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Vigilância e Monitoramento de Populações Expostas ao Mercúrio no Brasil

Em iniciativa pioneira, EPSJV forma mais uma turma de curso para Profissionais da Atenção Primária em Saúde que atuam em localidades do país onde exista atividade garimpeira
Julia Neves - EPSJV/Fiocruz | 20/10/2021 10h59 - Atualizado em 01/07/2022 09h41

A Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) fez a formação, de 4 a 8 de outubro, da segunda turma do Curso de Atualização Profissional em Vigilância e Monitoramento de Populações Expostas ao Mercúrio no Brasil. Em parceria com a Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz), a formação foi ofertada a 41 profissionais de saúde do Distrito Sanitário Especial Indígena do Rio-Tapajós (DSEI-Rio Tapajós), presencialmente, no campus da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), em Itaituba (PA). A primeira turma do curso foi realizada, de forma remota, de 26 a 30 de abril de 2021.

A iniciativa, inédita no Brasil, faz parte de uma série de produtos de comunicação e de educação em saúde previstos no projeto de pesquisa “Impacto do Mercúrio na Saúde de Indígenas Munduruku: Pesquisa-Educação-Serviço”, aprovado em 2020 no edital Atenção Primária em Saúde (PMA) do Programa Fiocruz de Fomento à Inovação (Inova Fiocruz) e coordenado pela professora-pesquisadora da EPSJV, Ana Claudia Vasconcellos, em conjunto com o pesquisador Paulo Basta, da ENSP.

“O foco foi levar a esses profissionais de saúde informações relacionadas à exposição humana ao mercúrio para que, a partir disso, eles possam identificar os indivíduos contaminados, monitorá-los e encaminhá-los ao tratamento médico mais adequado”, destacou Ana Claudia. 

O público-alvo e a localização da formação são justificados, segundo ela, porque a contaminação por mercúrio no Brasil está concentrada na região amazônica por conta do garimpo artesanal de ouro. “Priorizamos a população indígena, porque, além de serem submetidas a uma condição de vulnerabilidade pela negligência do Estado, eles consomem grandes quantidades de peixe. E esse consumo do pescado contaminado por mercúrio é a principal via de exposição humana”, explicou.

Para o técnico de enfermagem Kraiti Megrangnotere, indígena da etnia Kayapó que foi aluno do curso, a formação não poderia ser melhor. “Eu trabalho na casa do Índio, aqui em Itaituba. O que aprendi no curso é muito importante para que eu possa ajudar meu povo”, contou. 

Na avaliação de outro aluno do curso, o médico Helan Reis, a formação foi proveitosa, porque tratou de temas que estão ligados diretamente ao campo de atuação dos estudantes. “O curso foi engrandecedor e serviu de esclarecimento tanto para mim, como médico, quanto para meus colegas técnicos de enfermagem, enfermeiros, agentes indígenas de saúde e agentes indígenas de saneamento. Nos serviu como alerta e nos deixou com mais vontade de estudar e buscar conhecimento sobre esse tema”, destacou. E acrescentou: “Agora, nas consultas, teremos um olhar diferenciado com algum paciente que trabalhe com garimpo”.

Presença do MPF

No dia 7, o procurador da República Gabriel Dalla Favera de Oliveira participou da formação. Isso porque o Ministério Público Federal (MPF) atuou, nos dias 7 e 8 de outubro, em uma série de atividades voltadas à saúde de povos indígenas da região. Além da coleta de informações úteis para procedimentos em tramitação na instituição também foi feito o compartilhamento de dados de interesse das famílias indígenas.

Convenção de Minamata

Em 2018, o Brasil promulgou a Convenção de Minamata sobre Mercúrio, firmada em Kumamoto, em outubro de 2013. Esse acordo tem o objetivo de proteger a saúde humana e o meio ambiente das emissões e liberações de mercúrio e de compostos de mercúrio.

Além disso, Ana Claudia explicou que faz parte desse acordo o treinamento de equipes de saúde para identificar casos suspeitos de contaminação e oferecerem tratamentos adequados. É nesse sentido que a iniciativa da EPSJV e ENSP é pioneira. “Não existe nenhum outro curso com nosso objetivo, voltado para profissionais de saúde para atender populações vulneráveis, no Brasil. Nossa formação atende ao texto da Convenção de Minamata, da qual o Brasil é signatário”, concluiu.

Pesquisa

O curso de Atualização Profissional em Vigilância e Monitoramento de Populações Expostas ao Mercúrio no Brasil é um desdobramento da pesquisa “Impacto do Mercúrio na Saúde de Indígenas Munduruku: Pesquisa-Educação-Serviço”.

A ideia da pesquisa surgiu em 2019, quando um grupo de estudo, liderado por Paulo, promoveu uma investigação em comunidades do estado do Pará por demanda da Associação Indígena Pariri e em comunidades do Amazonas. “Pediram nosso apoio para investigar os impactos provocados pela mineração ilegal de ouro e pelo uso extensivo do mercúrio na região, tanto no ambiente quanto nas pessoas”, recorda-se.

Entre outubro e novembro de 2019, a equipe da pesquisa realizou um longo trabalho de campo na região. E os resultados foram reveladores. “Durante a pesquisa, coletamos e avaliamos amostras de cabelos de 200 pessoas. E todas elas, independentemente da idade e gênero, apresentaram-se contaminadas com níveis de mercúrio”, afirmou. Além disso, Paulo contou que foram coletadas também espécies de peixes e todas estavam contaminadas.

A partir disso, a equipe produziu um relatório de pesquisa, com os principais achados, que foi entregue para as principais lideranças da comunidade em outubro de 2020. 

Diante da necessidade de continuação do estudo, foi criada a pesquisa “Impacto do Mercúrio na Saúde de Indígenas Munduruku: Pesquisa-Educação-Serviço”. “Além de cursos de formação, nela também está prevista a preparação de materiais didáticos para serem usados nas escolas indígenas na comunidade; livros paradidáticos que contarão a história de uma forma mais lúdica, e um cd de canções que remete ao tema saúde e meio ambiente”, adiantou.