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Pesquisa aponta vulnerabilidade na saúde de jovens

Dossiê lançado pela EPSJV e a Agenda Jovem Fiocruz traz resultados inéditos a partir de bases de dados dos sistemas de informações em saúde do SUS
Erika Farias - EPSJV/Fiocruz | 13/12/2023 09h11 - Atualizado em 08/04/2024 11h19

Jovens sofrem violência física, psicológica e sexual em maior proporção que todas as demais faixas etárias. Esse é um dos dados apresentados pelo dossiê “Panorama da Situação de Saúde de Jovens Brasileiros de 2016 a 2022: Intersecções entre Juventude, Saúde e Trabalho”, elaborado pela Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) e pela Agenda Jovem Fiocruz, da Coordenação de Cooperação Social da Presidência da Fiocruz. O documento, que traz resultados inéditos a partir de bases de dados dos sistemas de informações em saúde do Sistema Único de Saúde (SUS) sobre jovens entre 15 e 29 anos, foi lançado, no dia 11 de dezembro, durante uma live transmitida pelo canal da Escola Politécnica no YouTube

Participaram do lançamento, Maria Augusta Rodrigues Gomes, da Coordenação-Geral de Vigilância em Saúde do Trabalhador, do Ministério da Saúde (CGSAT/SVSA/MS); João Victor da Motta Baptista, diretor de Políticas de Trabalho para a Juventude do Ministério do Trabalho e Emprego; Adriana Marcolino, coordenadora de Produção Técnica do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese); a professora-pesquisadora da ESPJV, Bianca Leandro; o coordenador da Agenda Jovem Fiocruz, André Sobrinho; e a socióloga Helena Abramo.

Por vídeo, a vice-diretora de Pesquisa da Escola Politécnica, Monica Vieira, falou sobre a pesquisa. “Essa é uma temática que atravessa a todos nós. Para pensarmos na vida, no futuro, no trabalho, precisamos compreender o que tem acontecido com os nossos jovens, quais são suas condições e possibilidades de existir”, disse.
André Sobrinho, da Agenda Jovem, comentou sobre a dimensão que a pesquisa tomou ao abordar o adoecimento e a morte de jovens, uma ideia conflitante com o que socialmente se tem em mente para este grupo populacional. “As pessoas veem esse grupo associado com uma questão de vitalidade, e então trazemos esses dados que apontam a forte vulnerabilidade que essa população vive em sua questão de saúde”, afirmou. O coordenador também alertou sobre a importância de as áreas de políticas públicas compreenderem que, quando se fala em jovens, há uma pluralidade. “Compreendemos essa faixa etária de maneiras distintas de acordo com marcadores sociais de gênero, raça, territorialidade, além do próprio marcador ‘idade’, visto que, dentro de ‘juventude’, essa marcação é necessária”, explica André.

O coordenador explica como é importante essa distinção etária no interior do segmento “juventude”, pensando especialmente em duas legislações brasileiras que orientam políticas de saúde pública voltadas à juventude: o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que abrange de 12 a 18 anos incompletos; e o Estatuto da Juventude (de 15 a 29 – com a interseção com o ECA). “Como está demonstrado no dossiê, quando pensamos em políticas públicas de saúde para adolescentes e jovens, não estamos pensando em percursos similares. Isso tem impactos na saúde de maneiras distintas, sobretudo de acesso, de proteção e de inserção”, complementou.

Helena Abramo, socióloga e uma das organizadoras da pesquisa, chamou a atenção para o fato de que a sociedade brasileira já tem algum acúmulo de informações e um número razoável de ações em curso sobre o período final da adolescência, no recorte de 15 a 17 anos, aproximadamente. Mas, para outros segmentos há pouca visibilidade e menos ações na garantia dos direitos. “Queremos olhar para esses segmentos com mais cuidado, para que também possamos incorporar esses jovens como sujeitos de direitos de políticas públicas que garantam seus direitos”, afirmou.

A professora-pesquisadora da EPSJV, Bianca Leandro, reforçou que o documento foi construído a partir das bases de dados dos sistemas de saúde do SUS, com o intuito de verificar suas possibilidades de contribuição na saúde dos jovens. Também foram somados aos dados do SUS, dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD Contínua), de 2021 e 2022; além da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), de 2019. Bianca também reforçou a escolha por dados públicos e abertos em nível nacional. “Quando possível, fizemos estratificações pelas grandes regiões do país, para mostrar que é possível ter um exercício analítico que possa olhar para a condição de saúde da juventude. São dados que possibilitam usar uma lupa sobre essas situações”, afirmou.

Cenário

Adriana Marcolino, coordenadora de Produção Técnica do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), falou sobre a conjuntura econômica atual que a juventude está vivenciando, com recessão, pós-pandemia, insegurança sanitária, degradação ambiental, entre outros aspectos. Adriana falou ainda que, no Brasil, um país “campeão de acidentes de trabalho”, “não deveria surpreender, que a juventude, com sua vinculação mais precária, com menos experiência profissional, com menor participação de organização sindical, que tudo isso colabore com esse maior adoecimento. Ainda assim, esses dados chocam bastante”, afirmou.

Já o diretor de Políticas de Trabalho para a Juventude do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), João Victor da Motta Baptista, questionou qual é o momento certo de a sociedade pensar na inserção do jovem no mercado de trabalho. “Já que muitos deles, trabalharão, no mínimo, mais 50 anos para se aposentarem. Em quais condições esses jovens trabalharão? Quais trabalhos estarão à disposição para eles executarem?”, questionou João Victor.

Por fim, Maria Augusta, da Coordenação-Geral de Vigilância em Saúde do Trabalhador, do MS, destacou que a notificação ainda é um agente dificultador na gestão da saúde do trabalhador. “Muitas vezes, o que temos observado é a questão da subnotificação. Os acidentes acontecem e vemos que os campos não foram devidamente preenchidos”, ressaltou. “Na pesquisa, vemos que nas notificações de violência, que são compulsórias, 89% dos campos ‘ocupação’ não foram preenchidos. Isso é grave, porque o trabalho não é só uma questão de subsistência, ele também reflete a realização pessoal”, disse.

Saúde de jovens

Ainda durante o evento, a professora-pesquisadora da EPSJV, Bianca Leandro, apresentou alguns resultados da pesquisa, que é estruturada em apresentação, fontes de informação e breve panorama sobre a juventude no Brasil, além de seis capítulos temáticos com bases em escolhas dos sistemas de dados: perfil de mortalidade, perfil de morbidade, violências, acidentes de trabalho, acidentes de trabalho com material biológico e transtorno mental relacionado ao trabalho. O dossiê destaca que os jovens compõem o grupo etário mais sujeito a acidentes de trabalho, sendo que um terço de todos os acidentes de trabalho notificados no período estudado ocorreram em jovens. Dentre esses, 78% são homens. Outro ponto levantado é que jovens entre 20 e 29 anos apresentam uma taxa de ocorrência de acidentes 50% maior que a população com 30 anos ou mais.

Já quando se fala em transtorno mental relacionado ao trabalho, Bianca apresentou dados que demonstram que a maior parte acontece em mulheres, com 74%. “Isso também pode acontecer em virtude das mulheres se reconhecem mais nessa situação de estarem vivenciado transtorno mental no trabalho”, explicou a pesquisadora. Dentre os jovens identificados com transtorno mental, 63% possuíam carteira assinada; as principais causas de afastamento foram ansiedade (22%) e estresse (17%). “E estamos falando de jovens que acabaram de ingressar no mercado de trabalho”, complementou.