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Experiências exitosas de combate à pandemia

Como porta de entrada do SUS, a atenção básica garantiu importantes avanços no combate à pandemia em todo o país
Viviane Tavares - EPSJV/Fiocruz | 15/03/2021 16h09 - Atualizado em 01/07/2022 09h42

Imagina um cenário em que alguém pula para a parte final de um processo, deixando de usar as ferramentas disponíveis que poderiam ter facilitado ou mesmo evitado que se chegasse ao estágio mais complexo do problema. Pois, de acordo com especialistas ouvidos por esta reportagem, foi isso que os governos fizeram no Brasil quando dispensaram, no primeiro momento, a atuação da atenção básica à saúde no combate à pandemia de Covid-19.

Com cobertura em cada canto do país, em todos os municípios brasileiros e com organização de base territorial, a atenção básica, também chamada de atenção primária, é o primeiro contato dos usuários com o Sistema Único de Saúde (SUS). Seu principal objetivo é a orientação sobre prevenção de doenças e uma assistência mais generalista, que permita solucionar alguns agravos e identificar aqueles que precisam ser encaminhados para especialistas ou atendimento de urgência e emergência. Funciona, portanto, como um filtro que organiza e direciona as necessidades e demandas da população para as redes de saúde, orientando desde casos mais simples, que envolvam, por exemplo, a educação em saúde, até os mais complexos, como o encaminhamento de uma internação por Covid-19. “A Atenção Básica caracteriza-se por um conjunto de ações de saúde, no âmbito individual e coletivo, que abrangem a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação e a manutenção da saúde. É desenvolvida por meio do exercício de práticas gerenciais e sanitárias democráticas e participativas, sob forma de trabalho em equipe, dirigidas a populações de territórios bem delimitados, pelas quais assume a responsabilidade sanitária, considerando a dinamicidade existente no território em que vivem essas populações. Utiliza tecnologias de elevada complexidade e baixa densidade, que devem resolver os problemas de saúde de maior frequência e relevância em seu território. É o contato preferencial dos usuários com os sistemas de saúde”, define a Portaria 648/06, do Ministério da Saúde, que trata dessa Política.

Com o potencial e a capilaridade que o desenho do SUS lhe conferiu, por que a atenção básica foi pouco mobilizada pelas estratégias de contenção da pandemia que ainda estamos vivendo? Avaliando o período de fevereiro e março de 2020, início da pandemia, o pesquisador Cesar Favoreto, no artigo ‘Atenção primária forte: elemento central no combate à pandemia de Covid-19’, afirma que poucas iniciativas dos gestores de saúde tiveram a atenção primária como principal linha de frente. Nessa mobilização, diz o texto, “a maior ênfase recaiu sobre a organização das redes de atenção para atender os casos de insuficiência respiratória aguda (IRA), como a criação de hospitais de campanha, ampliação dos leitos de terapia intensiva, aquisição de equipamentos (respiradores artificiais e de proteção individual – EPI)”.

A importância da atenção primária está, sobretudo, na sua capilaridade e por isso ela é tão crucial para uma doença que atinge todo o país, como explica a pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz) e integrante da Rede de Pesquisa em Atenção Primária à Saúde Ligia Giovanella. “A atenção primária à saúde e, especificamente no Brasil, a estratégia de saúde da família, com sua inserção comunitária, territorial, conhece o conjunto da população que vive naquela área, naquele território, acompanha grupos de maior risco, grupos prioritários de outras comorbidades de condições de saúde etc. Por todo esse conhecimento e distribuição, teria condições de fazer essa abordagem comunitária tão necessária, certamente, articulada com os campos da vigilância em saúde”, avalia.

Para Márcia Pinheiro, assessora técnica do Conselho Nacional dos Secretários Municipais de Saúde (Conasems) e coordenadora do projeto ‘Mostra Brasil, Aqui Tem SUS’, o que se viu até agora foi o foco na fase crítica da doença, mas muitos agravos poderiam ter sido evitados se tivessem olhado para a porta de entrada do SUS. “À medida que as coisas foram minimamente se organizando e a gente começou a olhar também para outras questões, ficou muito claro que o papel da atenção básica nisso tudo era mais do que fundamental”, avalia e completa: “O trabalho no território, com as comunidades, deveria ser de orientar [a população] desde o início, mas no começo a orientação era ‘fique em casa, não procure a atenção básica’, ou ‘quando tiver falta de ar, procure o hospital’. Esse momento, no começo, pelo próprio desconhecimento, afastou um pouco ou minimizou a potência da atenção básica na luta contra essa pandemia”.

