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Arte e Saúde: Utopia

Evento na Escola Politécnica contou com mesas de debate, oficinas de diferentes temas, exibição de filme e peça teatral
Portal EPSJV - EPSJV/Fiocruz | 05/09/2018 15h50 - Atualizado em 01/07/2022 09h44

Com o tema ‘Utopia’, a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) promoveu, nos dias 3 e 4 de setembro, a 12ª edição do projeto ‘Arte e Saúde’. O evento contou com mesas de debate, oficinas, exibição de filme e peça teatral. “Desde que começamos, em 2003, já trabalhamos temas como memória, meio ambiente, loucura, dentre outros. Neste ano, não queríamos que utopia fosse algo futurista, mas sim, algo que vamos construindo”, ressaltou a professora-pesquisadora da EPSJV, Verônica Soares, que divide a coordenação do projeto com a também professora-pesquisadora da Escola, Marilda Moreira, e com a ex-aluna Thatiana Victoria Machado.

Com bastante emoção, os integrantes da mesa de abertura falaram sobre o incêndio que destruiu, no dia 2 de setembro, o Museu Nacional, no Rio de Janeiro. A maior parte do acervo – fósseis, múmias, registros históricos e obras de arte –, de cerca de 20 milhões de itens, foi totalmente destruída.  “O incêndio de ontem é muito difícil de engolir, esse luto da nossa história de 200 anos. E pensar que daqui a pouco a gente pode não ter arte no nosso currículo, que é o que forma nossa sensibilidade, o que nos ajuda a pensar a vida... A gente estar aqui resistindo é muito bom. A gente vai querer arte sim, a gente vai querer memória”, destacou Anakeila Stauffer, diretora da EPSJV.

Para Carlos Maurício Barreto, vice-diretor de Ensino e Informação da Escola Politécnica, em menos de 24 horas depois da perda de um patrimônio da humanidade, realizar o ‘Arte e Saúde’ significa reafirmar que a EPSJV é uma escola que acredita e continuará lutando permanentemente por outro tipo de educação. ”Num momento em que a Fiocruz discute a sua política de memória, é dramático que a gente assista a um desmantelamento da política de memória nacional que estava fortemente representada pelo Museu Nacional. Um povo sem memória é um povo sem alma”, lamentou.

Apresentações e debates

O grupo CApachos da Arte, formado por alunos do Colégio de Aplicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (CAp-UFRJ), apresentou a peça ‘A três passos do horizonte’, que busca demonstrar diversas inquietações com as utopias da sociedade atual. Após o espetáculo, os alunos participaram de um debate com os atores e diretores da peça e com as professoras-pesquisadoras da EPSJV, Nina Soalheiro e Helena Vieira.

Para Pedro Henrique Mattos, aluno do 3º ano do Ensino Médio, da habilitação de Gerência em Saúde, o grupo retratou por meio das cenas apreensões sobre as utopias da sociedade atual. Segundo ele, as cenas trouxeram temas que são de interesse da maioria dos estudantes e profissionais da Escola, como o assédio e os atos machistas. “A peça falou de coisas que acontecem no dia a dia dos estudantes, às vezes, no próprio ambiente escolar. As distopias como racismo e homofobia foram demonstradas brilhantemente pelos atores”, apontou Pedro, que completou: “Pelas críticas à sociedade atual, a atuação mostrou como o teatro pode contribuir para a formação de indivíduos capazes de transformar o mundo”.

O primeiro dia do ‘Arte e Saúde’ contou também com a exibição do documentário ‘Visages, Villages’, que retrata uma experiência fotográfica e cinematográfica da cineasta Agnès Varda e do fotógrafo JR sobre uma viagem da dupla pela França, em um caminhão adaptado como cabine fotográfica. O filme foi seguido pela mesa de debate ‘Deslocamentos perceptivos: sobre a imagem’, com o professor-pesquisador da EPSJV, Daniel Groisman, e a professora do Colégio Pedro II e ex-professora da Escola Politécnica, Lethicia Ouro.

