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Entrevista: 
Euzebio Jorge de Souza

‘No Brasil, o jovem não tem opção de não procurar emprego’

Em breve, o Brasil pode ganhar uma nova carteira de trabalho, com uma mudança de forma e conteúdo: em vez da velha capinha azul, um design verde e amarelo; ao invés de direitos trabalhistas, o direito a não ter direitos, em nome da empregabilidade. A estratégia tem sido anunciada na imprensa pela equipe econômica do governo federal: não mexer na legislação que garante ganhos como o 13º salário e as férias, mas dar ao trabalhador a “opção” de abrir mão desses benefícios. Reportagens sobre o tema chegaram a afirmar que a data de nascimento pode ser usada como linha de corte para definir quem poderia ou não aderir à novidade, deixando claro que o foco principal dessa política é a juventude. As hipóteses que sustentam essa proposta, no entanto, estão longe de ser consenso – tanto no que diz respeito ao problema do desemprego quanto no se refere às soluções para a juventude. Euzébio Jorge Silveira de Souza é economista, presidente do Centro de Estudos e Memória da Juventude e está desenvolvendo, neste momento, uma tese de doutorado sobre ‘Juventude e trabalho decente’. Nesta entrevista, ele refuta a ideia de que a redução de direitos gera mais empregos, explica a relação entre escolaridade, empregabilidade e renda no Brasil, descreve o perfil do mercado de trabalho que se destina aos jovens hoje e defende um outro caminho de política pública para a juventude.
Cátia Guimarães - EPSJV/Fiocruz | 02/04/2019 10h15 - Atualizado em 01/07/2022 09h44

O Brasil hoje tem cerca de 13 milhões de desempregados que representam mais de 12% da população, sem contar o universo de subempregados, pessoas que estão na informalidade, ou que estão em trabalho precário. Como isso atinge a juventude?    

Primeiro é importante saber que, no Brasil, a juventude já tem uma taxa de participação muito alta. Taxa de participação é a quantidade de pessoas em idade de trabalhar que está trabalhando ou procurando emprego. No caso dos jovens de 15 a 29 anos, o Brasil é o segundo com a maior taxa, só perde para o Paraguai na América Latina. Quando se tem uma taxa de participação muito alta, quer dizer que nessa economia existe um número muito elevado de pessoas pressionando para ingressar no mercado de trabalho. O que eu quero dizer com isso é que no Brasil o jovem precisa trabalhar, ele não tem a opção de não procurar emprego. A gente não quer que os jovens de 15 a 18 anos estejam trabalhando nem procurando emprego, o ideal seria que eles estivessem ampliando a sua escolarização. Só que no Brasil não é possível fazer isso. Porque nós temos um tipo de mercado de trabalho em que, na maioria das vezes, a renda desses jovens é fundamental para compor a renda familiar. Quanto mais pobres as famílias, mais esses jovens contribuem para ingressar precocemente no mercado de trabalho. E isso reproduz a desigualdade, porque os jovens que puderem ingressar depois [no mercado de trabalho] poderão ampliar sua escolarização e alçar ocupações de melhor qualidade, com melhor projeção na carreira, salários maiores. 

Uma das características do nosso mercado de trabalho é um excedente estrutural da força de trabalho. Tem gente demais procurando emprego. Desde que se aboliu a escravatura, a gente deixou uma margem de pessoas fora do mercado de trabalho, pressionando para ingressar, e por isso elas estão o tempo inteiro margeando entre a formalidade e a informalidade, o que a gente chama de subemprego. E isso contém sempre o nível de preço do salário, que já é historicamente baixo no Brasil. Criar uma situação para que o jovem seja obrigado a ingressar no mercado de trabalho contribui para essa dinâmica.
Nos anos 2000, ocorreu uma redução da taxa de participação porque houve uma ampliação das rendas das famílias. Isso permitiu que a gente reduzisse a desigualdade também porque os jovens saíram do mercado de trabalho. Os jovens de famílias mais pobres puderam ingressar na universidade também porque não estavam trabalhando. Porque se o jovem tem que trabalhar dez, 11 horas por dia, contando o deslocamento nas grandes cidades, é impossível conciliar e ele acaba abandonando o estudo.