Experiências exitosas em cada canto do país

Apesar de as orientações e a pouca valorização do trabalho da atenção básica no início da pandemia terem dificultado ações mais estruturante, experiências exitosas em cada canto do país mostraram a potência dessa porta de entrada do Sistema Único de Saúde mesmo em meio a uma crise sanitária desse porte. Para ilustrar esse processo, a reportagem selecionou uma experiência de cada região brasileira, a partir de um levantamento produzido pelo Conasems e pela Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) sobre a atuação de equipes da atenção primária no combate à pandemia. “A gente não tem nenhum estudo de mortes [por Covid-19 nessas cidades], ou sobre os efeitos específicos [da atenção básica] nos desfechos [da doença], porque a pandemia tem tempos diferentes em cada um dos municípios. Não vi nenhum estudo que mostre a relação [da atuação da atenção básica] com o desfecho. Mas uma coisa muito importante é que a abordagem é populacional, comunitária, é intersetorial. Essa é a questão. [Para enfrentar a pandemia], tem que ser uma articulação entre os campos da saúde, da economia, dos serviços sociais. Acho que nunca se mostrou de forma tão importante a questão da intersetorialidade”, explica Ligia Giovanella, referindo-se à importância de se conhecer essas experiências.

Com uma população de cerca de 250 mil habitantes, o município de Rio Verde, no interior do estado de Goiás, região Centro-Oeste do país, estava em um momento de reestruturação da atenção básica quando a pandemia chegou. De acordo com o diretor geral da atenção primária do município e médico da família Marcos Vinícius Vaz, a pandemia serviu para ratificar a importância desse segmento.

Entre as iniciativas específicas para o combate à pandemia, o município de Rio Verde montou um consultório isolado para atender suspeitas de Covid-19. “Quando o paciente chegava, havia uma triagem. Se ele tinha alguma queixa suspeita, entrava por outro lado e neste local o médico ou enfermeiro colocava todo o equipamento de proteção individual (EPI) para fazer o atendimento”, conta. Como outra iniciativa ligada à atenção primária, Vaz apresenta a estruturação das farmácias em cada unidade de saúde impulsionada pela procura de medicamentos para o tratamento dos sintomas da Covid-19.  “Os usuários do SUS estavam andando muito atrás de medicamentos. E a gente se preocupou muito no abastecimento de medicamentos com base científica. Não teve nada de kit covid. A gente sabia que tinha que tratar os sintomas, não adiantava o paciente chegar aqui e não ter dipirona nessa unidade. Por conta dessa emergência, levamos farmácia para todas as 14 unidades e isso vai perdurar agora. A gente não vai tirar as farmácias mais”, diz.

Complementarmente a essas mudanças na atenção básica, eles adquiriram outra ambulância para dar conta do transporte de pacientes com estado moderado e grave para o Hospital Municipal. “Apelidada de ‘corona’, a ambulância funcionou exclusivamente para este tipo de transporte, evitando a fila do SAMU [Serviço de Atendimento Médico de Urgência], que tinha que se dividir com outros casos que não pararam de acontecer”, relembra.

A pandemia, conclui o diretor geral, “ajudou a mostrar a força e o tanto que a gente deve priorizar a atenção primária aqui”. Atualmente, com os recursos do Saúde na Hora, as 14 unidades estão funcionando das 7h às 21h e cinco horas nos finais de semana. Como força-tarefa para vacinação, segundo Vaz, foram criadas ainda três novas salas exclusivas para o atendimento a casos de Covid-19, além de um drive-thru. “Essas iniciativas vão no sentido de não tumultuar o andamento da unidade no atendimento, assim como quando a gente tiver vacina para população em geral”.

