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EPSJV promove palestra sobre a terapêutica de Nise da Silveira

EPSJV promove palestra sobre a terapêutica de Nise da Silveira
Eurípedes Junior, do Museu de Imagens do Inconsciente,
debateu com o público questões como marginalização
e estereotipia da esquizofrenia
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vida e o legado de luta antimanicomial da psiquiatra Nise da Silveira, fundadora do Museu de Imagens do Inconsciente, foram os assuntos da palestra 'Compreender a loucura: A terapêutica pioneira de Nise da Silveira', ministrada por Eurípedes Junior (responsável pelo setor de pesquisa do Museu), que aconteceu na manhã do último dia 13, no auditório da EPSJV e foi assistida por um público de 40 pessoas, entre alunos, professores e funcionários da Escola. O evento, organizado pela coordenação do Curso de Qualificação Profissional em Vigilância à Saúde do Trabalhador, marca as comemorações do centenário de nascimento de Nise.

Inicialmente, o palestrante apresentou a biografia da terapeuta, desde o seu nascimento, em 1905, até os anos em que combateu tratamentos agressivos empregados nas clínicas e hospitais psiquiátricos, como o uso de eletrochoque, camisas de força, lobotomia e fortes medicamentos, passando por momentos importantes como a graduação em Medicina aos 16 anos, o primeiro trabalho no Hospital da Praia Vermelha e a fundação do Museu de Imagens do Inconsciente, em 1946, e da Casa Das Palmeiras, em 1956 - a primeira clínica em regime de externato. Eurípedes também falou sobre os dois anos em que Nise esteve presa durante a ditadura de Getúlio Vargas (por conta da denúncia de uma colega de trabalho), e a influência desse episódio na adoção da terapêutica ocupacional, prática em que o paciente desenvolve atividades - principalmente pintura e modelagem - para dar forma às suas emoções, reorganizar as idéias e 'despotencializar', assim, suas angústias e perturbações. O conhecimento da obra de Nise - que também inclui o respeito ao ser humano e o afeto - ultrapassa, portanto, a questão específica da loucura, segundo defendeu o palestrante, por desencadear a percepção ampla da pisque humana e dos fundamentos da alma.

Após a explanação inicial, a atividade seguiu com a exibição de dois vídeos-documentários produzidos pelo Museu, com direção de Luiz Carlos Melo, montagem de Gladyr Schincariol, texto de Nise de Oliveira e narração de Cláudio Cavalcanti . O primeiro filme apresenta o trabalho desenvolvido pelo Museu e o método de terapia ocupacional no tratamento da esquizofrenia que, conforme explicou Eurípedes, é a dissociação do pensamento, caracterizada pelo profundo mergulho no inconsciente e fragilidade do ego e, apesar de não ter gênese conhecida, se manifesta, dentre outras formas, diante da dificuldade em lidar com experiências afetivas muito fortes. 'Neste tipo de sofrimento psíquico, que é conhecido como esquizofrenia ou como loucura, o que está doente é o ego', definiu o palestrante, completando, 'o restante da pessoa é preservado: a inteligência é preservada, as funções móveis, o cérebro, o pensamento são preservados, embora às vezes pareçam um pouco confusos'. O primeiro vídeo mostrou, ainda, a evolução dos pacientes neste método, desde a fase inicial, em que as imagens ilustradas são aparentemente indecifráveis, até o momento em que elas adquirem uma seqüência que permita a compreensão de seu estado clínico.

Já o segundo documentário, intitulado 'Paixão e morte de um homem', narra a história de Isaak, um paciente com sofrimento mental que sentia dificuldade em se comunicar verbalmente, já que suas frases pareciam desconexas e com sentido incompreendido pelas pessoas. Os médicos tiveram conhecimento de sua vida, incluindo os dramas que o perturbavam - uma suposta traição da mulher que amava - e a relação com a mãe superprotetora, por meio dos desenhos que fazia como parte do tratamento da terapia ocupacional, proposto por Nise da Silveira. O acompanhamento destas ilustrações, que se assemelhavam a uma história em quadrinhos, permitiu que os médicos avaliassem seu quadro clínico.

Ao final das exibições, Eurípedes trocou experiências com o público e debateu questões como marginalização e estereotipia da esquizofrenia, as dificuldades de se estabelecer as pré-disposições de desenvolvimento de um distúrbio psíquico e a reinserção dos usuários de hospitais psiquiátricos na sociedade. Sobre o preconceito, o palestrante explicou que é causado pela incompreensão às vivências do paciente: 'A gente tem esse estranhamento porque não consegue compreender. A nossa sociedade é extremamente cartesiana, acha que as coisas têm que ter uma relação lógica e se a gente não consegue estabelecer esta relação, se sente sem chão. Nos processos psicóticos, nos processos do inconsciente, essa relação é completamente diferente do que nós estamos acostumados, porque o mundo interno tem leis que o governam que são completamente diferentes do que conhecemos'.

O Museu de Imagens do Inconsciente, que fica no Engenho de Dentro, promove, dentre outras atividades, exposições internas e externas, cursos e pesquisas. O acervo possui cerca de 352 mil obras e foi tombado como patrimônio cultural há dois anos, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). O espaço fica aberto diariamente a visitações, das 9h às 16h. Até fevereiro de 2006, o Museu apresenta uma exposição em Paris, que integra as comemorações do ano do Brasil na França. Para mais informações, acesse o site www.museuimagensdoinconsciente.org.br.