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Evento do Ministério da Saúde comemora os 20 anos da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde

O encontro “Gente que faz o SUS acontecer” promoveu debates sobre políticas de saúde, formação profissional, gestão do trabalho, educação na saúde e necessidades do SUS
Julia Neves - EPSJV/Fiocruz | 18/10/2023 15h13 - Atualizado em 20/10/2023 10h53

A Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) esteve presente no encontro “Gente que faz o SUS acontecer”, realizado nos dias 10 e 11 de outubro, em Brasília, com objetivo discutir ações prioritárias e programas estratégicos coordenados pela Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES), que comemora 20 anos de criação. Debates sobre políticas de saúde, formação profissional, gestão do trabalho, educação na saúde e necessidades do Sistema Único de Saúde também estiveram na programação. No segundo dia do evento, a diretora da EPSJV, Anamaria Corbo, participou da mesa “Contribuição dos Observatórios para a área de Gestão do Trabalho e Educação na Saúde na Região das Américas”.

Na mesa de abertura, estiveram presentes a ministra da Saúde, Nísia Trindade, acompanhada de secretários da Pasta; a ministra da Igualdade Racial, Aniele Franco; e representantes da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS/OMS), do Conselho Nacional de Saúde (CNS), do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems) e de outras instituições. 

Nísia Trindade reforçou a importância do evento, que volta os olhares para os trabalhadores da saúde. “Gente que faz o SUS acontecer é também gente que nós precisamos acolher e cuidar. Precisamos cuidar de quem cuida”, disse.

Ainda segundo Nísia, o futuro irá trazer outras emergências em saúde que, junto com as questões históricas de desigualdades e de grandes problemas enfrentados pela sociedade, aumentam ainda mais os desafios. “Por isso, a nossa agenda precisa se renovar", destacou, pontuando, por fim, os desafios do mundo do trabalho contemporâneo no Brasil e no mundo. “Acompanhei o presidente Lula na missão à Assembleia Geral da ONU, onde aconteceu uma reunião ímpar na história: o encontro do presidente Lula com o presidente Biden, além de centrais sindicais e representações dos dois países para uma agenda de trabalho digno. Essa é uma demanda fundamental. Nós temos, em geral e na Saúde, questões ligadas a diferentes vínculos de trabalho, de falta de proteção. Essa agenda é incontornável e ultrapassa a saúde. Vamos trabalhar nessa pauta de uma maneira muito ativa, pensando os desafios do presente e do futuro. Sem ela, é impossível pensar em um SUS forte”, concluiu.

A representante da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas/OMS) no Brasil, Socorro Gross, ressaltou a importância do sistema de saúde brasileiro e dos trabalhadores que fazem com que ele aconteça. “O SUS é do Brasil, mas é referência para nós da região das Américas. Queremos que a Saúde seja um direito para todos, que tenhamos sistemas únicos e integrados, que sejam a resposta para as nossas comunidades, que são muito diversas. Os sistemas nacionais de saúde e o desenvolvimento de um país não acontecem sem recursos humanos”, afirmou.

O presidente do CNS, Fernando Pigatto, falou que a primeira vez que a discussão sobre a saúde do trabalhador ganhou relevância foi na 3ª Conferência Nacional de Saúde, em 1963. O tema voltou à pauta somente em 1986, na 8ª Conferência Nacional de Saúde. Ele lembrou ainda que a SGTES foi criada em 2003, pelo então presidente Lula.  “Estamos comemorando 20 anos da SGTES, mas também temos que pensar que, nesses 20 anos, poderíamos ter avançado mais, mas, infelizmente, tivemos retrocessos. Perdemos 700 mil vidas [pela pandemia de covid-19]. Não podemos deixar de falar sobre isso, porque senão apagamos a história e quando isso acontece, ela tende a se repetir”, ressaltou.

Após a abertura do evento, foi lançado o Aplicativo Equidade SUS, do Programa de Equidade de Gênero, Raça, Etnia e Valorização das Trabalhadoras no SUS. A ferramenta irá auxiliar no enfrentamento a situações de violência, preconceito e discriminação no âmbito do SUS.

Durante o evento, também aconteceu a Mostra fotográfica "Retratos da Gente", que apresenta fotografias de trabalhadores da Saúde. A exposição foi organizada por Nana Moraes, fotógrafa e Coordenadora do Retrato Espaço Cultural, e Liliana Santos, docente da Universidade Federal da Bahia (UFBA).

