista e a tradição do movimento urbano pensa a questão ambiental a partir da dicotomia entre agenda verde e agenda marrom. Agenda marrom seriam os resíduos sólidos, os dejetos, os efeitos da vida urbana sobre o meio ambiente. A agenda verde seria a agenda da preservação. Eu acho que é perversa essa dicotomia, o desafio é superá-la, pensando a integração dessa dupla temática (preservação ambiental e da vida urbana), mas ir além dessa integração e pensar a própria sustentabilidade ambiental no meio urbano. Ou seja, em outras palavras: a favela tem que ser um tema ambiental. Por que quando eu penso a questão ambiental, eu penso na área de preservação ambiental, no verde, ou na agenda marrom, o lixo, o resíduo sólido? Por que não pensar a própria ocupação urbana, a casa, a rua, a forma de vida na favela, na cidade, no asfalto, como uma questão ambiental, como uma questão de sustentabilidade? Eu acho que nós estamos desafiados a romper as barreiras entre a agenda urbana e a agenda ambiental.

Alguns estudos apontam uma mudança na concepção de cidade, que se tornou cidade-empresa. Isso é novo ou é inerente à cidade capitalista?

A meu ver, é inerente à cidade capitalista, mas essa metáfora me parece interessante para pensar o novo padrão de governança urbana que emerge na cidade na contemporaneidade. Não é nova a ideia de que a cidade seja empresa no sentido de estar moldada aos interesses do capital. No entanto, o principal ator para garantir a cidade-negócio até muito recentemente era o Estado Nacional. As cidades não emergiam como atores, não era o governo local que emergia como um ator na disputa por capitais, pelo financiamento, pela inserção internacional. Então, há uma mudança na governança das cidades, de um padrão mais administrativista para um padrão mais empreendedorista. Novas coalizões emergem nas cidades, liderando processos de inserção global. E a cidade passa a ser administrada como se fosse uma empresa.

Esse modelo traz oportunidades de mudança para as cidades? Ou traz obstáculos aos princípios da reforma urbana?

Na medida que surgem contestações, conflitos, movimentos sociais, espaços de questionamento sobre a forma como a cidade é gerida, surgem oportunidades, espaços de esperança de transformação dessas cidades. As cidades que nós tínhamos no passado, no outro modelo, administrativista, produziram a segregação urbana, as desigualdades, as exclusões, doença e morte — tudo que criticávamos. Portanto, eram também muito distantes do ideário da reforma urbana. A meu ver, a cidade do empreendedorismo urbano, a cidade-empresa não é nem melhor nem pior do que a do momento anterior: representa uma mudança nas formas de dominação, de exploração, na forma como a cidade se organiza a serviço do capital. Tal como os formuladores do ideário da reforma urbana souberam traduzi-lo numa plataforma política que buscava enfrentar a cidade da exclusão produzida no modelo anterior, eu acho que nós estamos desafiados a elaborar uma plataforma política que confronte o modelo de cidade que está sendo produzido nessa governança empreendedorista. O modelo anterior também não produziu só exploração e exclusão. Ele não se sustentaria se fosse só isso. Também produziu algum grau de integração, mesmo na subordinação; produziu uma cidade que também permitiu ampliar a qualidade de vida para parcelas consideráveis das sociedades. Eu acho que, tal como o anterior, o modelo atual também não se sustentaria se fosse só da perversão. Ele também tem as suas formas de integração e inclusão social. Tentando provocar a nossa reflexão, poderíamos tratar a cidade moderna criada pelo capitalismo industrial como uma cidade que também produziu a nossa anomia, o nosso isolamento. Talvez a cidade do empreendedorismo urbano seja menos caracterizada por esse isolamento porque requer formas de mobilização dos cidadãos em torno de certos valores — nessa perspectiva do empreendedorismo, é valorizada a imagem da cidade como mais próxima do cidadão. E isso talvez — não estou dizendo que vai acontecer — gere movimentos que permitam certos avanços ou novas perspectivas integradoras na cidade. Mas eu acho que, tanto no passado quanto no presente ou no futuro, as possibilidades abertas de integração ou os processos de dominação, subordinação e exclusão vão ser definidos pelo conflito social.

Que papel a periferia e as favelas desempenham nessa nova cidade-empresa?

A periferia desempenha um papel fundamental. As favelas, eu acho que, dependendo do lugar, representam um incômodo. A periferia está sendo redefinida. As favelas eram periferia também: lugares onde as condições de apropriação do solo não estavam dadas, rejeitados pelo mercado, que foram ocupados em condições sub-humanas ou não adequadas pela população de baixa renda que não tinha como acessar moradia pelo mercado formal. Esses lugares, por conta do conflito social, das reivindicações, das lutas, ou do clientelismo, foram integrados à cidade — ou mais ou menos integrados à cidade: hoje têm rede de luz, água... De um lado, a dinâmica da cidade passa a sofrer influência dessas áreas— a violência é uma das razões, mas não a única. A cidade cresceu, em todo o país, as favelas estão em áreas nobres, onde se concentra uma certa elite. E a reestruturação dessas áreas passa a ser fundamental para a dinâmica de valorização da cidade. Então, é preciso 'dar um jeito' nas favelas. No Rio de Janeiro, a UPP, a meu ver, é uma das respostas, associada ao projeto de urbanização das áreas centrais, à expansão para a Zona Oeste e à construção de moradia popular para a população pobre bem longe. Porque não se consegue conter, urbanizar e mesmo eliminar certas favelas, urbanizar áreas centrais e expandir para outras regiões, se não houver oferta de moradia popular longe dali. Eu estou falando explicitamente do Rio de Janeiro mas, como relator do Direito à  Cidade, fiz a missão a São Paulo no final de 2009 e lá encontrei exatamente a mesma coisa: urbanização e reestruturação das áreas centrais,  produção de solo urbano que, para ser apropriado pelo mercado imobiliário na dinâmica de valorização do capital, precisa retirar os pobres. Se você vai para Teresina, onde nós também fizemos a missão, ou outras grandes cidades brasileiras, vai encontrar processos muito similares. A cidade tem que ser atrativa para que os agentes invistam. E, na visão desses agentes, a pobreza, obviamente, não está incluída.

