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Entrevista: 
Paolo Nosella

‘Uma boa escola é aquela em que realmente se ensina uma cultura desinteressada’

Nesta entrevista, realizada para subsidiar uma matéria sobre Escola Unitária, o professor Paolo Nosella, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), conta um pouco do cenário a partir do qual o italiano Antonio Gramsci desenvolveu esse conceito e, numa crítica à profissionalização precoce, polemiza com os educadores que defendem o ensino médio integrado à educação profissional.
Cátia Guimarães - EPSJV/Fiocruz | 26/08/2020 19h01 - Atualizado em 01/07/2022 09h42

O que é escola unitária?

Eu partiria da diferença entre unitário e único. Unitário é uma palavra que conota processo, dinâmica e, ao mesmo tempo, também extensão, ampliação. Unitário conota um processo de porvir, enquanto único conota algo estático, idêntico. Unitário é um porvir político, social,é um ato subjetivo que acontece. Se você pega o caderno 12 [da obra Cadernos do Cárcere] de [Antonio] Gramsci, você vê que ele usou duas vezes, nas primeiras páginas, [o termo] escola única. Só duas vezes. E ele usa isso para se referir à escola “unitária” que está acontecendo; portanto, não é a proposta dele. Quando ele fala de unitário, usa o termo 13, 14 vezes. A Itália, por exemplo, se tornou um Estado único, mas não culturalmente unitário. Unitário é um processo de se tornar. Gramsci fala de unitário também referindo-se ao próprio sistema escolar, [defende que] tem que ter uma certa unitariedade entre ensino básico e ensino superior. Tem que haver uma conotação unitária também entre o sistema educacional e a vida cultural da sociedade como um todo, entre [a experiência do] aluno na escola e a vida que ele passa na família, na rua. A unitariedade deve ser também política, entre dirigentes e dirigidos, como naquela belíssima metáfora do maestro de orquestra. Maestro de orquestra équem dá o começo da música, o ritmo da música, mas, na verdade, ele não começa antes de olhar nos olhos dos músicos. Ele está perguntando pelo olhar: ‘vocês estão prontos?’. Ou seja, ele está pedindo aos músicos licença para começar. Se percebe que os músicos fazem algum sinal de que não estão prontos, ele não vai começar. Essa é uma metáfora da unitariedade entre dirigentes e dirigidos. Tem que haver esse mesmo equilíbrio. É um pouco aquilo que [Gramsci] fala quando o militante se inscreve em um partido. Os dirigentes devem vê-lo como um outro dirigente, como um futuro dirigente, devem prepará-lo para ser um dirigente. E, finalmente, [refere-se] à unitariedade entre Estado, governo e nação, uma unitariedade produzida pela cultura, pela linguagem.

Então, voltando à questão entre único e unitário, o unitário é uma categoria muito mais rica, eu diria, dinâmica e complexa. Do ponto de vista, digamos, ontológico, [trata-se] da unitariedade entre teoria e prática. Porque o corpo e a alma humana formam um todo unitário, embora, às vezes, desequilibrado. Quando Gramsci fala que todo homem é intelectual, que todo ser humano é filósofo é porque qualquer mínima operação, mesmo que sejalavar pratos ou esfregar chão, é unitária com a teoria. Ninguém lava pratos sem ter uma teoria de como lavar pratos, ninguém esfrega o chão sem ter uma teoria de como esfregar chão… O contrário também: em todo trabalho teórico, de um jornalista, de um professor, de um estudioso, há esforço muscular nervoso. Para ficar aqui no computador, me dói a coluna; para estudar, você tem que ter disciplina. No trabalho chamado teórico,tem a parte muscular, física; e também no inverso, no mínimo exercício físico, tem a questão teórica. É a diferença entre o ponto de partida de Platão e Aristóteles. Para Platão,no ponto de partida já há  ruptura: um nasceu para ser mecânico e outro para ser filósofo, então já não há unitariedade. Para Aristóteles, não. Ele diz que, se você quer criar uma escola e ensinar às pessoas, tem que estabelecer de antemão se esse aluno vai ser dirigente ou dirigido, ou se vai ser ora dirigente e ora dirigido. Se você conclui que ele pode ser dirigente e também dirigido, tem que criar uma escola que [garanta a formação] de dirigente para todos. Esse é Aristóteles. Essa organicidade, essa unitariedade incipiente, ontológica, por condições históricas, se desequilibra, mas nunca se rompe.

Para um aluno que estuda no ensino médio ou no ensino fundamental 2, o trabalho é o estudo

Se você quer formar dirigentes de partido e percebe que esse militante já trabalhou na enxada a vida inteira e nunca viu um livro, provavelmente, é um livro que tem que dar para ele encontrar certo equilíbrio. Mas se é um jornalista de experiência, que só viu livro e nunca viu uma enxada, provavelmente o currículo dele tem que ser diferente, dependendo do objetivo que você quer. Se se quer alfabetizar uma pessoa que não sabe escrever o alfabeto formalmente, mas é alfabetizada no mundo, porque conhece a vida, já tem quatro, cinco filhos, aíalfabetizar é uma questão formal.Gramsci coloca essa questão: como devemos alfabetizar esse adulto? Não da forma como se alfabetiza uma criança, ou seja, o ABC da criança não serve para ele. A escola unitária encara o desequilíbrio do alunoà luzdo objetivo que eu tenho de formá-lo para ser dirigente ou, como diz Aristóteles, um dirigido que controla o dirigente.

O Sr. deu o exemplo de um militante político-partidário para tratar do equilíbrio entre a enxada e o livro. Mas,e na escola regular, de educação básica ou profissional, como se faz para recuperaresseequilíbrio original entre o trabalho teórico e prático?

Veja bem, Gramsci parte dessa expressão ‘escola única do trabalho’, que era utilizada na Rússia. Ele passou um ano e meio na Rússia: lá namorou, casou, fez filho... E afamília da Eugenia [namorada] era amiga da Krupskaya [pedagoga russa] e do[Vladimir] Lênin e militante da escola única do trabalho. Veja que o ‘único’que está lá colocado é do‘trabalho’. Agora, trabalho é uma palavra muito ambígua, porque você pode entendê-lo como atividade profissional, com que se ganha alguma coisa, mas, na verdade, trabalho para ele é o momento sintético de teoria e prática. Trabalho é práxis, é a fórmula onde teoria e prática se fundem. Posto isso, ele insiste em dizer que o trabalho dos jovens e das crianças era o estudo. Portanto, não é estudo e trabalho, o estudo é trabalho porque, ao mesmo tempo em que põe em funcionamento a cabeça, põe em funcionamento também os músculos. O trabalho da criança pré-escolar é jogo, é brincadeira. É pelo tato que o neném recém-nascido desenvolve o cérebro...Na Rússia, estavam preocupados, com razão, com a industrialização - por exemplo, a eletrificação da Rússia era um problema. E é aí que vem a questão da politecnia. Para um aluno que estuda no ensino médio ou no ensino fundamental 2, o trabalho é o estudo. Mas aquino Brasil ele tem que deixar o estudo porque tem que ir para o supermercado empacotar mercadorias. Esse empacotamento de mercadorias não é o trabalho dele, é desvio do trabalho. Ele abandona o trabalho próprio do estudo para uma atividade imprópria. O trabalho próprio dele éestudar. Agora, quando ele está no segundo, terceiro ano do colegial, de repente, por exemplo, o professor percebe que ele tem uma capacidade de redação maravilhosa. Dá um tema e, em 20 linhas, pede para o aluno escrever a síntese de um fato. E ele percebe uma tendência. Pode ser que nasça a partir daíum certo tipo de atividadeextra escolar própria à sua tendência profunda. Nas férias, já no ensino médio, no liceu, Gramsci perguntou para o professor,que era dono de um jornal, se podia mandar alguma reportagem para ele publicar. ‘Nossa, é claro que pode!’, ele respondeu. Veja bem a diferença disso para o momento anterior, quando estava no [ensino] fundamental e tinha que largar as horas de estudo para carregar livros para ganhar algum dinheiro para a família. Carregar livros de cartório,mais pesados do que ele, perdendo tempo do trabalho próprio dele que era o estudo. Não há organicidade, não há unitariedade com a escola, há desintegração. Mas quando, no final do colegial, ele escrevia aquelas redações como jornalista, mandando para o jornal, isso tem organicidade. Portanto, no final do colegial, é possível que surja alguma tendência que , profissionalmente, dê resultado.

Às vezes eu tenho bronca com [o projeto do] ensino médio integrado porque não faz essas distinçõesentre o trabalho próprio e impróprio. O aluno tem que optar [por uma profissão] porque o Instituto Federal é uma boa escola. Mas isso tem defeitos profundos e um deles é que o aluno deve a priori dizer qual é a sua tendência, que ele ainda não identificou. Me lembro quando eu falei para uma turma de ensino médio integrado de técnico agrícola  lá no Espírito Santo,  do terceiro ano. Todo mundo gostava da escola, ninguém queria sair. Daí ai eu falei: ‘Mas,amanhã, o que vocês vão fazer?’. E um aluno disse:‘Professor, eu estou aqui, eu não vou sair daqui, aqui é muito bom, mas eu vou dizer uma coisa para o senhor: eu gosto de ser fotógrafo’. E o olho dele brilhava. Então, não havia organicidade plena entre o estudo para técnico agrícola e seu desejo de ser fotógrafo. Por isso, o ensino médio integrado fez hoje o que eu chamaria de uma amputação esperta. Era ensino médio integrado à profissionalização, mas foi amputada essa segunda parte, deixaram só o integrado.  Mas essa amputação revela o pecado original, que deixa sequelas: à profissionalização.

O filho da minha empregada praticamente vinha todo o dia para a minha casa. Brincava sempre com a minha filha. A gente perguntava:' o que você quer ser?’. E ele respondia: ‘eu queria ser professor’ e olhava meus livros aqui e tal... Depois não veio mais. E quando voltei a perguntar o que ele queria ser, ele respondeu: ‘não sei, eu vou ser tapeceiro como o meu tio’. Nahora de falar que seria tapeceiro como o tio, eu senti como um recuo, uma frustração. Hoje, minha filha é professora de biologia em São Paulo e ele agora está com 30 anos tentando recuperar [o tempo], fazer o [ensino] médio. Minha filha pegava um livro, ia a uma palestra, ou seja, todas as atividades extraescolares estavam de alguma forma integradas, mas existem atividades extraescolares que não estão integradas, que nempermitem que o cara faça a lição de casa.

Professor, mas o próprio Gramsci fala em escola profissional. E, além disso, os defensores do modelo do ensino médio integrado argumentam, em alguma medida, que a escola profissional atende a uma expectativa e uma necessidade da sociedade que existe hoje. Eu queria que o sr. comentasse um pouquinho isso.

Essa é uma questão muito boa. Você assistiu ao filme ‘Pai Patrão’, dos irmãos Taviani? É um filme maravilhoso. O cara veio da Sardenha, analfabeto, passou a adolescência trancado com as ovelhas e, finalmente, no serviço militar,teve condições de estudar radiotécnico. Ele lutou e se tornou um linguista. É possível isso, mas esse não é, vamos dizer assim, o largo caminho das possibilidades… O passo a passo que esse jovem  teve  que dar foi muito mais difícil. Cabe aos dirigentes apontar a parte mais alta da montanha. Eu me lembro quando escalava montanha, o guia falava: ‘Cuidado com esse passo, o rio passa por aí, tem que passar por esse outro lado’. Mas,toda hora ele apontava com o dedo lá em cima, mostrando aonde tínhamos que ir. Esse apontamento que faltou para nós, ou seja, a esquerda não apontou com clareza a questão da escola unitária, que é um processo. E misturou, como se fizesse escola unitária também com politecnia. Politecnia teve um momento histórico. Essa politecnia nossa aqui, para mim, é mais uma torcida de identificação de um grupo, porque a politecnia teve o seu momento específico… Talvez fosse melhor lutarmos para a melhoria do ensino médio regular, pagando uma bolsa para os bons alunos do 3º ano, quando aumentam a tentação e a necessidade de abandonar o trabalho próprio do estudo para um  ‘trabalho’ impróprio do salário.

E que momento foi esse da politecnia?

Foi em Lênin. Houve uma grande discussão sobre a profissionalização precoce, numa situação de implantação do socialismo depois da guerra. São momentos. Lênin acabou concordando com Gramsci. Gramsci falou: ‘Veja, a Primeira Guerra Mundial foi de fato um elemento importante para a Revolução de 1917, foi o que preparou e possibilitou a revolução, mas…’. Aí vem o ‘mas’: ‘foi um momento importante para aquela revolução, não para toda revolução. A guerra não é o elemento essencial para qualquer tipo de revolução’.  Lênin aceitou [e disse isso] no seu último discurso: ‘De fato, não conseguimos traduzir a nossa mensagem profunda nas linguagens européias’. Ora, politecnia e [educação] tecnológica eram uma coisa muito importante naquele momento na Rússia. São expressões. Mas o que importa é o que você quer desse aluno, hoje. Trato disso no meu livro ‘Ensino Médio à luz do pensamento de Gramsci’, que tem um texto que também saiu em revista, chamado ‘Para além da formação politécnica’. O ensino médio integrado dos Institutos Federais é um curso bom, é muito melhor [do que o restante do ensino médio público], embora limite o direito do jovem adolescente à indefinição profissional. A defesa do [ensino médio] integrado tem um pecadinho original, que é o partidarismo burocrático, PT versus PSDB.  É um projeto especial no Brasil. Projetos especiais são próprios dos governos que pretendem se distinguir dos anteriores. No ensino médio integrado dos Institutos Federais deve ter mais ou menos 2%, 1% da  clientela do ensino médio regular do Brasil. Para fazer uma reforma do ensino médio, tem que pôr na mesa a totalidade de jovens que saem do ensino fundamental 2, o universo total, 100%. E perguntar: o que fazer com isso? Esse ponto de partida é o correto. Se o objetivo último é formar um cidadão dirigente, um cidadão, portanto, não  um subalterno,  em certas situações, o governo terá que pagar o trabalho próprio do estudo do aluno.Ou seja, em certas circunstâncias, em algumas situações sociais muito precárias, você tem que dizer para o jovem: o seu trabalho não é vender Coca-Cola, o seu trabalho não é ir fazer pacote, é ir estudar e fazer a lição que o professor te deu. [Para compensar] aquilo que você ganharia vendendo Coca-Cola, eu te dou uma bolsa, eu pago o seu trabalho do estudo. Agora, essa proposta não foi colocada. Depois,quando entra na universidade, aí a questão da profissionalização pode se colocar de uma forma mais objetiva. Enfim, a unitariedade do ensino básico, mais do que um currículo, é uma bandeira política.

Houve no passado um curso de ensino médio profissionalizante que teve sucesso: a escola normal. A escola normal foi um sucesso. Eu estou falando dos anos 1930. É claro que as pessoas que entraram no ensino médio normal diziam, como se diz hoje: ‘eu termino o ensino médio normal e tenho já o diploma para poder trabalhar e ainda posso ir  para a universidade’. Portanto, a ideia era poder ter esse diploma de professor primário e continuar para o ensino superior.  Agora, repare, o currículo eraforte em francês, história, filosofia... A conclusão é a seguinte: o grande prestígio dessa escola não provinha das disciplinas profissionalizantes, mas da parte do currículo de cultura geral. O grande prestígio não decorria da didática especial, nem da didática de alfabetização; o grande prestígio provinhada grande matemática, da grande literatura, inclusive, em língua original (francês)... Inclusive,  se você pegar os institutos de hoje, com ensino médio profissional integrado, o prestígio não vem da profissionalização, mas sim do fato de que é uma escola boa, que ensina para ir para a universidade. Ora, tudo isso a esquerda tinha que falar, partindo do universal e não apenas de um grupo, oferecendo uma clara proposta para 100% dos jovens que encerram o ensino fundamental 2.

E por que esse modelo não é universalizável?

Por exemplo, o ensino médio integrado tem seleção [para ingressar]. Mas não pode ter seleção no ensino médio público regular.  O ensino médio integrado tem expulsão, que não se chama assim, mas no fundo você pode mandar embora. Agora, como você manda embora o cara do ensino médio público? Tem avaliação, tem tempo integral, vão ser quatro ou três anos? Ou seja, há umas “nuances” que não são pequenas… Se é universal, tem que deixar isso claro. Quando se fala de jovem, tem que precisara idade, porque o ensino médio regular é de 15 a 18 anos. EJA [educação de jovens e adultos] é outra história. Estaríamos em uma situação diferente se a esquerda tivesse optado por não pegar só o ensino médio dos institutos. Aquilo é um projeto especial.

No seu livro sobre a Escola de Gramsci, o sr. aponta como uma das expressões  da elaboração do conceito de Escola Unitária em Gramsci o debate da Câmara Municipal de Turim sobre a reformulação do Instituto Profissional Operário.... Gostaria que o sr. falasse um pouco mais sobre esse processo: quem eram os atores, o que estava em jogo, quais eram as posições defendidas, qual a importância e a influência disso para além de Turim...

Era uma interlocução com a reforma de Giovanni Gentile. A questão de Gentile era salvar a pérola do sistema educação italiano, que era liceu clássico. E, para isso, precisava fazer com que este ambiente, o liceu clássico, não fosse invadido pelo ‘populacho’ (zavorra, em italiano). A ideia, então, era criar uma espécie de escoadouro, uma saída lateral, que eram as escolas técnicas. Assim, os melhores estudariam latim, grego, história, literatura, linguística, química, física e os outros iriam  para as escolas técnicas. Gramsci, que passou pelo liceu clássico, tem uma grande saudade desse lugar onde ele vivenciou a sua catarse cultural: ‘Porque a massa popular também não poderia ter isso?’, pergunta-se. Defende que é preciso achar uma outra disciplina moderna que tenha a força didática, pedagógica e formativa que o latim tinha na escola clássica. E acredita que não será muito fácil achar isso.

Na esquerda sempre houveuma grande ruptura, desde [Karl] Marx até hoje: uns defendendo a escola técnica e outros  a escola clássica.  O próprio Gramsci teve dificuldade. Havia militantes que achavam que ele estava propondo o ensino do latim na escola fundamental. Se nós não tivéssemos  medo de reconhecer essa ruptura, se colocássemos às claras isso, talvez encontrássemos o caminho de solução. Lá na minha cidade [na Itália], o ensino médio é quase um campus, bonito até. Sabe qual é a grande crítica que fazem os professores das áreas tecnológicas profissionalizantes? Do curso de música, por exemplo? Coisa mais técnica do que isso não existe, você tem que pegar o violino, ficar oito horas por dia no piano, tocando as teclas, não é uma coisa simples. As críticas que os profissionalizantes fazem é que, aos poucos, o curso está indo em direção ao clássico porque reforça a história da música,a filosofia da música, a crítica estética da música...E esse professortecnicista acha que o menino não precisa saber história da musica, só precisa  tocar violino o dia inteiro. Entretanto, os melhores cursos são aqueles que cada vez mais se parecem com o clássico, porque o clássico acertara um caminho. Essa introdução da história, da filosofia, da estética é um aproximar-se ao ensino desinteressado. Um grande regente de orquestra sugere: ‘o senhor toca violino, toca piano muito bem, então toque, mas aprofunde a história da música, a filosofia... porque, se não, você vai ser um excelente mecânico de teclas, mas não vai ser um criador, não vai ser um intérprete da música’. Saiu na Itália um ‘Manifesto da Utilidade do Inútil’ (NuccioOrdine, em italiano) – leia inútil como ‘desinteressado’. A tese é que a curiosidade desinteressada, ‘inútil’, foi a matriz das melhores invenções técnicas, as mais úteis. Porque, senum curso de agronomia, eu te ensino como se produz a laranja, isso é técnica. Você aprendeu aquilo e ponto final. Agora, é diferente se eu ensino como surgiu o campo e a cidade, se ensino a ciência da terra relacionada dialeticamente à ciência da cidade...  Ou seja, quando esse manifesto fala em inútil, não é o inútil vagabundo, é o desinteressado. Uma boa escola é aquela em que realmente se ensina uma cultura desinteressada.

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