Debates

Ainda no primeiro dia, aconteceram as mesas “Trabalho e Educação na Saúde: Integração com as Políticas Estruturantes do SUS”, “Trabalho e Educação: Redes, Afetos e Lutas” e “Gestão do Trabalho e Educação na Saúde: Desafios da Integração”. Elas reuniram diferentes trabalhadores e representantes de secretarias do Ministério da Saúde e de outras instituições.

A secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, Isabela Pinto, mediou a mesa que tratou sobre Integração com as Políticas Estruturantes do SUS. “Ao tempo em que traz o debate sobre pressões estratégicas e prioritárias para o Ministério da Saúde acerca do Trabalho e da Educação, esse evento também comemora os 20 anos de uma secretaria cuja trajetória fez a diferença na formação dos trabalhadores da saúde, que produziu um conjunto de ações, tanto na perspectiva da educação permanente quanto da gestão do trabalho, pensando e valorizando os trabalhadores que operam e que fazem as políticas de saúde acontecerem”, comemorou.

O secretário de Atenção Básica (SAPS), Nésio Fernandes, destacou a importância da SGTES que, para ele, é a alma estruturante do SUS. “Podemos ter muito financiamento, os melhores softwares, a maior quantidade de equipes de Saúde da Família e de policlínicas, mas se o processo de trabalho não for digno, se o empoderamento dos trabalhadores da ponta, de fato, não for emancipatório, digno, empático, nós não estaremos constituindo um sistema de saúde que seja defendido pelo povo e pela classe da saúde pública com unhas e dentes”, afirmou.

Em sua fala, Carmem Pankararu, da Secretaria de Saúde Indígena (SESAI), falou sobre a necessidade de pensar nos povos indígenas que, no Brasil, somam 305 etnias, que falam ao menos 274 línguas diferentes. “Promover saúde para a população indígena exige um esforço muito grande, porque produzimos saúde no contexto em que o usuário está. Exige de nós, trabalhadores da saúde indígena, um conhecimento que valorize cada vez mais as questões ancestrais e a medicina indígena. O conceito antropológico de saúde é muito importante dentro da comunidade indígena”, comentou, apontando a falta de uma formação que seja específica e de qualidade para esses trabalhadores: “As instituições não formaram profissionais para a saúde indígena. Temos a necessidade de aprimoramento de formação, da Educação Permanente, que deve ser voltada a essas especificidades”.

Corroborando com a importância da formação de trabalhadores da saúde, a secretária da Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente (SVSA), Ethel Maciel, levantou ainda a necessidade de se pensar na gestão do Trabalho alinhada à área da Educação. “Além de cuidar da gestão da Educação, eu percebo a importância de fortalecer cada vez mais a gestão do Trabalho, porque é uma das fragilidades no cotidiano do SUS. Precisamos avançar em uma gestão de processos participativos, trazendo elementos da Política de Educação Popular”, disse.

Participaram ainda da mesa Ana Estela Haddad, Secretária de Informação e Saúde Digital (SEIDIGI); Érika Aragão, representante da Ciência, Tecnologia, Inovação e Complexo da Saúde (SCTICS); e Rodrigo Cairiri, representante da Secretaria de Atenção Especializada em Saúde (SAES).

Redes, Afetos e Lutas

Mediada pelo diretor de Gestão e Regulação do Trabalho na Saúde (DEGERTS/SGTES), Bruno Guimarães, a segunda mesa do evento reuniu Mozart Sales, assessor da Secretaria Especial de Assuntos Parlamentares (SEPAR/SRI/PR); Laura Feuerwerker, professora do Departamento de Política, Gestão e Saúde da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP); Desirée dos Santos, representante dos trabalhadores da Saúde; Alexsandro de Melo, representante dos residentes em Saúde; Márcia Fausto, coordenadora da Secretaria Técnica e Executiva da Rede Brasileira de Escolas de Saúde Pública (RedEscola); Lana Larra, primeira suplente da Área de Mulheres Trans e Travestis da Aliança Nacional LGBTI+; e Haroldo Pontes, representante do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass).

Para Bruno Guimarães, é fundamental olhar para a realidade do trabalho e pensar no futuro do trabalho no SUS. “Pensar na SGTES é pensar nessa secretaria que tem a missão institucional de ser um espaço democrático de defesa dos trabalhadores no campo da Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Temos um mundo do trabalho muito desafiador, então, nesse sentido, pensar em estratégias de forma conjunta e coletiva é o que temos feito ao longo dessa trajetória da nova gestão”, observou.

