Entrevista
-
Em 18 de setembro, a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) publicou uma nota em resposta ao editorial do jornal O Globo do dia anterior, em defesa da educação pública de qualidade, ressaltando o papel social dessas instituições e sua contribuição para a manutenção da soberania do país. A opinião do veículo, que chamou de “falidas” a UFRJ e a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), ofendeu a comunidade científica. O editorial também propunha a “reinvenção” das universidades públicas sob a lógica de economia de recursos. “Não há mais possibilidade de sustentação de instituições com gastos bilionários e déficits crescentes por uma sociedade na qual metade dos trabalhadores tem renda domiciliar de até dois salários mínimos por mês”, trazia o texto. Em reposta, a UFRJ desmente a decadência das universidades públicas e destaca resultados de sucesso alcançados pelas universidades públicas brasileiras em geral. Em agosto, por exemplo, a UFRJ apontada pelo ranking de Xangai como a melhor universidade federal do Brasil, alem de ser responsável por cerca de 10% dos programas de pós-graduação com qualidade internacional, conceitos 6 e 7 da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e seus cursos de graduação estão entre os melhores do Brasil, conforme resultados do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) e do Ministério da Educação (MEC). Para fazer uma análise conjuntural dos ataques da situação da educação pública no Brasil, o Portal EPSJV/Fiocruz conversou Mariana Trotta, professora Adjunta da Faculdade Nacional de Direito (FND/UFRJ) e vice-presidente do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes – Rio de Janeiro).
-
Em setembro de 1978, a Conferência Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde, realizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em Alma-Ata, na República do Cazaquistão, expressava a “necessidade de ação urgente de todos os governos, de todos os que trabalham nos campos da saúde e do desenvolvimento e da comunidade mundial para promover a saúde de todos os povos do mundo”. A Declaração de Alma Ata – documento síntese desse encontro – afirmava a partir de dez pontos que os cuidados primários de saúde precisavam ser desenvolvidos e aplicados em todo o mundo com urgência, particularmente nos países em desenvolvimento. Naquele momento, conforme defesa feita pela própria OMS, a saúde era entendida como “completo bem-estar físico, mental e social, e não simplesmente a ausência de doença ou enfermidade”. Por conta dos 40 anos de Alma Ata, completados neste mês de setembro de 2018, o Portal EPSJV/Fiocruz ouviu o professor do Departamento de Medicina Social da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e coordenador da Rede de Pesquisas em Atenção Primária à Saúde (Rede APS) da Associação Brasileira de Saúde Coletiva, Luiz Augusto Facchini, que fez um balanço das quatro décadas do documento que foi um marco para o mundo. Nesta entrevista, Facchini fala ainda sobre a Conferência Global da OMS sobre Atenção Primária em Saúde, marcada para outubro em Astana, no Cazaquistão, quando será apresentada uma nova Declaração sobre Atenção Primária à Saúde, analisando até onde os princípios apresentados pelo documento se aproximam ou se distanciam do texto de 1978.
-
O mês de setembro ganha a cor amarela como parte da campanha de prevenção ao suicídio. Por conta disso, o Portal EPSJV/Fiocruz foi ouvir o pesquisador do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz) Carlos Estellita-Lins, com atuação clínica em psicanálise e psiquiatria e estudioso do tema, para entender o recrudescimento do suicídio em alguns grupos populacionais e a relação entre suicídio e as transformações ambientais. Trata-se de um problema de saúde pública mundial: a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que 800 mil pessoas morram desta forma anualmente, uma a cada 40 segundos, o que equivale a 1,4% dos óbitos totais. A média global de mortes voluntárias é de 10,7 por cem mil habitantes, sendo 15 por cem mil entre homens e oito entre as mulheres. No Brasil, onde os índices são também relevantes, segundo dados do Ministério da Saúde registrados entre 2011 e 2017, a média foi de 5,7 suicídios a cada cem mil habitantes. Os números são maiores quando se trata da população jovem de 15 a 29 anos, na qual o suicídio é a quarta maior causa de morte, especialmente entre os homens. Entre 2011 e 2017, a taxa de suicídio entre os homens dessa faixa etária foi de nove mortes por cem mil habitantes, enquanto que entre as mulheres foi quatro vezes menor (2,4 por cem mil). Uma verdadeira epidemia de suicídio atinge ainda a população indígena, entre a qual a taxa de mortalidade por mortes voluntárias é quase o triplo da média nacional (15,2 por cem mil). E diferentemente da população geral, a maioria dos suicídios cometidos pelos indígenas (44,8%) no mesmo período ocorreu na faixa etária de dez a 19 anos.
