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Projeto que impede suspensão de aulas presencias na pandemia tem votação adiada novamente no Senado

Projeto de lei 5.595/20 pretende classificar educação em formato presencial como atividade essencial, forçando um retorno das atividades presenciais. Para críticos, medida passaria por cima de decisões dos gestores municipais e estaduais e ainda colocaria em risco o direito à greve dos trabalhadores da educação
André Antunes - EPSJV/Fiocruz | 18/06/2021 10h56 - Atualizado em 01/07/2022 09h42

O Senado deve realizar mais uma sessão de debates para deliberar sobre o Projeto de Lei 5.595/20, que classifica a educação básica e superior, em formato presencial, como serviços essenciais, impedindo a suspensão das aulas presenciais mesmo em meio à pandemia ou calamidade pública. O PL, aprovado pela Câmara dos Deputados em abril, vem gerando controvérsia no Senado. Na semana passada, ele entrou pela terceira vez na pauta de votação do Plenário mas foi novamente adiado diante dos questionamentos apresentados por senadores contrários ao projeto.

Autor do requerimento que convocou uma nova sessão de debates antes da deliberação, o senador Flávio Arns (Podemos-PR) defendeu que a lei não é necessária, podendo passar por cima de processos de gestão da educação nas demais esferas de governo. “Nós temos protocolos no Ministério da Saúde, no Ministério da Educação, nos estados, nos municípios. Soluções têm que vir num processo de diálogo e de entendimento entre as várias instâncias governamentais”, argumentou.

Já o presidente da Comissão de Educação do Senado, Marcelo Castro (MDB-PI), defendeu que classificar a educação presencial como serviço essencial é inadequada a partir da legislação sobre o tema. “O termo "atividade essencial" já é comprometido com a legislação trabalhista. As atividades que são consideradas pela lei como essenciais são atividades que, se forem paralisadas, colocarão em perigo iminente a sobrevivência das pessoas. Temos implicações e, evidentemente, uma lei dessa precisa ser mais bem debatida”, afirmou o senador.

Dirigente da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara comemorou o adiamento da votação. “Conseguimos travar a votação da matéria. É a terceira vez no Senado. Agora teremos mais uma Sessão Plenária. A boa notícia é que a Mesa da Comissão de Educação do Senado Federal se opõe a qualquer projeto com o conteúdo do PL 5595/2020” afirma Cara, ressaltando, no entanto, que o PL é uma prioridade do governo federal.


Direito à greve em risco?

Um dos pontos mais polêmicos do texto diz respeito justamente à legislação trabalhista. Senadores da oposição, assim como movimentos sociais e organizações sindicais da educação, apresentaram, ao longo da tramitação da proposta, preocupação quanto à possibilidade de o PL servir para restringir o direito de greve dos trabalhadores da educação, já que de acordo com a legislação trabalhista, o direito à greve é limitado no caso dos serviços e atividades consideradas essenciais.

O texto aprovado pela Câmara abre brechas para o entendimento de que a educação em formato presencial será considerada atividade essencial não apenas em situações de pandemia ou calamidade pública, o que tornaria permanentes as restrições ao direito à greve dos trabalhadores da educação. No artigo 2º da lei lê-se que a educação básica e superior, das redes pública e privada de ensino, em formato presencial, serão reconhecidas como serviços e atividades essenciais, “inclusive durante o enfrentamento de pandemia, de emergência e de calamidade pública”. No dia 10, o relator do PL, o senador Marcos do Val (Podemos-ES) apresentou relatório em que acata uma emenda feita ao texto apresentada pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) que buscou explicitar no texto que os dispositivos da lei 7.783/89, que mitigam o direito à greve dos trabalhadores de serviços essenciais, não serão aplicados no caso dos trabalhadores da educação caso a lei seja aprovada. O relatório também alterou o texto original aprovado na Câmara, acatando emendas apresentadas no sentido de limitar a aplicação da lei exclusivamente a situações de pandemia, emergência ou calamidade pública.


Críticas

Para Daniel Cara, no entanto, mesmo com as alterações, a lei, caso aprovada, trará riscos para estudantes e trabalhadores da educação. “A questão é que ‘serviço ou atividade essencial’ é um conceito jurídico. Ele determina que algumas atividades e serviços são inadiáveis para a sobrevivência e segurança da população. Em um incêndio generalizado ou em uma enchente, o que deve funcionar? Ambulância, hospital, corpo de bombeiros, serviço de água, etc. Isso não pode faltar. Imagina agora se o PL 5.595/2020 for aprovado - as escolas deverão estar abertas em qualquer circunstância. Ou seja, ao invés de proteger a vida e garantir a sobrevivência humana - que é o objetivo do conceito jurídico de "serviço ou atividade essencial" - o PL vai jogar toda comunidade escolar ao risco. Para sempre. Agora, nessa pandemia. E em todas as emergências, calamidades e pandemias futuras”, alerta o dirigente da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.

Entidades que representam dirigentes municipais e estaduais de educação também se posicionaram contra a aprovação do PL 5.595/20. Em nota assinada pelo presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) Luiz Miguel Garcia, a entidade considerou que o PL tem a intenção de “promover um retorno forçado às aulas presenciais, sem considerar as condições sanitárias das diferentes redes de ensino em todo o País”, movimento que a Undime chamou de “autoritário”. “Em pesquisa realizada pela Undime no período de 29 de janeiro a 21 de fevereiro deste ano, 63,3% dos 3672 municípios respondentes indicaram que o ano letivo de 2021 seria iniciado de maneira remota e 26,3% de maneira híbrida. É importante destacar que tais percentuais devem ter aumentado, devido ao agravamento da epidemia em todas as regiões do país. A proposta do Projeto de Lei (PL) desconsidera essa realidade e obriga o retorno imediato às aulas totalmente presenciais. Ou seja, proíbe, por exemplo, a implementação de protocolos sanitários de municípios que indicam a diminuição do número de alunos por sala (rodízio) e a oferta de ensino híbrido, ou mesmo a suspensão das aulas presenciais”, destacou a nota da entidade.

Nela, a Undime ainda classificou como “sem sentido” as situações de excepcionalidade estabelecidas pelo PL 5.595, cujo texto afirma que as aulas presenciais poderão ser suspensas caso as condições sanitárias do estado, Distrito Federal ou município, aferidas com base em critérios técnicos e científicos devidamente publicizados, não permitam as aulas em formato presencial. “A decisão sobre a modalidade de oferta da educação (presencial, remota ou híbrida) já está sendo tomada pelos governos com base em orientações das autoridades sanitárias municipais e/ ou estaduais”, lembrou a nota, complementando em seguida: “Da forma como se apresenta, fica evidente que sua intenção é vincular a decisão do retorno a uma diretriz nacional que negaria a situação de calamidade pública”.

O Conselho Nacional dos Secretários de Educação (Consed), que representa os gestores estaduais, também se posicionou contrariamente ao projeto. “Na prática, isso significa que, mesmo em situação de alto risco na pandemia, os estados e municípios serão obrigados a manter as aulas presenciais. Os secretários de Educação defendem que cada gestor estadual ou municipal possa avaliar com as autoridades sanitárias locais a situação epidemiológica na tomada da decisão de manter ou não as aulas presenciais. Portanto, o Consed acredita que não é o momento de obrigar estados e municípios a abrirem suas escolas, numa decisão única para todo o país”, afirmou o Conselho, em nota.

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