Diferente do município de Rio Verde, que implementou o fortalecimento da atenção básica em plena pandemia, o município de Sobral, no Ceará, região Nordeste do Brasil, com população de 210 mil habitantes, vinha investindo em atenção primária muito antes da crise sanitária mundial. E esse investimento, explica Marcos Aguiar Ribeiro, enfermeiro e coordenador de vigilância do sistema de saúde do município, se deu a partir de três frentes principais: estruturar as unidades básicas de saúde, organizar os processos de trabalho e ampliar a cobertura populacional. “Nesse período da pandemia e antes dela, nossa compreensão sempre foi de acreditar no quanto a atenção primária é importante. É ela que está perto das pessoas. Por ter essa capilaridade, conhece as realidades. A gente enxergou que precisava ter estratégias que conseguissem compreender que a atenção primária seria a ordenadora, a grande gestora do cuidado nesse processo de enfrentamento da pandemia. Acho que esse entendimento foi muito importante para a gente aqui em Sobral”, reflete Ribeiro, que completa: “Uma das coisas importantíssimas que aconteceu nesse movimento foi que, ao longo dos últimos anos, o município de Sobral investiu muito forte no processo de melhoria das estruturas das unidades básicas de saúde.Elas são grandes, geralmente têm estacionamento, são ventiladas, a gente tem, inclusive, modelos de unidades que a gente denomina de Unidade Porta Aberta, porque a própria estrutura arquitetônica dá essa perspectiva acolhedora, de porta aberta mesmo, de abraçar a comunidade”.

Na prática, o município de Sobral, por já estar com o sistema de saúde local organizado, pode também atuar de forma antecipada. “Antes do início da transmissão comunitária de Covid-19 no Brasil, Sobral teve um primeiro caso provável importado, posteriormente descartado. O surgimento prematuro desse caso suspeito alertou a secretária municipal de saúde e, a partir do mês de fevereiro, foi iniciado um processo de reorganização da rede para o enfrentamento de uma possível onda de casos de Covid-19, quando foi disparada a produção do plano de contingência do município”, informa o coordenador de vigilância no artigo ‘(Re) Organização da Atenção Primária à Saúde para o enfrentamento da Covid-19: Experiência de Sobral-CE’.

A partir dessa experiência, foi criado um Centro de Operações Estratégicas em Saúde Pública do município, com a participação de representantes das secretarias municipais, universidades públicas e privadas, indústria, terceiro setor, além de hospitais públicos e privados. “Esse espaço facilitou a implementação de ações intersetoriais e propiciou a reflexão contínua sobre as decisões, sempre baseadas em evidências científicas”, avalia Ribeiro, em entrevista à Revista Poli.

Entre as iniciativas que já existiam, Ribeiro elenca aquelas que colaboraram no mapeamento e no cuidado em meio à crise sanitária. “A gente tem uma estratégia aqui em Sobral que é a ‘Trevo de Quatro Folhas’, uma política pública municipal que acompanha mulheres gestantes, puérperas e recém nascidos em situação de vulnerabilidade. No momento da pandemia, a gente já tinha todo esse grupo mapeado, então a gente conseguiu entrar em contato com eles de maneira mais fácil. Os idosos com hipertensão e diabetes já estavam estratificados e georreferenciados, o que facilitou muito nosso processo de intervenção no decorrer da pandemia. Se não houvesse todo esse investimento prévio, a gente não consegue imaginar como seria enfrentar a situação que a gente vivenciou aqui em Sobral”, explica. O município é pólo para 55 outros de uma região de saúde, sendo referência para média e alta complexidade. “Municípios menores precisam da gente para um cilindro de oxigênio, porque tem município de pequeno porte aqui que não tem acesso a esse tipo de equipamento”, relembra. A macrorregião da qual Sobral faz parte e é referência em relação à atenção primária de saúde reúne 37 Centros de Saúde da Família, dos quais 23 encontram-se na zona urbana e 14 na zona rural, com 70 equipes de Estratégia Saúde da Família, seis equipes de NASF (Núcleo Ampliado de Saúde da Família ), 50 de saúde bucal, três equipes multiprofissionais de Atenção domiciliar e duas academias da saúde.

Na região Sudeste, mais especificamente no município de Maricá, no estado do Rio de Janeiro, com uma população de 164,5 mil habitantes, a política de atenção primária estava em momento de transição. “Nós estávamos num processo de reestruturação da rede, passamos a adequar as unidades de saúde da família, qualificar e compor equipe de uma forma mais célere. Um pouco antes da chegada da pandemia, estávamos em um processo de transformação das unidades básicas de saúde tradicionais em unidades de estratégia de saúde da família, além de também transformar as unidades mistas, que tinham equipes de estratégia de saúde da família e também o modelo tradicional de atenção primária em unidade de saúde da família ampliadas”, lembra Solange Regina de Oliveira, subsecretária da Rede de Atenção à Saúde Coletiva de Maricá.

