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EPSJV inicia nova turma do Curso Técnico em Agente Comunitário de Saúde

Grupo de estudantes é formado por trabalhadores do Sistema Único de Saúde de oito municípios do estado do Rio de Janeiro
Talita Rodrigues - EPSJV/Fiocruz | 17/03/2016 00h00 - Atualizado em 01/07/2022 09h46

A Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) iniciou a formação de mais uma turma do Curso Técnico em Agente Comunitário de Saúde (CTACS). O grupo de alunos é formado por trabalhadores que já atuam como ACS em oito municípios do estado do Rio de Janeiro. A EPSJV oferece o curso técnico desde 2008 e já proporcionou a formação técnica para 234 ACS no estado. “O que nos chamou a atenção neste processo seletivo foi que mesmo os que são mais novos na profissão também buscaram a formação, mesmo sabendo que o tempo de serviço era um dos critérios de seleção. Isso mostra que eles sentem a necessidade da formação e tem interesse em se qualificar”, observa Cristina Morel, que coordena o CTACS juntamente com Mariana Nogueira e Camila Borges. 

O processo de seleção dos alunos levou em conta o tempo de serviço comprovado de cada um - os que têm mais tempo têm prioridade na formação - e uma carta de intenção apresentada pelos candidatos na qual eles tinham que falar sobre a importância de fazer o curso para a categoria e para o Sistema Único de Saúde (SUS); dizer se participavam de movimentos sociais e contar um pouco de sua experiência como ACS. “O critério do tempo de serviço é uma solicitação do sindicato dos ACS do município do Rio de Janeiro para que os mais antigos fossem contemplados. Como a formação é um direito, mas, infelizmente, não é para todos, ouvimos o movimento social da categoria”, diz Mariana, acrescentando que o processo seletivo teve 596 inscritos e foi a maior procura desde 2008. “Isso mostra a importância da formação para eles, que acham que os cursinhos que fazem em serviço não são suficientes. Os ACS procuram uma formação técnica, mais complexa e profunda”.

“Procurei a formação porque comecei a trabalhar como ACS, em 2001, com pouco conhecimento. Meu interesse era buscar o que estava oculto, porque a gente aprende na prática, mas não conhece a teoria. A gente não sabe sobre ética, política, as diretrizes do SUS”, diz a aluna Márcia Marques Gomes, que trabalha como ACS em São Gonçalo (RJ) e só tinha feito o curso introdutório para começar a trabalhar.

Segundo Mariana, a turma de 33 alunos tem um perfil diferente das anteriores, pois grande parte deles atua ou já atuou em movimentos sociais e são mais sensíveis às discussões do curso. “É uma turma extremamente participativa. A gente conversa muito com eles sobre a responsabilidade de levar a formação técnica como uma luta para o seu território. Para eles, o curso é uma oportunidade de aprender e fazer mais pelo território em que atuam”. “Nas cartas de intenção, muitos candidatos disseram que entendem que a formação também tem um interesse social”, completou Cristina.

O CTACS está alinhado à missão institucional da Escola Politécnica de formar trabalhadores para o SUS, fortalecendo o Sistema Único de Saúde. “A gente está proporcionando o acesso à formação para adultos trabalhadores de uma política pública do SUS, que é a Estratégia Saúde da Família. E também para uma fração da classe trabalhadora, que é essa que está na periferia e tem muita dificuldade de acesso a qualquer tipo de direito”, destaca Mariana, lembrando que, historicamente, o processo de formação dos ACS é realizado nos próprios serviços de saúde, em função dos problemas locais e visando a preparação para as atividades a serem executadas. “É fundamental reconhecer que o ACS é um trabalhador precarizado e que o investimento na formação técnica desta categoria profissional fortalece a luta e a organização política dos trabalhadores na efetivação de seus direitos”, completa Mariana. “A formação técnica é importante pra gente se colocar como profissional porque os agentes de saúde são muito discriminados na equipe. Não olham para gente como profissionais”, observa Márcia, que é contratada, dentro das normas da CLT, pela Fundação Municipal de Saúde, assim como todos os ACS que trabalham em São Gonçalo. Ela e mais três ACS do município que também fazem parte da turma do CTACS serão as primeiras profissionais da categoria em São Gonçalo a ter a formação técnica. Márcia, que também é a representante dos 44 ACS da unidade de saúde em que trabalha no Sindicato Municipal dos Agentes Comunitários de Saúde de São Gonçalo, espera que a formação técnica também traga uma melhoria salarial para esses trabalhadores.

