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Oitava em dobro? Conferências de Saúde no túnel do tempo

Trabalhadores, usuários e militantes do SUS que estiveram na 8ª e na 16ª Conferência Nacional de Saúde revivem lembranças, traçam semelhanças e apontam diferenças entre a situação de saúde, a conjuntura política e a mobilização social em 1986 e 2019
Cátia Guimarães - EPSJV/Fiocruz | 02/09/2019 09h12 - Atualizado em 01/07/2022 09h43

Quando ia ao hospital com a mãe no interior de Pernambuco, o que mais chamava atenção de Conceição Silva era o amontoado de gente que ficava “num canto”, “sentada no chão”. “Era a indigência. E aquela imagem de criança para mim foi muito forte. Eu não entendia por que tinha banco para uns sentarem e outros não”, conta. Essa memória foi determinante para que ela se tornasse militante e, mais tarde, aos 22 anos, como estudante, se juntasse a outras quatro mil pessoas no Estádio Nilson Nelson, em Brasília, para decidir que, em relação às necessidades de saúde, no Brasil ninguém mais seria indigente. Era a 8ª Conferência Nacional de Saúde, que definiu saúde como direito de todos e dever do Estado. Foi para garantir a sobrevivência dessa conquista, inscrita na Constituição Federal por força de um movimento social efervescente que, em 2019, aos 55 anos e como representante do Movimento Negro no segmento de usuários, Conceição esteve presente também na 16ª Conferência Nacional de Saúde, batizada afetiva e politicamente de “8ª + 8”. “Fazer esse resgate chama as pessoas para a luta”, diz.

Conceição não está sozinha. Apesar da presença de uma juventude que foi saudada e comemorada em muitas falas, a ‘velha guarda’ do direito à saúde estava lá: um chamado meio informal para uma foto de veteranos durante a 16ª conseguiu reunir quase 30 pessoas que tinham participado também da 8ª. Mas havia muitos mais, anônimos, espalhados entre os quase 5,5 mil participantes desta última edição do maior espetáculo do controle social do país. “Foi com orgulho que eu reconheci e tive oportunidade de rever as pessoas que estavam lá atrás na luta inicial com a gente e que agora estão aqui. Olha que maravilha!”, comemora Cleuza Miguel, cadeirante, de São Paulo, representante do segmento de usuários pelo movimento dos portadores de esclerose múltipla.

Antes e depois do SUS

Foi também uma experiência pessoal – e traumática – que levou Gracinda Magalhães a deixar de ser uma ‘simples’ usuária e se tornar militante da área da saúde. Era final da década de 1970 quando sua irmã adolescente engravidou. “Ela não trabalhava e naquele momento acontecia uma greve dos médicos da Santa Casa”, conta, referindo-se às instituições onde eram atendidos aqueles que não tinham acesso à saúde pública. A irmã de Gracinda passou 56 horas com a bolsa rompida e o bebê entrou em sofrimento. “Então eu precisei fazer uma coisa que não era correta mas que eu fiz para salvar a vida da minha irmã: tirei a foto da minha carteira profissional que era assinada e coloquei na dela, que não era. Com isso consegui interná-la na maternidade do povo”, lembra. A irmã sobreviveu. O sobrinho também, embora com sequelas. “Por conta disso eu comecei a entender que aquele sistema estava errado, que nem eu nem minha família éramos indigentes e que nós deveríamos ter direito à saúde. A saúde foi minha bandeira de luta maior durante todos esses anos”. Na 8ª Conferência, ela descobriu que “não estava só”. “Havia um Brasil imenso que comungava a mesma coisa que eu”, diz.

Cearense que há muitos anos mora na região do Xingu, no Pará, Gracinda participou de todas as etapas de discussão até chegar à 16ª Conferência Nacional de Saúde. Sempre como usuária, em 1986 ela representou a Pastoral da Saúde da Igreja Católica; agora, em 2019, foi delegada pelo Conselho Municipal de Saúde de Altamira. “Eu confesso que às vezes fico desanimada mas não desesperançada. Porque me vejo ainda lutando para garantir direitos pelos quais eu lutei naquela época, na 8ª. Só que agora tem uma questão que me fortalece mais: eu provei o Sistema Único de Saúde. Como usuária, eu integrei o SUS que erradicou a poliomielite, que me deu a oportunidade de fazer o primeiro exame de PCCU [preventivo do câncer de colo uterino] na Transamazônica”, emociona-se.

