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Formação de técnicos em saúde no Brasil e no Mercosul

Representantes dos países membros apresentam suas experiências, avanços e dificuldades para a formação técnica em saúde. Veja as principais discussões do Seminário Internacional que debateu o tema.


A professora Sônia de Camargo, pesquisadora do Instituto de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), abriu o seminário com uma palestra sobre ‘O processo de integração regional e a livre circulação de trabalhadores no âmbito do Mercosul”. Em seguida, Marcela Pronko falou sobre a metodologia e os objetivos da pesquisa sobre a formação técnica no Mercosul.



Sônia de Camargo e Marcela PronkoSônia começou sua palestra com uma reflexão sobre a formação dos mercados comuns de fronteira aberta. Ela explicou que a integração entre países membros não se dá de forma simples e que tanto questões políticas como sociais e econômicas podem se tornar entraves a esse processo. “Tomando como base a dimensão política na América Latina, vemos que há pluralidade nas formas de governo: há governos conservadores e progressistas lidando com sociedades desiguais e tomando por base projetos ideológica e politicamente distantes entre si, o que dificulta as convergências”, observou, completando que a emergência de territórios eleitorais de esquerda, em contraste com as perspectivas neoliberais, traz grande complexidade ao processo de integração.



A professora citou a União de Nações Sul-Americanas (Unasul), criada este ano para aprofundar as relações os países do Mercosul (Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai) e os da Comunidade Andina (Bolívia, Colômbia, Equador e Peru). Para Sônia, a concretização desse objetivo vai exigir um trabalho minucioso de aproximação, já que existem assimetrias entre economias e propostas políticas que podem se tornar obstáculos. “Alguns críticos consideram que, por conta dessas assimetrias, a criação da Unasul deveria ser um ponto de chegada do processo de integração entre esses países, e não um ponto de largada”, disse.



Sônia acredita que, embora haja diferenças entre os países do Mercosul e mesmo dentro dos próprios países, esse problema é mais significativo entre os membros da Comunidade Andina. “Nos membros do Mercosul, as diferenças domésticas são menores, uma vez que os conflitos políticos internos tendem a ser menos graves e a identidade dos cidadãos, mais homogênea. Já Bolívia, Colômbia, Peru e Equador enfrentam entre si e internamente diferenças ideológicas na orientação de seus projetos políticos e assimetrias nas economias”, afirmou.



De acordo com ela, o maior problema do Mercosul é o grau de assimetria entre os países mais fortes economicamente – Argentina e Brasil – e os de economia mais frágil – Paraguai e Uruguai. “O fato de não ter sido incluído um princípio de reciprocidade que asseguraria uma distribuição eqüitativa dos benefícios obtidos entre os quatro, e sem que o Paraguai tenha conseguido direito a um tratamento diferenciado como país de menor desenvolvimento relativo cria uma situação desfavorável à ampla abertura das economias internas, inclusive no que diz respeito ao deslocamento de pessoas”, alertou.



A circulação de trabalhadores



Para contextualizar a livre circulação na América Latina, em diferentes conjunturas, Sônia de Camargo voltou um pouco no tempo: “Os modelos de integração proposto apontava para o desenvolvimento integrado, tendo como eixo central a substituição de importações para o fortalecimento de um parque industrial interno. Essa era a preocupação de projetos como a Associação Latino-Americana de Livre Comércio (Alac), de 1960 e o Pacto Andino, de 1969”, afirmou.



De acordo com Sônia, o Mercosul foi criado, em 1991, também como um acordo desenvolvimentista. “As políticas econômicas inseridas na conjuntura neoliberal e orientadas para a constituição inicial aduaneira e depois de mercado comum se voltaram à formação de um regionalismo aberto”, disse, observando que o modelo preocupou aos trabalhadores. “Quando o Mercosul surgiu, centrais sindicais dos quatro países lançaram uma carta social propondo a ratificação de um pacote de convenções da Organização Internacional do Trabalho, instrumento para homogeneizar as condições mínimas dos trabalhadores. Eles avaliavam que as novas políticas de ajuste e de reestruturação produtiva global fariam o desemprego aumentar e que a flexibilização dos direitos poderia diminuir seu poder aquisitivo”.



Outro problema levantado pelos trabalhadores dizia respeito justamente à livre circulação: “O descolamento de mão-de-obra subcontratada e clandestina entre países menos favorecidos, ao gerar discriminação na remuneração, poderia gerar sentimentos de rejeição a uma futura livre circulação. As centrais sindicais também afirmavam que a circulação de trabalhadores exigia, em um contexto de integração, uma regulamentação clara e um tratamento em relação à criação de critérios comuns para solucionar o deslocamento intra-comunitário”, comentou a professora. Para propor um espaço alternativo de criação, em que pudessem atuar com uma perspectiva sindical, foi criado o subgrupo nº 11, ligado a questões trabalhistas, de emprego e de segurança social.



Para ela, a constituição de um mercado comum exige que o fator ‘trabalho’ seja considerado, e é necessário, entre outras medidas, assegurar o livre acesso de trabalhadores a postos de trabalho em outros Estados membros e a manutenção dos direitos previdenciários. “Hoje, tentamos criar caminhos legítimos que permitam aos trabalhadores transitarem livremente por meio de uma lógica que não seja apenas nacional. E isso exige decisões coletivas, não separadas por barreiras culturais, regionais ou de qualquer outra espécie”, disse.



Sonia explicou que, em 2002, um acordo marcou o início de uma nova etapa na história da integração na América Latina: “Os países associados, a Bolívia e o Chile assinaram o acordo sobre residência nos Estados-parte do Mercosul. O documento estabelecia que todo o território deveria constituir uma área de livre residência, sem exigência de outro requisito que não a própria nacionalidade. Até agora, isso só foi implementado no Brasil e no Uruguai. Surgiu também o visto Mercosul, para facilitar a entrada de pessoas físicas e jurídicas nos Estados membros, para exercerem atividades econômicas”, explicou, completando que, três anos depois, os quatro países do Mercosul assinaram o Acordo Multilateral de Seguridade Social, que afetou positivamente a agenda social assim como a livre circulação.



Mas, de acordo com Sônia, ainda há muito a ser feito. “Como harmonização e convergência entre os países, essas ações contribuem para que os trabalhadores possam manter seus direitos em outros Estados. Mas, sendo o Mercosul caracterizado apenas por uma União Aduaneira imperfeita, os trabalhadores que migram ainda não possuem regulamentação previdenciária que legitime seu deslocamento e são precariamente inseridos no mercado para onde se deslocam”, concluiu.