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EPSJV desenvolve ações de cooperação com o Haiti

Inserção de agentes comunitários nos serviços e formação em saúde ambiental são as duas linhas de atuação da Escola.
Cátia Guimarães - EPSJV/Fiocruz | 10/11/2011 09h00 - Atualizado em 01/07/2022 09h47

O Brasil participa de diversas ações de cooperação para reestruturação do Haiti, sobretudo depois do terremoto que destruiu parte importante do país em janeiro de 2010. E a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) tem atuado em dois desses projetos: um voltado para a consolidação de estratégias de saúde comunitária e outro focado na saúde ambiental, com vistas ao fortalecimento da agricultura camponesa.



Inserção de ACS



Em outubro deste ano, a professora-pesquisadora Vera Joana Bornstein, que é uma das coordenadoras do curso técnico de agente comunitário de saúde da EPSJV, visitou o Haiti junto com pesquisadores da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz) e do Ministério da Saúde do Brasil para ajudar na inserção de 58 ACS no serviço de saúde do país. Trata-se de um Acordo de Cooperação Técnica Tripartite entre Brasil, Cuba e Haiti. Esses trabalhadores, que fizeram um curso ministrado por profissionais da Escola de Formação Técnica em Saúde Professor Jorge Novis (ETSUS Bahia) no próprio Haiti, são supervisioados por uma equipe composta por um médico, formado em Cuba, dois enfermeiros e quatro auxiliares de enfermagem.



A oficina realizada pelos pesquisadores da Fiocruz incluiu a discussão sobre a organização do trabalho, uma visita à área em que eles vão atuar — na região de Carrefour, em Porto Príncipe — e uma aula específica sobre educação popular e promoção da saúde, da qual participaram tanto os ACS quanto a equipe de supervisão. Essa aula mais teórica partiu do trabalho de campo, problematizando o que os agentes haviam observado durante a visita.



Segundo Vera Joana, o trabalho desses agentes inseridos no sistema de saúde haitiano será muito parecido com o que fazem os ACS brasileiros. Eles devem realizar visitas domiciliares, cadastramento e mapeamento de usuários, com foco no trabalho de educação em saúde. Mas devem também ser responsáveis pela detecção de pessoas com problemas de saúde que precisem de acompanhamento. A ideia é que a equipe tenha como referência mini-hospitais comunitários que ainda serão construídos com recursos do governo brasileiro, nos moldes das Unidades de Pronto Atendimento (UPAs). Mas essa infraestrutura de referência ainda é, segundo Vera Joana, um desafio para a continuidade do trabalho: o terreno onde seria construído o mini-hospital da região de Carrefour, por exemplo, está ocupado por pessoas que ficaram desabrigadas após o terremoto.



O projeto de apoio à inserção dos agentes haitianos deve continuar, tanto como reforço ao grupo de trabalhadores que começaram agora a atuar quanto com outros grupos, que continuarão vindo fazer a formação no Brasil.



Saúde ambiental



A EPSJV também participou, em agosto deste ano, do ‘Projeto de Intercâmbio sociocultural em agroecologia para jovens haitianos no Brasil’, ministrando um módulo de saúde ambiental. O projeto, que é uma parceria entre o governo brasileiro, a Via Campesina e movimentos camponeses do Haiti, teve duração de um ano e foi dividido em quatro fases, sendo a última restrita à avaliação. O primeiro passo foi ensinar noções de língua portuguesa, de modo que eles pudessem acompanhar todas as atividades. Ainda nessa primeira fase, os haitianos tiveram aulas de economia política e sobre a questão agrária brasileira. Num segundo momento, eles foram divididos em grupos de vivência em assentamentos e outros espaços de atuação de movimentos sociais do campo no Brasil. Foi da terceira etapa, dedicada à qualificação técnica desses jovens em agroecologia — certificada pelos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (Ifets) —, que a EPSJV participou.



Durante uma semana em Quissamã (SE) e outra em Maringá (PR), quatro professores-pesquisadores da EPSJV desenvolveram aulas teóricas e atividades práticas com as turmas. “Nós nos perguntamos muito o que era possível tratar em uma semana de curso. Levamos muitos materiais prontos, como artigos e aulas preparadas, mas, sobretudo, fomos com muita disposição de ouvir e construir as estratégias na hora”, conta Gladys Miyashiro, responsável pelo módulo junto com os pesquisadores Andre Burigo e Alexandre Pessoa e o estagiário Thiago da Cruz, todos da EPSJV. Ela destaca que, além de condensar o conteúdo, a grande dificuldade era não conhecer de perto a realidade do país.



Além de pesquisar material de referência sobre a situação de saúde do Haiti pós-terremoto, os professores buscaram informações com integrantes brasileiros da Brigada Dessalines, que atua no Haiti há muito tempo. “Identificamos, por exemplo, que as questões da água e do saneamento, de modo geral, eram fundamentais para eles. Por isso, além das aulas teóricas, fizemos, por exemplo, oficinas de saneamento, atividades de identificação do caminho das águas em territórios de assentamento e reconhecimento de estratégias de captação de luz solar para o aquecimento da água”, explica André Burigo. Para que se tenha uma ideia da gravidade desse problema no Haiti, de acordo com o pesquisador, os rios, que são uma das principais fontes de água do país são, ao mesmo tempo, o principal foco de epidemias.



Os conteúdos do módulo foram selecionados também a partir da experiência que a Escola tem com curso técnico de nível médio em vigilância em saúde e com a especialização técnica em saúde ambiental para a população do campo. Foram tratados temas como processo saúde-doença; determinação social da saúde; produção saudável; saneamento ambiental e ecológico; e alimentação relacionada à promoção da saúde, que tratou da questão dos agrotóxicos. Gladys, no entanto, destaca a importância da abordagem política associada ao conhecimento técnico em toda a formação que esses grupos tiveram. Ela conta que se surpreendeu, por exemplo, com o fato de eles terem uma visão do Haiti muito menos ‘catastrófica’ do que aquela que mostram os indicadores. “Eles não se reconheciam nas estatísticas que apresentávamos, nem reconheciam a situação do país no contexto da América Latina”, explica, completando que, por outro lado, eles são muito críticos em relação às ações militares e de ajuda humanitária que ocupam o Haiti.