-
Nenhuma das 27 unidades federativas do Brasil cumpriu as metas estabelecidas para o ensino médio. Os dados divulgados pelo Ministério da Educação nesta segunda-feira (3/9) fazem parte do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de 2017. Em uma escala de 0 a 10, o Ideb do ensino médio geral do Brasil foi de 3,8, abaixo da meta fixada em 4,7. O índice dos últimos três estudos, realizados a cada dois anos, tinha estacionado em 3,7. Este quadro de desempenho em relação ao ensino médio já havia sido anunciado na semana passada (30/8), quando o governo federal apresentou os resultados da prova de 2017 do Saeb, Sistema de Avaliação da Educação Básica. Somando-se às taxas de aprovação, o Saeb – resultado de avaliações de português e matemática, aplicadas ao fim dos 5º e 9º anos do ensino fundamental e do ano final do ensino médio, pontuando os estudantes em uma escala de 0 a 500 pontos – compõe o índice das escolas e redes de ensino do país. Segundo o Saeb 2017, enquanto as notas dos dois ciclos do ensino fundamental melhoraram no ano passado, as notas do último ano do ensino médio foram enquadradas como inadequadas. Em língua portuguesa, conforme análise do MEC, apenas 1,6% dos alunos atingiu nível considerado adequado, por terem feito mais que 375 pontos. Em matemática, por sua vez, apenas 4,5% dos alunos que terminam o ensino médio obtiveram 375 pontos ou mais. Em entrevista ao Portal EPSJV/Fiocruz, a coordenadora de políticas educacionais da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Andressa Pellanda, sugere olhar com cuidado para os números revelados pelo sistema de avaliação do MEC, uma vez que o Ideb não considera as desigualdades regionais nem as condições de trabalho dos profissionais de educação e das escolas. “A culpa desse resultado acaba injustamente recaindo sobre o estudante que realizou a prova e do professor que ensinou aquele aluno”, critica.
-
Um movimento chamou atenção do setor da saúde suplementar. O presidente Michel Temer publicará nos próximos dias, segundo divulgou reportagem do jornal ‘O Globo’ (28/8), decreto que reativa um conselho que poderá se sobrepor à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Trata-se do Consu, Conselho de Saúde Suplementar, esvaziado há 18 anos, depois que foi criada a agência reguladora do setor. Contando agora com duas câmaras técnicas – uma dedicada à análise das resoluções pretéritas do Conselho e outra com o escopo de estudar e propor diretrizes gerais para o setor –, o Consu poderá recomendar políticas, rever decisões já tomadas e ficará a cargo da Casa Civil. Em entrevista ao Portal EPSJV, o professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) Mário Scheffer, estudioso do setor, observa que pode ser uma tentativa do governo de avançar com medidas que foram barradas na Justiça, como os planos de saúde acessíveis. “Trata-se de uma última tentativa do governo de aprovar uma antiga agenda do setor privado”, avalia. Scheffer levanta dúvidas em torno das intenções do governo com essa proposta e afirma: “O Consu está sendo retomado no momento em que a ANS está enfraquecida técnica e politicamente”.
-
Em decisão inédita, a Justiça americana condenou a Monsanto a indenizar o jardineiro Dewayne Johnson em US$ 289 milhões pelo aparecimento de um câncer, que estaria relacionado ao uso do herbicida Roundup, que tem como princípio ativo o controverso glifosato, um dos agrotóxicos mais usado no Brasil. O processo é um de cinco mil casos similares em andamento nos EUA. Apesar de a Monsanto negar que a substância esteja ligada à doença, a Agência Internacional de Estudo em Câncer (Iarc, na sigla em inglês) já havia classificado em 2015 a substância como “provavelmente carcinogênico para seres humanos”. Em entrevista ao Portal EPSJV, a toxicologista do Instituto Nacional do Câncer (Inca) e integrante do grupo de trabalho ‘Saúde e Ambiente’ da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Márcia Sarpa, fala como essa decisão impacta nosso país, que em 2009 se tornou o maior consumidor mundial de agrotóxicos, com mais de um milhão de toneladas, o que equivale a um consumo médio de 5,2 kg de veneno agrícola por habitante. A exemplo do estudo da Iarc, o Inca comprova em pesquisa que está para ser publicada até o fim deste ano que pacientes com exposição ocupacional a agrotóxicos têm mais chances de desenvolverem linfomas não-Hodgkin, o mesmo que afetou o jardineiro americano.
-
Há dois meses milhares de argentinas tomaram as ruas e, por conta de sua mobilização e pressão, foi aprovada na Câmara dos Deputados a legalização do aborto. A Argentina foi pioneira na América Latina na aprovação do casamento homoafetivo, em 2010, e na Lei de Identidade de Gênero, em 2012. O próximo avanço, no entanto, ainda vai ter que esperar. Numa votação apertada realizada nesta semana, no dia 9 de agosto, o Senado argentino rejeitou o projeto que veio da Câmara. Do lado de fora, as ruas de Buenos Aires e de várias cidades brasileiras foram ocupadas por uma onda verde de mulheres militantes. Ao mesmo tempo, entre 6 e 9 de agosto, aqui no Brasil, diversos setores da sociedade, pró e contra a descriminalização do aborto debateram numa Audiência Pública promovida pelo Supremo Tribunal Federal. Nesta entrevista, Maria Aparecida Schumaher, conhecida como Schuma, fala sobre o resultado da votação e defende que o movimento não pode desanimar. Coordenadora executiva da ONG Rede de Desenvolvimento Humano (Redeh), ela faz também um panorama dos entraves e das lutas pela legalização do aborto e das lutas pela descriminalização na América Latina e Caribe.
-
Feito a cada dez anos, Censo Agropecuário do IBGE foi divulgado parcialmente, e os primeiros dados mostram um retrato nada bom, comentado pelo geógrafo Paulo Alentejano, professor da Universidade estadual do Rio de Janeiro
-
A população aplaudiu. Parte da esquerda se calou. O governo Temer tremeu. Foram 11 dias de paralisação, gerando desabastecimento em diversas cidades. Vitimada mais pelo preço da gasolina e do gás de cozinha do que pela carência daqueles dias, 87% da população aprovou o movimento dos caminhoneiros – embora, uma vez finalizado, 69% avaliem que ele trouxe mais prejuízos do que benefícios ao país, segundo pesquisa Datafolha. A memória de momentos históricos dos caminhoneiros – como a participação no boicote que ajudou a enfraquecer o governo de Salvador Allende, no Chile –, somada ao pedido de intervenção militar, vocalizado por parte dos manifestantes, dividiu partidos e movimentos sociais de esquerda. Diante da exigência concreta, de redução dos impostos que incidem sobre os combustíveis, aumentou a desconfiança de que a greve era, na verdade, locaute – um movimento de empresários e não de trabalhadores. O que o sociólogo e professor Giovanni Alves, da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp), explica nesta entrevista é que tanto essa categoria quanto a conjuntura brasileira em que a paralisação aconteceu são bem mais complexas do que essas classificações expressas. Ele ressalta que, num contexto como esse, de demandas legítimas com soluções regressivas, fica mais claro perceber a falta de um sujeito político capaz de disputar o sentido das pautas e da organização de trabalhadores. O resultado, diz, é que eles acabam sendo atraídos por movimentos de direita. E essa ausência se expressa ainda, segundo ele, na dificuldade de se “traduzir” o problema para a população, dando um passo além da consciência imediata. “Quem é que movimenta as ruas?”, questiona.
-
O sociólogo César Callegari renunciou, no início desta semana (2/7), à presidência da comissão que analisa a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) no Conselho Nacional de Educação (CNE). Em carta endereçada aos conselheiros do CNE, Callegari – que permanece como integrante do órgão até outubro deste ano – fez críticas à BNCC do Ensino Médio, apresentada pelo MEC ao Conselho em abril. Segundo ele, o documento do ensino médio contradiz o que foi definido na BNCC da Educação Infantil e Fundamental, homologada pelo CNE em dezembro de 2017, e é “radicalmente distinta” das versões iniciais. Para Callegari, a organização do documento, em que apenas as disciplinas de matemática e português aparecem como obrigatórias, com as demais diluídas em áreas do conhecimento, é um dos principais problemas. Ele reivindica, também, a revogação da Lei 13.415/2017, que aprovou a reforma do ensino médio. Segundo ele, representa um grave retrocesso, na medida em que autoriza que essa etapa de ensino seja ofertada na modalidade a distância, abre espaço para que recursos públicos sejam direcionados para a iniciativa privada e permite a contratação de professores sem formação específica para dar aulas na educação básica. Nesta entrevista, ele expõe suas críticas ao governo, fala sobre a pressão do MEC para acelerar a aprovação do documento pelo CNE e responde às críticas apresentadas por educadores e movimentos críticos à BNCC durante o processo de discussão da base no conselho.