Uma das críticas que recaiu sobre a reforma do ensino médio, aprovada no governo Michel Temer, é que ela visa acelerar a entrada do jovem no mercado de trabalho. Recentemente, o ministro da Educação causou polêmica ao afirmar que a universidade não é para todos, argumentando, entre outras coisas, que ela não gera emprego. Nessa relação entre educação e trabalho, qual é a política adequada para a juventude?

No Brasil, na verdade, a universidade nunca foi para todos, só que ninguém nunca verbalizou isso. Esse governo não só entende que não é para todos, como quer tornar para menos – e diz isso. No Brasil, a educação sempre foi dual. Sempre houve uma educação voltada para os filhos dos ricos, para a elite, para formar com pensamento crítico, com capacidade de visão prospectiva, e outra para os pobres, voltada para romper com o analfabetismo funcional, para que as pessoas conseguissem operar a vida no cotidiano, sobretudo a partir das décadas 1970, 80, quando se amplia a urbanização no Brasil. O grande objetivo é criar formações para os filhos dos trabalhadores apenas para reproduzir a força de trabalho o mais funcional possível, ao passo em que se responsabilizam os estudantes pelo seu fracasso e pelo seu desemprego. Quando se flexibiliza o mercado de trabalho supondo que isso vai aumentar o mercado de emprego, está-se tentando responsabilizar o trabalhador pelo seu desemprego. Quando se diz que as pessoas estão desempregadas porque não têm qualificação, está-se responsabilizando os jovens, ou os trabalhadores como um todo, pelo seu fracasso na vida profissional.

Um paradoxo do nosso sistema educacional é que nós temos uma educação pública de ótima qualidade nos Institutos Federais, com ensino médio e técnico. Se a educação brasileira fosse do mesmo nível dos IFs, estaria entre as melhores do mundo. Agora, a questão é que essa educação, que parte de um princípio meritocrático, bloqueia a entrada de uma grade parcela de jovens, sobretudo os que precisariam de uma educação melhor para romper com a condição de pobreza. E faz com que se ofereça ensino técnico, voltado para o mercado de trabalho, para quem ingressa ali apenas para se preparar para o curso superior.

Mas se só entrar nos Institutos Federais quem vai direto para o mercado de trabalho e não para a universidade, a gente não acaba reproduzindo também a lógica da dualidade educacional? Os filhos dos trabalhadores não devem ter acesso a escolas como os IFs, que têm educação profissional, mas também poderem ir para a universidade?

A situação ideal seria, além de garantir grandes políticas universais, também ampliar a possibilidade de escolha. A escolha do filho do jovem da periferia de não fazer um curso superior na universidade pública é a não escolha. Mesmo que ele diga que escolheu não prestar o vestibular. A gente deveria conseguir universalizar a educação com a qualidade que existe nos Institutos Federais. Eu não vejo como problemático universalizar a educação técnica, para que pessoas que vão fazer o curso superior tenham um ensino prático. Isso acontece em vários países desenvolvidos e pode contribuir para constituir uma vida mais completa. O ideal seria dar essa qualificação para todas as pessoas e dar também as condições de elas escolherem não fundadas nos limites socioeconômicos, nos limites de exclusão que a gente tem no Brasil hoje. Os jovens brasileiros que precisam contribuir com a renda familiar têm poucas escolhas. Isso é diferente em países como França, Alemanha e Noruega, em que existe um aparato de proteção social que permite que as pessoas tomem suas decisões não fundadas pela [necessidade de garantir] sua subsistência. Já no Brasil, as propostas estão sempre fundadas em reduzir qualquer tipo de proteção, para levar os trabalhadores de forma mais contundente, mais violenta, a terem qualquer ocupação.

Programas como Prouni e Fies levaram mais jovens de famílias pobres e de classe média baixa à universidade. Isso se reverteu em mais emprego ou mais empregabilidade? Jovens com curso universitário de fato têm mais chances de serem empregados?

