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EPSJV cria Comissão de Heteroidentificação Racial

Grupo foi criado para avaliar os candidatos de processos seletivos pautado em suas características físicas, evitando, assim, possíveis fraudes
Julia Neves - EPSJV/Fiocruz | 17/03/2022 11h47 - Atualizado em 01/07/2022 09h40

Com o objetivo de validar as ações afirmativas das cotas para pessoas pretas, pardas e indígenas, a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) criou, recentemente, uma Comissão de Heteroidentificação Racial. Constituída em conformidade com a Portaria Normativa nº 13, de 11 de maio de 2016, do Ministério da Educação e com a Portaria 491/2021-PR, da Presidência da Fundação Oswaldo Cruz, a iniciativa consolida uma parte das políticas afirmativas reivindicadas pelo movimento negro e por movimentos dos povos originários. Os membros da comissão são compostos por servidores da Fiocruz com diferentes raças, etnias e gêneros.

Segundo o coordenador-geral do Ensino Médio Técnico da EPSJV e coordenador da Comissão da EPSJV, Jonathan Ribeiro, o caráter fenotípico, ou seja, as características físicas de uma pessoa, é o fator principal para os casos de racismo na sociedade e isso implica em uma marginalização histórica que atravessa a história do Brasil. “A comissão avaliará os candidatos de processos seletivos pautada em suas características físicas, evitando, assim, possíveis fraudes”, explica. Além dele, também fazem parte da comissão as professoras-pesquisadoras Gisele Apolinário, Letícia Batista, Regimarina Reis, Valéria Carvalho.

Para Valéria Carvalho, esse é mais um passo importante no processo de formação humana anunciado no Projeto Político Pedagógico da escola. De acordo com ela, a importância da comissão está também no processo de fortalecimento da identidade negra, pois, segundo a professora, para algumas pessoas negras esse seja talvez o primeiro momento que se afirme como negra, haja vista as violências subjetivas promovidas pelo racismo que geram, em parte dessa população, um processo de negação de si mesma. “A criação das comissões de heteroidentificação evidencia também o fortalecimento do movimento social negro, no sentido de não permitir que estratégias de fraudes ou de omissões fomentadas pelo racismo estrutural e institucional continuem a se concretizar”, aponta.

Para consolidação da comissão, a EPSJV realizou uma oficina, no dia 14 de março, com a participação de Hilda Gomes, coordenadora do Comitê de pró-equidade e Gênero e Raça da Fiocruz e pesquisadora da Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz); e Roseli Rocha, integrante do mesmo comitê e pesquisadora do Instituto Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz). Uma nova oficina deve ser realizada até o mês de maio, tendo como público-alvo pessoas que compõem comissões de heteroidentificação ou pessoas que estudam e pesquisam sobre questões étnico-raciais. 

Na visão do coordenador, o maior desafio da iniciativa é pensar a política em um país tão miscigenado como o Brasil. “A pessoa que se candidatar pode ter pai negro, ou mãe negra, ou avós negros, entretanto, podem ser lidos enquanto branco. O importante é ter em mente que essa política é voltada para contemplar pessoas que, historicamente, sofreram pelos seus traços, que os colocam em desvantagem pela branquitude”, aponta Jonathan, que acrescenta que o pardo pode ser uma outra questão desafiadora, porque pode ter a pele mais clara. “Mas a depender de um conjunto de características fenotípicas, ele é lido como uma pessoa que não é beneficiado pela branquitude, ou que está numa linha limítrofe. A banca precisa estar atenta a esses aspectos tão marcados na sociedade brasileira”, ressalta.

Na avaliação de Valéria, as inúmeras denúncias de fraudes pelo Brasil revelam alguns aspectos importantes sobre a questão racial, sobre o racismo que estrutura a formação social brasileira e sobre a luta antirracista. “Revela o não reconhecimento dos danos materiais, sociais, psicológicos, políticos e educacionais advindos da escravidão e da postura racista permissiva e ativa do Estado em relação a essa população, mesmo após o fim da escravidão, com consequências que se reverberam e estão presentes no cotidiano dos dias atuais”, finaliza.