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Eleições 2010: propostas do candidato Plínio de Arruda Sampaio

Plínio de Arruda Sampaio é candidato à presidência pelo Partido Socialismo e Liberdade (Psol)
Redação - EPSJV/Fiocruz | 01/09/2010 00h00 - Atualizado em 01/07/2022 09h44

Precisamos derrubar o muro da desigualdade no Brasil

Saúde

A saúde pública é um dos principais problemas no Brasil hoje, muitas vezes ela divide aqueles que têm direito de vida e de morte. Os que podem pagar têm acesso a uma medicina de qualidade e podem cuidar de sua saúde muito bem, quem não pode pagar espera meses por um atendimento, por um exame.
Isso precisa mudar. O acesso à saúde é um direito de toda a população e fornecer saúde de qualidade é um dever do Estado, e não uma bondade. A partir dessa análise, acredito que são necessárias mudanças profundas e radicais no sistema que vivemos hoje.

A base para esta mudança se espelha no sistema britânico, conquistado por lutas trabalhistas após a segunda guerra mundial. Neste processo diversas empresas foram estatizadas, entre elas a de prestação de serviços de saúde. Em 1979, com a entrada de Margareth Tatcher no governo inglês, uma série de empresas foi privatizada, no entanto, o sistema de saúde continuou sobre controle estatal. Até hoje os ingleses têm acesso à saúde pública e estão satisfeitos com o atendimento.

Voltando à realidade brasileira, é indispensável que um sistema próximo ao inglês seja aplicado no Brasil se realmente desejamos que os mais pobres recebam atendimento médico de qualidade. Para que isso ocorra, não podemos nutrir a ilusão de que o fortalecimento do SUS (Sistema Único de Saúde) é suficiente para que a população carente seja bem atendida, é necessário que a medicina seja socializada. Enquanto houver estruturas privadas de saúde, ha-
verá sempre um atendimento superior para quem tiver mais recursos.

A saúde não pode ser, sob hipótese alguma, instrumento de comércio. O pobre recorre ao sistema público, enfrenta longas filas, falta de remédios, e a precariedade do sistema; de outro lado, o rico paga e tem acesso rápido e fácil a bons hospitais, compra de remédios e médicos com boa formação. Tendo esse cenário em vista, eu pergunto: é justo que algumas pessoas tenham acesso à saúde e outras não? É justo ainda que alguém lucre com a doença de outrem?

Quando exponho estas ideias algumas pessoas as taxam de ideológicas, pois estaria aceitando o atraso no desenvolvimento da medicina, já que argumentam que o Estado não tem a mesma agilidade do setor privado no desenvolvimento de inovações tecnológicas.

Lembrando novamente o exemplo inglês, vemos que não houve atraso algum na medicina do país europeu. Mas, além desse exemplo concreto, é fácil rejeitar a objeção: quando os ricos têm de se submeter ao tratamento dado a todos, eles pressionam o Estado para gastar no setor.

Além disso, a política de socialização da medicina tem que estar em consonância com outras políticas públicas, como a aumento de recursos para a educação pública, incentivando assim a pesquisa e o desenvolvimento das diversas áreas, e entre elas a medicina. Assim, garantimos também que as inovações e novos tratamentos sejam aplicados a todos sem distinção.

Nesta medicina socializada também é essencial que médicos, enfermeiros e demais trabalhadores sejam todos funcionários públicos, organizados em carreira e que tenham seus direitos trabalhistas respeitados.
Tratando-se de mudança tão substancial, será necessário proceder em prudência. Mas tudo indica que em quatro anos, com iniciativa e vontade política do Estado, além da inversão na prioridade dos gastos públicos, o sistema poderá estar integralmente instalado.

Educação

Um dos pilares da desigualdade brasileira se assenta sobre a diferença entre a educação pública e a privada. Podemos resumir a educação brasileira com as seguintes características: educação básica, fundamental e média particular de boa qualidade acessível a famílias ricas que podem pagar; educação superior pública de boa qualidade, de difícil acesso a quem não frequentou escolas particulares. Este cenário destina meninos e meninas pobres a uma formação de má qualidade e consequentemente a ocuparem postos de trabalho com menor remuneração, insalubres ou informais.

Assim como na saúde, existe um muro de desigualdade, e é preciso acabar com isso. A principal proposta neste sentido é aumentar abissalmente os recursos para a educação, que durante os últimos 16 anos beiraram os pífios 3%. Se o Brasil gastar menos de 10% do PIB na educação pública será impossível superar o atraso tecnológico e político que o separa das nações desenvolvidas.

