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Escola Politécnica promove 1º Seminário de Iniciação Científica na Educação Básica

Evento foi realizado em parceria com a Secretaria Estadual de Educação do Rio de Janeiro e, nessa primeira edição, reuniu professores de duas escolas estaduais do Sul Fluminense
Julia Neves - EPSJV/Fiocruz | 11/05/2023 14h33 - Atualizado em 11/05/2023 14h36

Em parceria com a Secretaria Estadual de Educação do Rio de Janeiro (Seeduc-RJ), a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) promoveu, nos dias 4 e 5 de maio, o 1º Seminário de Iniciação Científica na Educação Básica: caminhos para o fortalecimento da pesquisa como princípio educativo nas escolas. Além de professores-pesquisadores da EPSJV e profissionais da Seeduc-RJ, o evento reuniu professores da Escola Estadual Rio Grande do Norte, de Volta Redonda (RJ), e do Colégio Estadual Boa Vista, de Barra Mansa (RJ).

A mesa de abertura contou com Ingrid D’avilla, vice-diretora de Ensino e Informação da Escola Politécnica; Myrian Medeiros, subsecretária de Planejamento e Ações Estratégias da Seeduc-RJ; e Cristiani Machado, vice-presidente de Educação, Informação e Comunicação da Fiocruz.

Em sua fala, Ingrid agradeceu a parceria com a Seeduc-RJ e com a Fiocruz e destacou a alegria em ver um auditório cheio de professores da educação básica. “Para quem está no cotidiano da escola todos os dias dando aula é muito bom poder sair, é uma grande oportunidade poder refletir e compartilhar esses momentos com outros professores”, ressaltou.

Myrian agradeceu às duas escolas convidadas que procuraram a Seeduc-RJ para pensar, em conjunto, estratégias de desenvolvimento de iniciação científica. “As escolas precisam acreditar no seu potencial, ousar e não pensar apenas nos seus problemas, apenas nas questões que impedem o crescimento e o melhor desenvolvimento dos alunos, muito pelo contrário, precisamos manter essa escola cheia de paixão”, apontou. 

A subsecretária comentou ainda a importância do evento, a cooperação com a Fiocruz e a necessidade de que essas ações sejam cada vez mais expandidas para outras instituições. “Para nós, é um orgulho estarmos aqui, em mais uma parceria maravilhosa com uma instituição tão séria e comprometida com a sociedade, tão capaz de mudar a realidade de vida das pessoas. Que essas ações sejam reproduzidas nas nossas 1.233 escolas da rede”, afirmou.

Por fim, Cristiani apontou que há diversos desafios hoje na área da educação, desigualdades que, segundo ela, se exacerbaram nos últimos anos, como as dificuldades de acesso e permanência de jovens nas escolas. “É um desafio imenso e uma responsabilidade coletiva de todos nós, enquanto sociedade, darmos condições efetivas para que esses jovens possam estudar, continuar os estudos, se sentirem motivados”, disse. Ela acrescentou ainda a importância da iniciação científica nesse cenário: “É uma das possibilidades que se tem de ter atividades inovadoras de formação, atividades diferenciadas que transcendem o espaço da sala de aula e que ajudem a promover essa reflexão crítica sob a realidade social”.

IC na Educação Básica

Em seguida, teve início o painel temático “Por que fazer iniciação científica na educação básica?”, com a participação de Ingrid D’avilla; Cristiane Braga, professora-pesquisadora da EPSJV e coordenadora do Programa de Vocação Científica (Provoc) da Fiocruz; Cristina Araripe, coordenadora de Divulgação Científica da Fiocruz; e Patrícia Cardoso, ex-aluna da EPSJV.

Ingrid D’avilla disse que a proposta do encontro era discutir as possibilidades de iniciação científica e como a EPSJV pode contribuir com os percursos formativos das duas escolas em questão. “Entendemos que o ponto de partida deveria ser, de fato, pensar em estratégias de formação dos professores, porque com todas as questões que ficaram muito evidentes, tem sido cada vez mais rara a oportunidade de fazer as atividades de formação inicial e continuada”, apontou, acrescentando que a Escola tem dialogado com a Seeduc-RJ sobre a possibilidade de outras estratégias de formação mais pontuais, como cursos de especialização e mestrado profissional: “O grande desafio é: quais são os espaços de formação dos docentes que serão possíveis e necessários construir para efetivar uma proposta de iniciação científica nessas escolas?”.