No município do Rio de Janeiro, os ACS que têm a formação técnica recebem uma gratificação salarial. “Hoje, os agentes que já são técnicos em ACS e os que são técnicos em Enfermagem, que são uma grande parte da categoria, já recebem uma gratificação”, diz o aluno Felipe Vieira dos Santos, trabalha como ACS desde 1999 e também é secretário geral do Sindicato dos ACS do Município do Rio de Janeiro. Na cidade, trabalham cerca de cinco mil ACS, todos contratados por meio de Organizações Sociais.

Processo formativo

Segundo a coordenação do CTACS, a manutenção do curso como uma formação regular oferecida pela Escola Politécnica, desde 2008, fomenta diversos processos na Escola tanto em relação às questões sobre ensino e aprendizagem do educando trabalhador inserido no SUS, quanto em relação às diferentes frentes de atuação protagonizadas por esta instituição. “A execução de turmas do CTACS na EPSJV subsidiou a produção de material didático para docentes do CTACS, que pode ser utilizada em âmbito nacional pelas Escolas Técnicas do SUS (ETSUS), e processos permanentes de pesquisas, publicação de artigos, organização de eventos junto a trabalhadores ACS sobre a formação técnica e organização política. Além disto, possibilitou o fomento de discussões sobre as experiências implantadas pelas ETSUS”, ressalta Mariana.

A turma atual do CTACS é formada por ACS que atuam nos municípios de São Gonçalo, Duque de Caxias, Nova Iguaçu, Belford Roxo, São João de Meriti, Mesquita, Magé e Rio de Janeiro. Em algumas dessas cidades, a formação técnica irá proporcionar aos ACS uma melhoria salarial, pois, quando eles se tornam técnicos, tem o salário equiparado ao do técnico de enfermagem ou do técnico em Saúde Bucal, o que também os fazem se sentir mais valorizados profissionalmente e reduz um pouco a precarização do trabalho, tão frequente no caso desses profissionais. “Na comprovação do tempo de serviço, ficamos impressionados com a quantidade de rupturas empregatícias e a diversidade de vínculos deles, alguns são contratados por OS, outros por cooperativas e alguns são servidores municipais. A heterogeneidade de vínculo ainda é muito presente nessa categoria profissional, principalmente no município do Rio de Janeiro. Eles tiveram dificuldade em comprovar o tempo de serviço porque são várias contratações em um curto período, isso é mais uma expressão da precarização do trabalho”, diz Mariana.

A expectativa pela formação técnica pode ser percebida logo no primeiro dia de aula do CTACS, quando os alunos participaram de uma dinâmica proposta pelos professores, na qual deveriam montar uma árvore com suas expectativas em relação ao curso. “Ao final da atividade, eles disseram que trouxeram ansiedade e levaram esperança. Eles relataram muito sofrimento no trabalho, não valorização e dificuldades de integração com a equipe, mas disseram que a Escola é um espaço de esperança para eles, uma nova fase da vida”, conta Mariana.
A expectativa de Felipe é que após se tornarem técnicos de saúde, os ACS sejam mais respeitados em suas equipes de trabalho. “Hoje, nos tratam como se o ACS fosse uma categoria menor. Existe um preconceito, uma barreira, que esperamos romper com a formação técnica. Poderemos ter um diálogo mais técnico com os profissionais de nível superior da equipe, que hoje nos tratam de forma pejorativa e humilhante”, conta o agente de saúde.