De acordo com Bruno, quando se pensa em redes, se pensa em espaços de articulação e de intercâmbio entre diversos atores sociais da Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. “Porque só dessa forma conseguimos produzir políticas efetivas. Quando falamos de afetos, falamos da capacidade de nos afetarmos frente a realidade na qual os trabalhadores da saúde estão inseridos e, em especial, a realidade que desconsidera os direitos dos trabalhadores e desumaniza a classe trabalhadora”, ponderou. E acrescentou: "O campo do Trabalho e da Educação na Saúde não existe sem luta. A luta dá conta de que possamos refletir sobre como assegurar o debate entorno das necessidades dos trabalhadores da saúde frente ao contexto de fragilização do sistema de proteção social, que expõe a classe trabalhadora a um processo de precarização de vínculos e relações e condições de trabalho inadequadas”.

Márcia Fausto apresentou a experiência da Rede Brasileira de Escolas de Saúde Pública (RedEscola) que, segundo ela, tem o objetivo de articular e fortalecer as escolas e os centros formadores em saúde pública/coletiva, mediante estratégias para o desenvolvimento de políticas e ações no âmbito da Educação na Saúde, visando a produção do conhecimento e a qualificação da força de trabalho no SUS. “Somos uma rede que agrega instituições formadoras muito diversificadas, com pluralidade de projetos, formas de atuação e capacidade de respostas a propostas formativas”, definiu. Sobre desafios, Márcia apontou algumas questões a serem enfrentadas como: a heterogeneidade das escolas da rede, o reencantamento dos trabalhadores do SUS e o papel da formação nesse movimento, bem como pensar em formas de conexão do mundo do trabalho com o mundo da formação: “A RedEscola tem o compromisso de criar espaços de diálogo, de reflexão e de proposição em torno do tema da Educação na Saúde e da formação dos trabalhadores do SUS”.

Desafios da Integração

Para tratar dos desafios da integração entre as áreas da Gestão do Trabalho e Educação na Saúde, a última mesa do primeiro dia do encontro teve como mediadora a diretora de Gestão da Educação na Saúde (DEGES/SGTES), Regina Gil. Também estiveram presentes: Mario Róvere, da Escola de Governo em Saúde Floreal Ferrara, da Argentina; Alexandre Medeiros, professor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB); Robson José da Silva, diretor de Regulação, Monitoramento e Avaliação do Trabalho na Saúde (SES-TO); Jhéssica Alves, representante dos Agentes Comunitários de Saúde (ACS); Maria Cristina Paz, representante  dos Agentes de Combate às Endemias (ACE); Lesli Araújo, representante do PET-Saúde; Márcia Pinheiro, representante do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems).

Para Regina Gil, os desafios do mundo do trabalho são muitos e os desafios do mundo da formação também não são menores. “É preciso pensar no quanto já avançamos na integralidade, na universalidade, mas temos muito que avançar ainda na questão da equidade, no olhar para as pessoas. Não queremos doenças, queremos discutir o cuidado a pessoas. Os processos de formação precisam investir nisso, olhar para as pessoas e entender a complexidade e a diversidade do nosso país”, falou.

A escassez de profissionais de nível técnico e superior foi um ponto levantado por Alexandre Medeiros. “Existem áreas de grandes gargalhos. Me lembro, por exemplo, do Plano de Expansão sobre Aceleradores Lineares, pois não tínhamos técnicos nessa área”, relembrou, citando ainda um outro desafio: “Precisamos dimensionar as necessidades dos trabalhadores, não só de formação, mas expectativas sobre a sua profissão. Precisamos ter uma singularização das necessidades regionais, termos capacidade de identificar as necessidades de saúde dos territórios, por exemplo, de terras indígenas, dos quilombos, das periferias das grandes cidades e, a partir disso, pensar no processo de trabalho, que não pode ser o mesmo em todas as regiões do país”.

Para Marcia Pinheiro, os municípios precisam disponibilizar as condições adequadas para que os trabalhadores realizem bem o seu trabalho. Isso, segundo ela, significa pensar estrategicamente, uma vez que a produção de uma saúde de qualidade para a população é, em boa parte, reflexo da forma e das condições com que são tratados esses trabalhadores. “Portanto, articular a entrega da saúde como bem público e o devido cuidado àqueles que produzem esse bem é o objetivo da Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde municipal”, concluiu.