Houve uma forte ampliação da escolarização na década de 1980, entre pessoas com menos de 15 anos. Nos anos 1990, o desemprego aberto como a gente conhece hoje passou a ser muito relevante, sobretudo entre os jovens. E isso aconteceu ao mesmo tempo em que houve o ingresso das mulheres no mercado de trabalho, o que foi uma mudança brasileira de costumes, mas também uma mudança econômica porque tão logo se ampliaram as grandes cidades, as mulheres precisaram passar a contribuir numa vida mais mercantilizada. Isso começa a pressionar ainda mais [o mercado de trabalho]. A taxa de desemprego dos jovens era muito elevada, porém com elevação da escolarização. Ampliamos a escolarização, só que o salário se reduziu. Se houvesse um dado histórico, como a gente tem agora com a PNAD [Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio] Contínua, a gente provavelmente veria uma ampliação profunda da subutilização da força de trabalho. Se fizermos um paralelo, nos anos 2000 ocorreu também uma ampliação da escolarização, dada pelo acesso ao curso superior, privado ou público. Mas aconteceu também uma ampliação da renda. O processo mais importante do mercado de trabalho nos anos 2000 foi a elevação da renda, e isso não ocorre por conta da alteração da escolarização. Os jovens reduzem a sua participação [no mercado de trabalho], ingressam nas universidades e o nível dos salários se eleva porque o Brasil estava crescendo economicamente. A ampliação de salários e da política de transferência de renda fez com que a economia também crescesse por conta do consumo. Vários departamentos da nossa indústria começaram a contratar mais, num ciclo virtuoso. A taxa de emprego deriva do nível de consumo e de investimento de uma economia. O mercado de trabalho não é um dado isolado. A ampliação do salário mínimo gerou efeitos tanto em ocupações informais, quanto nas ocupações formais e [benefícios] previdenciários. Em várias regiões do país, que têm menos dinamismo econômico, a ampliação do salário mínimo e do benefício previdenciário é fundamental para ampliar a atividade econômica naquele lugar. É um processo de transferência de renda. Então, o que ocorreu nos anos 1990 foi ampliação da escolarização, com redução de salário, ampliação do desemprego e da informalidade. Nos anos 2000 ocorre o contrário: ampliação da escolarização, de salários e do nível de emprego. Portanto, se tem alguma coisa que a gente pode dizer sobre a relação entre nível de emprego e nível de salário, é: sempre que houver nível de emprego muito baixo, vai-se construir um processo de redução de salário.

Mas, segundo dados da OCDE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico], no Brasil os adultos graduados recebem em média 149% a mais do que aqueles que pararam no ensino médio.  Existem dados que comprovem essa relação?

Se você cruzar, vai conseguir uma correlação positiva entre nível de escolarização e taxa de emprego e nível de salário, sobretudo. Em alguns momentos a gente ficou com um desemprego maior entre pessoas com escolarização maior. Isso varia de acordo com cada ciclo econômico. Mas eu acho que o mais importante de se constatar é que deveríamos enxergar a educação como um elemento de constituição da nossa humanidade. Eu acho, de verdade, que estabelecer essa correlação direta [da empregabilidade] com a educação é um equívoco porque inverte causa e efeito. A nossa desigualdade aparece antes de o sujeito ingressar no mercado de trabalho e na escolarização. Quando a gente olha os dados, vê que a desigualdade no começo da juventude é muito menor e se amplia muito no transcorrer da vida. Os jovens dos 20% das famílias mais pobres ganham um salário mínimo. Os jovens dos 20% mais ricos ganham um salário mínimo e meio. Então, você olha e fala: ‘nossa! Esse valor é baixo’. Só que esse jovem das famílias mais pobres que entra com um salário mínimo é um repositor de supermercado. O outro jovem é um estagiário de empresa multinacional. Se você olhar pelo salário, vai dizer que são iguais. Mas os jovens mais ricos vão ampliar [o salário] inexoravelmente. O jovem mais pobre pode virar caixa, depois de ser repositor pode ser gerente, se se esforçar muito. A gente acaba reproduzindo a ideia de que a vida dos nossos jovens é um fracasso porque eles não conseguiram ingressar na USP, e por isso não têm um salário de R$ 10 mil, R$ 15 mil. A partir disso, começa a surgir esse tipo de correlação, de que a desigualdade é fruto exclusivamente das desigualdades educacionais. A desigualdade educacional é uma expressão da nossa desigualdade de renda.