Curso

As aulas do CTACS tiveram início no dia 29 de fevereiro e devem ser concluídas em junho de 2018, totalizando 1340 horas de formação, com aulas duas vezes por semana, em período integral. Nos dias de aula, que acontecem na EPSJV, os ACS são liberados do trabalho para estudar. O curso é dividido em três etapas - Construção histórica do trabalho do ACS: políticas públicas, território e educação em saúde (Etapa I); Organização da Atenção Básica e a atuação do ACS: o cuidado e a educação em Saúde da Família (Etapa II); e Trabalho do ACS e participação política: educação e cidadania em saúde (Etapa III). O corpo docente do curso é formado por profissionais de diversos setores da EPSJV.

Para essa nova edição do curso, a equipe do CTACS fez oficinas de revisão curricular para discutir a inclusão de novos conteúdos e componentes curriculares e a maior integração entre eles durante a formação dos alunos. Nessa discussão, foi definida a criação da Oficina de Cultura, que tem o objetivo de possibilitar ao ACS, a partir do contato com diferentes expressões culturais, problematizar sua condição de vida, seus valores e interesses, enfatizando a reflexão sobre a formação social brasileira sob o ângulo do debate cultural, além de discutir a importância da cultura para a reflexão sobre os direitos humanos. Além dessa oficina, já fazia parte do currículo do curso a Oficina de Leitura, que visa fortalecer a compreensão de textos e o aprimoramento da escrita por meio de atividades de leitura e redação com os alunos, auxiliando-os na elaboração do Trabalho de Conclusão do Curso e visando fortalecer o protagonismo dos ACS no trabalho em equipe, auxiliando-os na proposição e argumentação de ideias e projetos. Essas oficinas são estratégias de articulação entre a formação geral e a formação em saúde.

Ao longo do curso, é trabalhada com os alunos a ideia da prática profissional, articulando a realidade do território com o conhecimento adquirido em sala de aula. O trabalho da prática profissional, que atravessa o curso como um todo, é acompanhado por três preceptores, com experiência em Educação Popular e Educação Popular em Saúde, e que também são responsáveis pela orientação dos alunos para o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). “As práticas profissionais são momentos de investigação e reflexão sobre a prática, sobre o que está acontecendo no mundo. Também tem um trabalho de formação politécnica, no sentido de pensar o mundo criticamente e o lugar deles como trabalhadores”, explica Mariana.

Também como parte dessa revisão curricular, a equipe do CTACS está realizando discussões com a equipe da Educação de Jovens e Adultos (EJA) da EPSJV sobre o aprendizado do aluno adulto trabalhador e a elaboração de um material didático específico para as próximas turmas do curso.

Zika

No momento em que o país vive uma emergência sanitária, a formação dos ACS também discute as estratégias de combate e prevenção da Zika. “A questão da identificação dos sinais e sintomas da doença já está muito batida nos cursinhos que eles fazem em serviço. O que a gente vai trabalhar especificamente é a reflexão sobre os motivos disso e por que a doença aparece em alguns locais e outros não. É olhar essa doença sob a perspectiva dos Determinantes Sociais da Saúde”, diz Mariana.

Para aprofundar essa discussão, será realizada ainda no primeiro semestre do ano, uma aula pública com o tema “Desigualdade, Saúde e Cidade”, com o objetivo de mostrar a questão da epidemia não apenas com foco no mosquito e nos hábitos das pessoas, mas sim, a partir do ângulo das desigualdades sociais e de saúde.

Formação

Essa é a décima turma e a quarta vez que a EPSJV oferece o Curso Técnico de ACS. Em 2011, a EPSJV concluiu a formação da primeira turma de ACS da região Sudeste a fazer um curso técnico. Foram formados ACS que atuam na região de Manguinhos, na cidade do Rio de Janeiro. Em dezembro de 2012, a EPSJV concluiu a formação de sete turmas, com a participação de 210 ACS que atuam no município do Rio de Janeiro. Esse foi o segundo grupo de trabalhadores da categoria no estado que recebeu formação técnica completa, conforme determinam os referenciais curriculares do Ministério da Educação (MEC), que regulamentam a formação desses profissionais. A terceira oferta do curso foi concluída em 2014, com a formação de 31 ACS que atuam nos municípios do Rio de Janeiro e Duque de Caxias (RJ).

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