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Reformas do Estado e Seguridade Social

O impacto das reformas nos direitos dos trabalhadores foi o tema na abertura do Ano Letivo 2017 da EPSJV, com a professora Sara Granemann
Talita Rodrigues - EPSJV/Fiocruz | 03/04/2017 07h46 - Atualizado em 01/07/2022 09h45

As reformas e contrarreformas propostas pelo governo e que afetam os direitos dos trabalhadores foram o tema da Abertura do Ano Letivo 2017 da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz), no dia 29 de março, com a palestra da professora Sara Granemann, da Escola de Serviço Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Em sua exposição, Sara mostrou que a justificativa do governo de que as reformas são necessárias para economizar recursos do Estado não se sustenta sob uma análise de quanto o governo arrecada e quanto gasta com Seguridade Social, que inclui Previdência Pública, Saúde Pública e Assistência Social.

O Fundo Público, montante de recursos usado pelo governo para custear as despesas com políticas sociais, educação e habitação, entre outros, é de R$ 4 trilhões para 2017, segundo Sara. Desse total, 70% vêm do dinheiro arrecadado dos trabalhadores com os impostos que incidem sobre o trabalho, enquanto 30% vêm da arrecadação com o mercado de capitais. “O Estado diz que é deficitário porque está gastando com educação, saúde, previdência. E isso justifica as reformas do Estado e na Seguridade Social, mas pagamos por isso com o nosso salário. O Estado diz que tem que fazer a Reforma da Previdência e saúde porque gasta muito conosco, mas pagamos 70% da conta”, afirmou a professora, acrescentando que a lógica entre quem paga a conta e quem recebe os benefícios é inversa na hora de gastar o dinheiro do Fundo Público. De acordo com Sara, 80% dos recursos são devolvidos aos capitais e 20% são aplicados nas políticas sociais para os trabalhadores. “Quando o Estado devolve à sociedade essa riqueza socialmente construída, devolve em proporções muito diferentes para o capital e o trabalho. A guerra é pela partição do Fundo Público”, completou.

Sara destacou que esse “avanço” sobre o Fundo Público acontece de várias formas. Uma delas é a contrarreforma da Previdência, que tira direitos dos trabalhadores e faz com que as pessoas busquem alternativas como a previdência privada, que também é custeada, em parte, pelo Fundo Público. A mesma lógica é usada na Saúde e Educação. “A queda na qualidade da educação pública faz crescer a educação privada. Assim como o ataque à saúde pública, que a torna ineficiente, alimenta o crescimento da saúde privada”, observou a professora.

Ao contrário do que afirma o governo federal, a Seguridade Social não é deficitária, segundo a professora: ela é superavitária porque gasta menos do que arrecada. Somando todas as arrecadações, são recolhidos cerca de R$ 3 trilhões por ano entre recursos de trabalhadores para a previdência pública, previdência privada e fundos de pensão. “É esse dinheiro que está em disputa porque, na visão dos capitais, esse dinheiro não deve ser devolvido aos trabalhadores sob a forma de direitos: direito a se aposentar, ter saúde púbica e assistência social”, disse.

Para fazer a divisão do Fundo Público, o governo cria estratégias como a PEC do Teto dos Gastos, o PL da Terceirização e a Reforma da Previdência. “Tudo isso está articulado e faz parte de um só projeto de governo, que tem o objetivo de tirar mais direitos dos trabalhadores”, disse Sara.

Previdência

Entre os direitos dos trabalhadores que estão ameaçados com a PEC 287, da Reforma da Previdência, Sara citou o Benefício de Prestação Continuada (BPC), que, atualmente, é o único benefício que os trabalhadores com mais de 65 anos conseguem acessar depois de uma vida inteira de trabalho informal. Atualmente, o valor do BPC é de um salário mínimo. Com a reforma, a proposta é que o benefício tenha seu valor desvinculado do salário mínimo. “Os capitais defendem que o BPC deve ser de metade ou menos do salário mínimo e ser pago a partir dos 70 anos, com aumento da idade mínima a cada dois anos. Com isso, a redução de beneficiados vai ser brutal. Se trata de produzir a miséria e a morte das pessoas”, afirmou.

A professora ressaltou ainda que a reforma retira direitos também de quem recebe mais de uma aposentadoria, como professores que são servidores estaduais e municipais e, pelas regras atuais, têm direito a duas aposentadorias. “Ao se aposentar, essas pessoas terão que escolher qual benefício irão receber. Apesar de terem trabalhado a vida toda nos dois empregos e contribuído com a previdência, só poderão receber um benefício quando se aposentarem”, disse Sara, lembrando que a mesma regra vai se aplicar também a quem já recebe aposentadoria e passar a ter direito a pensão por morte, entre outros casos.

Sara destacou ainda que, além das questões específicas, a nova regra geral vai atingir a todos. O tempo mínimo de contribuição passa dos atuais 15 anos para 25 anos e a idade mínima para se aposentar passa a ser de 65 anos para homens e mulheres. Atualmente, a idade mínima é de 60 anos para mulheres e 65 anos para homens. A professora criticou a justificativa da PEC para igualar as idades mínimas de homens e mulheres. “O governo diz que, atualmente, mulheres vivem mais e estão recebendo os mesmos salários e direitos que os homens, mas os dados mostram que não é isso. Em média, as mulheres trabalham 42 horas semanais fora de casa e mais 25 horas em trabalhos domésticos. Enquanto os homens trabalham 44 horas fora de casa e de 7 a 10 horas em casa. Ou seja, as jornadas são diferentes. A mulher tem direito a se aposentar com idade inferior. Não é privilégio. E os homens tem que defender isso junto com as mulheres”, defendeu.

Para a professora, as reformas aumentam a exploração da classe trabalhadora e nenhum trabalhador está com seus direitos garantidos. “A reforma afeta a todos, inclusive os que ainda nem entraram no mercado de trabalho. A reforma não é nossa necessidade, é necessidade deles, do governo. Por isso devemos impedir, porque vai nos tornar mais pobres, mais miseráveis e menos humanos, mesmo com a riqueza que produzimos todos os dias”, concluiu Sara.