O Jessé [Souza] fala uma coisa interessante: que a relação que os filhos da classe média estabelecem com a educação, com a leitura, com o pensamento prospectivo é muito distinta das famílias pobres, porque estas têm um senso de urgência muito profundo. Nas famílias mais pobres, muitas vezes se tem uma relação subjetiva com a escolarização como um obstáculo para garantir a subsistência no curto prazo. Então, é fundamental que se consiga ampliar a escolarização e reduzir a desigualdade, mas eu acho que não está na escola nem na universidade exclusivamente a redução da desigualdade. É óbvio que quem conseguiu estudar medicina na USP ou na Unicamp pode ter um salário de R$ 20 mil, R$ 30 mil por mês. Agora, qualquer pessoa pode cursar medicina na USP ou na Unicamp?

Dados do Ipea [Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada] de dezembro de 2018 apontam que 23% dos jovens brasileiros nem trabalham nem estudam. São os chamados jovens nem-nem. Desses, 31% estão procurando emprego e não encontram, sem contar que 64% dedicam-se a trabalhos domésticos, principalmente mulheres. Por que isso acontece?

A gente tem um processo histórico de desigualdade de gênero no mercado de trabalho muito grande. As meninas, as mulheres, pressionaram para ingressar todo o tempo. E esse problema é maior ainda porque nós não temos um aparato de proteção social como existe em países mais desenvolvidos. Ou seja, o cuidado com os idosos e com os menores recai sobre as mulheres, sobretudo as jovens. Então, tudo isso vai constituindo um tipo de trabalho não remunerado que a gente não contabiliza. A escolarização das mulheres no Brasil é maior desde pelo menos a década de 1970. E mesmo assim o fosso salarial [entre homens e mulheres] e no acesso ao mercado de trabalho sempre foi muito grande. Se a teoria do capital humano é verdade, por que as mulheres não ganham mais do que os homens?

Precisamos ressignificar o conceito do desemprego. As famílias mais pobres não podem se dar ao direito de ficar verdadeiramente desempregadas. O sujeito está tão acostumado com a informalidade que quando perde o emprego pega a caixa de isopor e vai vender água no farol. Temos que fazer mesmo pesquisas com relação aos ‘nem-nem’, mas devemos evitar comparação como se fossem análogos aos ‘nem-nem’ da França, da Alemanha ou de Portugal, por exemplo. Porque na Europa esse é um fenômeno da classe média, enquanto no Brasil é eminentemente de pobres que não têm acesso à escolarização nem a um emprego formal.

A geração de emprego para os jovens é preocupação central do governo e argumento para a defesa de mudanças nas relações trabalhistas. Notícias da imprensa, inclusive, disseram que o governo usaria a data de nascimento para especificar quem poderia optar pela carteira verde e amarela. Por que esse foco na juventude?

Quando você imprime uma mudança no mercado de trabalho, em geral isso se dá inicialmente com a juventude. Uma hipótese minha é que, quando a gente quer olhar como vai ser o mercado trabalho para frente, deve olhar como os jovens estão ocupados agora: o tipo de relação, vínculo empregatício, níveis de salário... Porque isso tende a se reproduzir no mercado trabalho como um todo. É por isso que quando você faz reformas em períodos de crise, elas em geral rebaixam muito a média de qualidade da vida das pessoas. Como os jovens estão ingressando agora e precisam de experiência para conseguir ter alguma trajetória na vida profissional, eles aceitam qualquer condição. E assim, num período de muito desemprego, esses jovens se submetem a coisas ainda piores. Na década de 1990 houve país, se eu não me engano a Bolívia, em que o Carrefour colocava jovens para trabalhar em supermercados, com coletes escritos: ‘meu salário é sua gorjeta’. Conforme a pobreza vai aumentando, com a crise, com outros membros da família desempregados, esses jovens são compelidos ainda mais a aceitar qualquer trabalho. E é nesses momentos de crise que surgem propostas de rebaixamento de salário e redução dos direitos trabalhistas visando reduzir o desemprego entre jovens.

O problema é que não existe mercado de trabalho dos jovens, o mercado de trabalho é um só. E quando você reduz as condições de trabalho para os jovens, está indicando para o mercado que vale mais a pena contratar jovens e substituir o trabalhador adulto, que tem compromissos maiores com a manutenção da família. Isso reduz o nível de renda dentro das famílias e a média da remuneração do mercado de trabalho. Não faz sentido achar que reduzir direitos trabalhistas ou salários vai aumentar o número de empregados.