Já existe dentro da Constituição um mecanismo que prevê que 18% da receita dos impostos sejam usados obrigatoriamente na educação. Durante o governo Itamar, no entanto, foi criado um mecanismo que permite o desvio de 20% deste recurso mínimo a ser gasto em todos os setores sociais que têm recursos vinculados na Constituição. Essa medida desviou, somente entre 2003 e 2007, R$ 23 bilhões da educação.

Em 2009 foi aprovada uma emenda constitucional que acaba progressivamente, até 2011, com a DRU na educação. A distribuição dos recursos para a educação, no entanto, não é automaticamente alterada somente porque foi aprovado um percentual de recursos em relação ao PIB. Outros artigos da Constituição formatam o modelo de distribuição de recursos, especialmente o artigo 212 e o artigo 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Nestes artigos que estão estabelecidas as regras de aplicação de recursos. Sem alterá-los de forma substantiva, o estabelecimento de relação gasto educacional/PIB será mera declaração de princípios, de boas intenções.

Além de aumentar os recursos, é necessário rever toda a política de educação dos últimos 16 anos, eliminando toda a transferência (direta e indireta) desses recursos para as indústrias do ensino superior. Atualmente, 90% do ensino superior é ministrado em instituições privadas, sendo que 70% destas são “negócios” que fornecem ensino de baixa qualidade a preço elevado. Além de o ensino ser privado, e portanto restrito, o ensino é de péssima qualidade. Por isso uma das prioridades é, sem prejuízo das medidas destinadas aos demais níveis, dar atenção ao ensino superior no Brasil.

Isto exige uma reconstrução do PROUNI, tirando o subsídio para as Faculdades particulares e aumentando as vagas no ensino público. Hoje o dinheiro gasto com uma bolsa no PROUNI equivale à abertura de três vagas em instituições do Estado. Esse projeto, gestado no Banco Mundial, expande o número de profissionais de nível superior, mas com formação limitada, pressionando os salários desses profissionais para baixo. O REUNI materializa esse projeto e deverá ser inteiramente revisto.

É necessário ao mesmo tempo combater a privatização disfarçada dos centros universitários através de convênios e fundações. Na Universidade de São Paulo (USP), por exemplo, as parcerias destroem a pesquisa, atrelando-a aos mercados. Nas Faculdades de Química e na Farmácia existem diversas linhas de pesquisas para o desenvolvimento de medicamentos para a indústria farmacêutica e sabores e texturas mais agradáveis para os fabricantes de comida.

Na Faculdade de Economia e Administração bancos patrocinam pesquisas e construção de salas de aula. Existe uma lista enorme de outras medidas como estas que mostram como o dinheiro publico é utilizado para financiar pesquisas privadas.
Esse muro de desigualdade que impede o pobre de disputar um emprego bom precisa ser derrubado. O instrumento principal para promover essa derrubada é acabar com a mercantilização da educação, um processo que não poderá terminar no período de um mandato, mas que pode e deve avançar bastante num período de quatro anos.

Trabalho

O PSOL defende a redução da jornada de trabalho das atuais 44 horas para 40 horas, sem redução de salários e com o fim da flexibilização da jornada, dos direitos trabalhistas e dos bancos de horas.

Se parte da força de trabalho está sem ocupação, não é necessário que o trabalhador fique oito horas por dia em seu emprego.

Atrelado a essa política é preciso alterar a salário mínimo para os padrões do DIEESE (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos). Com esse salário o brasileiro conseguirá pagar todas as suas despesas com cesta básica, moradia, transporte, educação, saúde, vestuário, higiene e previdência. O índice divulgado em junho aponta que o salário mínimo deveria ser quatro vezes maior do que o atual, o que equivale a cerca de R$ 2.090,00.

Para que essa medida seja aplicada, é necessária a criação de um sistema que desonere os produtos da cesta básica, mas que aumente os impostos para os donos das grandes fortunas. Proporcionalmente, um homem rico e um homem pobre que compram uma caixa de fósforo pagam o mesmo imposto absoluto. Para o rico não é nada. Para o pobre é um problema. Por isso, algumas tarifas como o ICMS, que hoje é cobrado na origem, podem ser até aumentadas.

Plínio de Arruda Sampaio é candidato à Presidência da República pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL).