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Quem sustenta o desenvolvimento sustentável?

Tema foi debatido durante palestra para alunos do Programa de Educação de Jovens e Adultos de Manguinhos.
Talita Rodrigues - EPSJV/Fiocruz | 26/10/2010 09h00 - Atualizado em 01/07/2022 09h47


 “O que é desenvolvimento sustentável para vocês?”. Com essa pergunta, o professor-pesquisador da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) e mestre em Engenharia Ambiental, Alexandre Pessoa, iniciou a conversa sobre o tema para os alunos do Peja (Programa de Educação de Jovens e Adultos), em Manguinhos, Rio de Janeiro. O evento foi realizado no dia 19 de outubro e fez parte das atividades organizadas pela EPSJV para a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia 2010, que teve como tema ‘Ciência para o Desenvolvimento Sustentável’. Para alguns alunos, desenvolvimento sustentável é aquele que acontece sem agredir o meio ambiente. Outros disseram que a abordagem sobre isso pela imprensa não é muito esclarecedora.



Alexandre explicou que ‘desenvolvimento sustentável’ é definido como um “desenvolvimento que dê resposta às necessidades do presente, sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras darem resposta às suas próprias necessidades". A expressão surgiu pela primeira vez em 1987 no Relatório de Brundtland, produzido pela Comissão Mundial para o Ambiente e Desenvolvimento, presidida pela então primeira-ministra da Noruega Gro Harlem Brundtland. “Mas a geração atual está sendo atendida em suas necessidades? Isso é muito subjetivo. O que é necessário para um pode não ser para outro. Cada um tem que ser atendido em sua necessidade real. Moramos todos no mesmo avião, o planeta Terra, mas alguns estão na primeira classe, outros no bagageiro”, comparou Alexandre. “E outros já foram até expulsos”, completou um dos alunos do Peja, que tem é realizado em parceria pela EPSJV.



Para Alexandre, a expressão mais adequada seria ‘sustentabilidade socioambiental’, com sociedades saudáveis e sustentáveis. “Vocês acham que as cidades são sustentáveis?”, perguntou o professor aos alunos. Uns responderam que sim, já outros acham que não. “Se não fossem sustentáveis, as cidades iriam colapsar e surgiria uma nova proposta, mas as cidades sobrevivem na sustentabilidade da desigualdade. Outra relação delicada, segundo ele, é a das grandes empresas com o meio ambiente. “As empresas até fazem ações socioambientais, mas desde que isso não interfira no lucro. Se interferir, eles não fazem”, disse Alexandre.



O professor também mostrou para os estudantes do Peja que, apesar de ter ganhado mais destaque na imprensa recentemente, a questão do meio ambiente não é recente. O livro ‘Um sopro de destruição – Pensamento político e crítica ambiental no Brasil Escravagista (1786-1888)’, de José Augusto Pádua, mostra que ainda no século 18, diversos abolicionistas, como José Bonifácio e Joaquim Nabuco, já criticavam o modelo de ocupação portuguesa no Brasil colonial, que era baseado em muitos desmatamentos que geraram impactos para o meio ambiente. Em outro livro, ‘Colapso – Como as sociedades escolhem o fracasso ou o sucesso’, o autor Jared Diamond mostra como as sociedades são sucumbidas ou bem-sucedidas de acordo com seu relacionamento com a natureza. Um dos casos abordados na obra conta como a sociedade Maia acabou por causa das agressões à natureza. “O desmatamento foi causando falta de água, o fim da agricultura e a sociedade entrou em colapso. A população se dispersou, começaram os conflitos e a cultura Maia se perdeu”, contou Alexandre.



Mas reverter uma situação de devastação também é possível: basta uma decisão ambiental. Como exemplo, Alexandre citou o caso da Floresta da Tijuca, no Rio de Janeiro, que teve grande parte de sua vegetação desmatada para o plantio de café. Quando essa devastação começou a afetar o Império, com a falta de água, o Imperador Pedro II pediu uma solução para o problema. “No início, decidiram buscar água mais longe, construir dutos e continuaram a fazer o desmatamento. Até que surgiu a ideia do reflorestamento, que foi feito por mais de 50 anos e gerou a maior floresta plantada do mundo. Com isso, a água voltou e a qualidade do ar melhorou. Foi uma solução sustentável, a partir de uma decisão ambiental do Imperador”, contou Alexandre.



Já os piscinões construídos no Rio de Janeiro há alguns anos — e que alguns alunos disseram frequentar — foram apontados por Alexandre como uma solução não sustentável. “O piscinão de Ramos é chamado de Parque Ambiental, mas é solução ambiental insalubre. Não tem banheiros suficientes, é um piscinão de esgoto. Não foram usados critérios ambientais e sanitários para a sua construção”, destacou Alexandre.



Agrotóxicos



O professor também falou sobre outra questão relacionada ao desenvolvimento sustentável: o uso de agrotóxicos. Ele destacou que o modelo de agronegócio adotado pelo Brasil faz do país o maior consumidor de agrotóxicos do mundo. “A indústria do agronegócio brinca de Deus. Eles desenvolvem as sementes transgênicas e criam um agrotóxico que mata tudo, menos a semente geneticamente modificada. E ainda causa poluição atmosférica, do solo, da água”, explicou. Sobre esse tema, Alexandre mostrou aos alunos o livro ‘Primavera Silenciosa’, de Rachel Carson, lançado em 1962 nos Estados Unidos. A obra mostra como o pesticida DDT penetrava na cadeia alimentar e acumulava-se nos tecidos gordurosos dos animais, inclusive do homem, com o risco de causar câncer e dano genético. O livro provocou grande polêmica ao ser lançado e o DDT deixou de ser usado nos EUA em dois anos. “O Brasil ainda levou dez anos para acabar com o DDT. Mas saiu esse pesticida e passaram a usar outros agrotóxicos”, disse Alexandre.



As atividades organizadas pela EPSJV na Semana Nacional de Ciência e Tecnologia 2010 foram encerradas no dia 22 de outubro com o debate ‘A dragagem dos canais do Fundão e do Cunha e os impactos socioambientais na Sub-bacia do Cunha’, realizado na EPSJV. O evento teve a participação da coordenadora de Educação Ambiental da Subsecretaria de Projetos e Intervenções Especiais da Secretaria de Estado de Ambiente (SEA) do Governo do Rio de Janeiro, Ana Maria Santiago; do professor-pesquisador da EPSJV, Alexandre Pessoa Dias; e do presidente da Associação de Moradores do Parque Carlos Chagas, Paulo Raimundo (“Paulinho Varginha”).