Uma das peculiaridades do município é ter diversos tipos de população. “Maricá é composto por um mosaico populacional e de territórios”, afirma a subsecretária, explicando que lá existem áreas urbanas e rurais, além de moradias de veraneio e regiões de povos indígenas. É ligado a grandes cidades da região metropolitana do estado e à região litorânea da Costa Azul, além de ser a cidade que mais cresce em população no Rio de Janeiro, de acordo com Solange. Por essa complexidade e por ter enfrentado outro desafio, que foi o combate à febre amarela silvestre em 2017, o município estruturou de maneira mais territorial sua atenção básica. “Maricá tem essas áreas grandes rurais, áreas de mata, muita área de preservação, animais silvestres à beça. Isso tudo obrigou a equipe de saúde a ter uma capilaridade muito grande, o que ajudou no enfrentamento à pandemia”, relembra.

Nas ações exclusivas de combate aos efeitos provocados pela Covid-19, Solange informa que todo o trabalho foi feito em rede. “É como se a gente tivesse desenhado um tour do paciente que sofre com a Covid-19, passando por todas as instâncias da saúde. A rigor, no primeiro momento – até pelo fato de somente o isolamento social horizontal ser efetivo para reduzir a contaminação, além do uso de máscara e higienização –, a gente também isolou o paciente que tinha suspeita de Covid-19 dos outros”, explica a subsecretária, que completa que essa iniciativa foi importante para que a atenção primária continuasse funcionando sem ser impactada de maneira substancial com pacientes de Covid-19 e também para acompanhar casos não hospitalares. “A gente criou um fluxo em que os pacientes com suspeita de Covid-19 não utilizavam o mesmo espaço físico dos outros. Foi o que viabilizou e possibilitou à atenção básica continuar atendendo os seus grupos prioritários, os diabéticos, os hipertensos, as gestantes com maior segurança”, explica. Passando pelo tour, ilustra, tanto quando o paciente era diagnosticado com Covid-19 como quando ficava livre do vírus, era feito contato imediato com a sua equipe de saúde da família. “Ou seja, o usuário da estratégia de saúde da família, da atenção primária, faz seu diagnóstico num ambiente separado da rede, porém imediatamente é comunicado à unidade de saúde que ele esteve lá e que tem o diagnóstico. E a unidade de saúde, por via remota ou por visita, acompanha esse paciente: [veririca] se ele está estável, se terminou sua quarentena sem maiores problemas ou se precisou de algum atendimento na rede de urgência e emergência. Nesse tour, o paciente fez seu diagnóstico num ambiente diferenciado e foi acompanhado no domicílio pela equipe de estratégia de saúde da família com a comunicação entre esses dois setores”, detalha Solange.

O município de Florianópolis, Santa Catarina, região Sul do país, com cerca de 510 mil habitantes, também apostou no fortalecimento da atenção primária à saúde como porta de entrada para o combate ao novo coronavírus, com foco nas experiências de teleatendimento. “Isso permitiu que a rede se organizasse de uma maneira muito rápida para atuar frente à pandemia da Covid-19. A aposta foi manter as unidades abertas e fortalecer e privilegiar o teleatendimento, reorganizando os fluxos na unidade, evitando as aglomerações nos serviços e, claro, garantindo os EPIs e materiais técnicos para os profissionais da saúde”, informa Ronaldo Zonta, coordenador do Departamento de Gestão da Clínica da Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis.

Na avaliação do coordenador, essa ação permitiu acompanhar melhor e mais de perto a evolução da doença, reduzindo agravos e prescrições desnecessárias, além de garantir um atendimento com maior qualidade. “Claro que, para isso, a gente tem que ter uma atenção primária funcionante, que a pessoa consiga acesso, que consiga dar resposta aos problemas dela, que ela realmente tenha uma carteira de serviços ampla. Então, a gente vê que, de modo geral, essa descentralização do atendimento, e não a centralização, é uma resposta oportuna e benéfica para a pandemia. E reduz também o risco de criar centros que vão superlotar e concentrar pessoas, deslocá-las”, explica.

