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Encontro de Cuidadores de Idosos discute regulamentação da profissão

Projetos de lei em discussão na Câmara dos Deputados estiveram no centro do debate que reuniu cuidadores de idosos, professores e pesquisadores do tema.
Julia Neves - EPSJV/Fiocruz | 25/10/2017 11h05 - Atualizado em 01/07/2022 09h45

Mobilizar a categoria de cuidadores de idosos para discutir os desafios no cotidiano do trabalho e as questões relacionadas à regulamentação da profissão: esses foram os objetivos do VI Encontro de Cuidadores do Estado do Rio de Janeiro, realizado no dia 20 de outubro, na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Promovido pela Associação dos Cuidadores da Pessoa Idosa, da Saúde Mental e com Deficiência do Estado do Rio de Janeiro (Acierj), em parceria com a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) Universidade Aberta da Terceira Idade (UNATI-UERJ) e Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência (CDDP-OAB-RJ), o evento reuniu profissionais, professores e pesquisadores do tema de todo o país. Na ocasião, foi produzida uma carta que será entregue ao Senado, com apontamentos sobre o Projeto de Lei 11/2016, que trata da regulamentação.

Na mesa organizada para discutir esse tema, Daniel Groisman, professor-pesquisador da EPSJV/Fiocruz, afirmou que, embora não tenha sido regulamentada a profissão, o mercado de cuidador não para de crescer, mas sem as necessárias garantias: “Uma das vantagens de regulamentar uma profissão é que você define as atribuições e que tipo de formação e escolaridade a pessoa deve ter para exercer o trabalho. É isso que uma lei que cria uma profissão basicamente define”, explicou.

Segundo Groisman, o PL 11/2016 que está avançando agora na Câmara - criando e regulamentando as profissões de Cuidador de Pessoa Idosa, Cuidador Infantil, Cuidador de Pessoa com Deficiência e Cuidador de Pessoa com Doença Rara - não passou por um amplo processo de debates e, em função disso, traz alguns problemas para categoria. Ele lembrou que também tramita na mesma Casa Parlamentar um outro PL, nº   4.702/2012, que previêa regulamentação dos cuidadores. Este, segundo o professor, teve o texto amplamente discutido em audiências públicas, mas está parado aguardando apreciação da Câmara dos Deputados. plenário .

“O PL 4.702/2012, inicialmente, previa a criação da profissão de cuidador da pessoa idosa, porém, um dos relatores chegou a propor que o foco do projeto mudasse pra criar a profissão de cuidador social, que abrangesse diferentes dimensões e públicos do cuidado, idosos, crianças, pessoas com deficiência”, contou. Já o PL 11/2016 não pretende criar uma categoria unificada, trabalhando, de acordo dom o professor, com a lógica da segmentação e da especialização. “Isso pode ser interessante pelo lado da especialização, mas pode enfraquecer a categoria porque são profissões diferentes que estão sendo criadas. Isso facilita a fragmentação”, analisou.

O projeto possui alguns problemas no que diz respeito aos requisitos para o exercício da profissão, segundo Groisman. Pelo texto, os profissionais devem ter ensino fundamental completo e curso de qualificação na área, além de idade mínima de 18 anos, bons antecedentes criminais, e atestados de aptidão física e mental. “São exigências que eu não vejo aparecerem em profissões análogas do campo dos cuidados. Por que aos cuidadores se impõe essa condição? Se o cuidador adoecer no trabalho - e alguns cuidadores adoecem em função das condições difíceis de trabalho -, será que ele vai ser demitido por justa causa?”, questionou.

Para o professor, existem vulnerabilidades também em relação aos antecedentes criminais: “Se a pessoa sofreu uma condenação, fica proibida para o resto da vida de trabalhar como cuidadora? Em tempos de crescente judicialização das relações sociais, essa questão da criminalização pode representar um problema”.

Sobre os direitos trabalhistas, Groisman apontou outra novidade que aparece no PL 11: – os cuidadores poderão ser contratados como microempreendedores individuais (MEI). Hoje, eles são regidos pelas leis do trabalho doméstico, quando contratado por pessoa física, ou pela Consolidação das Leis do Trabalho, quando contratado por pessoa jurídica. “Será que as pessoas vão deixar de assinar as carteiras para contratar como microempreendedor individual? Acho que é interessante esclarecer esses pontos para que essa profissão, que é supernecessária, cuja regulamentação considero urgente, possa receber o seu devido reconhecimento social”, concluiu.

Caio Souza, advogado e secretário da comissão de defesa dos direitos da pessoa com deficiência, concorda com as críticas. Para ele, o projeto de regulamentação da profissão é segregador e não dá abertura para discussão sobre quem é o cuidador, quais as suas atribuições e qual a sua jornada de trabalho: “Nada disso é discutido. Então vai passar um projeto de lei, como esse que está no Senado, no qual o cuidador que tiver antecedentes criminais não pode exercer a profissão ou terá terá que abrir uma microempresa para ser contrato, por exemplo”.

Mas, também segundo Caio, a regulamentação é um passo importante, que traz benefícios, como a definição dos direitos e dos deveres desses profissionais. “Em relação aos direitos, as jornadas de trabalho têm que ser definidas. E aos deveres, o cuidador, por exemplo, que fez uma medicação oral de forma equivocada e o paciente teve uma reação, vai responder por isso. Precisamos definir muito bem isso”, alertou.

A ideia de regulamentar a profissão é dar condições de trabalho para o cuidador para que a pessoa seja cuidada, afirmou Caio. E completou que, para isso, é preciso discutir cidadania e dignidade: “Cidadania e dignidade são fundamentos da nossa Constituição. E com esse PL, não se garante isso para o cuidador, que é quem está na ponta, nem para a pessoa que será cuidada”.

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