Em meio ao agravamento da violência em Manguinhos e ao complexo cenário de violações de direitos que essa e outras regiões de favelas do Rio de Janeiro vêm vivendo, movimentos sociais, organizações, trabalhadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e moradores do território e de comunidades vizinhas se reuniram, no dia 20 de agosto, para fazer um apelo contra uma política de segurança pública que tem vitimado a população. O evento anunciado era a “5ª Caminhada da Paz com Garantia de Direitos”, programada para acontecer com a ocupação da avenida Leopoldo Bulhões, oferta de vários serviços e a participação de mais de mais de duas mil pessoas. Mas a mobilização foi reprogramada – e abreviada -devido ao grau de insegurança gerado após a morte do policial civil Bruno Guimarães Buhler no dia 11 de agosto durante uma operação da Coodenadoria de Recursos Especiais da Polícia Civil (Core-RJ) na comunidade do Jacaré, vizinha a Manguinhos. No dia seguinte ao crime, a polícia iniciou uma série de operações na região que que resultaram em sete pessoas mortas e outras sete feridas. Só no ensino fundamental, segundo dados da Secretaria Municipal de Educação (SME), 131 mil alunos ficaram sem aula pelo menos um dia. Na segunda-feira, 21 de agosto, depois de 11 dias consecutivos de operação policial, a SME decidiu fechar 15 escolas da região por tempo indeterminado. “Compreendemos que o objetivo seja garantir a segurança dos estudantes e trabalhadores e entendemos também que ter uma decisão institucional é importante para que não recaia sobre os diretores de escola a responsabilidade de avaliar os riscos a cada tiroteio. Mas não podemos naturalizar o fechamento de escolas. Não podemos naturalizar que a resposta do Estado seja privar a população de direitos ao invés de repensar o papel do próprio Estado nesse círculo vicioso da violência nas favelas”, analisa a diretora da EPSJV/Fiocruz, Anakeila Stauffer.
“Transformamos a caminhada em um Ato Manifesto pelo não à violência em respeito à vida moradores da favela. Não oferecemos os serviços programados e fizemos um evento com duração menor, pois se houvesse confronto quem pagaria com sangue e com a vida seriam os moradores, vítimas de vingança dos policiais no Jacarezinho e Maguinhos”, lamentou Patrícia Evangelista, moradora de Manguinhos e integrante da organização Mulheres de Atitude. A caminhada, que já está na sua quinta edição, é conhecida pela forte expressão artística e, segundo Patrícia, tem o objetivo de mostrar “que Manguinhos não é apenas um lugar de violência como mostra a mídia todos os dias, mas um lugar que também tem espaço para os projetos, parcerias, instituições e o principal, os moradores de bem”.
Ainda assim, o Ato Manifesto contou com a participação de aproximadamente 250 pessoas. O ponto de encontro foi a avenida Leopoldo Bulhões, no trecho entre os conjuntos residenciais Nelson Mandela e Nova Embratel. A programação contou com discursos de coletivos e o Sindicato dos Trabalhadores da Fiocruz (Asfoc-SN) entregou a Medalha Jorge Careli de Direitos Humanos ao time Estrelas do Mandela Futebol Clube e à Comissão dos Agentes Comunitários de Saúde de Manguinhos e o Prêmio Sérgio Arouca de Saúde e Cidadania ao Fórum Basta de Violência (Maré) e à moradora Jane da Silva Camilo.
Caminhada da Paz
A 5ª Caminhada da Paz com Garantia de Direitos acontecerá oficialmente no dia 24 de setembro. O novo ato cultural e político começará às 9h, no mesmo local e seguirá até as 14h com uma feira de ações de cidadania e exposição do trabalho desenvolvido pela rede de atores sociais atuantes em Manguinhos. No palco serão recebidos os talentos locais das mais diversas linguagens artísticas.
A primeira Caminhada da Paz aconteceu em 2005, a partir das discussões da Agenda Redutora de Violência, que reunia atores sociais do território, trabalhadores da Fiocruz e outras instituições, a fim de que fossem elaboradas estratégias para mitigação das diferentes formas de violência sofridas pela população. O evento, desde a sua primeira edição, conta com o apoio da Fiocruz.