Por que não? Se não é a redução de direitos que resolve o desemprego, o que, de verdade, gera emprego?

Na base desse pensamento está a ideia de que os trabalhadores só não são contratados porque estão querendo receber salários maiores do que os empresários estão dispostos a ofertar. Essa percepção é tão ultrapassada, que na crise de 1929 – ou seja, daqui a pouco vai fazer um século – já foi constado que em alguns momentos de crise do capitalismo os trabalhadores estão dispostos a receber qualquer salário e, em situações extremas, até a não receber salário nenhum, trabalhando inclusive por comida. Se funcionasse assim, por essa lógica automática e simplória, poderíamos pensar que em todos os países desenvolvidos, com maior proteção social, o nível de desemprego seria muito maior do que nos países periféricos. É assim que ocorre? Não. No Brasil, o desemprego mais elevado, olhando de 2012 até 2018, sempre foi no Nordeste, ou seja, a região que tem o maior nível de informalidade no país. Mas eu não acho que existe engano teórico e metodológico em relação a essa ideia de que reduzir direitos gera emprego. O que existe é uma pressão profunda do empresariado brasileiro para pagar ainda menos, para garantir uma ampliação ainda maior desse excedente da força de trabalho, para criar margem de lucro. Todos os dados mostram que a ultraflexibilização gerada pela reforma trabalhista e pela regulamentação da terceirização não resolveu o problema do desemprego.

Mas algumas medidas da reforma trabalhista já aprovada, como, por exemplo, o trabalho intermitente, foram defendidas também mirando os jovens, com o discurso de que, assim, eles poderão trabalhar sem deixar de estudar. Qual a sua avaliação sobre isso?

A ideia de que é melhor algum emprego do que não ter emprego leva facilmente a gente a apoiar, por exemplo, o trabalho escravo. O trabalho intermitente não foi implementado para gerar emprego. De fato, ele pode reduzir a forma como a taxa de desemprego aberto aparece na estatística. Porque o sujeito pode estar empregado num trabalho intermitente, não ter trabalhado nenhuma hora naquele mês e aparecer como empregado. Ele não recebeu nem um real, mas tem que fazer a contribuição previdenciária. Do ponto de vista da estatística, é bom para o governo dizer que reduziu desemprego, porque no final das contas todo mundo pode ser um trabalhador intermitente. Mas não resolve o problema no nosso mercado de trabalho. Foi se vendendo uma ideia, que hoje alguns estudos começam a questionar, de que os jovens buscam ocupações mais flexíveis, que consigam captar o seu empreendedorismo. Só que dados, inclusive da OIT [Organização Internacional do Trabalho], mostram que os jovens querem emprego estável. Querem direito a férias, querem uma ocupação de qualidade, algum tipo de estabilidade. Dizer que o trabalho intermitente vai facilitar a educação também é uma falácia, porque não tem uma jornada estabelecida, o que é pior para a escolarização do que o sujeito saber que vai entrar às 9 h e sair às 18h. Porque o empregador pode chamá-lo para trabalhar no horário da faculdade. Ele tem a opção de ir ou não, mas quanto menor a renda, quanto piores as condições de trabalho, mais ele é compelido de forma contundente a fazer o que o patrão está exigindo.

Que tipo de emprego ou ocupação os jovens mais têm no Brasil?

A taxa de participação dos jovens de 18 a 24 anos tem crescido. A taxa de desemprego desses jovens fechou em 26% no terceiro trimestre de 2018, o que sugere que mais do que um a cada quatro jovens estão desempregados. A taxa de subutilização dessa mesma faixa etária está em 41%. Entre os jovens de 14 a 17 anos, essa taxa sobe para 68%. E existe aqui uma intersecção: eles são os jovens mais pobres, que além de terem que trabalhar muito cedo, também convivem com maior desemprego e pressionam ainda mais o mercado de trabalho. No Brasil também tem crescido muito o nível de informalidade entre a juventude e é por isso que tem ocorrido essa pressão para flexibilizar ainda mais. Os níveis de salário da juventude também têm se reduzido, junto com a ampliação do desemprego.