Zonta observa que, mesmo antes do início da pandemia no Brasil, Florianópolis estava organizando o lançamento de um serviço de teleatendimento pré-clínico denominado ‘Alô saúde Floripa’. Nele, equipes de saúde da família podiam ter contato direto com a população. Com a pandemia, os números de telefone disponíveis aumentaram e foram amplamente divulgados para a população. “Hoje, a gente tem a possibilidade de a pessoa acessar o serviço através de um contato remoto que gera uma videoconsulta com o médico, com o enfermeiro. Dependendo do quadro, se não forem constatados sinais de gravidade, já é agendado o exame de PCR, é prescrita a medicação sintomática, é feita a orientacão. Tudo pela videoconsulta, sem que ela tenha que se deslocar. Por isso, a atenção primária 2.0, que é a remota, trouxe muitos benefícios”, avalia.

Para esse tipo de teleatendimento funcionar, analisa o coordenador do Departamento de Gestão da Clínica da Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis, um fator importante foi o vínculo, que ele chama de “histórico”, entre usuários e profissionais dos serviços de saúde, elemento que é muito mais forte na atenção básica. “A partir dessa plataforma digital, poder resgatar as experiências próprias, no sentido de ter uma equipe, um profissional, um médico em quem você tenha confiança, com quem já se consultou, com quem já tem um vínculo, muda tudo”, explica e acrescenta: “Nem sempre há o médico de família no Brasil, mas, às vezes, é um pediatra que te acompanhou até a adolescência. A gente sabe que isso realmente tem um impacto. De maneira mais ampla, vários estudos mostram indicadores positivos resultantes dessa proximidade criada. É intuitiva essa satisfação de ter um profissional com o qual se consiga contar numa hora difícil, para dar opinião e ter confiança”.

Rosicléia Borges, coordenadora municipal de atenção primária de Rurópolis, no Pará, região Norte do país, com 51,5 mil habitantes, explica que a estratégia utilizada para enfrentar a pandemia foi a integração de forças, que alinhou desde a educação em saúde à produção de EPIs em uma força-tarefa entre a equipe de atenção básica e movimentos sociais. “Montamos o Comitê de Operações Emergenciais (COE), de combate à Covid-19, formado por vários setores ainda no mês de março. Quando começaram a aparecer casos na região, esse comitê começou a atuar na parte educativa, realizamos reunião com inspetores escolares e com a parte administrativa do município, além de idosos e pessoas com comorbidade”, explica.

Para dar conta da complexidade, o comitê decidiu pela centralização dos atendimentos de suspeitos em uma única unidade e foi criado o Centro Integrado de Combate à Covid-19.

Lá os pacientes tiveram acesso a exames, testes diagnósticos, consultas, atendimentos psicológicos, internação, transporte e assistência farmacêutica. “Com essa rede paralela e exclusiva para atendimento das vítimas da Covid-19, pudemos separar os atendimentos e evitar que pessoas de grupos de risco, idosos, gestantes e crianças tivessem contato com contaminados. Essa força-tarefa envolveu cerca de 60 profissionais”, relembra Rosicléia.

A participação popular também fez grande diferença no enfrentamento da pandemia, segundo a coordenadora. Além da conscientização da população por meio dos agentes comunitários de saúde, a secretaria distribuiu kits de proteção a pessoas vulneráveis, localizadas a partir do cadastro das equipes de saúde da família. “Outra iniciativa que também completou a atuação [contra a Covid-19] em Rurópolis foi o Disque Vigilância, um canal telefônico por onde foi possível realizar o monitoramento dos casos suspeitos em que os trabalhadores das unidades básicas de saúde faziam atendimento”, conta.

Para garantir todas essas atividades em um período curto de tempo, explica Rosicléia, foi de extrema importância conhecer a população e o território em que ela vive. “Foi a partir da força e estruturação que tínhamos da atenção básica, integrando os serviços de vigilância em Saúde com os da atenção primária, e também por conta das melhorias feitas na infraestrutura das unidades básicas de saúde prévias, que Rurópolis conseguiu enfrentar com bons resultados a Covid-19”, avalia.