Promover a reflexão e a discussão sobre a práxis da rede de frio de imunobiológicos e o processo de formação, dialogando com profissionais e gestores envolvidos com a temática, de modo a estabelecer as relações entre processo de trabalho e as demais atividades de promoção e prevenção da saúde, com vistas à materialização do princípio da integralidade da atenção à saúde e das políticas de formação no contexto da vigilância. Foi sob este objetivo que a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) promoveu, em 9 de novembro, o 1º Encontro de Profissionais de Rede de Frio, sob o tema ‘Perspectivas e desafios da atuação e formação’. O evento foi organizado pelo Laboratório de Educação Profissional em Vigilância em Saúde (Lavsa) e contou com a participação de profissionais que atuam nas centrais de rede de frio de imunobiológicos e salas de vacinação, representantes das redes municipal, estadual e federal e egressos da Especialização Técnica de Nível Médio em Rede de Frio de Imunobiológicos da EPSJV.
Sob o tema ‘Gestão e Planejamento de uma Rede de Frio’, a primeira mesa de debate apresentou a experiência da cidade do Rio de Janeiro quanto ao monitoramento e ao planejamento da rede municipal. Nadja Greffe, coordenadora de imunizações da Secretaria Municipal de Saúde (SMS-RJ), destacou os desafios da Rede de Frio do Rio de Janeiro: “Temos um município com mais de seis milhões de habitantes, uma estrutura com 234 salas de vacinação, 10 hospitais, 12 maternidades e dois centros de referência para imunobiológicos especiais. Este grande universo de trabalho é bastante desafiador”. Para organizar a rede, revelou, foi feito um inventário do estoque, se criou instrumentos de capacitação e aperfeiçoamento para trabalhadores e foi produzido um guia prático de normas e procedimentos da Secretaria Municipal de Saúde com um capítulo específico sobre rede de frio.
Revisão da Rede
João Leonel Estery, consultor em Rede de Frio de Imunobiológicos do Estado do Rio de Janeiro, falou sobre o papel do gestor na revisão da rede a partir da sua experiência no Programa Nacional de Imunizações (PNI) desde 1973. Ele destacou a aproximação e o apoio da EPSJV na qualificação dos profissionais da rede estadual. Em seguida, Andreia Ayres, enfermeira do Hospital Universitário Gaffrée e Guinle, explicou que o grande desafio do gestor na área é manter o trabalhador motivado. “Como você mantém as pessoas motivadas em meio a um cenário crítico, que ultrapassou a questão financeira. Como a gente consegue dormir com um anel de R$ 800 mil no dedo sabendo que a fome reside na sua esquina? Trata-se de uma crise ética, e nosso desafio é entender que estamos qualificando pessoas em meio a tudo isso, e não técnicos simplesmente”, orientou Andreia.
Na mesa ‘Estruturação e organização da Rede de Frio: ferramentas que envolvem a prática segura’, o presidente do Instituto Vital Brasil, Edimilson Migowski, focalizou os conceitos essenciais em vacinação para a prática segura. Ele lembrou o surgimento da vacina, seus mitos e verdades. “Não é de hoje que as pessoas tendem a colocar a culpa na vacina em relação a tudo que surge depois dela aplicada. Todo mundo aqui já ouviu falar sobre o caso de uma criança que depois que tomou a vacina, nunca mais foi o mesmo, ficou mais rebelde”, brincou. Migowski destacou que para a conservação de uma vacina é preciso saber em primeiro lugar se é atenuada ou ativa: “É a partir desta informação que tomo conhecimento acerca da conservação, da via de administração, dos efeitos diversos e das contraindicações”.
Nadja Greffe, da Secretaria Municipal de Saúde, apresentou ainda algumas maneiras de aperfeiçoar o trabalho e evitar perdas de vacinas. “A primeira coisa é a observar a validade dos imunos, em seguida é identificar se a vacina não foi utilizada para alguém, se não foi possível captar alguém para uso efetivo ou se o volume da vacina estava em excesso”, ensinou, indicando que tais observações orientam o processo logístico de gerenciamento da rede de frio. Para ela, o acompanhamento das perdas é uma forma de gerenciar o sistema e reduzir os ônus orçamentários. “De janeiro a junho deste ano, por exemplo, havia dez milhões de doses disponíveis para uso, aproximadamente. Desse montante, 1.152 doses foram inutilizadas em face de algum procedimento inadequado do profissional e 15 mil doses por falhas em equipamentos. Isso é um número pequeno, mas importante de ser observado e monitorado”, exemplificou.
Consultora em Imunizações e Rede de Frio, Mirian Martho Moura falou sobre os princípios e as boas práticas na área. “Devemos nos preocupar com alguns fatores que interferem na qualidade dos imunobiológicos, entre eles o manuseio e a cobertura vacinal”, orientou. Ela destacou, porém, que somente boas práticas não são suficientes, sendo necessário também ter uma cadeia de frio com qualidade.
Formação ampliada
Sob o tema ‘Desafios para uma política de formação dos trabalhadores da saúde’, a última mesa de debate, coordenada por Regina Flauzino, vice-diretora do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal Fluminense (ISC/UFF), foi iniciada por Carlos Eduardo Colpo Batistella, professor e pesquisar da EPSJV. Ele falou sobre os avanços tecnológicos na área e o quanto isso demanda a atualização dos profissionais. “Precisamos incluir novos conteúdos na formação e atualizar os currículos”, defendeu, questionando se além das incorporações tecnológicas e das mudanças de gestão estaríamos preocupados com a formação do trabalhador. Para ele, há uma naturalização da “subformação” do trabalhador técnico em saúde. “É fato que só é possível compreender a responsabilidade de um ato profissional na medida em que eu tenho elementos para compreender as várias dimensões da sociedade, que vão além do ato técnico”, disse.
Regina Canedo, coordenadora de Educação Permanente em Saúde da Superintendência da Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro (SES-RJ), destacou a importância da educação permanente enquanto estratégia pedagógica de repensar o papel, a formação e a atuação dos profissionais em saúde da rede de frio. Já Marileide do Nascimento Silva, professora e pesquisadora da EPSJV, abordou o papel da Escola Politécnica na formação profissional: “Não queremos instrumentalizar apenas, tampouco queremos tratar somente da questão técnica. A escola busca pensar a formação e o currículo de forma integrada. Com isso, teremos uma formação ampliada, pela qual o aluno consiga se entender enquanto cidadão dentro de um contexto mais amplo”. O evento foi finalizado com lançamento do livro ‘Rede de Frio de Imunobiológico’, da Editora Fiocruz, com alguns exemplares sorteados.