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O SUS que se quer é o SUS constitucional

Relatório da Câmara dos Deputadosconfirma que o investimento em saúde no Brasil é muito abaixo da média dospaíses com sistemas universais, um dos motivos que impedem a consolidação doSUS como está previsto na Constituição brasileira.
Redação - EPSJV/Fiocruz | 01/12/2011 09h00 - Atualizado em 01/07/2022 09h46

Está em apreciação hoje no Senado o projeto de lei (substitutivo da Câmara ao PLS 121/2007) que regulamenta a Emenda Constitucional 29, responsável por determinar a porcentagem de gastos da união, estados e municípios com a saúde. O projeto original da regulamentação garantia que o governo federal deveria investir 10% da receita corrente bruta para a área, proposta que foi modificada na Câmara. O relatório da subcomissão especial da Câmara dos Deputados destinada a tratar do financiamento, reestruturação da organização e funcionamento do SUS, aprovado recentemente na Comissão de Seguridade Social e Família garante que se esse percentual já tivesse sido fixado para o governo federal na Emenda Constitucional 29, o SUS teria hoje mais R$ 35 bilhões e a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), criada para gerar recursos adicionais para a saúde, teria cumprido o seu papel. "A CPMF, que começou como Imposto sobre Movimentações Financeiras, em 1993, teoricamente destinado à Saúde, foi sendo absorvida pelo
Orçamento da União. No ano 2000, o Orçamento do Ministério da Saúde era 8,1% da receita corrente; em 2007, 6,7%. Se os gastos da União com a Saúde tivessem permanecido no patamar de 2000, a área teria R$ 10 bilhões a mais. Se a vinculação dos gastos da União em 10% tivesse ocorrido, hoje a saúde teria R$ 35 bilhões a mais do que os cerca de RS$ 70 bilhões de hoje. No governo de 1994 a 2002, a vinculação de 10% da receita líquida da União para a Saúde não aconteceu e a CPMF não virou dinheiro adicional", explica o relatório.

Para Elias Jorge, professor da Universidade Federal de Minas Gerais e especialista em financiamento da saúde, só a regulamentação da Emenda 29 garantindo os 10% de aporte da União não é o bastante para prover o SUS. "Ainda assim o financiamento da saúde não seria suficiente. Ela é um passo importantíssimo porque se pularia dos 3,5% do PIB [investidos na saúde] para 4,5% do PIB, mas ainda está longe da necessidade de financiamento do SUS, que é 6% do PIB. É importante que as pessoas tenham clareza de que, para manter um sistema universal, com integralidade, buscando a equidade, com as condições esgarçadas de suporte social que a população brasileira tem, precisamos realmente de no mínimo 6%. Em todos os lugares do mundo onde há sistemas universais do porte do SUS, a aplicação dos estados locais é no mínimo dessa porcentagem. Então, temos que ter isso como meta", argumenta.

Além dessa clara necessidade de o governo federal aporte mais recursos para o SUS, o relatório apresenta também outras medidas para melhorar o financiamento do Sistema. Entre elas estão a remodelagem por meio de novos instrumentos para atribuir efetividade ao
ressarcimento das operadoras de planos e seguros de assistência à saúde ao SUS, a  regulamentação da Contribuição Social para a Saúde prevista no Projeto de Lei que regulamenta  a EC 29, com dedução de 100% do Imposto de Renda e para fins de combate à sonegação; a criação do Imposto sobre Grandes Movimentações Financeiras - IGMF; a tributação de grandes fortunas, como por exemplo, o patrimônio sobre jatinhos, helicópteros, iates e lanchas, bem como de remessa de lucros para o exterior; o aumento da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) das instituições financeiras; a extinção e em alguns casos a diminuição das subvenções do Estado às empresas ou aos grupos de medicina do setor privado lucrativo; e o estabelecimento de um teto de abatimento do Imposto de renda de
despesas com saúde. Para Elias Jorge, professor da Universidade Federal de Minas Gerais e especialista em financiamento da saúde, as sugestões são válidas. "Para a solução estrutural do financiamento da saúde acredito que deveriam ser tomadas todas essas medidas citadas, mais a contribuição social com alíquota máxima de 0,30% ao invés de 0,10% sobre movimentação financeira. Esse recurso adicional teria que ser direcionado à atenção básica ou atenção primária. Uma nova contribuição sobre movimentação financeira deve de alguma maneira premiar também estados e municípios que apliquem os dispositivos constitucionais da saúde e da educação. Ou seja, se o Tesouro Nacional estiver recolhendo, por exemplo, R$ 30 bilhões, ele irá aplicar esse recurso na atenção básica, mas aí durante o período no qual ele recolher os R$ 30 bilhões, ele disponibiliza de outras fontes, R$ 5 bilhões para estados e R$ 5 bilhões para municípios para que eles possam sanear a sua situação financeira", propõe. 

Nelson dos Santos, presidente do Instituto de Direito Sanitário Aplicado (Idisa) e consultor do Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (Conasems), também considera importantes as sugestões do relatório e alerta que a discussão sobre a regulamentação da EC 29 não pode estar condicionada à criação de novas contribuições. "Essa posição não é contra as novas fontes, que pode e deve haver, mas a criação de novas fontes não tem que entrar em tramitação no congresso nacional para depois haver a aprovação dos 10% da receita corrente bruta da União para a saúde. Quando a Emenda 29 foi negociada no ano 2000, os estados e municípios foram penalizados em 12% e 15%, respectivamente [da arrecadação destinada para saúde] e o movimento político dos municípios e estados não
exigiu a condição de se criarem novos impostos municipais e estaduais para contribuir no SUS com essas porcentagens. Essa mesma posição de responsabilidade no financiamento do SUS agora é exigida do governo federal. Assim,
igualamos com a mesma responsabilidade governo federal, estados e municípios e depois continuamos discutindo as novas fontes sem nenhum problema", reforça.