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Documentário sobre a regulamentação de produtos químicos é exibido na EPSJV

Cineastas Marie-Monique Robin e Silvio Tendler participaram de debate na Escola
Talita Rodrigues - EPSJV/Fiocruz | 14/09/2011 08h00 - Atualizado em 01/07/2022 09h47


Dando continuidade ao Ciclo de Debates sobre a Rio +20, a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV) exibiu na segunda-feira, dia 12, o filme ‘O veneno nosso de cada dia’, da jornalista e cineasta francesa Marie-Monique Robin, que também dirigiu o filme ‘O mundo segundo a Monsanto’.



No novo documentário, Marie-Monique investiga os efeitos dos agrotóxicos e de outros produtos químicos (como o adoçante aspartame e componentes do plástico) para a saúde humana. Após a exibição do filme, a jornalista e o cineasta Silvio Tendler, diretor do filme ‘O veneno está na mesa’, produzido com o apoio da EPSJV, participaram de um debate na Escola.



Marie-Monique contou que ‘O veneno nosso de cada dia’ nasceu como uma continuidade de ‘O mundo segundo a Monsanto’, classificado por ela como “o filme mais pirateado que existe”. “O livro [escrito por ela antes do filme] já foi traduzido em 16 idiomas e a Monsanto nada fez contra mim, apesar de seu poder, porque todas as informações foram checadas e comprovadas”, disse a cineasta, acrescentando que ‘O veneno nosso de cada dia’ é um trabalho de dez anos de levantamento de informações e dois anos de produção. “O importante não é ter as informações, é checar. Fiz os dois filmes sem ter nenhum processo porque tudo foi checado. Soube que a Monsanto esquadrinhou meu livro tentando achar uma brecha para me processar, mas não conseguiu encontrar nada”.



Ao contar como foi feito o levantamento de informações para o filme, Marie-Monique disse que a primeira sensação que se tem ao começar esse tipo de investigação é de vertigem. “Se você digitar na internet ‘câncer e pesticida’, aparecem mais de 16 mil respostas”, exemplificou a jornalista. A partir daí, ela começou a identificar quais eram os estudos mais confiáveis e a buscar outras fontes de informação. Com isso, leu mais de cem livros e entrou em contato com mais de 300 cientistas. “A minha maior dificuldade foi convencer os representantes das agências reguladoras a me dar entrevistas. Eles tinham medo de falar comigo porque já tinham assistido ao filme sobre a Monsanto. Com a Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (ESFA, na sigla em inglês), por exemplo, foram mais de três meses trocando e-mails e eles se recusavam a falar. Até que eu disse que se eles não queriam falar é porque tinham alguma coisa a esconder. E aí, finalmente eles me receberam, mas filmaram todas as minhas entrevistas. E ficaram sem ação quando eu cheguei lá com os próprios documentos da ESFA, porque a situação deles é indefensável. Para mim, o melhor resumo dessa situação é quando o representante da OMS diz no filme que ‘isso é o melhor que eles podem fazer’, sobre a regulamentação”, contou.



Regulamentação



O processo de regulamentação dos processos químicos é uma dos temas centrais de ‘O veneno nosso de cada dia’. Segundo Marie-monique, a regulamentação dos produtos químicos é muito controversa e, depois da Segunda Guerra Mundial, dos mais de 100 mil novos produtos colocados no mercado, apenas 10% foram testados. “Mas como é feita essa regulamentação? O problema da regulamentação é o cerne desse filme. Que critérios são usados para determinar, por exemplo, a dose diária recomendada de um produto? Ninguém sabe como isso foi medido”, disse ela.



Uma das conseqüências da falta de regulamentação apontada por Marie-Monique é o crescimento dos casos de câncer de mama entre mulheres jovens, já que muitos dos produtos químicos são carcinogênicos. “A indústria diz que é porque as mulheres estão envelhecendo, mas não é verdade porque os casos acontecem em pessoas cada vez mais jovens. A causa da epidemia do câncer de mama entre mulheres jovens de países desenvolvidos é o excesso de hormônios nos alimentos, os pesticidas, os produtos químicos dos desodorantes, dos xampus, o teflon das panelas, entre outros”, disse Marie-Monique.