De fato, os entrevistados desta reportagem são unânimes em reconhecer que não se pode comparar a situação de saúde que mobilizou a 8ª Conferência e a que se tem hoje, quando aconteceu a 16ª. Entre uma e outra, a construção de um sistema universal fez toda a diferença. “Foi um ganho na estrutura de um sistema que torna possível dar respostas concretas às necessidades de saúde da população”, resume Ary Miranda, pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP), da Fundação Oswaldo Cruz, que foi membro do comitê assessor da 8ª e participou como convidado da 16ª. Entre uma fala e outra, no entanto, ninguém nega que alguns problemas persistem. “Tínhamos uma assistência que não era universal. Nós aprovamos, está na Constituição como direito, mas na prática não conseguimos efetivar completamente”, lamenta Célia Chaves, delegada do Rio Grande do Sul, representante do Sindicato dos Farmacêuticos na 16ª e da Confederação Nacional das Associações de Moradores na 8ª.

O que a 16ª mostrou foi que, para trabalhadores, gestores e usuários, a principal tarefa agora é evitar retrocesso em conquistas que vêm desde a 8ª

A relação entre as questões ambientais e a saúde – que se expressou fortemente no documento final aprovado na 16ª – é, na avaliação de Ary, também devedora da 8ª Conferência, que instituiu o debate sobre o conceito ampliado de saúde e sua determinação social. E a recorrência de propostas nessa área, principalmente denunciando o crescimento do uso de agrotóxicos no Brasil e seus impactos na saúde, mostram que o desafio revelado em 1986 permanece ainda em 2019. A professora Maria Inês Bravo, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e da Frente Nacional contra a Privatização da Saúde, que representou o Conselho Federal de Assistentes Sociais, como trabalhadora, no encontro de 1986 e, também como delegada, o Conselho Federal de Serviço Social na última conferência, lembra que essa ênfase que a 8ª deu à determinação social do processo de saúde e doença se deve, em grande medida, a um diagnóstico de aguda desigualdade social no Brasil. E isso, na sua avaliação, permanece. De acordo com o primeiro relatório da Oxfam publicado em 2017, entre a promulgação da Constituição – dois anos depois da 8ª – e 2015, o país reduziu as desigualdades “a partir da base”: caiu de 37% para menos de 10% a parte da população que vivia abaixo da linha de pobreza, embora a concentração de renda entre os mais ricos tenha se mantido estável. Mesmo assim, o texto ressalta que o Brasil continuava sendo um dos piores países do mundo no quesito igualdade. Agora, relatório da FGV Social mostra que, do final de 2014 a junho de 2019, a renda per capita do trabalho da parcela de 1% mais ricos da população cresceu 10%, enquanto a dos mais pobres caiu 17%. O índice Gini, que mede a distribuição de renda e tinha sofrido redução nas décadas anteriores, também apontou piora. De acordo com o Relatório da Desigualdade Global, produzido pela Escola de Economia de Paris, entre as democracias, o Brasil é hoje o país com maior concentração de renda entre os 1% mais ricos. “Na 8ª havia uma motivação muito grande pelo processo de democratização. Nesta conferência, a gente está no desespero pela regressão dos direitos sociais”, resume Maria Inês.

De fato, o que a 16ª mostrou foi que, para os trabalhadores, gestores e usuários que votaram as propostas do documento final em todas as etapas da Conferência, a principal tarefa agora é evitar retrocesso em conquistas que vêm desde a 8ª. É o caso, por exemplo, da atenção básica, que junto com a recusa aos agrotóxicos e a exigência de mais financiamento, foi uma das pautas mais destacadas no documento referendado em Brasília. Apesar da contradição de se aprovar, no mesmo relatório, propostas de revogação e de revisão, o recado claro da 16ª foi contra a ‘nova’ Política Nacional de Atenção Básica (Pnab), instituída em 2017 sob protestos de entidades científicas e do próprio Conselho Nacional de Saúde.

Público e privado

Também é fato que, mais de 30 anos depois, alguns fantasmas que se tentou expulsar no momento de criação do SUS continuam a ssombrando. E o mais citado pelos entrevistados desta reportagem são as contradições entre a garantia do direito à saúde e os interesses privados. Destacada como única grande ‘polêmica’ da 8ª, lá atrás a proposta de estatização progressiva do sistema de saúde venceu a defesa da estatização total imediata. “Foi um erro”, diz Eni Carajá, coordenador estadual do Morhan, Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase, em Minas Gerais que participou da 8ª como delegado pelo Movimento Popular de Saúde, o Mops. Maria Inês concorda que o SUS está pagando o preço da concorrência com o privado, mas ameniza o peso sobre a Conferência. Segundo ela, a divergência naquele momento era tática e o debate principal girava em torno da possibilidade, ou não, de se garantir assistência imediata sem contar com a estrutura privada existente, composta, principalmente, por hospitais. Segundo ela, na 8ª ainda não havia divergência sobre o objetivo final, que era ter um SUS inteiramente estatal. Foi só um pouco mais tarde, na Comissão Nacional da Reforma Sanitária, que fez os ajustes para o debate na Assembleia Constituinte, diz Maria Inês, que a estatização progressiva se transformou em complementaridade do setor privado como parte do SUS. Hoje, ela avalia que a posição assumida na 8ª, embora plenamente justificável, foi “ingênua” porque não levou em consideração a crise mundial do capitalismo, que se refletiu fortemente no Brasil, trazendo, já no início dos anos 1990, obstáculos aos direitos conquistados na Constituição Cidadã. “Todo o nível de tecnologia ainda hoje está na mão das entidades privadas, principalmente os níveis mais finos. E nós permanecemos cada vez mais reféns disso”, lamenta Eunice Guedes, delegada do Pará, que participou da 8ª como usuária, representando o movimento de mulheres.

Flick Conselho Nacional de SaúdeA decisão do setor privado de atuar só na Constituinte não foi por acaso. Rompendo com a tradição das sete conferências anteriores – que só reuniam os “burocratas do Ministério da Saúde”, na descrição de Ary Miranda –, a 8ª abriu as suas portas para a sociedade civil, inaugurando o formato de participação que sobrevive ainda hoje, com 50% de usuários – a outra metade se divide entre trabalhadores e gestores. Já desde aquela época, os gestores poderiam ser públicos ou privados, mas o fato é que, apesar dos apelos da organização da Conferência, que apostava na conciliação de interesses de toda a sociedade civil, o setor privado de prestadores de serviço de saúde simplesmente não compareceu à 8ª. “A grande maioria das pessoas que participaram da 8ª eram a favor da mudança, da construção de um outro sistema. Os que eram contrários talvez não tenham se mobilizado”, explica Célia Chaves. E essa é, segundo ela, uma diferença importante em relação às conferências que vieram depois e também à 16ª. “A indústria está aqui. O comércio varejista de medicamentos e de tecnologia em geral está aqui, até porque eles estão dentro do próprio Conselho”, diz a delegada, que hoje representa o Sindicato dos Farmacêuticos do Rio Grande do Sul. Ela ressalta ainda que, de lá para cá, as disputas entre público e privado assumiram formas mais sutis, como a da gestão privada de serviços públicos. E, na sua avaliação, a defesa desse tipo de “privatização” esteve bem presente na 16ª, por meio de propostas que visavam, por exemplo, melhorar a contratação em hospitais filantrópicos ou mesmo privados lucrativos. “Toda proposta que vem no sentido não de tornar público mas de melhorar o funcionamento do privado contratualizado é favorável ao privado”, opina. Entre as quatro únicas propostas recusadas na 16ª, nenhuma era sobre esse tema. Para Célia, esse é um desafio ainda pendente para o controle social porque, de modo geral, diz, o segmento de usuários luta por um serviço bem prestado e gratuito, mas não se importa muito se ele é oferecido pelo Estado ou por instituições particulares.

