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Direitos humanos e sociais em debate na Fiocruz

Virgínia Fontes, Marcelo Freixo e Pedro Bocayuva discutem o tema durante seminário internacional.
Talita Rodrigues - EPSJV/Fiocruz | 30/07/2010 08h00 - Atualizado em 01/07/2022 09h47


Direitos humanos e a expropriação de direitos sociais foram os temas centrais da mesa ‘Direito de Cidadania e as Tecnologias Sociais’, realizada no dia 28 de julho e que contou com a participação de Virgínia Fontes, Marcelo Freixo e Pedro Cunca Bocayuva. O debate fez parte da programação do V Seminário Internacional Direito e Saúde, realizado na Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP) e que teve o apoio da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz).



A historiadora e pesquisadora da EPSJV e da UFF, Virgínia Fontes, observou que Democracia, Direitos e Cidadania são conceitos essenciais que remetem a conquistas sociais importantes, mas incompletas. “É a imagem do copo meio cheio e meio vazio, que demonstra instabilidade. A conquista de direitos pode resultar em uma situação perversa, em que a parte vazia avança sobre a cheia, por sucção ou evaporação das conquistas populares”, disse Virgínia, que continuou: “No caso da saúde no Brasil, por exemplo, temos 20 anos de muitas lutas, mas também temos derrotas. Os direitos estão sendo expropriados e a metade do copo está esvaziando”.



Virgínia defendeu ainda que a sociedade tem que lutar por uma saúde que vá além do direito aos hospitais e à assistência, portanto, que, tanto na concepção quanto na prática, envolva o conjunto da vida social e humana.



Ela citou os transgênicos como um exemplo de um tipo de expropriação, ressaltando que, nessa situação, a alimentação se torna fonte de vida e de doenças ao mesmo tempo. “A mesma empresa que faz a semente faz o remédio. Nesse caso, ao contrário do que diz o ditado, o que engorda pode matar. Passam a se produzir remédios para combater as doenças vendidas como alimentos”, explicou Virgínia. E completou: “Os transgênicos expropriam a humanidade da capacidade natural de reprodução das sementes e esse processo também pode ser estendido para os animais tratados e produzidos quimicamente, como o frango, por exemplo”.



Urbanização e retirada de direitos



O intenso processo de expropriação de direitos sociais nas últimas décadas coincide, segundo Virgínia, com a redução do papel do Estado, principalmente a partir da década de 1990. “São três décadas de devastação sistemática de direitos. No caso brasileiro, estamos na triste situação de ser modelo de expropriação mundial”, afirmou.



A crescente urbanização da população não reduziu o processo de espoliação de direitos, ao contrário, acelerou uma intensa expropriação de direitos conquistados pelos trabalhadores como formas de proteção social (saúde, educação, lazer, aposentadoria). “Mesmo com o crescimento contínuo da população das cidades e a redução dos moradores do campo, a expropriação primária, que foi a base social para a implantação do capitalismo, continua avançando no campo”.



O professor da PUC-RJ e pesquisador da UFRJ, que foi outro debatedor da mesa, Pedro Bocayuva, lembrou que mesmo os direitos conquistados com as revoluções, muitas vezes são perdidos. “No interior das revoluções, houve uma perda de direitos e os Estados de Bem-Estar Social se tornaram corporativos e rígidos”, disse Pedro. Na busca pelos direitos, Pedro observa que a ferramenta jurídica tem que ser estendida como um instrumento de luta coletiva. “As ações civis públicas têm que existir”.



Diretos Humanos



Discutir a questão dos direitos humanos em uma perspectiva de classe é o principal debate a ser travado pela sociedade para o deputado estadual Marcelo Freio (PSOL-RJ). “O eixo da luta pelos direitos humanos são as relações de classe estabelecidas. Atualmente, o conceito de cidadania está cada vez menos ligado aos direitos humanos e mais ao direito do consumidor. É a relação do ‘compro, logo existo’. Para aqueles que não consomem, sobram os Direitos Humanos. Por isso, o debate da justiça é também um debate de classe”, disse Marcelo.



O deputado apontou a produção do medo como fundamental para manter as relações de poder atualmente estabelecidas na sociedade. Para isso, a sensação de insegurança precisa ser incorporada e sentida pela população. “Para todo o Estado mínimo vitorioso, é necessário um Estado penal máximo. É uma rearrumação do Estado. O sistema prisional brasileiro é muito eficaz no que se propõe: retira da sociedade as pessoas que são temidas, aliviando o medo para manter a ordem”, criticou Marcelo, informando que o Brasil tem a quarta maior população carcerária do mundo, com 500 mil presos, atrás apenas dos Estados Unidos, China e Rússia.



A pacificação da cidade do Rio de Janeiro, com a implantação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) revela, para o deputado, a concepção de cidade pensada pelo poder público. “O mapa das UPPs nos mostra que elas estão em lugares que interessam economicamente: a Zona Sul, a Cidade Deus, por causa da especulação imobiliária na Barra, e a região do Maracanã, por causa da Copa do Mundo”, disse Marcelo, que completou: “Mas a ideia de um Rio de Janeiro pacificado não poderia conviver com os índices de auto de resistência que se mantêm no Rio de Janeiro. Oficialmente, são três pessoas mortas por dia no Rio pacificado”.