Para Lethicia, o documentário fala de uma utopia não idealizada a partir do momento que a dupla coloca, no lugar de imensos cartazes de marketing com pessoas famosas e idealizadas, fotos de trabalhadores da cidade, suas esposas, de animais e de idosos. “A intenção da dupla parece ser dar invisibilidade a quem passa como invisível, como quando colam foto de três mulheres no porto onde somente trabalham homens”, opinou.

Segundo ela, a visibilidade dada nos grandes pôsteres colocados no vilarejo, muitas vezes no próprio local de trabalho, fez com que os retratados se tornassem o assunto da cidade. “A interferência estética é um pontapé de poder na política da comunidade. É o trabalhador que diz qual é a cara da cidade e não mais obedece a regras ideológicas impostas por uma elite”, afirmou.

Groisman falou sobre a questão da memória e da intergeracionalidade, que é a relação de uma pessoa idosa com alguém mais jovem. “O filme se constrói a partir de um encontro de artistas de diferentes idades e gerações. Isso se caracteriza com Agnès, de 88 anos, e JR, de 33”, explicou.

Para Groisman, o filme tenta dar rosto a paisagens, coisas e lugares que, a princípio, são impessoais. Groisman ressaltou que, de certa maneira, o documentário traz memórias individuais e as torna coletivas. “Será que a memória é algo privado ou coletivo? Esse filme brinca com isso. E onde está o lugar da memória na sociedade da obsolescência? Nos idosos, no Google?”, questionou.

Segundo dia

O segundo dia do ‘Arte e Saúde’ começou com diversas oficinas criadas, em sua maioria, pelos próprios alunos do Ensino Médio, com os seguintes temas: Mudas; O feminismo e as angiospermas; Mandalas; Terrário; Dança contemporânea; Lambe; Matemática utópica; e Jardim Sensorial.

Lorena Souza, do segundo ano de Biotecnologia, destacou o objetivo da oficina Jardim Sensorial que, segundo ela, buscou aguçar os sentidos das pessoas, fazendo com que conheçam novas texturas, cheiros e sons. “Nós vendamos as pessoas para que elas consigam identificar os alimentos que usamos no dia a dia através do cheiro, tato ou paladar. Também ensinamos sobre as propriedades medicinais de diversos alimentos, como a babosa, o gengibre e o alho”, afirmou.

Na parte da tarde, a mesa ‘A escola utópica: A educação que queremos’ reuniu as ex-alunas Júlia Barcelos e Amanda Nolasco, e o aluno Pedro Henrique Mattos. “O interessante é ver como o Politécnico nos apresenta a diversas coisas. É surreal a gente estar aqui e poder conversar sobre tudo. É um privilégio de poucos, mas não deveria ser”, lamentou Amanda, que completou: “A minha utopia para a educação é que todo mundo tenha a oportunidade que a gente tem aqui, de pode discutir sobre arte e sobre saúde fora da sala de aula. A minha utopia é que todos os alunos percebam a força que a voz deles tem”.

Para Júlia, a escola mudou a visão dela de que o público não é de ninguém. “O que é público é nosso e, por isso, precisamos ocupar espaços, denunciar o que não concordamos, mobilizar os estudantes. Eu acredito na educação como elemento de transformação da sociedade. Quando a gente se reeduca e educa o próximo, a gente pode transformar as nossas realidades”, ressaltou.

Na parte da noite, os alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA) da EPSJV participaram de seis oficinas – Ciclo da Semeadura; Utopia em Movimentos; Vida e (R) existência LGBT: a utopia de ser; Fotografias poéticas; Lutas e utopias; e Grafite: arte ou utopia?.  Segundo o professor-pesquisador Marcello Coutinho, na oficina Ciclo da Semeadura, por exemplo, a proposta foi mostrar a utopia como algo que germina, que transcende gerações e é construída coletivamente. “No final do encontro, os alunos apresentaram o que foi realizado em cada oficina. Tivemos também uma mística da utopia com os participantes do Ciclo da Semeadura, que distribuíram girassóis em uma metáfora de continuidade para que a gente permaneça caminhando e acreditando que a luta vale e que a utopia pode ser conquistada”, contou.

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