A verdade é que, entre as 329 propostas aprovadas, não houve grandes mudanças na relação entre público e privado que se construiu no SUS ao longo dos últimos 31 anos. Mas os temas priorizados no eixo relativo ao financiamento talvez indiquem que o fundamental dessa disputa está sendo travado em outro lugar, fora dos espaços da saúde. “Hoje, aqui em Brasília, qual é o nosso foco? É quebrar e derrubar a Emenda Constitucional 95”, resume Miguel Jacob, delegado da 16ª que participou da 8ª como convidado pelo Conselho Municipal de Saúde de São Paulo, referindo-se à legislação que estabeleceu um teto de gastos para o governo federal nos próximos 20 anos.

Proposta pelo então presidente Michel Temer e aprovada no Congresso Nacional, a EC não fala especificamente de saúde e não foi definida nos espaços de controle social ou mesmo de gestão do SUS. Mas foi contra ela, sem dúvida, que a 16ª Conferência Nacional de Saúde lançou seu recado maior. “Ela está judiando do SUS”, diz Miguel, que completa: “A gente vai mobilizar o Brasil para exterminá-la”. No relatório aprovado, as estratégias para isso foram diversas: mobilização no Congresso, apoio a uma Ação Direta de Inconstitucionalidade já apresentada ao Supremo Tribunal Federal, realização de um plebiscito para que a população decida, entre outros. O objetivo final, em todos os casos, é revogar a medida que, segundo cálculos da comissão de financiamento do Conselho Nacional de Saúde, fez o SUS perder R$ 12,3 bilhões em valores atuais entre 2016 e 2019, sendo R$ 4,4 bilhões apenas este ano. As propostas aprovadas nos municípios, estados e referendadas na etapa nacional mostram um desejo de mudança em todo o modelo de financiamento do SUS, reivindicando, principalmente, a ampliação da participação da União. Mas refletem também a clareza de que, num sistema subfinanciado desde a origem, a EC 95 pode funcionar como uma pá de cal.

A 16ª como resposta

A um modelo privatista e excludente, que não era capaz de garantir o mínimo de assistência à população brasileira, a 8ª Conferência Nacional de Saúde respondeu com o desenho de um sistema de saúde universal, integrado, descentralizado e de responsabilidade do Estado. Além disso, respondeu com uma mobilização social tão forte que ultrapassou os muros da Conferência e chegou até a Assembleia Constituinte, onde, embora com negociações, foi possível inscrever na Constituição o texto sobre saúde discutido e aprovado num espaço de participação social. Seu relatório final continha 48 propostas com sub-itens, divididas em três eixos temáticos – direito à saúde, reorganização do sistema de saúde e financiamento –, orientados por um tema transversal: ‘Democracia e Saúde’.
Pensada como ‘8ª + 8’, a 16ª repetiu os mesmos temas e eixos da conferência de 1986, mudando apenas a “reorganização” por “consolidação”. Após quatro dias de debates, aprovou um documento com 329 propostas sem muita polêmica – apenas 17 foram para votação na plenária final e somente quatro foram reprovadas, ainda no trabalho de grupos. Ao final, a maior divergência pública acabou se expressando na votação das moções – das 56 que chegaram à plenária, apenas uma foi recusada: a que pedia apoio ao projeto de lei do Estatuto do Nascituro.

Sobre sua capacidade de mobilização, as respostas são variadas. O único consenso é sobre a dificuldade da comparação entre dois momentos tão distintos na conjuntura brasileira e mundial. “Foi o conjunto da sociedade que construiu o SUS”, destaca Ary, lembrando a “mobilização nacional gigantesca” que antecedeu a 8ª. Conselheira nacional de saúde hoje e delegada também presente na 8ª pelo Rio Grande do Sul, Maria Laura Bicca destaca o esforço que o CNS fez agora para atingir e envolver a sociedade de forma mais ampla – por exemplo, promovendo conferências livres que, inclusive, elegeram delegados. Mas ela reconhece os limites do resultado. “Quem está aqui são os militantes do SUS”, diz, lamentando a distância em relação ao conjunto da população. 