A vice-diretora apresentou ainda alguns pontos do Projeto Político Pedagógico da Escola Politécnica. “Para nós, há uma indissociabilidade entre os aspectos do trabalho manual e intelectual. Não incorporamos itinerários formativos, porque faz parte da nossa compreensão de educação a centralidade nas disciplinas que promovem os fundamentos técnicos e científicos do trabalho. Temos a ideia do trabalho e da pesquisa como princípios educativos, a compreensão de que o sujeito é o indivíduo singular e, ao mesmo tempo, com consciência geral, pois a organização da sociedade capitalista coloca os trabalhadores no lugar de classe que nem sempre é facilmente identificado por eles”, concluiu.

Cristiane Braga falou sobre o Programa de Vocação Científica (Provoc) da Fiocruz. Segundo ela, o programa foi criado em 1986 no campus da Fiocruz, em Manguinhos, e sempre foi coordenado pela EPSJV. “O Provoc é pioneiro na iniciação científica para alunos de ensino médio e deu origem a uma série de outras propostas e ações de iniciação científica, como por exemplo, as bolsas Pibic – EM [Programa Institucional de Bolsas de Iniciação para o Ensino Médio], do CNPq [Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico]”, afirmou.

O Programa é dividido em duas etapas: Iniciação e Avançado. Na etapa Iniciação, cuja duração é de 12 meses, os alunos se familiarizam com as principais técnicas e objetos de pesquisa de Ciência e Tecnologia em saúde. No Avançado, com duração de 22 meses, o aluno desenvolve todas as etapas de execução de um projeto de pesquisa em Ciência e Tecnologia em Saúde. “Entendemos que precisamos estimular a aprendizagem de conhecimentos técnicos e científicos a partir da experimentação da prática de pesquisa, com uma imersão no cotidiano do trabalho do pesquisador para que ele possa se apropriar e aprender ciência fazendo ciência”, explicou.

O Provoc tem convênio com instituições de ensino, como a rede do Colégio Pedro II; duas escolas particulares (São Vicente e o Centro Educacional Anísio Teixeira); os colégios de aplicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ); além do Centro de Estudos e Ações Solidárias da Maré (Ceasm); da Rede de Desenvolvimento da Maré (Redes); e da Rede de Empreendimentos Sociais para o Desenvolvimento Socialmente Justo, Democrático, Integrado e Sustentável (Rede CCAP) - Manguinhos. “Além disso, trabalhamos com todas as unidades técnico-científicas e regionais da Fiocruz, com exceção do Paraná. Ou seja, os estudantes podem atuar em pesquisas dos mais variados campos”, apontou Cristiane.

A coordenadora explicou ainda que os alunos da etapa Iniciação participam da Jornada de Iniciação Científica e os estudantes do Avançado participam da Semana de Vocação Científica. Além disso, eles participam de eventos, como o Congresso da Federação de Sociedades de Biologia Experimental (FeSBE). “Ao longo desses anos, 1854 jovens já concluíram a etapa Iniciação e 710, o avançado. Contamos ainda com cerca de 1100 pesquisadores”, destacou.

Cristina Araripe falou sobre o programa “Mulheres e Meninas na Ciência” e o contexto sociopolítico no qual ele está inserido. Nesse sentido, ela mostrou alguns números que retratam a desigualdade de gênero nos espaços onde se produz ciência, no Brasil. “Temos um número bem maior de homens que mulheres nas instituições, nos projetos, nas bolsas de produtividade. Tem uma relação direta a obtenção dessas bolsas e a ocupação de cargos de liderança”, apontou, trazendo dados da Fiocruz: “No que diz respeito principalmente aos servidores, também temos muito mais homens que mulheres nas chefias e coordenações”.

A coordenadora de Divulgação Científica contou ainda que a Fiocruz criou o Programa “Mulheres e Meninas na Ciência”, em 2019, com objetivo de enfrentar as desigualdades e firmar o seu compromisso com a promoção da equidade de gênero na Ciência. O programa, de acordo com Cristina, está estruturado em três eixos. São eles: (1) Valorização das mulheres na Ciência, que tem como foco o reconhecimento das pesquisadoras e suas contribuições, debatendo problemas e propondo mudanças para que mais mulheres avancem em suas trajetórias; (2) Mais Meninas na Fiocruz, que, por meio de editais, estrutura o desenvolvimento de ações que promovem a igualdade, o acesso e a participação de alunas da educação básica no campo científico; e (3) Estudos e publicações em Gêneros, Ciência e Saúde, destinado ao incentivo de produções científicas que valorizem a dimensão de gênero nas análises sobre Ciência e Saúde.

Ainda nesse contexto, em fevereiro de 2023, segundo Cristina, a Fiocruz promoveu a Imersão no Verão, que selecionou 120 alunas do ensino médio do estado do Rio de Janeiro para participar de atividades de pesquisa em laboratórios e nos diversos espaços da Fiocruz, sob a supervisão de pesquisadoras. “Tivemos mais de 300 inscrições e a maioria foram de meninas da baixada fluminense do Rio de Janeiro. Agora queremos ampliar ainda mais essa experiência”, reforçou.

A egressa Patrícia Cardoso falou sobre a sua experiência pessoal com a iniciação científica. Para ela, a EPSJV é um lugar com uma representação simbólica muito grande, pelo impacto e o efeito que os ensinamentos adquiridos trouxeram para a formação dela. “A experiência com a iniciação científica me trouxe um novo olhar sobre mim mesma. Foi nesse espaço que eu tive o primeiro contato com o campo da Saúde Pública. Foi um encontro com uma nova perspectiva de educação, emancipadora, que se abria o diálogo, e proporcionava aos estudantes um espaço de autonomia do pensamento, de pensar sobre a nossa interação com os nossos pares e o mundo”, lembrou.

Experiências da EPSJV

Na parte da tarde do primeiro dia do evento, os professores-pesquisadores Carolina Dantas, Gregório Albuquerque, Tainah Galdino, Letícia Batista e Danielle Cerri apresentaram experiências práticas de projetos de iniciação científica na Escola Politécnica.

Carolina apresentou o componente curricular “Trabalho Integração (TI)”, no qual os estudantes do 2º ano do ensino médio têm momentos de investigação, atividades e práticas de pesquisa sob supervisão docente, além de discussões teóricas e atividade de campo. Ao final do componente, há um “seminário integrador”, quando os estudantes mostram o seu percurso e o resultado de seus trabalhos. “A nossa iniciação científica é curricular, então, a compreensão dela como formação precisa ser colocada no contexto no nosso Projeto Político Pedagógico, do nosso currículo. A ciência pode servir para dominar e para emancipar. No nosso caso, fazemos iniciação científica para emancipar e formar sujeitos produtores de conhecimentos”, ressaltou Carolina.

Ao falar sobre o audiovisual, Gregório comentou sobre o processo de produção de um documentário como metodologia científica que, segundo ele, é união da arte com a ciência, permitindo ao estudante o conhecimento da realidade do seu objeto e da linguagem audiovisual na sua expressão. “O início de qualquer ciência e de qualquer documentário é sempre uma pergunta. O que muda é a sua forma de método de exposição, no caso do documentário, a linguagem do audiovisual”, explicou.

A experiência da Feira de Ciências foi apresentada por Tainah. Segundo ela, o evento foi criado com o intuito de proporcionar aos alunos uma imersão no mundo científico de forma lúdica e ativa, possibilitando a transição do estado de espectador para o de protagonista. “Sendo assim, nós estimulamos a participação deles desde a criação de uma logomarca para a feira, por meio de um concurso, e, principalmente, na idealização dos projetos que eles gostariam de apresentar”, contou. Ainda segundo Tainah, os trabalhos são elaborados com a supervisão dos professores, abarcando todas as áreas do conhecimento. “A Feira é muito semelhante a um projeto de iniciação científica porque estimula a curiosidade dos estudantes e integra os estudantes de diferentes séries. Os estudantes do 4º ano, por exemplo, quando participam, trazem a temática de seus estágios ou de suas monografias, através de oficinas e cartilhas, por exemplo”, frisou.