Programas habitacionais como o ‘Minha Casa, Minha Vida’ desempenham essa função de retirar os pobres do centro e colocá-los na periferia?

Sim e não.  Eu acho que, de um lado, o ‘Minha Casa, Minha Vida’ expressa, pela primeira vez na nossa história recente, um programa de habitação popular reconhecido como política habitacional, não como política de assistência. E reconhece a responsabilidade do Estado no provimento habitacional para a população de baixa renda que não consegue acessar moradia via mercado. E, em parte, minoritariamente, esse programa também engaja movimentos de moradia vinculados à auto-gestão, produção habitacional, fortalece atores na sociedade. Então, expressa, de um lado, esses avanços e abre possibilidades interessantes para efetivar o direito à moradia. No entanto, estamos numa sociedade capitalista: é óbvio que esse programa também é apropriado pelos interesses capitalistas privados. Aí está a disputa. Quem controla a terra? Os agentes que controlam a produção de moradia no Brasil se apropriam do subsídio público: há casas que poderiam ser construídas pela metade do preço pelo qual efetivamente são feitas pelos agentes imobiliários. Eu lhe desafio a identificar programas ‘Minha Casa, Minha Vida’, para baixa renda, em áreas centrais, em qualquer capital do Brasil. Você vai encontrar uma aqui, outra ali. Em geral, são conjuntos habitacionais construídos nas áreas periféricas. Então, há uma subordinação do programa a essa lógica do mercado imobiliário. Eu vou dizer com isso que o programa representa um atraso? Não. Porque, efetivamente, para parcela não desprezível — não vou dizer que é a maioria ou minoria, porque teríamos que fazer uma pesquisa — da população que vai para essas novas áreas, esse programa pode representar uma brutal melhoria na qualidade de vida. Mas para parcela considerável dessa população morar nessas áreas pode significar perda de vínculos e relações sociais; pode, efetivamente, significar uma decadência na qualidade de vida, incidindo, inclusive, na impossibilidade da sua reprodução ali, o que vai levar partes dessas famílias a venderem esse imóvel e irem para outras favelas, periferias, lugares desprezados pelo mercado imobiliário, buscando sobreviver. Eu tenho tido a oportunidade de ir a campo, com essa história das remoções, e tenho escutado dos moradores diferentes opiniões sobre o significado dos processos de reassentamento . Agora, remoção como tem sido efetivamente praticada no Brasil é crime. Sobre isso, não há dúvida.

Como tem sido?

Com desrespeito aos direitos básicos do cidadão, desrespeito ao Estatuto da Cidade em relação ao direito à moradia, não reconhecimento da posse... É absolutamente criminosa a forma como têm ocorrido as remoções, em geral, no Brasil, e especificamente no Rio de Janeiro.

Isso se dá historicamente ou há uma intensificação com os megaeventos?

Tem acontecido historicamente, mas com uma absoluta intensificação por conta dos megaeventos. Os pequenos avanços que foram alcançados ao longo dos últimos anos, com o Estatuto da Cidade, com a resolução sobre conflitos aprovada pelo conselho das cidades, são absolutamente ignorados, atropelados pelos procedimentos que vêm sendo adotados pelos governos que estão envolvidos com as intervenções vinculadas à Copa do Mundo e às olimpíadas.

Uma série de exceções são acordadas para a promoção de eventos como a Copa do Mundo: flexibilidade nas licitações, não-publicização de orçamentos etc, além de um alto grau de interferência direta da Fifa, se sobrepondo, inclusive aos governos. Eu queria que você falasse sobre como as regras institucionais e a relação público-privado se alteram nesses momentos.

É exatamente isso. A Fifa, lembremos, é uma entidade privada. Você tem uma subordinação enorme. Inclusive o fórum de resolução de conflitos não é o Brasil durante a Copa. Não há palavras para expressar o absurdo dessa situação. Obviamente isso revela o poder econômico da Fifa, de intermediar recursos simbólicos e financeiros para os países que disputam o direito de sediar a Copa. E, para alcançar esse “privilégio”, os países subordinam os interesses nacionais aos interesses da Fifa. Isso só mostra o poder dos investidores — a Fifa, na verdade, está intermediando interesses muito maiores — nessa nova governança urbana.

Os passivos costumam ser maiores do que os ganhos?

Há muitos estudos mostrando isso: Montreal, por exemplo, está com dívida até hoje... Mas eu acho que é mais complexo. Se só tem passivo, por que os governos querem? Eu acho que existem passivos para alguns e lucros grandes para outros. É importante desnudar os vencedores, aqueles que ganham com esses eventos e aqueles que perdem — a população de rua, os camelôs, as prostitutas, os favelados, que são os primeiros a serem varridos. A meu ver, na maior parte dos casos, não é um jogo tão simples de se identificar vencedores e perdedores. Há uma complexidade de ganhos e perdas distribuídos desigualmente entre os agentes ao longo desse processo.