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A história se repete

Estudantes no México sofrem violência durante manifestação de descomemoração de assassinatos de 300 estudantes em 1968. Quase 50 anos depois, seis morreram, 15 ficaram feridos e 43 estão desaparecidos.
Viviane Tavares - EPSJV/Fiocruz | 13/11/2014 09h00 - Atualizado em 01/07/2022 09h46
Estudantes protestam na Cidade do México Foto: Viviane Tavares / EPSJV

(Do México)

Ao caminhar pelas ruas de diversas cidades do México são constantemente encontradas frases como: ‘Vivo los se llevaron, vivos los queremos', ‘Quando nos enterraram, não sabiam que éramos sementes', ‘Tu lucha es mi lucha, tu dolor es mi dolor', ‘Ayotzinapa Somos Todos?' e ‘Ni uno más'. São gritos de socorro dos pais, estudantes e de toda a população do país em relação ao caso dos estudantes de Ayotzinapa.

O caso até agora não desvendado e que já está causando comoção mundial, aconteceu nos dias 26 e 27 de setembro durante um protesto em Iguala, no Estado de Guerrero.? Na ocasião, diversos estudantes estavam se organizando em busca de verba e transporte para fazer uma manifestação na Cidade do México em descomemoração a outro episódio histórico de violência, o Massacre de Tlatelolco, que ocorreu em 1968, quando cerca de 300 estudantes foram assassinados.

Quase 50 anos depois, a história se repete. De acordo com relatos de três policiais que integram o grupo Guerreiros Unidos e que confessaram o crime, o prefeito de Iguala, José Luis Abarca, teria dado ordens à polícia para reprimir os estudantes para que eles não interrompessem um comício que seria realizado por sua esposa, Maria Piñeda, na cidade, no mesmo dia, e no qual ela pretendia lançar sua candidatura à prefeita no próximo ano. Os estudantes foram levados pela polícia, mas não chegaram à delegacia. De acordo com as investigações, eles teriam sido entregues aos Guerreiros Unidos. Após a declaração dos policiais, o casal fugiu, mas foi preso na cidade do México no dia 4 de novembro.

Os 43 estudantes desaparecidos eram da Escola Normal Rural Raul Isidro Burgos, da cidade de Ayotzinapa, no Estado de Guerrero, conhecida por seu forte viés de esquerda. "O orgulho compensa a dor", diz a mãe de Julio César Ramirez, um dos assassinados no dia 26 de setembro, quando foi à Ayotzinapa com um grupo de estudantes, às pressas, para dar reforço aos outros estudantes que haviam chegado mais cedo e estavam sofrendo forte repressão da polícia. "Ele foi encontrar seus companheiros porque sabia que podiam matá-los. Eles iam adiante porque tinham a certeza de que os companheiros vinham atrás", contou Berta Ramirez.

Viviane Tavares

Próximos passos

A imprensa alternativa e os pais dos estudantes até agora não acreditam na versão dada pelo Procurador da República, Jesus Murillo Karam, de que os estudantes teriam sido executados, calcificados e colocados em sacos plásticos e jogados no Rio San Juan, como informaram os réus confessos, integrantes da Guerreiros Unidos. De acordo com os pais, ainda não foram apresentadas evidências para tal afirmação e eles acreditam que essa versão visa encerrar o caso para que seja esquecido no país.

"A ações de comunicação das autoridades federais estão marcadas por falta de zelo e indolência. Não deixaram as famílias conhecerem os materiais que dizem ter e que está auxiliando no avanço das investigações, apesar das famílias pedirem para ter acesso, não apresentaram provas irrefutáveis sobre a versão dos detidos, porque carecem delas, e não esperaram o resultado da equipe forense que acompanha os familiares das vítimas. O que alimenta a percepção de que os governantes querem dar um esquecimento no assunto", afirmou o editorial "Ayotzinapa: expediente aberto", do jornal La Jornada, um dos principais jornais de esquerda do país, publicado no dia 9 de novembro. O texto cita ainda que um exemplo dessa ação a caminho do esquecimento é a declaração do presidente do Partido Revolucionário Institucional (PRI), César Camacho, que qualificou o episódio como uma lição dolorosa e convidou a sociedade a seguir adiante. Por conta dos acontecimentos e ainda com resquício do resultado duvidoso nas últimas eleições, há alta mobilização pedindo a cassação do presidente Piña Neto, do mesmo partido de Camacho.

Na última semana, corpos foram encontrados em cemitérios clandestinos em Cerro Viejo, na região de Iguala. Mas a possibilidade que os restos mortais pudessem ser dos estudantes foi descartada devido à incompatibilidade genética, segundo o resultado divulgado no dia 11 de novembro pela Equipe Argentina de Antropologia Forense (EAAF), contratada pelos pais dos estudantes para fazer a investigação e perícia. Os especialistas argentinos trabalham ainda na identificação de outros nove corpos encontrados em covas em La Parota e Iguala, além de ajudar na recuperação dos restos mortais no lixão de Cocula e no Rio San Juan. Há testes com restos mortais também enviados à Áustria.

Enquanto aguardam os resultados, uma comissão de pais e amigos dos 43 normalistas desaparecidos está organizando uma caravana por diversos estados do México para divulgar o ocorrido e buscar mais apoio. A mobilização já conta com o fortalecimento de estudantes universitários e de organizações sociais. A caravana ocorrerá de 13 a 20 de novembro e será concluída com uma grande marcha na Cidade do México, capital do país.

Mobilização mundial

Até agora, países como Holanda, Canadá, Estados Unidos, Argentina, Colômbia e Costa Rica já organizaram marchas de solidariedade aos familiares dos 43 estudantes desaparecidos e dos seis que foram assassinados.

 

*Com informações do coletivo Desinformémonos, La Jornada e Aristegui Notícias.