Letícia falou sobre o componente curricular “Projeto Trabalho, Ciência e Cultura (PTCC)” que, de acordo com ela, é composto por duas atividades – a disciplina de Metodologia Científica, ofertada aos estudantes do 3º ano do ensino médio, e a produção de uma monografia, desenvolvida pelos alunos do 4º ano. “Trata-se de uma iniciação científica curricular, que tem como foco a pesquisa como princípio educativo”, comentou.

Danielle trouxe a experiência do Projeto Brotinho, realizado em 2019, a partir das aulas de Biologia nas turmas de 3º ano do Ensino Médio, no processo pedagógico de abordagem da temática Ecologia. Em articulação com o Projeto Semeando, no Projeto Brotinho os estudantes, segundo a professora-pesquisadora, fizeram plantio de mudas e sementes em diferentes suportes com aproveitamento de resíduos como garrafas PET, pallets e galões de água; e realizaram oficinas de horta nesses suportes e em vasinhos auto irrigáveis, além de compostagem utilizando resíduos orgânicos. O Projeto Semeando oferece atividades multidisciplinares a partir de ações educativas, contribuindo para a iniciação científica e para a educação profissional na Escola Politécnica. “Ao terem contato com o tema e os debates sobre ecossistemas, assim como aulas no jardim da Escola sobre a relação dos vegetais e o solo, os alunos tiveram a ideia de elaborar um projeto para a Feira de Ciências da escola que envolvesse as práticas e princípios da Agroecologia Urbana”, lembrou.

Debates e plano de ação

No segundo dia do evento, os professores das escolas Boa Vista e Rio Grande do Norte se reuniram em grupos para debater sobre os desafios e as possibilidades de inserir a iniciação científica na proposta pedagógica das escolas e elaborar propostas de planejamento sobre o tema. Após os debates, os professores apresentaram seus planos de ação.

Uma das propostas de iniciação científica apresentadas pela Escola Rio Grande do Norte foi a ideia de, em conjunto com os estudantes, criar um bairro virtual. O professor de história Gustavo Marcondes explicou: “As terras do nosso município, Volta Redonda, foram apropriadas pela iniciativa privada e os moradores estão apartados disso. Nossa ideia, então, seria criar um espaço de convivência mais voltado a justiça social e acesso a moradia que, quem sabe um dia, possa ser aplicado pelo poder público”. 

Os estudantes, segundo o professor, ficariam responsáveis pela pesquisa, levantamento de dados e criação de projetos e propostas que viabilizem esse bairro autossuficiente, voltado para pedestres, com implementação de energia limpa e tratamento de resíduos. “Precisamos discutir com nossos estudantes a lógica perversa que atinge a maioria dos municípios do Brasil. Nossas cidades são hostis e segregam grande parte da população”, contou.

Já o Colégio Boa Vista apresentou, em seu plano de ações, a proposta de os estudantes desenvolverem suas pesquisas com professores/orientadores e que os produtos desses estudos sejam apresentados em um evento, como uma Jornada de Ciência e Tecnologia. “Conseguimos pensar e projetar algumas ações importantes e já vamos colocá-las em prática a partir deste bimestre. Vamos sensibilizar a comunidade escolar sobre a importância da iniciação científica, para que eles entendam que o cientista não é só o grande detentor do conhecimento, que está no laboratório, fazendo descobertas. Cientista é o professor que está na sala de aula ou o estudante que descobre e se projeta para crescer através do conhecimento”, concluiu.

Para Cristiane Braga, foram dois dias de muito trabalho, compartilhamento e aprendizados: “As duas escolas trouxeram reflexões importantes e, principalmente, fortaleceram a ideia da iniciação científica como uma atividade fundamental para o desenvolvimento da Ciência e Tecnologia”.