Na França, uma das consequências do filme foi uma decisão do Senado para que todos os produtos que contenham substâncias que podem causar problemas endócrinos venham com um rótulo desaconselhando seu uso por mulheres grávidas. Além disso, a Comunidade Europeia está estudando adotar a mesma medida. “Existe também um movimento na Europa para proibir totalmente esses produtos porque são considerados nocivos mesmo em pequenas doses”, contou a cineasta.



A jornalista destacou ainda que o uso de agrotóxicos e o modelo atual de produção de alimentos é uma decisão política dos governantes. “O problema é que existe um custo para o ambiente e os governantes aceitam pagar esse preço. E a pergunta que devemos fazer é se nós queremos continuar com isso. Os agricultores têm que ir contra o lobby das multinacionais, porque o mesmo laboratório que faz o pesticida, faz o remédio”, disse Marie-Monique.



Filha de agricultores, a cineasta contou que seu pai participou da chamada ‘Revolução Verde’, quando se começou a usar agrotóxicos para aumentar a produção de alimentos, mas que hoje ele é uma pessoa triste por causa das consequências que o uso dos venenos trouxe para a família. “Foram muitos casos de câncer na família e algumas mortes. E nós sabemos que isso foi causado pelo uso de herbicidas por mais de 30 anos. Não se pode acusar os agricultores por isso porque eles também foram enganados pela indústria química. Meu pai infartou na noite seguinte à estreia de ‘O mundo segundo a Monsanto’ porque ficou chocado com todas as mentiras que foram ditas a ele. Os agricultores foram as primeiras vítimas da indústria química”, disse Marie-Monique, acrescentando que por causa das consequências do uso de agrotóxicos entre os agricultores, os médicos de família da França fizerem uma carta para a OMS, pedindo que não se use mais os venenos, pois eles atendem cada vez mais agricultores doentes.



Agroecologia



Depois de falar sobre os impactos do uso de venenos para a produção de alimentos, Marie-Monique contou que já está trabalhando em um novo filme/livro sobre agroecologia. “Os representantes da indústria química dizem que é impossível alimentar o mundo sem pesticidas. Quero fazer uma nova volta ao mundo e mostrar que é possível sim comer sem pesticidas. Quero mostrar que a agroecologia, baseada na agricultura familiar e sustentável, é a solução. Já existem experiências no mundo inteiro que mostram que a agroecologia funciona”, completou a jornalista.



A agroecologia também será incluída na segunda versão de ‘O veneno está na mesa’. Silvio Tendler disse que o documentário será ampliado com a inclusão de alternativas ao uso de agrotóxicos. “Vamos tentar responder que é possível fazer a produção orgânica em grande escala”, contou Silvio.



Silvio disse ainda que se inspirou em Marie-Monique para a divulgação do documentário. “Meu filme vem com o selo ‘copie e distribua’, incentivando as pessoas a divulgar essa informação”, disse, acrescentando que o filme dirigido por ele e o documentário produzido por Marie-Monique são complementares, pois um trata do veneno cotidiano e o outro sobre o veneno que está na mesa das pessoas. “Tudo aquilo que supúnhamos que acontecia, passamos a ter certeza com o documentário dela”, disse o diretor.



Ciclo de Debates



O ‘Ciclo de Debates sobre a Rio +20: Quem sustenta o desenvolvimento sustentável?’, promovido pela EPSJV, teve início no dia 2 de setembro, com a exibição do filme ‘O veneno está na mesa’, de Silvio Tendler. O ciclo se estenderá até o fim do primeiro semestre de 2012, com a realização de diversos encontros. O objetivo do ciclo é promover um debate preparatório, dentro e fora da Fiocruz, para a realização da Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável (Rio + 20), que acontecerá em junho de 2012, no Rio de Janeiro.