“Nós temos uma característica do movimento social hoje totalmente distinta dos anos 1980”, explica Ary, citando o enfraquecimento dos sindicatos – derivado, entre outras coisas, do processo de desindustrialização do país, agravado pela recente reforma trabalhista – como um dos elementos importantes dessa mudança. Para ele, no entanto, isso não quer dizer que não houvesse movimento social na 16ª. “As conferências sempre foram forte fator de mobilização de segmentos sociais no Brasil inteiro. Indígenas, mulheres, representantes das religiões, sindicalistas, profissionais de saúde: estão todos aí”, enumera. Maria Laura destaca também a presença de novos grupos que não participaram com força da 8ª, como o Movimento LGBTQI e o Movimento de Moradores de Rua. Eni Carajás cita ainda a atuação dos militantes da Educação Popular em Saúde, “puxados pelo Mops”, o mesmo Movimento Popular em Saúde que ele representou na 8ª, entre outros. “Eu posso afirmar que a 16ª é completamente popular em relação à participação da sociedade”, garante. Miguel Jacob, delegado de São Paulo, vê inclusive um movimento de ascensão: “O povo voltou para essa Conferência. Eu participei da passada e não foi assim tão árdua, como está sendo essa”, opina.

Maria Inês tem dúvidas sobre essas análises: embora presentes, ela avalia que os movimentos sociais não estavam articulados na 16ª e isso, aponta, é uma diferença importante em relação à 8ª. “Você vê que o povo está aqui”, ressalta também Eunice, concordando, no entanto, que isso não é suficiente. “Fortalecemos o controle social. Garantimos a representação, mas não a participação popular de fato no sentido de fortalecer a base”, analisa. Para a psicóloga, o problema é que, para além da conferência, “a estrutura está muito burocratizada”. “Não estou negando a importância dos espaços institucionalizados, só estou dizendo que hoje a gente precisava de um outro movimento que desse sustentação a isso”, diz.

Se a conjuntura impõe tantas diferenças, de fato faz algum sentido falar em 8ª + 8? “É porque a 16ª já nasceu como resistência”, justifica Eni. “O fio condutor é a democracia”, explica Jussara Cony, convidada na edição atual e delegada da 8ª pelo Sindicato dos Farmacêuticos, argumentando que a importância maior da 16ª será o ‘dia seguinte’: “Essa conferência terá um papel estratégico porque cada pessoa que sair daqui vai voltar para as suas bases para reconquistar, para conversar com outras pessoas e exercer a pressão do controle social do SUS”, aposta. Também para Joaquina Amorim, do Sindicato de Odontologia da Paraíba, além de barrar a EC 95, a principal tarefa atual é contribuir para que o povo seja mais “consciente como cidadãos” e “lute por seus direitos”. “Não podemos deixar morrer esse movimento”, apela, lembrando que, na 8ª, “nós éramos mais destemidos”.

Mais destemidos e mais esperançosos, ressaltam praticamente todos os entrevistados. Com todas as contradições de uma conferência que contou com a presença de um presidente da República eleito pelo voto indireto mesmo depois de um movimento tão forte como as ‘Diretas Já’, em 1986 o caminho que se seguia era em direção à democracia, após mais de duas décadas de ditadura. Apesar da sobrevivência do aparato militar, inclusive de repressão, o momento era de esperança. “A gente sabia que tinha possibilidade real de fazer diferença”, lembra Eunice. E agora? “Tem que ser dado um pontapé inicial. Se não tivesse sido dado na 8ª, não chegaríamos a esta conferência. Então, eu acho que este é um momento histórico”, aponta Cleuza. “A única saída é a possibilidade de mobilização popular. É que essas frentes e movimentos que estão vivos hoje assumam o protagonismo desses processos. A única perspectiva que a gente tem de conter esse retrocesso anunciado é os movimentos das mulheres, dos negros, LGBTQI, da periferia, dos próprios sindicatos, junto com a militância dos profissionais de saúde, estarem engajados no SUS”, defende Ary. Do alto dos seus 71 anos, Gracinda não se sente com toda a energia que esbaldava na 8ª, mas não titubeia: “Eu ainda tenho força para modificar essa situação”, garante.

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